Para os profissionais do ramo e os interessados por política, nenhuma eleição é igual à outra, mesmo que aconteçam ao mesmo tempo. Agora, por exemplo, que teremos eleições simultâneas para cinco cargos, escolhendo seis nomes, eles são capazes de enxergar as particularidades de cada uma, percebendo as diferenças, pequenas ou grandes, que existem entre elas.
Para a maioria da população, no entanto, a política e as eleições não são coisas tão nítidas. Estão em um mundo distante, nebuloso, longe do cotidiano. Sua linguagem é monótona, repetitiva. Salvo exceções notáveis (Lula, por exemplo), seus personagens são todos parecidos, falam e fazem igual. Normalmente, as pessoas mal se lembram delas.
Até um dia em que tudo muda e as eleições invadem a vida. É quando elas chegam à televisão, inundando a programação, mudando horários e forçando a todos que se adaptem. Com centenas de candidatos tentando conquistar sua atenção, o cidadão costuma se confundir e misturar alhos com bugalhos.
Nas eleições deste ano, uma parte importante do eleitorado brasileiro será submetida a uma dificuldade adicional. Em São Paulo e em Minas Gerais, dois dos principais campos de batalha entre governo e oposição, os eleitores ouvirão mensagens dissonantes dos maiores partidos. PSDB e PT vão falar as mesmas coisas, mas vão querer que eles as entendam de maneiras diferentes.
Em São Paulo, o PSDB começa a etapa final da campanha em franca vantagem, com Geraldo Alckmin muito à frente de Aloísio Mercadante. Não quer dizer que vai ganhar, mas, se o ex-governador confirmar o favoritismo, será o quinto governo tucano em sequência no mais importante estado da federação.
O enfrentamento PSDB/PT nessas condições é uma espécie de cópia invertida da eleição presidencial. O jogo é o mesmo, mas os papeis de governo e oposição estão trocados. Por serem situação, os tucanos não acham que o estado precise de qualquer mudança. Inversamente, os petistas não querem nem ouvir falar de continuidade, sua bandeira por excelência na eleição federal. E não deixa de ser curioso observar o bailado que fazem, ora defendendo aqui o que criticam ali, ora considerando inaceitável em um nível a mesma coisa que justificam no outro.
Um jogo com componente contraditório semelhante acontece em Minas Gerais, mesmo que a disputa do PSDB não seja diretamente com o PT. No estado, a briga será entre Antonio Anastasia e Hélio Costa, do PMDB, coligado ao PT e com duas importantes lideranças petistas ao seu lado na chapa majoritária. Dessa feita, no entanto, não são os conceitos de oposição e governo que ficam embaralhados, mas os modos de posicionar os candidatos.
O PSDB mineiro não tem como escapar da valorizar a associação entre seu candidato e Aécio, pois Anastasia não tem biografia política autônoma, ainda que tenha disputado, como vice, a última eleição. Reconhecendo a popularidade do ex-governador e a boa avaliação de seu governo, a alternativa do PMDB é chamar a atenção para a biografia política e eleitoral do ex-ministro (sem descurar, é claro, de mostrá-lo ligado a Lula).
Ou seja, na hora em que começar para valer a campanha, um lado precisará ter muito cuidado para não propor, no plano estadual, o oposto do que prega no nacional. A campanha Dilma, a que mais tempo de televisão terá, vai insistir em uma argumentação que aproxima o eleitor mineiro de Anastasia. A de Serra, também poderosa, fará o inverso, jogando lenha na candidatura peemedebista.
Paradoxalmente, a campanha do PSDB para permanecer à frente dos governos estaduais em São Paulo e em Minas pode, por razões diferentes, reforçar a imagem da candidata de Lula, enquanto que as de Aloísio Mercadante e de Hélio Costa terão um simbolismo favorável a Serra.
Considerando que os dois estados, juntos, têm mais de 43 milhões de eleitores, representando, quase exatamente, um terço do eleitorado brasileiro, essas ambiguidades podem ter consequências decisivas no resultado final. É difícil antecipar o que prevalecerá, se o local sobre o nacional ou vice-versa. Mas o potencial de influência de um sobre o outro existe e é grande.
O certo é que cada campanha seguirá a lógica que todas obedecem, a de fazer o possível para vencer. Dilma vai pensar na dela, mesmo que prejudique aliados aqui ou acolá. O mesmo fará Serra. Que é o que farão as campanhas dos candidatos a governador em São Paulo e em Minas Gerais. Cada um puxando a brasa para sua sardinha.
Farinha pouca, meu pirão primeiro.
Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
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