segunda-feira, 18 de abril de 2016

Um golpe parlamentar e a volta reacionária da religião, da família, de Deus e contra a corrupção




"Importa notar um fato preocupante: emergiu novamente como um espantalho a velha campanha que reforçou o golpe militar de 1964: as marchas da religião, da família, de Deus e contra a corrupção. Dezenas de parlamentares da bancada evangélica claramente fizeram discursos de tom religioso e invocando o nome de de Deus. E todos, sem exceção, votaram pelo impedimento. Poucas vezes se ofendeu tanto o segundo mandamento da lei de Deus que proibe usar o santo nome de Deus em vão. Grande parte dos parlamentares de forma pueril dedicavam seu voto à família, à esposa, à avó, aos filhos e aos netos, citando seus nomes, numa espetacularização da política de reles banalidade", constata Leonardo Boff, teólogo e escritor.

Eis o artigo.
Observando o comportamento dos parlamentares nos três dias em que discutiram a admissibilidade do impedimento da presidenta Dilma Rousseff parecia-nos ver criançolas se divertindo num jardim da infância. Gritarias por todo canto. Coros recitando seus mantras contra ou a favor do impedimento.
Alguns vinham fantasiados com os símbolos de suas causas. Pessoas vestidas com a bandeira nacional como se estivessem num dia de carnaval. Placas com seus slogans repetitivos. Enfim, um espetáculo indigno de pessoas decentes de quem se esperaria um mínimo de seriedade. Chegou-se a fazer até um bolão de apostas como se fora um jogo do bicho ou de futebol.
Mas o que mais causou estranheza foi a figura do presidente da Câmara que presidiu a sessão, o deputado Eduardo Cunha. Ele vem acusado de muitos crimes e é réu pelo Supremo Tribunal Federal: um gangster julgando uma mulher decente contra a qual ninguém ousou lhe atribuir qualquer crime.
Precisamos questionar a responsabilidade do Supremo Tribunal Federal por ter permitido esse ato que nos envergonhou nacional e internacionalmente a ponto de o New York Times de 15 de abril escrever: “Ela não roubou nada, mas está sendo julgada por uma quadrilha de ladrões”. Que interesse secreto alimenta a Suprema Corte face a tão escandalosa omissão? Recusamos a idéia de que esteja participando de alguma conspiração.
Ocorreu na declaração de voto algo absolutamente desviante. Tratava-se de julgar se a presidenta havia cometido um crime de irresponsabilidade fiscal junto a outros manejos administrativos das finanças, base jurídica para um processo político de impedimento que implica destituir a presidenta de seu cargo, conseguido pelo voto popular majoritário. Grande parte dos deputados sequer se referiu a essa base jurídica, as famosas pedaladas fiscais etc. Ao invés de se ater juridicamente ao eventual crime, deram asas à politização da insatisfação generalizada que corre pela sociedade em razão da crise econômica, do desemprego e da corrupção na Petrobrás. Essa insatisfação pode representar um erro político da presidenta mas não configura um crime.
Como num ritornello, a grande maioria se concentrou na corrupção e nos efeitos negativos da crise. Apostrofaram hipocritamente o governo de corrupto quando sabemos que um grande número de deputados está indiciado em crimes de corrupção. Boa parte deles se elegeu com dinheiro da corrupção política, sustentada pelas empresas. Generalizando, com honrosas exceções, os deputados não representam os interesses coletivos mas aqueles das empresas que lhes financiaram as campanhas.
Importa notar um fato preocupante: emergiu novamente como um espantalho a velha campanha que reforçou o golpe militar de 1964: as marchas da religião, da família, de Deus e contra a corrupção. Dezenas de parlamentares da bancada evangélica claramente fizeram discursos de tom religioso e invocando o nome de de Deus. E todos, sem exceção, votaram pelo impedimento. Poucas vezes se ofendeu tanto o segundo mandamento da lei de Deus que proibe usar o santo nome de Deus em vão. Grande parte dos parlamentares de forma puerial dedicavam seu voto à família, à esposa, à avó, aos filhos e aos netos, citando seus nomes, numa espetacularização da política de reles banalidade. Ao contrario, aqueles contra o impedimento argumentavam e mostravam um comportamento decente.
Fez-se um julgamento apenas politico sem embasamento jurídico convicente, o que fere o preceito constitucional. O que ocorreu foi um golpe parlamentar inaceitável.
Os votos contra o impedimento não foram suficientes. Todos saimos diminuidos como nação e envergonhados dos representantes do povo que, na verdade, não o representam nem pretendem mudar as regras do jogo político.
Agora nos resta esperar a racionalidade do Senado que irá analisar a validade ou não dos argumentos jurídicos, base para um julgamento político acerca de um eventual crime de responsabilidade, negado por notáveis juristas do país.
Talvez não tenhamos ainda suficientemente amadurecido como povo para poder realizar uma democracia digna deste nome: a tradução para o campo da politica da soberania popular.
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/553832-um-golpe-parlamentar-e-a-volta-reacionaria-da-religiao-da-familia-de-deus-e-contra-a-corrupcao

