sábado, 9 de fevereiro de 2019

Google e Facebook não têm nada de revolucionário








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As revoltas na África, Oriente Médio e Europa animam a esquerda mundial. O entusiasmo é ainda maior em relação às ações organizadas através das “redes sociais”. Muito justo. Mas, vamos com calma. 

Redes de apoio, solidariedade e organização sempre existiram na luta dos explorados. Elas é que tornaram possível vários avanços e conquistas populares.

A classe trabalhadora mundial se mobilizou em vários momentos. No apoio à Comuna de Paris, por exemplo. Contra a execução dos anarquistas Sacco e Vanzzetti. Nas brigadas formadas para lutar na guerra civil espanhola contra o fascismo.

O que pode surpreender é a rapidez da internete. No entanto, tal agilidade é também uma resposta desigual a ação das próprias classes dominantes.

A internete foi criada por militares. Universidades públicas a tornaram um poderoso canal de comunicação. Foi apropriada pelas grandes corporações do comércio mundial. Vem sendo utilizada pelos monopólios de comunicação para impor padrões de consumo e valores conservadores. Só muito marginalmente, ela serve a objetivos subversivos.

Um século atrás, a reposta dos trabalhadores aos jornais dos patrões foi a imprensa operária. Antes disso, as idéias revolucionárias circulavam através dos imigrantes. O capitalismo precisava deles em vários pontos planeta. Anarquistas e socialistas chegavam aos locais mais distantes com suas idéias “virais”. Espalhavam rapidamente sua experiência de luta contra o capital.

Internete e rede social? Tá valendo. E muito. Mas, não custa lembrar que as tão festejadas “redes sociais” são monopolizadas por duas empresas gigantes. Google e Facebook não estão a serviço da revolução. Nossas idéias, sim.

No Facebook, a sincera amizade da intolerância


Dizem que amigo verdadeiro é o que fala mal de você pela frente. Por esse critério, o Facebook estaria cheio de amizades genuínas. Mas vejamos o que diz Siva Vaidhyanathan sobre o tema no livro “Mídia antissocial: como o Facebook nos desconecta e enfraquece a democracia”.

Na “Ética a Nicômaco”, diz ele, Aristóteles descreve três formas de amizade. A primeira é baseada na utilidade mútua. Pode ser facilmente desfeita ou mesmo esquecida. É uma amizade de conveniência e comércio. A segunda é baseada no prazer. Fica em algum lugar entre o erótico e o tribalismo. Um vínculo forjado por experiências ou condições em comum. Ambas podem desaparecer à medida que as condições da vida mudam.

Já a terceira e mais significativa forma de amizade é baseada no reconhecimento da bondade em outra pessoa. É o “amor fraternal ”, uma das mais elevadas formas de amor. Contudo, ela, certamente, não surge de um clique e alguns comentários no Facebook. Pouco frequente, exige esforço, paciência e sabedoria.

Concorde-se ou não com essa classificação, Aristóteles acerta ao dizer que nós nos relacionamos com diferentes amigos de maneiras diferentes, em termos diferentes. Além disso, o pensador grego também dizia que toda amizade é política. A pólis teria sido forjada e apoiada por uma rede formada pelos três tipos de amizade descritas por ele.

Se Zuckerberg tivesse considerado a limitação do foco de Aristóteles na pólis local (e não global), talvez compreendesse que o Facebook é incapaz de enriquecer um sentimento de amizade ou criar uma cidadania global, conclui o autor.

E que ódio e intolerância jamais passariam por ser amizade.



A violência de classe, segundo Rosa Luxemburgo


A violência de classe, segundo Rosa Luxemburgo

Kate Evans
Uma breve e didática explicação de Rosa Luxemburgo sobre violência de classe:

Se um “cidadão livre” é detido por outro contra a sua vontade e confinado por um tempo em uma sala fechada e desconfortável, imediatamente todos percebem nisso um ato de violência. No entanto, quando o mesmo processo ocorre de acordo com o livro chamado Código Penal, e a sala em questão é uma cela, tudo é prontamente considerado pacífico e legal. Se um homem é levado por alguém a matar outros homens, trata-se claramente de uma violência. Mas não é assim se o processo em questão é chamado de “serviço militar” (...). Se um cidadão é privado contra sua vontade de parte de sua propriedade ou lucros, é óbvio que se trata de uma violência. Mas se o processo é chamado de “impostos indiretos”, está tudo bem.

