quinta-feira, 11 de abril de 2019

O fim da imprensa e da internete


“Não ignore as mudanças do Brasil de Bolsonaro”, adverte Leandro Demori em artigo publicado no Intercept Brasil, em 28/10/2018.

Dois trechos se destacam. O primeiro fala em “fim da internet”:

Todo o caos fértil que a rede nos pareceu em meados dos anos 90 e depois, toda aquela libertação dos meios tradicionais nos anos 2000, se transformou em um engenho de algoritmos no qual nós somos os animais a empurrar a roda. Animais que votam com a cabeça entupida de desinformação.

O segundo é sobre uma imprensa moribunda:

É preciso também falar sobre a insistência da imprensa em conversar só com a elite intelectual. Sobre o linguajar complicado, a profusão de jargões, as matérias escritas para serem elogiadas pelos colegas jornalistas, para terem lugar cativo nas newsletter de iniciados, e para serem ignoradas pela população em geral. Esse sistema perdeu, foi humilhado por memes e notícias falsas. A separação antiga entre “jornalismo e opinião” – como se não pudesse haver “jornalismo” mentiroso e “opinião” informativa e embasada – perdeu o sentido. Porque não importa o que nós, jornalistas, achamos sobre esses velhos cânones, o que importa é a percepção das pessoas.

Segundo ele, não “é mais possível construir uma manchete em que Bolsonaro acusa o PT de fraude nas urnas sem dizer que ele não tem provas”.

E conclui: “O jornalismo precisa parar de fingir que não é parte do jogo e que existe só para ‘reportar os fatos’”.

Se Demori espera ser ouvido pela grande mídia, jamais conseguirá. Mas suas advertências são perfeitas para a imprensa de esquerda. Este setor que também precisa ser salvo do falecimento.

A máquina Enigma de nossos tempos


A máquina “Enigma” ficou famosa por ter sido utilizada pelos nazistas na Segunda Guerra, para codificar mensagens de modo quase indecifrável. 

Seu funcionamento baseava-se em de três rotores intercambiáveis, possibilitando mais de 105 mil combinações possíveis para criptografar uma mensagem.

A máquina teria seu mecanismo totalmente desvendado em 1940 por matemáticos britânicos. Entre eles, Alan Turing, conhecido por ser um dos primeiros idealizadores do computador.

Mas o trabalho de decodificação começou com matemáticos poloneses, em 1933. Bem antes da guerra, portanto. Afinal, já naquela época, Hitler não escondia seus planos macabros de ninguém.

Os tempos em que vivemos também têm sua própria máquina Enigma. E muitos fascistas por trás dela. São os algoritmos das redes virtuais, cada vez mais onipresentes na vida social.

O problema é que demoramos demais a descobrir não apenas o código, mas a própria existência da máquina que os gera. Foi apenas quando suas mensagens já estavam fazendo estragos aos montes que atentamos para a situação.

Nós até tivemos alguns “poloneses” tentando fazer sua parte. Denunciando a máquina e seu potencial destruidor. Mas foi tudo simplesmente ignorado. E isso apesar dos vários equivalentes de Hitler circulando mundo afora.

Agora, é tentar recuperar um valioso tempo perdido. Mas não basta somente decifrar os códigos do inimigo. Precisamos descobrir também porque nós e nossos potenciais aliados nos tornamos

Globo, Facebook e outros fatores tóxicos do debate público



Em sua coluna publicada no Globo, em 29/02/2019, Pedro Doria discute a Esfera Pública na era digital. Ele começa lembrando como o impacto da criação da imprensa no século 16 teria levado a uma repentina explosão de acesso à informação.

E quanto mais informação circula, diz o colunista, maior a consciência do quão pouco se sabia antes. Mais se questionam as instituições estabelecidas e menos se acredita “nas fontes tradicionais”. Histórias estapafúrdias se popularizaram. Viralizaram, diríamos hoje. Naquela época, os relatos “fake” envolviam “sereias e monstros marinhos”, por exemplo.

“Esfera Pública é aquela parcela da sociedade que participa do debate a respeito das coisas de interesse comum a todos”, define Doria. Após o Iluminismo, a “implantação das democracias” levou à Esfera Pública “uma série de critérios para orientar os debates”, afirma. Entre eles, a ideia de que “fatos científicos não seriam questionados”. Ou de que opções religiosas não poderiam “se intrometer como critério no debate público”.

Mas estes valores jamais foram unânimes na sociedade. ”E pessoas que antes não participavam da Esfera Pública (...) agora participam graças às novas tecnologias. Isso quer dizer que democracias precisarão sobreviver a ambientes nos quais o consenso possível é muito menor”, conclui o colunista.

Sem dúvida, uma leitura muito interessante sobre o que vem acontecendo. Mas esse levantamento histórico precisaria considerar outras fases. Principalmente, aquela da criação dos grandes monopólios da comunicação.

Foi essa fase que tornou possível o surgimento dos poderosíssimos controladores digitais de informações contemporâneos. Novíssimas ou nem tanto, Facebook ou Globo, são corporações como estas as maiores responsáveis pelo clima tóxico do debate público atual.


segunda-feira, 8 de abril de 2019

Por um feminismo das classes trabalhadoras

Em 0
5/03/2019, foi lançado o manifesto “Feminismo para os 99%”, por Nancy Fraser, Cinzia Arruzza e Tithi Bhattacharya.

Em entrevista publicada no portal Outras Palavras, a professora estadunidense Nancy Fraser afirma que o objetivo é substituir “o feminismo corporativo de elite” por um “feminismo das classes trabalhadoras”.

Afinal, diz ela, o capital baseia-se:

...na reprodução social do trabalho não assalariado. Algo que as mulheres fazem: criar filhos, criar laços e vínculos sociais e afetivos, educar meninos e meninas que sustentam a força do trabalho. Assim, as relações de classe não são constituídas apenas na fábrica, elas se formam nos e através dos espaços desse trabalho social reprodutivo.

Para Nancy:

...as mulheres são parte integrante do que chamamos de classe trabalhadora. O fato de não receberem um salário não significa que não estejam trabalhando. Elas trabalham no absolutamente essencial, sem o qual você não pode pensar na ideia padrão do trabalhador assalariado ou do capitalismo.

Seria um movimento anticapitalista que inclua o feminismo para os 99%. Envolva os movimentos operário, ambientalista, antirracista, em defesa dos migrantes...“Se não tivermos uma alternativa, é claro que parte desses grupos sociais caminhará politicamente à direita”, afirma Nancy. E conclui:

Não acho que o feminismo possa fazê-lo por si só, mas penso que, por razões conjunturais, é a força mais visível, crescente e radical que vemos. Mas tem que se aliar às correntes antissistema de outros movimentos sociais e aos partidos de esquerda que estão em cena e abertos a expandir sua ideia da luta da classe trabalhadora, rejeitar o dogmatismo sectário e colocar as mulheres no centro.

Parece muito bom!