Cientistas políticos criticam argumentos de deputados em votação do impeachment




Para a professora da UFMG, Marlise Matos, “É entristecedor ver a qualidade de argumentos”.
Cientistas políticos criticaram a argumentação de deputados na sessão do plenário da Câmara que votou a admissibilidade do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
Os parlamentares dedicaram os votos às suas famílias, a Deus, aos evangélicos, aos cristãos, aos prefeitos de suas cidades e correligionários. A sessão foi marcada pela presença de cartazes, bandeiras, hino e gritos de guerra.
Com 367 votos a favor (mais de dois terços dos 513 deputados), 137 contra, sete abstenções e duas ausências, o parecer pela instauração do processo de impeachment foi aprovado nesse domingo (17) na Câmara dos Deputados. Agora cabe ao Senado decidir se processa e julga a presidenta.
“Acho estarrecedor, em um país republicano, que tem princípios de laicidade do Estado, levantar argumentos religiosos e a família.
Pouquíssimos levantaram os motivos reais que são julgados no processo. É entristecedor ver a qualidade de argumentos, todos arregimentados para seu entorno, em questões de seu interesse”, disse a professora do Departamento de Ciência Política e coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marlise Matos.
A professora destaca que há uma leitura estranha do que seja o interesse democrático. “Há pessoas caricatas, como [o deputado Jair] Bolsonaro, que não contam. Mas deveria ser pedagógico, fica muito claro que o problema não é a presidenta Dilma Rousseff, o PT. Temos um problema muito mais sério, mais grave. Ficou explícita a falência do sistema representativo brasileiro”, argumentou Marlise.
Para o professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Jorge Almeida, em nenhum momento ficou caracterizado o crime por parte da presidenta Dilma Rousseff.
“Raros foram os parlamentares pró-impeachment que argumentaram a existência de crime de responsabilidade. Falaram sobre questões econômicas, políticas, sociais, religiosas, lembraram as famílias e os próprios familiares. Isso mostra a fraqueza desse argumento e que foi realmente um julgamento político”.
Pablo Ortellado, professor de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), disse que para muitos brasileiros foi um choque conhecer o Parlamento. “Ele é muito ruim, muito desqualificado. É muito assustadora a qualidade dos nossos deputados. Os nossos parlamentares são muito ruins, mas o baixo clero é muito inferior. Não é programático, não é ideológico”.
Por sua vez, o professor do programa de pós-graduação de ciência política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Rodrigo Gonzalez, diz que cada um está aproveitando seus 30 segundos de fama. “Porque é bom lembrar que, fora poucas lideranças, a maioria tem poucas oportunidades de aparecer na mídia nacional. É a oportunidade que os deputados pouco conhecidos têm, e vale qualquer tipo de manifestação”.

Mudanças imediatas
Para o professor da UFRGS, as manifestações dos deputados precisam ser mais moderadas, pois estão fazendo um discurso comum de que essa votação muda o país. “Essa votação não só não muda o país, como os nossos representantes deveriam temperar os discurso com um pouco de racionalidade”.
Gonzalez observou que os discursos exaltados podem acender algum tipo de expectativa que não pode ser entregue à população. “A inflação não vai baixar amanhã, o [vice-presidente, Michel] Temer não vai assumir amanhã. Dessa forma, se joga uma expectativa que não pode ser cumprida”.
O professor diz que o país passará por mais um período tumultuado até o processo de julgamento da presidenta no Senado. “Não há garantia de que a partir de amanhã haja um país pacificado, vão se exaltar mais ainda. Nesse meio tempo, os partidos que são situação passarão a oposição”, lembrou.