Em outras palavras, sob o verniz da legalidade esconde-se nada mais do que a violência de classe, elevada a um padrão obrigatório pela classe dominante (...). Elevado a norma obrigatória, tudo isso se apresenta na mente do advogado burguês (e também na do socialista oportunista) não como o que é, mas de ponta cabeça: o processo legal aparece como uma criação independente da “justiça” abstrata. E o Estado como consequência, mera “sanção” de direito. A verdade é exatamente o oposto. A legalidade burguesa (...) não passa de uma forma social particular sob o qual se expressa a violência política da burguesia, desenvolvida sobre bases econômicas específicas.

Foi esta legalidade que assassinou covardemente a grande revolucionária, em janeiro de 1919. No Brasil de Marielle, tudo muito parecido.



Sob as patas de Bolsonaro


Na campanha eleitoral, Bolsonaro afirmou que seu governo pretendia voltar ao Brasil de 50 anos atrás. Realmente, as recém-divulgadas propostas de Sérgio Moro para a segurança pública lembram o regime governado pelo AI-5.

A Reforma da Previdência pretendida por Paulo Guedes também remete a meio século atrás. Seu modelo previdenciário é o da ditadura Pinochet, que levou à miséria a grande maioria dos aposentadores chilenos.

Mas há propostas do governo que pretendem atrasar o País uns 80 anos, pelo menos. É o caso da Carteira de Trabalho verde e amarela. Quem optasse por ela, poderia abrir mão de seus direitos trabalhistas.

Voltaríamos aos tempos anteriores ao getulismo. Com direito a tratar as lutas sociais na base das patas de cavalos. Retornaríamos às “políticas públicas” dos tempos da República Velha.

Diante disso tudo, há os que enxergam com esperança algumas divergências surgidas no interior do governo. As mais importantes delas manifestadas pelo vice-presidente.

Mourão, no entanto, é outro saudosista. Não só dos tempos da barbárie do início do século 20, mas do poder fardado e absoluto. Vem bancando uma espécie de “tira bom” diante de Paulo Guedes, o “tira mau”. No meio deles, um presidente “Débi” com vários candidatos a “Lóide”.

Precisamos parar de buscar soluções em conflitos palacianos ou nas contradições das cúpulas parlamentares.

Elas podem e devem ser exploradas pela esquerda. Mas jamais ao custo de continuar a colaborar para a apatia em que se encontram alguns setores importantes das forças populares. Especialmente, o movimento sindical.

Ou rompemos com essa paralisia ou acabaremos nos acostumando a ficar sob patas de cavalos.


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domingo, 3 de fevereiro de 2019

Ex-membro do Esquadrão da Morte é nomeado para integrar Governo Bolsonaro


Carlos Humberto Mannato, o Manato, durante campanha eleitoral no Espírito Santo
Secretário Especial para a Câmara dos Deputados, Carlos Humberto Mannato, fez parte do sinistro Esquadrão da Morte, a Scuderie Le Cocq


Saiu no Diário Oficial da União desta sexta (1º/2) a nomeação, assinada por Jair Bolsonaro e Onyx Lorenzoni, do ex-deputado federal capixaba Carlos Humberto Mannato, o Manato, que fez parte do sinistro Esquadrão da Morte, a Scuderie Le Cocq. Manato foi exercerá o cargo de Secretário Especial para a Câmara dos Deputados da Casa Civil da Presidência da República.

Só no Espírito Santo, Estado onde Manato desenvolve suas atividades, a Scuderie Le Cocq matou 1.500 pessoas, segundo o Ministério Público Federal. A organização assassina foi extinta pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio/ES) no final de 2005. Para a Justiça, a entidade abrigou e protegeu, por vários anos, pessoas acusadas de pistolagem, tráfico de drogas e roubos a bancos. A Le Cocq foi apontada, entre os anos 80 e parte de 2000, como o braço armado do crime organizado capixaba!

As investigações sobre o braço direito de Bolsonaro, Fabricio Queiroz, e suas ligações com suspeitos de assassinar a vereadora Marielle Franco, estão atualizando as informações sobre o envolvimento da Famiglia Bolsonaro com grupos de milicianos. Mas a Famiglia não se importa com isso e agora nomeia um ex-integrante da mais famosa quadrilha de policiais matadores.

