sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Como o Poder Judiciário sacia sua fome e garante sua casa


judiciario

Os juízes e desembargadores gaúchos vão receber, individualmente, R$ 38,3 mil de auxílio alimentação. O poder judiciário outorga privilégios a si mesmo.


Jacques Távora Alfonsin
Foto: Carlos Humberto/SCO/STF
O site da Radio Guaíba deste 6 de novembro publica: “Os juízes e desembargadores gaúchos vão receber, individualmente, R$ 38,3 mil de auxílio alimentação retroativos a 2011. Cumprindo a decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul publicou em sua última edição do Diário Oficial o ato administrativo que garante o repasse. O valor é proporcional aos R$ 799 reais por mês de subsidio alimentação para os meses desde 2011 e valerá para os salários futuros. Os juízes tem salários a partir de R$ 22,2 mil reais.”
A Zero Hora destaca que esse auxílio vai se estender ao Ministério Público e à Defensoria. Nesse jornal, o escândalo da notícia se comprova ao lado da nota. Apesar do déficit orçamentário do Estado, previsto para 2016, subir a R$4,6 bilhões, o presidente da Famurs, Luiz Carlos Folador, “está pedindo ao relator do Orçamento na Comissão de Finanças, Marlon Santos, quatro emendas, sendo R$80 milhões para financiamento do transporte escolar, R$120 milhões para custeio dos hospitais de pequeno porte, R$100 milhões para acessos asfálticos e R$4 milhões a mais para o Fundo de Assistência social.”
Resposta do relator: “Estamos repartindo miséria. É muito difícil contemplar todos os pedidos.” Miséria seletiva, então, como a história tem repetido. Como sempre, os tais auxílios ao Poder Judiciário passam longe dela.
Se necessidades públicas como aquelas cuja satisfação é inadiável, reivindicadas pelo presidente da Famurs – transporte escolar, hospitais de pequeno porte, acessos asfálticos, fundos de assistência social – forem comparadas com benesses salariais estendidas a essas carreiras jurídicas, podemos retirar algumas conclusões dessa desigualdade imoral:
A primeira, mais do que óbvia, explica e justifica a inconformidade e até a indignação do povo com vantagens salariais levadas a um tal patamar, acrescentadas a quem já é tão bem remunerado. Como explicar isso a pessoas que recebem o bolsa família para mal poder se alimentar, outras que se socorrem do programa Minha Casa, Minha Vida para poder adquirir casa própria, um sem número de desempregadas, de sem-teto e de sem-terra, lutam diariamente para simplesmente sobreviver, não faltando, para tanto, o preconceito generalizado de que se encontram nessa situação por sua única e exclusiva responsabilidade?
Seria justo medir quanto dinheiro as políticas sociais responsáveis por manter toda essa multidão viva, nem que seja num padrão básico de dignidade, estão perdendo com o auxílio moradia e o auxílio alimentação pagos a quem agora está “legalmente” (!?) habilitado a recebê-los.
A segunda pode ser vista nas razões de serem utilizados subterfúgios para aumentar o valor dos salários de carreiras jurídicas, sonegando indiretamente o imposto de renda e dessa forma lesando toda a população carente de serviços públicos. Isso envergonha, e muito, as/os integrantes honestas/es e probas/os dessas carreiras, ao ponto de se obrigarem a renunciar aos tais penduricalhos.
Conforme reconheceu o próprio desembargador Túlio Martins, presidente do Conselho de Comunicação Social do Tribunal de Justiça do Estado, de acordo com o site da Guaíba “admite que a medida causa antipatia da sociedade.  A reserva de simpatia da população com o Poder Judiciário se desgasta. Eu não acho que nós percamos credibilidade, porque isso vem do trabalho e das decisões. Mas não é nem um pouco simpático, aumento de salário de quem ganha mais é sempre difícil, e aumento de salário indireto, com nome de auxílio, é menos simpático ainda. A perda do ponto de vista da imagem do Poder Judiciário é evidente”.
Perde credibilidade sim, pois é exatamente no trabalho e nas decisões da magistratura que o povo avalia a conduta pessoal de quem representa esse Poder. O Judiciário é um servidor do povo, trabalha por ele, para ele e com ele. De qual autoridade vai se valer quando está subtraindo de quem serve parte substancial dos recursos necessários para garantir o gozo e o exercício de direitos humanos fundamentais sociais devidos como prioritários, pelo Poder Público, como condição de vida e liberdade?
É preciso sublinhar-se a gravidade dessa falta. Trata-se do reconhecimento de uma pura e simples simulação. Os auxílios, seja o de moradia, seja o de alimentação, de auxílio só tem o nome, como o próprio desembargador reconhece, nisso se comprovando, pois, a existência de um vício legal, de forma e conteúdo, diuturnamente enfrentado pelo Poder Judiciário e por ele, paradoxalmente, punido, civil e penalmente.
Pode e deve punir o que ele mesmo faz? O art. 167, parágrafo primeiro, inciso II do Código Civil, por exemplo, retira todo ou parte de qualquer efeito de negócios jurídicos nos quais se verifique simulação. Ela é suficiente para serem declarados nulos, quando “contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira”.
Bem, vão afirmar as/os as/defensoras/es desses auxílios: isso só vale para negócios jurídicos e lá no Direito Privado. Para contrariar-se essa desculpa nem há necessidade de se lembrar que o Direito Privado tem de ser interpretado em harmonia com a Constituição Federal. “Cláusula não verdadeira”, igualmente, constitui ilícito passível de rejeição em qualquer contexto, não exclusivamente jurídico. Assim, a simulação é imoral também e, justamente por enganar e mentir, ela obriga o Poder Judiciário a não se socorrer dela, pelo artigo 37 da mesma Constituição, seja a pretexto do que for, independentemente de outra qualquer consideração.
Esse Poder está sujeito ao princípio constitucional da moralidade, não simulando, não enganando e não mentindo. Nos artigos 171 a 179 do Código Penal, aliás, quando esse trata dos crimes de estelionato e outras fraudes, não faltam disposições semelhantes para demonstrar que a simulação não é somente um ilícito jurídico civil e privado. Se assim fosse, toda essa crise política vivida atualmente no país, já teria sido vencida sem qualquer cogitação dos ilícitos morais responsáveis pela sua eclosão.
Numa das famosas bem aventuranças louvadas por Jesus Cristo, disse ele: “Bem aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados” (Evangelho de São Lucas, capítulo 5, versículo 6). É uma lástima, mas o Poder Judiciário brasileiro, com as exceções de sempre – ainda bem – à vista dos privilégios outorgados a si mesmo, não está muito interessado em se saciar desse pão, beber dessa água, nem reparti-lo/a nas casas onde mora, muito menos nos tribunais onde trabalha. (Carta Maior)