Alto quórum
Ao contrário do que muitos imaginavam, apenas dois dos 513 deputados que compõem a Câmara se ausentaram da votação sobre a abertura do processo de impeachment. Compareceram para a votação 511 deputados.
De acordo com Ortellado, a presença em massa dos parlamentares já era aguardada na votação. “Era esperado, porque há muita pressão popular para os deputados irem. Acho que não houve nenhuma grande surpresa”. Os dois faltosos são Anibal Gomes (PMDB-CE), que estaria com problema de saúde, e a deputada Clarisse Garotinho (PR-RJ), que está na 35ª semana de gravidez e apresentou atestado médico.
O professor da UFRGS acredita que, em um momento de polarização, um abandono do plenário seria difícil de ser justificado. “Não só o deputado está perdendo sua visibilidade, como vai ser condenado por ter fugido da raia”.
Para Jorge Almeida, da UFBA, a presença maciça de deputados na votação na Câmara foi fruto da cooptação, distribuição de recursos e de cargos. “Foi um processo muito rebaixado do ponto de vista político. O Congresso virou uma feira de varejo. Grande parte dos votos foi fruto de interesses particulares”.
Segundo o professor, uma reforma política deveria inserir a possibilidade de destituição do presidente da República. “Já houve um ataque à democracia. A legislação tem uma falha porque não traz a possibilidade de destituição do presidente por vontade popular, por plebiscito”.

Impactos
Para os cientistas políticos, o impeachment é um instrumento legítimo que, no entanto, deixa traumas em uma sociedade democrática.
“Ele deve ser usado muito excepcionalmente, porque já é um trauma quando utilizado dentro do previsto, dentro da lei. A lei do impeachment é muito aberta, ela permite que uma coisa muito pequena, como as pedaladas fiscais, sejam utilizadas para conduzir o processo. Isso deixa uma marca muito ruim para a democracia brasileira.
No processo do [ex-presidente] Collor, a gente não tinha o Congresso tão rachado, a sociedade dividida, além disso, a acusação era mais sólida”, diz o professor Ortellado, da USP.
A decisão da Câmara dos Deputados de abrir processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff pode ampliar a divisão da sociedade brasileira, acrescenta Ortellado. “Essa polarização está sendo construída com base de sentimentos.
As pessoas aderem a uma visão de grupo que está pronta. Não existem visões intermediárias. Enquanto não mudarmos a nossa forma de ver a política, de maneira mais ponderada, não vamos sair dessa situação. Não há solução boa, qualquer lado que perder vai se sentir lesado”.
Segundo Marlise Matos, “o processo mostra fragilidade no processo democrático no Brasil”. A professora vê riscos para democracia brasileira e projeta um cenário de retrocesso e perdas de diretos sociais no Congresso. “O risco desse cenário é de uma agenda de retrocesso. Esse congresso, assim que eleito, começou a pautar propostas de regressão. A gente vai ter que conviver com uma agenda de retrocesso de direitos sociais”, comenta.
“Utilizou-se de um sentimento muito forte, que é a indignação com a corrupção. E a campanha Fora Dilma! explorou de forma muito bem-sucedida essa indignação. Por outro lado, se explorou de forma muito profunda a questão do golpe.
Esse recurso que o governo usou para se defender gerou uma polarização muito generalizada na população brasileira. Estamos falando de 30% da Câmara dos Deputados e 30% da população, e isso vai fazer com que essas pessoas se sintam subtraídas, com sentimento de ter sua presidenta eleita subtraída do cargo”, disse Matos.