Aqui, você pode ler o perfil de Carlos Humberto Mannato, o Manato, e o histórico da atuação da Scuderia Le Cocq no Espírito Santo, elaborado pelo Blog do Elimar Côrtes. Vale a pena ler e conhecer a “turma” perigosa com a qual Bolsonaro quer trabalhar.


Carlos Humberto Mannato, o Manato, já integrou os quadros da temida Scuderie Detetive Le Cocq. O registro de filiação de Manato na Scuderie Le Cocq é o de número 687. O candidato afirma ter sido filiado da Le Cocq por três anos.

A Scuderie Le Cocq teve sua extinção confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio/ES) no final de 2005.

Para a Justiça, a entidade abrigou e protegeu, por vários anos, pessoas acusadas de pistolagem, tráfico de drogas e roubos a bancos. A Scuderie Le Cocq foi apontada, entre os anos 80 e parte de 2000, como o braço armado do crime organizado capixaba.

Candidato a governador do Espírito Santo em 2000, Manato apresentou como suas principais propostas a redução da maioridade penal para 16 anos e a liberação do porte de armas para cidadãos comuns. Ele defendeu a revisão do Estatuto do Desarmamento.

Quando entrou para a Scuderie Le Cocq em 1992, Manato era médico do Hospital Evangélico. Manato teve três padrinhos para entrar na Scuderie Le Cocq: dois delegados de Polícia e um investigador. Todos já estão aposentados.

Manato entrou na vida política em 1994, quando se filiou ao PSDB. Depois, em 2001, ingressou no PDT. Iniciou sua vida no setor público assumindo a Secretaria Municipal de Serviços da Prefeitura Municipal de Serra, entre os anos de 2001-2002. Na eleição de 2002, foi eleito pela primeira vez a exercer um mandato na Câmara dos Deputados. Foi reeleito em 2006, 2010 e 2014.

Carlos Manato desistiu do legislativo em 2018 para sair candidato ao governo do Espírito Santo, com o objetivo maior de dar palanque ao candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro.

Candidato diz em nota que foi convidado por policiais amigos e que pessoas de renome faziam parte da Scuderie Le Cocq

Em nota enviada ao Blog do Elimar Côrtes na tarde de sábado (08/09/2018), a Assessoria de Imprensa do candidato Manato confirmou que ele já integrou os quadros da Scuderie Le Cocq, mas que desconhecia o envolvimento da entidade e ou de associados com a prática de crimes.

“Em 1991, Carlos Manato, na época médico, concluiu o curso da Escola Superior de Guerra (ESG), vindo a integrar a Associação dos Diplomados na Escola Superior de Guerra (ADESG). Durante o curso, alguns amigos policiais o convidaram para também fazer parte da Le Cocq, que, segundo eles, seguia as mesmas linhas da ESG. Manato participou de algumas reuniões e não se identificou com os temas, achou que era bem mais restrito ao meio militar e não voltou às reuniões. A desfiliação só ocorreu cerca de três anos depois, pois encontrou certa dificuldade devido a mudança de endereço da sede da organização”.

Prossegue a nota: “É importante frisar que Manato não teve acesso, nem conhecimento de nenhuma prática criminosa que, por ventura, tenha sido imputada à organização enquanto participou das reuniões. É importante ressaltar também que, à época, pessoas de renome e conhecidos amigos faziam parte da Le Cocq o que dava credibilidade e uma aparente segurança para que Manato também participasse dessas poucas reuniões”.

Scuderie foi acusada de proteger assassinos, traficantes e assaltantes

A Scuderie Detetive Le Cocq, que era inscrita como Pessoa Jurídica na condição de entidade filantrópica, foi extinta depois de ser acusada pelo Ministério Público Federal de abrigar e proteger grupos de extermínio, traficantes e assaltantes.

Em dezembro de 2005, o desembargador federal Guilherme Calmon, do TRF-2, manteve a decisão do juiz Alexandre Miguel, da 12ª Vara Federal no Espírito Santo, que extinguiu a Scuderie Le Cocq. A decisão que extinguiu a Le Cocq proibiu também a utilização dos símbolos da entidade em bonés, camisas, chaveiros, adesivos e outros objetos.