Biografia restaura trajetória política de Luiz Carlos Prestes


prestes

Entrevista – Anita Leocádia Prestes

A autora, filha do biografado, fez uma reconstituição da história do político que passou pelo exército e se tornou comunista
por Thaís Barreto — Carta Capital
Luiz-Carlos-Prestes
Prestes chega à capital de Pernambuco para participar de comício
Após mergulhar por 32 anos em documentos e relatos, a historiadora Anita Leocádia Prestes concluiu a biografia do pai. A autora de Luiz Carlos Prestes: um comunista brasileiro(Boitempo Editorial, R$ 48) afirma que a obra não é definitiva. São, contudo, mais de 500 páginas de rigorosa apuração sobre a trajetória de um dos mais destacados políticos brasileiros que aderiu ao comunismo. A preocupação de Anita foi apresentar para as novas gerações a história de um personagem que “foi sempre caluniado ou silenciado pelos donos do poder”.
Filho de militares, Prestes foi criado pela mãe – o pai faleceu cedo, quando tinha 10 anos. Estudou em escola militar e, em 1920, aos 22 anos, tornou-se segundo-tenente e foi servir no subúrbio do Rio de Janeiro. Foi quando teve a primeira imagem do povo brasileiro, segundo a autora. Via rapazes de 18 anos chegarem ao exército analfabetos, e acompanhava a rotina de humilhações que os superiores impunham aos mais novos. Prestes dedicou 70 anos à vida política e viveu até os 92 anos. Leia os principais trechos da entrevista com Anita Leocádia Prestes, filha de Prestes e Olga Benário:
Prestes
O 1º encontro de Prestes com a filha, nascida numa prisão da Alemanha nazista
CartaCapital: Como foi o processo para escrever a biografia de Luiz Carlos Prestes?
Anita Leocádia Prestes: Comecei o trabalho no início dos anos 1980, e à época não tinha certeza se ia conseguir escrever a biografia dele.
Meu pai tinha uma excelente memória, principalmente sobre a Coluna Prestes. Daí nasceu a preocupação de gravar um depoimento dele. Entrei no mestrado e doutorado em História e fui pesquisar a Coluna Prestes. Utilizei não só a entrevista dele, mas muitos outros arquivos listados no livro.
CC: Como foi pesquisar o próprio pai?
Anita: Pesquisei a vida política dele e também o Partido Comunista Brasileiro (PCB), pois se entrelaçam. Tive que estudar profundamente a história do Brasil no século XX e relacionar com a história mundial. Foram 11 livros publicados em diferentes períodos. Nesses últimos anos parti para escrever a biografia propriamente dita. No meu trabalho, a banca examinadora da minha tese de doutorado reconheceu que eu tinha conseguido alcançar objetividade. Fui criada na minha família sem mitificar o meu pai.
CC: Que pontos são essenciais para compreender a vida política de Prestes?
Anita: A preocupação de Prestes, desde muito jovem na Escola Militar, foi com os subordinados dele, o que não era comum. O que imperava no Exército era a violência, os castigos corporais por parte dos oficiais, extremamente autoritários e elitistas. Ele tinha a preocupação que os soldados estudassem, queria uma vida digna para eles.
No Rio de Janeiro ele criou três escolas: uma de alfabetização, outra para soldados e outra para sargento. Ele mesmo era o professor e dava aulas. Ninguém fazia isso no Exercito na época. Quando ele foi transferido para o Rio Grande do Sul fez a mesma coisa, tanto que isso foi muito importante na preparação até do levante da Coluna Prestes.
Capitão-do-Exército
Como capitão do Exército (sentado, o segundo da esquerda para a direita), em serviço no Rio Grande do Sul
CC: No livro você detalha como surgiu o movimento tenentista nos anos 1920, o qual pretendeu, entre outras coisas, tirar do poder o presidente Artur Bernardes, que representava exclusivamente a oligarquia brasileira. A partir daí foi formada a Coluna Prestes…
Anita: A palavra de ordem do movimento tenentista era o voto secreto, pois a eleição no Brasil era totalmente fraudada. Quando Prestes participou da Coluna, na medida em que ele conheceu o interior do Brasil, se convenceu de que aquele programa não ia resolver os problemas do país, pois a miséria era assustadora.
Ele achou que era preciso encontrar uma solução. Encerrou a Coluna e foi para o exterior. Primeiro ficou um ano na Bolívia, depois foi para Buenos Aires, o grande centro do movimento comunista. Veio ao Brasil para dois encontros muito rápidos, por insistência dos tenentes que queriam que ele apoiasse o Getúlio Vargas.
Era muito duro para ele não conseguir convencer os colegas para suas posições comunistas. Ele veio com o objetivo de desmascarar Getúlio, mostrar que ele não queria fazer revolução nenhuma, mas Getúlio era muito hábil, prometeu até armas e dinheiro para o movimento.
CC: Como está no livro, Prestes deixou claras suas posições para Getúlio e este fingiu concordar?
Anita: Exatamente. Prestes ficou isolado, um general sem soldado. Os tenentes aderiram ao movimento liberal, depois se tornam marionetes. Alguns até viraram marechais, ministros de Getúlio e até da Ditadura após 1964.
Luiz-Carlos-Prestes
Na campanha do candidato a governador de Pernambuco apoiado pelo PCB, Cid Sampaio
CC: Essa constatação do Prestes sobre as necessidades do povo foram a semente para o que ele se tornou dali em diante?
Anita: Ele chegou à conclusão que não era possível assistir tudo aquilo e ficar de braços cruzados. A partir daí, estudou o marxismo e constatou que a teoria permitiria realizar essa transformação. Essa ruptura que ele faz em 1930 com os tenentes é algo que as classes dominantes do Brasil nunca perdoaram.
Foi um momento em que o Prestes saltou sobre a trincheira da luta de classes, abandonou qualquer possibilidade de ser uma liderança a serviço da classe dominante, e se colocou ao lado dos trabalhadores, dos explorados. Ele nunca quis voltar para o Exército, tinha uma avaliação muito negativa e nunca aceitou a Anistia. Prestes encerrou a carreira de militar e passou a ser um político revolucionário.
Agenda
Lançamento do livro “Luiz Carlos Prestes: um comunista brasileiro”, com Anita Leocádia Prestes
Terça-feira 10, às 19h, no Centro de Apoio à Pesquisa Histórica da Universidade de São Paulo (USP) Endereço: Av. Professor Lineu Prestes, 338 – Cidade Universitária – São Paulo