Próximos passos
Nesta segunda-feira (18), o processo será enviado ao Senado e no dia seguinte (19), lido no plenário da Casa. Amanhã (19), os líderes partidários deverão indicar os 42 parlamentares que vão compor a comissão que analisará o assunto no Senado, com 21 titulares e 21 suplentes.
A comissão tem prazo de 48 horas para eleger o presidente e o relator. Por causa do feriado de 21 de abril na quinta-feira, isso deverá ocorrer somente na segunda-feira (25).
Caso aprovada a admissibilidade do processo pelo Senado, o que deve ser decidido entre os dias 10 e 11 de maio, a presidenta Dilma Rousseff será notificada e afastada do cargo por um prazo máximo de 180 dias, para que os senadores concluam o processo.
O vice-presidente da República, Michel Temer, assume o posto. Mesmo se for afastada, Dilma manterá direitos como salário, residência no Palácio da Alvorada e segurança. Nesse período, ela fica impedida apenas de exercer suas funções de chefe de Estado.
De acordo com a professora da UFMG, ainda são necessárias provas para que o processo tenha legitimidade. “Há que se provar o crime de responsabilidade. Esse debate não foi feito em nenhuma circunstância. Quero ver a prova cabal dos crimes de responsabilidade atribuídos a Dilma para que se deponha uma presidenta democraticamente eleita. Acredito que haverá mais serenidade e atenção aos fatos nos próximos julgamentos”, disse.

Falta de legitimidade
O prosseguimento do processo, disse Jorge Almeida, foi viabilizado porque, além da crise econômica e das denúncias de corrupção, Dilma negou todas as promessas de campanha que foram feitas, o que levou à perda de legitimidade política do mandato.
“Isso, considerando a legislação brasileira, não é elemento para gerar impeachment, mas é um elemento importante para compreender a situação política”.
Segundo o professor da UFBA, tudo indica que a decisão da Câmara será seguida pelo Senado, o que implica colocar no poder outro presidente sem legitimidade. “O que vai implicar que o [vice-presidente] Michel Temer vai assumir a Presidência da República. Isso não vai resolver nenhum problema nacional porque Temer, além do questionamento sobre a legalidade do mandato, incorre nos mesmos problemas de Dilma”.
“Se houve perda de legitimidade de Dilma por não ter cumprido as promessas, Temer nunca teve essa legitimidade. O Brasil vai entrar em um período complicado”, afirmou Almeida, acrescentando que o governo Dilma não trouxe conquistas concretas e que há o risco de retrocessos maiores em termos de conquistas históricas de trabalhadores.

UM PAÍS SOB IMPEACHMENT


Por Mauro Santayana, em seu blog 

Traduzida, de forma literal, a palavra inglesa impeachment significa, em português, impedimento.
Ela está relacionada à ideia de retirar-se do poder um presidente que tenha cometido grave infração, de ordem criminal ou constitucional.

No esporte, o termo impedimento – que muitas vezes pode ser imposto taticamente pela defesa contra a outra equipe - está ligado à décima-primeira Lei do Futebol, que se refere à situação em que um jogador está em posição inadequada ou interfere com uma jogada em curso.

Nos dois casos, a imposição do impedimento está dirigida a impedir que prossiga o avanço do adversário, que pode estar prestes a marcar um tento, fazendo com que ele seja obrigado a recomeçar, praticamente do zero, a busca pela consecução de seus objetivos, que são o gol e a vitória.

O problema é quando, no afã de paralisar o inimigo, corre-se o risco de “impedir” a própria partida, e, em última instância, até mesmo o público presente no estádio.

E é isso o que está ocorrendo, e continuará em jogo, no Brasil, em caso de aprovação do impeachment, hoje, ou na próxima jogada, que será decidida, em maio, na pequena área do Senado.       

O Congresso irá decidir, não apenas o impeachment de Dilma, mas se o país continuará “impedido” do ponto de vista político – e, por extensão, econômico – até, pelo menos, 2018.

Afinal, o “impedimento” do Brasil – que já se adivinhava quando tudo se fez para sabotar a realização da Copa do Mundo – começou, de fato, quando acabaram as últimas eleições.

Da sabotagem permanente, com as pautas-bombas no Congresso, às decisões e liminares judiciais, incluída a mudança das regras do jogo no meio da partida, como foi o caso das “pedaladas fiscais”, à insuportável, diuturna, pressão da mídia, alimentada por uma estratégia deliberada de lançar a população contra o governo, e a fábrica de factoides da Operação Lava-Jato, baseada, majoritariamente, em prisões ilegais, o cerceamento ao direito de defesa e delações premiadas, o país entrou em situação de impedimento prático, concreto, no dia primeiro de janeiro de 2015, para nunca mais voltar ao normal.

