quinta-feira, 16 de maio de 2019

Uber: de volta ao século 19


“O Trabalho na Uber é neofeudal”, diz o título de entrevista publicada no portal Sul21, em 13/05/2019. As palavras são do procurador Rodrigo de Lacerda Carelli, que integra o Grupo de Estudos “GE Uber”, do Ministério Público do Trabalho.

O grupo realizou um estudo sobre “as novas formas de organização do trabalho relacionadas à atuação por meio de aplicativos”. Para Carelli:

A estrutura da relação entre as empresas que se utilizam de aplicativos para a realização de sua atividade econômica e os motoristas se dá na forma de aliança neofeudal, na qual chama os trabalhadores de “parceiros”. Por ela, concede-se certa liberdade aos trabalhadores, como “você decide a hora e quanto vai trabalhar”, que é imediatamente negada pelo dever de aliança e de cumprimento dos objetivos traçados na programação, que é realizada de forma unilateral pelas empresas.

Ainda segundo o procurador:

...as ordens do empregador não são mais dadas diretamente por ele mesmo ou por um preposto qualquer. O preposto passa a ser o aplicativo.

(...)

Antigamente você xingava seu empregador porque ele não estava pagando um salário decente. Hoje em dia, os trabalhadores reclamam do aplicativo, do sistema. Ergueram uma parede entre o empregador e o trabalhador. O aplicativo consegue invisibilizar o empregador.

A comparação do entrevistado com o feudalismo faz algum sentido. Mas nas relações feudais, não havia nada de tão invisível. O servo sabia perfeitamente que reis e outros poderes o exploravam.

Tornar a exploração invisível é uma especialidade capitalista. Bem antiga, inclusive. O pagamento de salários por peças era uma espécie de “uber” do século 19. É a isso que estamos voltando.

Leia também: Teria Marx previsto o Uber?

Bolsonaro e a aposta no caos


O bolsonarismo aposta no caos para levar adiante seu projeto autoritário. Resumidamente, é isso o que pensa o professor da UFMG Roberto Andrés, em entrevista que concedeu recentemente para o IHU. Segundo ele:
...talvez o presidente não esteja tão preocupado com a significativa queda de aprovação nos primeiros três meses, tendo a proeza de ser o presidente com pior avaliação nos 100 dias do primeiro mandato desde a redemocratização – comparando-se com Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma. Como a queda parece que atingiu um piso de cerca de 30% de aprovação positiva e este piso é bem maior do que aquele que era o teto do então candidato antes da facada nas eleições (cerca de 17%), a situação, por ora, é confortável. Pensando bem, esta é a verdadeira proeza: um governo que entrega muito pouco, que passa os dias criando falsas polêmicas e batendo cabeça com aliados, ter 1/3 da população, achando que está tudo ótimo.

Como tem sido dito, não se trata, para este governo, de buscar dialogar com a maioria, mas de garantir a “melhor minoria” – a mais fidelizada, engajada e barulhenta. O risco maior para a democracia brasileira é o bolsonarismo conseguir, enquanto governo, levar adiante a estratégia de campanha bem-sucedida dos últimos quatro anos e fazer sua minoria barulhenta aumentar, chegando à metade do eleitorado. Hipótese que para muitos parece improvável, mas ainda hoje tenho arrepios quando me lembro dos analistas, em meados de 2016, que diziam que o teto do bolsonarismo estava entre 6 e 8% do eleitorado.


Arrepios não nos faltam, mas precisamos deixá-los para trás urgentemente