O chavismo, a esquerda pequeno-burguesa e a luta revolucionária

chavismo
Venezuela – Diário Liberdade – [Alejandro Acosta] Às vésperas das eleições nacionais que acontecerão no dia 6 de dezembro na Venezuela, a campanha da direita pró-imperialista está esquentando.
Foto: Télam
A Administração Obama tem focado os esforços na tentativa de estabilizar o Oriente Médio, perante as eleições nacionais que acontecerão nos Estados Unidos no próximo ano. Por esse motivo, o golpismo na América Latina tem sido desescalado, mas de maneira alguma tem sido eliminado. As engrenagens golpistas continuam em movimento, mas em velocidade de cruzeiro, sem a histeria do ano passado ou do primeiro semestre deste ano. 
A direita apertou a propaganda antichavista e a esquerda pequeno-burguesa, que representa os interesses das camadas médias da sociedade, começou a repetir, que nem papagaio, os mantras direitistas.
Recentemente, um dos deputados mais esquerdistas do Psol, o ex-BBB Jean Wyllys, se especializou em defender abertamente o golpismo antichavista. Entre outras várias pérolas: “Maduro expressa seu desprezo pela democracia e pelas liberdades democráticas”.
A limitação principal do chavismo não está na “falta de democracia” e “liberdade”. Esse é o discurso da direita.
Qual é o caráter de classe do chavismo?
Hugo Chávez é um elemento de extração militar e ligado ao Estado burguês, um representante do nacionalismo burguês, embora ele mesmo seja um elemento da pequena burguesia.
Os setores da burguesia nacional obtêm lucros da exploração dos recursos nacionais e, por esse motivo, têm contradições com o imperialismo. Para enfrentar essa força poderosa, o imperialismo, fazem algumas concessões às massas com o objetivo de usá-las como massa de manobra para os próprios interesses. Devido ao temor à organização independente das massas, o nacionalismo burguês nunca é consequente na luta contra o imperialismo e tende a buscar acordos.
Nicolás Maduro, apesar da extração operária, é um representante do chavismo, um movimento nacionalista burguês que não tem na base os sindicatos ou as lutas operárias independentes, mas no movimento nacionalista surgido do exército. Uma avaliação similar também se aplicaria para os governos Kirchner, de Rafael Correa, de Humala, de Mujica e Tabaré Vázquez, de Michele Bachelet, de Humberto Ortega e os demais governos nacionalistas burgueses latino-americanos.
Diferentemente de Chávez, Lula (em 1989) era um candidato operário, surgido das lutas dos metalúrgicos do ABC e, nesse sentido, fazia, objetivamente, a luta pela formação de um partido independente avançar. A campanha de 1989 de Lula foi uma campanha proletária e da pequena burguesia de esquerda. Lula teve grande votação nas fábricas. Os trabalhadores que levavam adiante uma luta sindical e política contra a burguesia tomaram a candidatura Lula como um instrumento da sua luta, embora apenas servisse de maneira muito limitada e parcial. Como o próprio Lula declarou anos mais tarde, se ele tivesse vencido em 1989 teria havido duas opções, ou um golpe de estado ou o avanço no sentido da revolução. O governo do PT de 2003 foi fruto de um acordo com a direita e o imperialismo.
A esquerda pequeno-burguesa e a “democracia”
A campanha da direita propaga que as eleições na Venezuela seriam, supostamente, antidemocráticas. A democracia somente existiria nos países imperialistas. Jean Wyllys, ecoando a direita, chegou a declarar: “Pode chorar. O símbolo capitalista opressor está se tornando cada vez menos opressor das liberdades individuais”.
Na realidade, se houve alguém que ganhou eleições, na Venezuela e no mundo, esse foi Hugo Chávez. E mais transparência que nas eleições venezuelanas é quase impossível. Nas eleições que a direita tentou boicotar após a morte de Chávez, foram recontados muitos mais votos do que a lei contemplava. Nas seguintes eleições locais, a diferença se alargou bastante e mais ainda nas municipais. O repúdio da direita na Venezuela é grande.
Chávez não precisou do BBB para ganhar as eleições. Ele encabeçou a luta contra o regime neoliberal em colapso na década de 1990.
A propaganda do imperialismo, que sempre esteve de olho no petróleo venezuelano, é assimilada em cheio pela esquerda pequeno-burguesa (aquela que representa os interesses das classes médias). O fracassado golpe de Estado de 2002 e o fracassado lockout (greve patronal) de 2003 na PDVSA jogaram a direita numa crise da qual não tem conseguido se recuperar até hoje.
As críticas ao governo chavista para terem um caráter revolucionário devem ser direcionadas aos aspectos negativos, às limitações do chavismo. Os pontos fracos do chavismo passam pelo não rompimento com o imperialismo e pelo controle da organização independente das massas por meio dos programas sociais, que consomem 40% do orçamento público (para desespero da direita), e são assistencialistas. As políticas econômicas são muito frágeis e mantêm a dependência dos monopólios. O chavismo sempre pagou a corrupta dívida pública sem mais. A dependência do petróleo é absoluta. As importações ameaçam fazer o país entrar em colapso.
Os verdadeiros socialistas nunca devem repetir a crítica da direita que, principalmente na Venezuela, está ligada por cordão umbilical aos interesses do imperialismo: I) que “o chavismo não é democrático”; II) que “a RCTV não teve a concessão renovada”; III) que “não há liberdade na Venezuela”; IV) pior ainda, que “não há liberdade de imprensa”; V) que “o Leopoldo López é um coitadinho encarcerado”; VI) que “o chavismo é comunista”. Além de outras imbecilidades imperialistas parecidas.
O chavismo e a direita
Jean Wyllys escreveu: “O que me espanta, por isso, é o esquematismo de parte da esquerda (e digo isso como militante e deputado de um partido de esquerda), que divide o mundo em bons e maus, amigos e inimigos, e acha que a retórica anti-imperialista de Maduro é suficiente para estar ao lado dele, sem levar em consideração situações graves como o culto à figura do líder, que lembra os totalitarismos do século XX, a militarização da sociedade, com milícias ‘bolivarianas’ armadas pelo Estado que respondem ao partido, a repressão aos estudantes (tão ou mais violenta que a que nós do PSOL denunciamos quando ocorre no Brasil), a prisão de dirigentes da oposição (já tem até um promotor do Ministério Público venezuelano exilado, que denuncia ter sido pressionado para inventar provas contra um dirigente da oposição hoje preso) e uma lógica política autoritária que identifica como ‘inimigo da pátria’ todo aquele que se opõe ao governo.”
A esquerda pequeno-burguesa é uma grande apaixonada pela “liberdade” e a “democracia” em abstrato, isto é, a liberdade e a democracia imperialista.
Para a esquerda pequeno-burguesa (aquela que representa os interesses das camadas médias da sociedade), os Estados Unidos, a Alemanha, a França e a Inglaterra, entre outros, seriam democráticos porque respeitam os direitos das mulheres, dos homossexuais. Os governos nacionalistas burgueses seriam antidemocráticos: chavistas, Rafael Correa, Evo Morales, PT. Nem falar da Irmandade Muçulmana, que não gostava de homossexuais. 
A análise, a concepção do mundo, dessa esquerda, é moral. A visão dos interesses das classes sociais envolvidas é igual a zero. Não há uma única palavra sobre imperialismo, sobre a farsa da democracia burguesa, sobre a NSA (agência nacional de segurança norte-americana), sobre a cada vez mais brutal exploração capitalista, sobre o ultraparasitismo financeiro, sobre o Estado policialesco etc. E o que falar ainda sobre o Brasil? Sobre a Rede Globo? Sobre esse verniz democrático que encobre a “nossa” brutal ditadura?
Ao analisar os interesses materiais das forças políticas envolvidas na Venezuela, vemos que, os chavistas, para se manterem no poder, repassam 40% do orçamento estatal aos programas sociais. Os recursos vêm do petróleo e é exatamente isso o que está em jogo. A direita, unificada na MUD, é ligada aos Estados Unidos, sendo que a extrema-direita (Leopoldo López e outros) é ligada ao Tea Party, a extrema-direita norte-americana. Essa direita quer entregar de bandeja a PDVSA (a empresa estatal de petróleo) para os monopólios. O modelo a seguir seria o México.
Qual liberdade de imprensa?
