Editorial, Jornal do Brasil
RIO - Nos últimos anos, um dos conflitos que ganharam mais destaque na sociedade brasileira é o que opõe dois fortes grupos de interesse: os ruralistas, liderados por grandes proprietários de terra, cuja representação política no Parlamento remonta à origem do Brasil como nação, e os ambientalistas, cada vez mais atuantes na arena pública, seja por meio de um partido político próprio, o PV, seja pela pressão de organizações não governamentais (ONGs) – nacionais ou internacionais.
O embate no campo não é novo. O que mudou foi um deslocamento, ou melhor, uma superposição de conflitos que revela o surgimento de novas prioridades. O latifúndio, antes atacado exclusivamente sob um viés economicista, no contexto da luta de classes, tendo a reforma agrária como bandeira, passou a ser duplamente questionado, por meio dos movimentos ambientalistas.
Um novo flanco se abriu. Grandes propriedades de terras não seriam só um retrato da desigualdade no campo, mas também a ponta de lança de uma prática ambiental danosa, que derruba impiedosamente grandes extensões de matas e de florestas. Quanto à primeira acusação, os ruralistas sempre se apoiaram no direito à propriedade. Quanto à segunda, o argumento é algo semelhante a um direito de produção, cuja defesa é bradada pelas exportações recordes e a geração de divisas ao país.
Seria fácil dizer que, no lugar deste confronto, devesse prevalecer algo como o “interesse nacional”. A expressão serve costumeiramente a múltiplos propósitos e é vazia de significado. O interesse nacional é, em alguns casos, o interesse de um grupo hegemônico ou, em outros, o amálgama que resulta da correlação de força dos grupos da sociedade.
A elaboração do polêmico Código Florestal é exemplo da dificuldade de se chegar a esta solução de compromisso. Ontem, numa sessão tumultuada, o texto-base do Código, que seguirá para o plenário, foi aprovado na Comissão Especial da Câmara dos Deputados. Não agradou nem a um nem a outro lado, apesar dos esforços do relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
Para os ambientalistas, houve retrocesso, como a anistia aos condenados por crimes ambientais e a redução dos limites de plantação de 30 para até 15 metros das margens de rios. Os ruralistas também não ficaram nada satisfeitos: querem a redução da área de reserva legal obrigatória para as médias e grandes propriedades. De acordo com a lei, terras com área superior a quatro módulos fiscais (medidos em hectares e fixados em cada município) deverão ter pelo menos 20% de mata nativa, se localizadas na Mata Atlântica, percentual que sobe para 35%, no cerrado, e 80% na Amazônia.
Obviamente, o norte ideológico sempre existirá e, se é impossível escapar a ele, deve-se deixar claro que interessa ao país, sim, tanto a pujança da agricultura, da produção, quanto a preservação ambiental. É preciso equilíbrio. E uma rigorosa fiscalização, para que o Código prevaleça de fato.
Nenhum comentário:
Postar um comentário