Uma das vítimas de policiais militares ligados à Le Cocq foi o menino Jean Alves Cunha, 14 anos, assassinado com tiros na cabeça no Morro das Torres de TV, depois de ter sido sequestrado na avenida General Osório, no Centro de Vitória. Jean foi executado uma semana antes de representar o Espírito Santo no Encontro Nacional de Meninos e Meninas de Rua, em Brasília.

No Espírito Santo, entidade teria sido responsável por mais de 1.500 assassinatos, diz MPF

A Scuderie Le Cocq foi oficialmente fundada no Espírito Santo em 24 de outubro de 1984, pautada para “aperfeiçoar a moral e servir à coletividade”. Ao pedir à Justiça Federal a extinção da Scuderie Le Cocq, a Procuradoria Regional da República apontou que a entidade teria sido responsável por pelo menos 30 assassinatos de políticos capixabas cometidos em 18 anos e quase 1.500 homicídios anuais que transformaram o Espírito Santo no segundo Estado mais violento do Brasil, naqueles anos compreendidos entre 1990 e início de 2000, quando se deu início o processo de extinção.

A organização surgiu no Rio de Janeiro, em 1965, quando um grupo de policiais decidiu vingar a morte do detetive Milton Le Cocq. Cara de Cavalo, o bandido que matou Le Cocq, foi exterminado com mais de 100 tiros e seu corpo coberto com o cartaz de uma caveira.

Aliado de Manato, Magno Malta presidiu CPI que apontou os crimes da Le Cocq

Em 1998, o Congresso Nacional abriu a Comissão Parlamentar de Inquéritos (CPI) do Narcotráfico para apurar diversos crimes País afora, inclusive a atuação da Scuderie Detetive Le Cocq no Espírito Santo. A CPI Nacional do Narcotráfico teve como presidente o então deputado federal Magno Malta.

A CPI do Narcotráfico, presidida por Magno Malta, chegou a indiciar diversas autoridades capixabas por suposta ligação com a Le Cocq. Eram pessoas filiadas à Scuderie Le Cocq e acusadas de crimes que variavam da receptação de carros roubados à organização de assaltos a banco, passando por assassinatos e tráfico internacional de drogas.

Ao acolher pedido do Ministério Público Federal para extinguir a Scuderie Le Cocq, a Justiça Federal alegou também que a Scuderie Le Cocq “tem natureza paramilitar e persegue objetivos ilícitos em detrimento de órgãos e interesses da União”. Além disso, a Scuderie Le Cocq “intervém na apuração de crimes em que supostos associados estariam envolvidos, para assegurar-lhes impunidade”.

No Espírito Santo, entre a sua criação e até o início de 2002, a Scuderie Le Cocq chegou a ser formada por mais de mil associados, entre jornalistas, policiais civis, militares, advogados, delegados de Polícia, magistrados, coronéis, políticos, médicos, engenheiros, bicheiros, dentre outros.

Em maio de 2002, a Anistia Internacional divulgou um relatório em que o Espírito Santo era citado como um Estado em que os “defensores dos direitos humanos sofriam ameaças crescentes” e classificou a Scuderie Le Cocq como “uma estrutura paramilitar”, “com poderosos grupos econômicos e políticos no Estado, incluindo membros dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”.

Há 25 anos, policial civil foi executado com tiro na nuca dentro da sede da Le Cocq: claro, crime está impune

Um dos casos mais emblemáticos envolvendo a Scuderie Le Cocq foi o assassinato do investigador de Polícia Derneval Gonçalves Pereira, o Russo. Ele foi executado com um tiro na nuca, em outubro de 1993, dentro de um dos banheiros da sede administrativa/social da Le Cocq, no bairro Bento Ferreira, em Vitória.

Russo foi assassinado como queima de arquivo, assim como ocorreu com todos os pistoleiros – policiais e integrantes da Le Coc – envolvidos no assassinato do então prefeito da Serra, José Maria Miguel Feu Rosa, e do seu motorista Itagildo Coelho de Souza; e também envolvidos no assassinato do advogado Carlos Batista de Freitas – que defendia justamente os acusados do duplo homicídio.

O prefeito e seu motorista foram assassinados por pistoleiros capixabas em 8 de junho de 1990, na cidade de Itabela, na Bahia, onde José Maria Miguel Feu Rosa tinha uma fazenda. Carlos Batista foi sequestrado e morto em janeiro de 1992. De acordo com investigações, Russo teria atraído Carlos Batista – de quem era amigo e paciente – para o local onde foi torturado e morto a tiros, na Serra.