Jean Wyllys declarou: [Na Venezuela], “há eleições periódicas e funcionam lá jornais e canais de televisão oposicionistas. Contudo, essa liberdade foi ameaçada mais de uma vez pelo governo, por exemplo quando ordenou cortar o sinal do canal de notícias colombiano NT24 e anunciou que poderia expulsar do país os repórteres da CNN e cancelar as licenças da emissora, ou quando usa a televisão pública para difamar opositores e promover o ódio, como foi feito contra o ex-candidato presidencial Henrique Capriles”
A rede televisiva RCTV tinha se envolvido diretamente no golpe de 2002 contra Hugo Chávez. Henrique Capriles esteve envolvido no golpe de 2002 e no lockout da PDVSA. Ele é ligado ao Partido Republicano, apesar de que comparado com Leopoldo López, podemos dizer que ele é um esquerdista. A família de Capriles controla uma parte importante da imprensa pró-norte-americana.
Leopoldo López já é um fascista, ligado ao Tea Party, a extrema-direita norte-americana. Ele esteve envolvido diretamente em operações contra o governo. Foi preso e, posteriormente, anistiado por Chávez. E novamente preso há um ano e pouco. Na realidade, de tão reacionário, nem o Capriles tem boas relações com ele.
Sobre a imprensa é preciso lembrar a questão das concessões. Apesar de algumas famílias, ligadas aos monopólios, considerarem essas concessões como propriedade, elas são prerrogativas do Estado que pode concedê-las, renová-las ou não. A tal “liberdade de imprensa” não passa da liberdade dos capitalistas comprarem tudo. E mais ainda no Brasil, onde a grande imprensa é grotescamente nojenta.
A política dos verdadeiros socialistas não pode levantar a bandeira da liberdade de imprensa para os capitalistas como o faz a esquerda pequeno-burguesa. A bandeira revolucionária é a da estatização total da imprensa, o controle dos trabalhadores, a divisão dos tempos na imprensa eletrônica entre as organizações sociais, pelo fim dos repasses de recursos públicos para os capitalistas, pelo fim do monopólio do papel etc.
A crise capitalista e a oposição de esquerda ao chavismo
O aprofundamento da crise capitalista alterou em termos quantitativos as relações do chavismo com a burguesia nacional e com as massas. O racha na base do chavismo foi impulsionado pelo imperialismo sobre setores que com os quais se aproxima por serem contrários aos repasses gigantescos para os programas sociais. Já a direita, o que teria a oferecer além da entrega da PDVSA aos vampiros capitalistas?
O racha no chavismo não tem na base o repúdio popular que estaria buscando um governo “moderno”, “neoliberal”. Esse racha passa, em primeiro lugar, pela política geral do governo norte-americano que busca rachar a base eleitoral de todos os governos latino-americanos de cunho nacionalista. Essa política fica ainda mais evidente no caso do PT/PMDB no Brasil ou do kirchnerismo na Argentina, os dois países mais importantes da América do Sul.
As questões colocados são: 1- Reduzir o repasse para os programas sociais, os subsídios ao consumo de petróleo (US$1= 50 litros de gasolina) e outros. Direcionar esses recursos para investimentos na PDVSA, pagar a dívida pública etc. O efeito colateral é a escalada do descontentamento social. E deve-se considerar que parte da população se armou em 2002 para enfrentar o golpe de Estado que acabou fracassando. Essa é a política do setor do chavismo que se aproxima do imperialismo. 2- Entregar tudo em bandeja para o imperialismo. Essa é a política da direita. 3- Manter tudo como está. É o que o governo tenta fazer, devido ao temor das massas, mas enfrenta muitas dificuldades por causa dos preços do petróleo.
As massas apoiam o chavismo, por causa dos programas sociais. O “engessamento” é grande, tanto no PSUV (Partido Socialista Unido), como nos sindicatos, nas organizações sociais e nas Misiones. As massas são práticas e querem resultados materiais imediatos. Não gostam das conversas típicas de intelectuais universitários. Esse é um problema gigantesco para a luta independente dos trabalhadores, mas que deverá evoluir conforme a crise capitalista continuar se aprofundando e a política chavista encontrar mais dificuldades para ser mantida.
A oposição pela esquerda ao chavismo é muito fraca. A esquerda pequeno-burguesa é nanica e muito paralisada. Orlando Chirino foi do PSUV. Rachou e formou a Unidad Socialista de Izquierda que agora se chama Partido Socialismo y Libertad. Sem qualquer mera coincidência, aplica a mesma política oportunista típica do Psol no Brasil.
Em quem um socialista deveria votar na Venezuela?
Chamar a votar na direita golpista, como a MUD, liderada por Capriles, que Jean Wyllys defende, é o cúmulo do pró-imperialismo. Mas, chamar ao voto no PSUV gera enorme confusão, apesar do apoio da população ao chavismo ser massivo. Está colocado o problema da contraposição entre a independência de classe e o apoio condicional e crítico a determinadas reformas chavistas.
Votar nas eleições burguesas para os socialistas revolucionários não passa de uma plataforma de propaganda. O golpe que a direita pró-imperialista e o imperialismo estão tentando viabilizar não será contido votando no chavismo, na Dilma ou em Scioli, mas pela reação popular nas ruas.
A luta central é contra a direita que aposta no fracasso do chavismo para retomar o poder, com consequências nefastas para os trabalhadores. Ela está indo às eleições com esse objetivo. É preciso derrotá-la, mas sem sacrificar a independência da classe operária diante do chavismo, que corresponde a outra classes social, a burguesia nacional.
A tática do socialismo revolucionário nas eleições deve seguir o mesmo princípio da luta geral, ou seja, a luta pelo desenvolvimento da consciência de classe e, portanto, de uma organização política de classe, a forma prática da consciência de classe. As eleições não passam de uma questão secundária da luta da classe operária, uma vez que o capitalismo não pode ser eliminado em forma parlamentar e eleitoral e a época das reformas parlamentares ficou há muito no passado. Tratam-se apenas de uma tribuna de propaganda pelo programa revolucionário.
Deveria ser sacrificada a independência de classe por uma tribuna de propaganda? Se tivermos força suficiente para eleger um deputado, o próprio processo da eleição já seria uma tribuna importante.
A preocupação fundamental dos revolucionários deve ser a separação da classe operária da burguesia, a delimitação permanente, achar e aplicar a política que permita avançar em direção à independência da classe operária e à revolução. É necessário mostrar os interesses diferentes, a necessidade dela ser uma classe independente. Por esse motivo, nunca devemos chamar a votar em candidatos de partidos burgueses ou em candidatos pequeno-burgueses e burgueses de esquerda, mesmo que se apresentem sob o rótulo de “socialistas”.
Sobre a questão nacional e a luta democrática há duas soluções, a da burguesia e a operária. Há políticos que estão vinculados à luta operária, apesar da política burguesa. Os únicos candidatos do nacionalismo burguês latino-americano em quem os revolucionários operários poderiam chamar a votar, neste momento, seriam Lula e Evo Morales, pois ambos têm raízes vinculadas às lutas operárias e camponesas. Mesmo assim trata-se de uma questão meramente tática que deve ser analisada, caso a caso, no sentido da evolução da luta revolucionária pela independência da classe operária.
O ideal seria lançar um candidato proletário próprio, levando em conta que as eleições burguesas, sob o ponto de vista marxista, não passam de uma tribuna propagandística. É neste sentido que os revolucionários deveriam ter trabalhado para estas eleições ou em vista ao futuro, independentemente de ter poucos votos.
Encarando o processo eleitoral como uma tribuna, é preciso focar-se na divulgação do programa revolucionário ao invés de “eleger um deputado de esquerda” como propõe, por exemplo, a frente de esquerda argentina ou brasileira.
A política da frente de esquerda é uma política centrista, oportunista e focada em questões eleitorais que visa mostrar um tamanho desses grupos numericamente maior. Não tem nada a ver com a política de frente única operária e anti-imperialista da III e da IV Internacional, nem com a experiência revolucionária prática posterior, por exemplo, a da revolução boliviana de 1952.
Alejandro Acosta é cientista social, colaborador do Diário Liberdade e escreve para seu blog pessoal.
http://www.patrialatina.com.br/o-chavismo-a-esquerda-pequeno-burguesa-e-a-luta-revolucionaria/

