sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Obama pariu um monstro

O sonho das companhias seguradoras

Abortem a reforma de saúde dos democratas

por DAVE LINDORFF*, no Counterpunch

Que seja dado crédito a Howard Dean. Ainda médico, o ex-governador de Vermont, ex-presidente do Partido Democrata e ex-candidato presidencial democrata pediu a membros progressistas do Congresso nas duas casas que se juntem a seus colegas republicanos para matar o que ele apropriadamente chama de "sonho das companhias seguradoras".

Esses autodenominados progressistas do Partido Democrata, que alegam que a reforma do sistema de saúde ainda pode ser salva com a inclusão de uma "opção pública" falsa, cuidadosamente circunscrita e capada, que no máximo ofereceria cobertura ruim por um preço alto a um pequeno número de autônomos pobres, estão errados. Essa suposta tentativa de reformar o sistema de saúde -- o mais caro e menos eficaz do mundo desenvolvido -- é impossível de salvar.

[Nota do Viomundo: Originalmente, a opção pública deveria permitir que o governo federal dos Estados Unidos competisse com a iniciativa privada na oferta de planos de saúde. Seria a adoção, pelos Estados Unidos, de uma espécie de SUS]

O único lugar apropriado para a lei a essa altura é a lata do lixo.

O que poderia ser um momento transformador da política dos Estados Unidos -- o fim de décadas de um sistema de saúde corporativo e a criação de um sistema que garantisse a todos os estadunidenses cuidados de qualidade e financeiramente acessíveis como um direito básico da cidadania, da mesma forma que existe no Canadá, em todos os países da Europa, no Japão, em Taiwan, em Cuba e na maior parte do restante do mundo, esse momento foi desperdiçado.

Foi desperdiçado pelo presidente Obama, que não teve coragem de assumir o papel de liderança e deixou o assunto por conta do Congresso e que em seguida cedeu aos grandes jogadores do complexo médico-industrial e fez acordos secretos com todos eles -- médicos, companhias seguradores, companhias farmacêuticas e a indústria dos hospitais -- em troca de "apoio".

Foi desperdiçado por muitas lideranças do Congresso nas duas casas, especialmente por aqueles que se intitulam democratas Blue Dog, mas também pelos que se definem como "liberais", que aceitaram o dinheiro sujo dessas indústrias (os lobistas delas invadiram o Congresso no último ano, com quantias sem precedentes de contribuições de campanha), que transformaram a legislação em uma gigantesco presente para essas indústrias, produzindo uma lei que deixará os empregadores no papel de agentes do seguro de saúde (embora eles não paguem por isso, será responsabilidade dos empregados pagar), que exige que os que não tem seguro de saúde obrigatoriamente comprem planos, garantindo para a indústria um vasto novo mercado, especialmente de jovens saudáveis; uma lei que quase nada vai fazer para controlar os custos.

Os médicos vão enriquecer com essa "reforma". As companhias seguradoras vão enriquecer muito mais com essa "reforma". As companhias farmacêuticas vão enriquecer com essa "reforma". Mas milhões de pessoas vão continuar sem acesso à saúde. Haverá dezenas de milhões que conseguirão acesso a planos de baixa qualidade ou, pateticamente, lixo médico.

E o custo da saúde, tanto para indivíduos quanto para a sociedade como um todo, que já é o mais alto do mundo, vai continuar a crescer. Para piorar ainda mais, os impostos vão aumentar de forma dramática, cerca de 100 bilhões de dólares por ano. Para dar uma risadas extras, enquanto esses custos vão começar a atingir o público imediatamente, os "benefícios" da lei não começam antes de 2013, o que significa que um Partido Republicano renovado, depois de tirar Obama da Casa Branca e de acabar com a maioria democrata no Congresso em 2012, acabaria com o plano [antes que ele entrasse em vigor].

O sr. Dean está certo. É uma lei ruim. Mas não apenas. É moralmente ultrajante, politicamente desastrosa e economicamente perigosa. Move o país no caminho errado -- não no caminho do "socialismo" que a direita tem denunciado, mas em direção a um caminho corporativo custoso que será mais difícil ainda de reformar no futuro.

Há apenas uma esperança e essa é de que haja integrantes liberais nas duas casas do Congresso em número suficiente para reconhecer que não fazer nada é o melhor nesse caso e que em defesa de seus eleitores se neguem a dar apoio a essa monstruosidade legislativa.

O Health Insurance Enrichment Act of 2009 deve ser morto no útero congressista antes de emergir como o monstro que se tornou.

A única coisa positiva que posso ver nesse fracasso é que talvez o presidente Obama leve um bofete de seus apoiadores mais ardentes no que ele disse ser seu objetivo legislativo número um, que ele e seus meio-assessores "brilhantes" caiam na real e assumam que é preciso dar uma guinada de 180 graus no caminho que adotaram para tentar governar.

O mais provável, no entanto, é que essa derrota será o começo do fim do governo de Obama, que agora se revelou sem princípios, incapaz de liderança e envolvido pelos interesses corporativos mais cínicos e egoístas.

*Dave Lindorff é jornalista e colunista na Filadélfia


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