A morte de Russo foi praticada durante uma reunião onde estavam presentes dezenas de associados – a maioria policiais – na sede da Scuderie Le Cocq. Uma delegada de Polícia Civil, também ‘lecoquiana’ e que estava na entidade na hora do crime, mandou retirar o corpo do policial Russo de dentro do banheiro e levar para a calçada.

A mesma delegada ainda mandou lavar o local (banheiro) e a área externa por onde o corpo de Russo foi arrastado, retirando, assim, o sangue e prejudicando o trabalho da Perícia Criminal.

Vinte e cinco anos se passaram e até hoje a Polícia Civil capixaba “não conseguiu descobrir” quem matou o policial Derneval Gonçalves Pereira, o Russo, dentro da Le Cocq.






Os escribas da direita se esforçam para negar qualquer relação entre a privatização da Vale e as tragédias que se sucedem por negligência e irresponsabilidade da empresa. Hoje, Roberto Dias afirmou que se trata de um “argumento torpe” contra as privatizações. Ontem, também na Folha, foi Alexandre Schwartsman – como de costume, disparando coices contra seus desafetos e com argumentação ao nível do relincho.

Eles citam desastres ocorridos com empresas públicas e julgam que, assim, liquidaram a questão: não existe relação entre ser privado ou ser público e ter menos ou mais cuidado com a proteção ao trabalho ou ao meio ambiente. O fato de que a Vale do Rio Doce passou mais de 50 anos como empresa pública sem que ocorresse qualquer desastre digno de nota seria mero fruto do acaso.

É claro que ocorrem desastres com empresas públicas. Ocorrem desastres propriamente ditos (a origem da palavra remete aos “astros desfavoráveis”), advindos de causas incontroláveis ou de uma sucessão de pequenos equívocos, cada um sem maiores consequências quando isolado. E ocorrem tragédias causadas por irresponsabilidade e negligência.

Mas é de se esperar que, quando mais uma empresa for verdadeiramente pública, isto é, prestando contas à sociedade, maior será a pressão para que mantenha padrões elevados de segurança e maior será a capacidade de resistência de seus profissionais contra decisões de risco. Por outro lado, quanto mais as empresas públicas passam a emular as empresas privadas e a projetar o lucro como alfa e ômega de suas ações, que é a régua pela qual são medidas pelos economistas liberais, maior será a tendência de afrouxamento de seus padrões.

Para as empresas privadas, que prestam contas a acionistas sequiosos por dividendos suculentos, tudo entra num cálculo de custo-benefício – incluindo a vida humana, a dignidade humana, a segurança do trabalho, a proteção ambiental. Não é só a Vale. Das empresas automobilísticas fraudando a certificação de emissão de poluentes às grandes confecções operando com trabalho escravo, o registro das corporações é um show de horrores. E quando um escândalo ocorre, a resposta é muito mais uma ofensiva de relações públicas do que a alteração de práticas.

O que está em questão, portanto, é mais do que a oposição entre empresa pública e empresa privada. É a posição que a obtenção do lucro deve ocupar na nossa escala de valores. Empresas públicas estão mais bem posicionadas do que empresas privadas para resistir à pressão por lucro a qualquer custo; mas, para isso, devem resistir também à ideologia liberal que tudo avalia pela lucratividade.

É assim que as empresas públicas podem cumprir suas funções de estimular o desenvolvimento, combater desigualdades e garantir a soberania. Se o lucro for seu único ou principal objetivo, estarão desvirtuadas.

A discussão ganha urgência porque o governo Bolsonaro anuncia sua intenção de tudo privatizar. A ladainha é a mesma de sempre: as empresas públicas são deficitárias, ineficientes, incompetentes. Aliás, o primeiro adjetivo define os outros, já que eficiência e competência são definidas em função da capacidade de gerar lucros. Os ganhos prometidos de eficiência são tão grande que justificariam a venda das empresas por uma fração de seu real valor, como é de praxe na privataria brasileira.

Nos vinte anos de sua privatização, a Vale gerou lucros assombrosos para seus acionistas. Mas os brasileiros ganharam ou perderam?

Luís Felipe Miguel


do http://www.contextolivre.com.br/2019/02/com-privatizacao-da-vale-os-brasileiros.html