A reescravização dos povos ocidentais: escravo, não! Slave.

Via Resistir.info


Acontecimentos desta espécie são possíveis por todo o ocidente quando os povos descobrirem que perderam todo o controle sobre todo aspecto das suas vidas e que a sua única opção é a revolução ou a morte.
European consumer rights activists take part in a march to protest against the Transatlantic Trade and Investment Partnership (TTIP), austerity and poverty in Brussels, Belgium October 17, 2015


Paul Craig Roberts [*]

A reescravização dos povos ocidentais está a verificar-se a vários níveis. Um deles, acerca do qual tenho escrito durante mais de uma década, decorre da deslocalização de empregos. Os americanos, por exemplo, têm uma participação decrescente na produção dos bens e serviços que lhes são comercializados.

A outro nível estamos a experimentar a financiarização da economia ocidental, acerca da qual Michael Hudson é o perito principal ( Matando o hospedeiro , Killing the Host). A financiarização é o processo de remoção de qualquer presença pública na economia e de converter o excedente económico em pagamentos de juros ao sector financeiro.

Estes dois desenvolvimentos privam o povo de perspectivas económicas. Um terceiro desenvolvimento priva-o de direitos políticos. As parcerias Trans-Pacífico e Trans-Atlântica eliminam soberania política e transferem o governo para corporações globais.

Estas chamadas "parcerias comerciais" nada têm a ver com comércio. Estes acordos negociados em segredo concedem às corporações imunidade em relação às leis dos países com os quais elas fazem negócios. Isto é alcançado ao declarar que qualquer interferência de leis e regulamentos existentes ou em perspectivas sobre lucros corporativos como restrições ao comércio, pelo que as corporações podem processar e multar governos "soberanos". Exemplo: a proibição em França e outros países de produtos de organismos geneticamente modificados (OGM) seria negada pela Parceria Trans-Atlântica. A democracia simplesmente substituída pelo domínio corporativo.

Eu tinha intenção de escrever acerca disto há muito tempo. Entretanto, outros, tais como Chris Hedges, estão a fazer um bom trabalho na explicação da captura de poder que elimina governos representativos.

