É inegável que as velozes e radicais mudanças por que passa o “mundo do trabalho” vêm causando grande confusão na esquerda. Mas muito dessa confusão poderia ser evitada se alguns conceitos fossem mais precisos.
É o caso da ideia de que a única parte da classe trabalhadora capaz de abalar o poder do capital seria a classe operária.
Esse equívoco costuma ser produto de algumas leituras distorcidas de “O Capital” a partir de erros de tradução. Nos 150 anos da publicação dessa grande obra de Karl Marx vale a pena destacar, por exemplo, as observações feitas pelo historiador Marcelo Badaró no artigo “A classe trabalhadora: uma abordagem contemporânea à luz domaterialismo histórico”:
Nas línguas neolatinas, tendemos muitas vezes a traduzir (...) a expressão alemã empregada por Marx, Arbeiterklasse, ou o correlato inglês working class, por classe operária. Tal tradução aparece muitas vezes associada à ideia de que o verdadeiro sujeito revolucionário é o operário industrial – trabalhador produtivo...
Este entendimento restritivo e equivocado é responsável por muitas crises da esquerda nas últimas décadas: “A classe operária desapareceu ou tornou-se residual. Portanto, adeus à revolução!” Conclusões desse tipo soam como música aos ouvidos dos capitalistas.
Enquanto isso, o capital arranca imensas taxas de lucro de milhões de trabalhadores de serviços, como teleatendimento e fast-food. Explora multidões em pequenas oficinas ou grandes fábricas que integram cadeias de produção espalhadas pelo planeta. Todas ligadas a grifes tão modernas quanto escravocratas, como Nike ou Apple.
Ou seja, o constante surgimento de candidatos ao papel de sujeito revolucionário estava previsto em O Capital. Mais importante, eles estão aí, na vida real.
http://pilulas-diarias.blogspot.com.br/2017/08/marx-nao-fala-de-classe-operaria-em-o.html