Um “impedimento” agravado pela decisão da Presidente Dilma, de ceder à pressão da mídia e dos adversários, e, no lugar de lançar mão de parte das reservas internacionais para liquidar a questão das “pedaladas” logo no início do governo, e criar um fundo que reestimulasse a economia, aceitar que o país estava em “crise” e em recessão, e se deixar pautar pela agenda recessiva imposta pelos “mercados”, vestindo - por ausência de uma reação articulada e à altura - a carapuça de “mentirosa” e “incompetente”, sem reagir, na política econômica e na comunicação.

Um “impedimento” agravado, também, do ponto de vista psicológico, pela busca do “quanto pior melhor”, e pela campanha permanente de crise, destinada a provocar confusão e desalento nas pessoas, embora os bares, pelo menos em Brasília, continuem tão lotados como os aviões, as rodoviárias, as estradas e os aeroportos nas férias e nos feriados.

Com isso, consolidaram-se, em um ano precioso, os paradigmas dos adversários do governo, que acabaram conduzindo, pela incompetência, isso sim, estratégica do Palácio do Planalto, o país à situação em que se encontra.   

Neste momento, a parte mais conservadora e parcial da mídia, e as “organizações” que estão por trás dos movimentos antipetistas, assim como os inimigos do governo no Congresso, conseguiram convencer o senso comum de que basta tirar Dilma do poder, para que o país volte aos trilhos, com a sua reorganização política e fiscal, e crescimento econômico, do consumo e do emprego.  

Mas isso dificilmente ocorrerá.

Primeiro, porque a bolsa subirá fortemente por um intervalo curto, e muita gente vai ganhar milhões de reais, em poucos dias, especulando com o câmbio e com ações, mas, depois, o peso da crise internacional, que depende de fatores como a China e o preço das commodities, incluído o petróleo, voltará a se impor, assim como a percepção, como já mostram matérias em jornais estrangeiros como o New York Times, de que o que está ocorrendo no Brasil é um golpe judiciário-midiático organizado por gente como Eduardo Cunha, contra uma presidente da República sobre a qual não pesam acusações de enriquecimento ilícito.  

E, em segundo lugar, porque o país continuará, de fato, imobilizado, sob impeachment permanente, porque, no dia seguinte ao de sua posse, poderá começar, com a banalização da utilização desse instrumento a partir de agora, o processo de impeachment do hoje vice-presidente Michel Temer, baseado no fato, lógico, consequente, dele ter cometido os mesmos supostos “crimes” de Dilma, em uma situação que será influenciada também pela atitude que será adotada por um PT ferido e indignado com a queda da Presidente da República.

Meses se passarão, no tempo em que se desenrolar o impeachment de Michel Temer.

Depois dele, em caso de aprovação, se já não tiver sido – o que é cada vez mais improvável – cassado Eduardo Cunha, começará a ser discutido o impedimento do Presidente da Câmara dos Deputados, caso ele venha a tomar posse como Presidente da República.

E, depois, ocorrerá o mesmo com o Presidente do Senado, Renan Calheiros, caso este venha a suceder o atual Presidente da Câmara dos Deputados, até que as eleições de 2018 venham a ser provavelmente realizadas sob a batuta do Ministro Ricardo Lewandowski, como último elo da corrente sucessória presidencial.

O impeachment da Presidente Dilma, portanto, não acabará com o “impedimento” do Brasil.

Com ela no poder, em sua peculiar situação atual, ainda é possível forjar um amplo acordo nacional que garanta a governabilidade, mesmo que seus adversários venham a vencer – se concentrarem-se nisso e não no caos – as eleições municipais deste ano, aproveitando o enfraquecimento institucional do Partido dos Trabalhadores.    

Sem ela, o avanço do estraçalhamento  político e econômico do país continuará, inexoravelmente.

Não apenas por causa da insegurança jurídica que envolve os três possíveis “impincháveis” seguintes, em sua linha de sucessão.

Mas também porque nesse clima de incerteza e de disputa pelos despojos – já se começa a dividir a pele do urso, ou melhor, da ursa, antes que ela tenha sido abatida pelo caçador – depois de toda essa lambança vai ser difícil costurar uma aliança que dure o suficiente – considerando-se principalmente as incógnitas Moro e Bolsonaro – para a travessia até 2018, e - como diria o astronauta de plástico, Buzz Lightyear - se o país não começar a tomar juízo, política e democraticamente – depois de 2018, ao infinito...e além!