As corporações estão a comprar poder a preço barato. Elas compraram toda a Câmara dos Representantes (House of Representatives) dos EUA por apenas US$200 milhões. Isto é o que as corporações pagam ao Congresso para concordar com a "Via Rápida" ("Fast Track"), a qual permite ao agente das corporações, o Representante Comercial dos EUA, negociar em segredo sem a contribuição ou supervisão do Congresso .

Por outras palavras, um agente corporativo dos EUA faz a negociação com agentes corporativos dos países que serão abrangidos pela "parceria" e este punhado de pessoas bem subornadas redigirá um acordo que ultrapassa a lei de acordo com os interesses das corporações. Ninguém a negociar a parceria representa os povos ou os interesses públicos. Os governos dos países em parceria incomodam-se em votar a proposta – e serão bem pagos para votar pelo acordo.

Uma vez em vigor estas parcerias, o próprio governo será privatizado. Já não haverá mais qualquer sentido em legislativos, presidentes, primeiros-ministros, juízes.

Tribunais corporativos decidem a lei e determinam as sentenças

É provável que estas "parcerias" venham a ter consequências inesperadas. Por exemplo: a Rússia e a China não fazem parte dos acordos e nem o Irão, Brasil, Índia e África do Sul, embora de modo separado o governo indiano pareça ter sido comprado pelo agronegócio americano e esteja em vias de destruir seu auto-suficiente sistema de produção alimentar. Estes países serão depositários de soberania nacional e controle público enquanto a liberdade e a democracia extinguem-se no ocidente e entre os vassalos asiáticos do ocidente.

A revolução violenta por todo o ocidente e a completa eliminação do Um Por Cento é uma outra consequência possível. Uma vez que, por exemplo, o povo francês descobre que perdeu todo o controle sobre a sua dieta para a Monsanto e o agronegócio americano, os membros do governo francês que lançaram a França na servidão dietética aos alimentos tóxicos provavelmente serão mortos nas ruas.

Acontecimentos desta espécie são possíveis por todo o ocidente quando os povos descobrirem que perderam todo o controle sobre todo aspecto das suas vidas e que a sua única opção é a revolução ou a morte.

O original encontra-se em sputniknews.com/columnists/20151109/1029803298/us-west-economy-values.html

Os psicopatas estão bem mais próximos do que você imagina




A psiquiatra Kátia Mecler prepara a segunda edição do seu livro “Psicopatas do Cotidiano”, lançado em agosto deste ano. Eles não são os temíveis assassinos em série. São pessoas aparentemente normais que estão no trabalho, em casa ou na escola e têm em comum algum transtorno de personalidade

A própria definição de “psicopatas do cotidiano” não existe na Organização Mundial da Saúde (OMS). Como a senhora mesma disse em entrevistas anteriores, é um termo resgatado do psiquiatra alemão Kurt Schneider na década de 40. Por que escolheu esse tema? Algum caso específico a motivou?

A OMS realmente não considera a psicopatia como uma categoria médica. Schneider, no livro “As Personalidades Psicopáticas”, de 1923, tratou de pessoas cuja personalidade foge à média normal e que sofre ou causa sofrimento por causa de sua anormalidade. Essa definição é bastante próxima daquilo que tanto a OMS quanto a Associação Americana de Psiquiatria consideram hoje um transtorno de personalidade e comportamento. A principal motivação para escrever o livro foi perceber o sofrimento dos pacientes que lidam com indivíduos que têm transtornos de personalidade. Muitos chegam com a autoestima arrasada, num grau de estresse emocional inimaginável. Procuraram ajuda especializada por considerarem que têm algum problema, quando, na verdade, o problema está no outro.

A senhora pode citar alguns desses casos de muito sofrimento?

Os casos são muitos. Os psicopatas do cotidiano injetam sentimento de culpa, impotência e inadequação naqueles que estão no seu entorno. Pais que sufocam os filhos com uma vigilância sem limites, homens e mulheres envolvidos em relações amorosas excessivamente dependentes, pessoas que sofrem com parceiros manipuladores e transgressores, funcionários sufocados por chefes abusivos, enfim, um universo de situações que podem se repetir na sua casa, na sua escola, no seu trabalho.

Pela sua definição, os psicopatas do cotidiano são pessoas com transtorno de personalidade, que é um jeito de ser inflexível, rígido, que envolve sentimentos ou sensações, pensamentos ou comportamentos repetitivos que acarretam disfunção em alguma área da vida. A senhora pode traduzir essa definição?

Imagine que você tenha se casado com uma pessoa muito dependente, desse tipo que popularmente chamamos de “chiclete”. Ela está sempre exigindo a sua atenção, sofre por achar que não tem o cuidado que merece (mesmo que você nada faça além de tentar agradá-la) e acredita que é questão de tempo ser abandonada. Em algum tempo, você estará exausto emocionalmente. Outra situação comum: a mãe que faz cenas dramáticas cada vez que é contestada ou criticada pelos filhos, que chega a ter sintomas físicos de algum mal-estar para chamar a atenção. Pense ainda naquele vizinho que está sempre arrumando encrenca no prédio. Desconfia de tudo e de todos e não perde uma chance de comprar briga com quem quer que seja. São tipos com que todos nós convivemos, que exibem traços patológicos de transtorno de personalidade. Ou seja: sempre agem da mesma maneira, não admitem ser confrontados, não enxergam problemas em si.

Quando a senhora diz que o grupo B, daqueles com tendência à perversão, é o grupo da moda, o que significa? Pode explicar melhor isso?

Estamos vivendo uma época de superexposição da vida pessoal, da intimidade. De ter é melhor do que ser. As pessoas estão conectadas 24 horas por dia, exibindo seus corpos, seus bens materiais, seus relacionamentos. O conceito de privacidade mudou. Nesse contexto, pessoas com tendências ao egocentrismo, à vaidade excessiva, à manipulação, à mentira, à sedução sentem-se muito à vontade. São características que perpassam os quatro tipos do grupo B. Porém, cada um deles tem traços próprios.

Pode falar um pouco sobre esses quatro subitens (antissociais, borderlines, narcisistas e histriônicos)?

No caso dos antissociais, estamos falando de pessoas manipuladoras, transgressoras, que botam seus desejos e necessidades acima de qualquer coisa. Agem como parasitas sociais, sugando as energias emocionais do outro. E não têm constrangimento em usar e descartar quem quer que seja. Os borderlines são instáveis, passam do amor ao ódio em segundos. Podem assumir comportamentos de risco em relação a sexo e drogas, por exemplo, e tendem à automutilação e ao pensamento suicida. O narcisista, de maneira bem simples, é aquele cidadão que chega e pergunta: “Sabe com quem está falando?” É alguém que se considera acima do bem e do mal, tão especial que não precisa seguir regras. Já o indivíduo com transtorno de personalidade histriônico poderá ser reconhecido pela tendência à dramaticidade, à necessidade de estar sempre sob os holofotes.

Já vi estimativas de que 5% da população seria, de forma mais leve ou mais grave, psicopata. Existe alguma estimativa de quanto desse total seria de psicopatas do cotidiano?

Tanto a OMS quanto a Associação Americana de Psiquiatria estimam que cerca de 10% da população têm um ou mais traços patológicos de transtornos de personalidade. A mera presença de uma característica (típica de um problema psíquico), sem trazer tantos prejuízos, não é suficiente para definir a doença.

Se no trabalho você tem colegas ou um chefe psicopata do cotidiano, como se “defender” dele? Tem um jeito de agir com que você “neutraliza” a influência negativa na sua vida?

No trabalho, em família ou na sociedade, há alguns caminhos para conviver de maneira menos traumática com um psicopata do cotidiano. O primeiro passo é entender que você não é a única vítima. Pessoas com esses traços agem da mesma forma com todos. Saiba também que confrontá-lo não vai adiantar. Dificilmente uma pessoa com essas características compreende que tem um problema – ela acredita que o problema são os outros. Quando você compreende que seu chefe é daquele jeito e que não vai mudar, você aprende a se defender e a reagir melhor.


O Tempo )

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

A lógica corporativa e o conceito de humanidade

"Vamos agora aos destaques sobre o desastre ambiental em Mariana", anuncia locutor de uma rádio de Belo Horizonte.

Aumentei o volume. Será que falariam sobre as consequências trágicas para a população da comunidade destruída pela lama? Abordariam as responsabilidades óbvias da Samarco/Vale? O que falariam sobr...

"A presidente Dilma Roussef foi vaiada em Governador Valadares durante viagem para visitar a região do desastre.", completou o sujeito.

Claro. Como posso permanecer ingênuo assim?

A lógica da mídia corporativa é clara: se há alguma questão envolvendo uma estatal, ataque a estatal; se envolve uma empresa privada, ataque o governo. Não é à toa que a maior parte das matérias produzidas pela velha mídia se concentra em desculpas em nome da Samarco/Vale: teria sido um abalo sísmico? A lama não era tóxica, vejam que bom. Acidentes acontecem; seria precipitado atribuir responsabilidade à EMPRESA RESPONSÁVEL PELA BARRAGEM QUE ROMPEU. 

Certo? Certo? Certo?

Por outro lado, se o heroico e ilibado juiz Moro diz que a Lava-Jato SUPÕE um valor de 40 bilhões de prejuízo no esquema (isso depois de - igualmente na base da suposição - chutar 20 bilhões), as manchetes imediatamente assumem o valor como fato a fim de martelar na cabeça dos leitores mais um dos vários boatos que visam enfraquecer a empresa a fim de facilitar uma eventual privatização (ou, no mínimo, uma abertura para a exploração de reservas por parte de empresas privadas estrangeiras).

A matemática do capital não é sutil, basta descobrir os olhos: as mesmas empresas que compram mandatos parlamentares com financiamento de campanha a fim de aprovar legislações que facilitam suas ações, desregulamentando o setor, agora contam com o apoio da mídia para tentar isentá-las de culpa ou para fazer um terrorismo acerca dos "prejuízos" que o PAÍS teria caso as multas e outras penalidades impostas pelo governo sejam severas demais.

Não à toa, semana passada o Diário de São Paulo, ao noticiar a queda no número de fatalidades no trânsito graças às medidas adotadas pela prefeitura de Haddad, mancheteou "Redução nas mortes do trânsito tem um preço alto".
Os sobreviventes e seus amigos e familiares discordam de que o preço seja alto.
Esta é a lógica corporativista: o lucro vale mais do que a vida. Uma lógica que, inacreditavelmente, muitos parecem adotar - tanto que já criaram uma página chamada "Somos Todos Samarco".

E a partir do momento em que um desastre provocado pela barragem de uma empresa que destrói toda uma comunidade desperta, como resposta, manifestações de solidariedade À EMPRESA... bom, podemos começar a repensar todo o nosso conceito de "humanidade".

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P.S.: Querem uma ilustração clara do que estou falando? "Deputados da comissão de barragens receberam R$ 587 mil de mineradoras" http://www.otempo.com.br/cidades/deputados-da-comiss%C3%A3o-de-barragens-receberam-r-587-mil-de-mineradoras-1.1164302

A REPÚBLICA DAS BANANAS





Era inevitável e portanto, aconteceu o esperado. Após um pequeno delírio de imaginarmos ir para o Primeiro Mundo, onde as coisas funcionam e você é respeitado como cidadão, e enquanto país no cenário mundial, voltamos ao lugar de onde em verdade, nunca saímos.

O Brasil está voltando a passos largos, a ser a boa e velha República de Bananas que sempre foi. Aquele lugarzinho tão conhecido na América Latina, onde quem tem poder, faz o que quer. Derruba e elege presidentes, rouba descaradamente, achaca, ameaça e especialmente, vende tudo. Tudo é colocado à venda a preços módicos aos ricaços de fora. Melhor ainda se forem os ricaços do Tio Sam.

A culpa neste caso, não é do pobre que vive do Bolsa Família, como pensa a maioria de nossa classe-média. Não. O pobre mal tem o que comer, quem dirá ter poder de influenciar alguma coisa em algum lugar. A culpa é dela mesma, a classe-média desinformada, que insiste em acreditar que todo o mal do mundo provém dos pobres e dos 80 reais que eles ganham por mês pra não morrerem de fome.

Não analisam, porque não querem, que o que sangra um país são as universidades públicas frequentadas por endinheirados que poderiam pagar uma particular. São os empregos públicos bem remunerados, ocupados por quem tem grana pra pagar um curso preparatório ou mesmo, por quem tem influência pra obter para sí, uma vaga arranjada, sempre em busca da tal "estabilidade".

O pobre não consegue nem um, nem outro. Esse pobre que no mínimo precisa de educação pra poder alterar nossa força de trabalho, que é mundialmente reconhecida como despreparada e ignorante, portanto, pouco produtiva. O pobre que precisa ser capacitado pra trabalhar nas empresas e gerar lucro pro patrão e renda para toda a sociedade não consegue acesso justamente à educação que faria todo mundo ganhar mais dinheiro. E quem impede? O próprio patrão que seria o primeiro a ganhar. Mas afinal, como sabemos, no Brasil pobre só merece ter dois dentes. Um pra doer, outro pra abrir garrafa. Quantas vezes você já ouviu essa frase?

O que sangra o país são as mamatas da sonegação bilionária que vemos todos os anos, que sequer são lembradas pela imprensa, especialmente porque ela mesma está entre os maiores sonegadores. O que sangra o país são políticos pilantras, que preferem atear fogo ao país, do que abrir mão do interesse próprio, mesquinho e perturbador.

O que sangra o país é não termos espírito de pátria. É concordarmos alegremente em sermos estuprados por forças alienígenas, que nada mais querem do que nossas vestes pra usar como tapete, usado na entrada de suas garagens em dias de chuva.

O que sangra um país é a indignação seletiva. É ver um imbecil nas redes sociais justificando porque o corrupto que ele apoia, é melhor do que o corrupto que o outro apoia. E curioso, normalmente esse tal imbecil sequer leva uma fatia do roubo que seu político preferido está promovendo. É a vassalagem gratuita mais incompreensível do universo.

Roubar é feio, mas deixar que outros te roubem, sem dó nem piedade, e ainda exaltá-los como se fossem salvadores da pátria, é de dar medo. É burrice atroz.

E esta burrice, como já dito, não vem do pobre miserável. Esse, pode até se vender, mas é por necessidade primária. Se vende por comida. A classe-média se vende por polos da Tommy Hilfiger compradas em Miami em shoppings desqualificados.

Vamos lembrar daquela colunista "chique" de um certo jornal carioca, que falava que isso era brega, que aquilo era sofisticado. Que detonava os pobres porque eram um bando de jacús e que um dia, se deu a falar em sua coluna que não tinha mais graça ir pra Paris porque o porteiro de seu prédio agora também podia ir. Mal sabia ela que em Paris também há diversos pobres e todos eles são franceses. Alguns até são porteiros de prédio. E em Paris também há jornalistas mal remunerados, que sonham em algum dia, serem algo que nunca serão.

Aí a respeitável senhora perdeu o emprego e foi bater na porta da Justiça do Trabalho. Aquela mesma justiça que ela defenestrou, porque dava direitos a quem? Aos porteiros que ela odeia, às empregadas domésticas que ela gostava de ter, mas não queria pagar. E pior, esta senhora pediu a Assistência Judiciária Gratuita, que é o expediente concedido pela lei, a quem não tem grana pra pagar as custas judiciais.

E aquela moça que um dia postou no Facebook que voar tinha perdido o glamour, já que havia pobres, negros e gente mal vestida no avião.

E aquele outro jornalista, dito economista, que nunca leu O Capital (nem que fosse só pra saber do que se trata), que trabalhava numa famosa revista brasileira, de números de circulação e vendagem falsificados, e que ergueu um cartaz numa manifestação pública, dizendo que preferia limpar privada nos Estados Unidos, que ser governado pelo PT.

Onde está ele neste exato momento? Onde sempre quis, fazendo o que preferia. Existe certa poesia no mundo que nem sempre vemos de imediato.

Na União Soviética na Guerra Fria, foi inventado um termo bem bacana, que espelha exatamente o que essa gente é. O "idiota útil". Aquele bobalhão desinformado, que acredita em tudo o que certas pessoas mandam ele acreditar, e pensam, ilusoriamente, que um dia conseguirão um espaço no seleto grupo dos abonados.

E antes que pensem que esse artigo é uma ode ao comunismo, note que o "idiota útil" dito pelo governo, era direcionado aos próprios cidadãos soviéticos, que amestrados que eram, não viam o que seus mandatários faziam em verdade.

Evidentemente seu equivalente ocidental existia e existe em larga escala. Ninguém produziu tantos idiotas úteis como a América.

Não, amigo ingênuo. Você não conseguirá fazer parte deste grupo de abonados, porque ele não aceita novos sócios. Especialmente os que não são originalmente daquela classe social. Os "emergentes" não são considerados nobres, nem nunca serão. O seleto grupo apenas aceita serviçais, remunerados de acordo com a serventia.

O que nos tem levado rapidamente de volta à bananice das repúblicas, é nossa falta de amor próprio. É optar livremente por sermos empregados mal remunerados do capital especulativo que somente nos dá migalhas em troca da servidão da alma.

E sim, nossa classe-média é servil até a alma. 

Se isso nos traz algum consolo, vale a constatação de que toda a América Latina está voltando a ser república de bananas. Ora, foram ingênuos os presidentes que imaginaram que o poder financeiro internacional concordaria sem maiores consequências, em perder o seu lugar no olimpo dos privilégios. Só a China conseguiu isso sem ser incomodada. E não porque esqueceram dela e sim, porque antes de tudo, ela construiu um governo poderoso e inflexível. Depois, construiu a bomba atômica. Depois, reverteu a ordem financeira internacional com produtos baratos, produção massiva e fantásticas reservas financeiras e aquisições de bônus de todos os governos ditos centrais. Ou seja, Os EUA e a Europa estão no bolso da China e não há nada que possa ser feito.

E não se engane você ao achar que a China tem poder porque é grande e populosa. A Índia também é, e nunca passou de uma república de bananas da Ásia.

Mas é chato que isso esteja acontecendo. Foi bom o delírio momentâneo de sermos respeitados enquanto país.

Ao contrário, voltamos rapidinho a sermos mandados por gente estúpida muito possivelmente pior do que os estúpidos que foram eleitos por nós mesmos nos últimos pleitos.

Mas como já cansei de dizer, o brasileiro tem demonstrado que não merece nada a mais do que isso. Se não sabemos sequer valorizar a democracia e as leis, como podemos pensar que algo maior estaria disponível?

Welcome Woody Allen. Venha refilmar seu "Bananas" de 1971 em nossas terras de 2015. Material humano você terá em abundância. Especialmente na classe que se acha sabichona.

http://anaispoliticos.blogspot.com.br/2015/10/a-republica-das-bananas.html