“O ex-ministro diz que para seguir crescendo o Brasil terá de se apoiar no mercado interno – com equilíbrio fiscal e taxa de juro menor
Ivan Martins e José Fucs, ÉPOCA
ÉPOCA – Qual é o principal problema econômico que a nova presidente terá de enfrentar?
Antônio Delfim Netto – A (presidente) Dilma (Rousseff) recebe um governo muito melhor do que Lula recebeu. Com uma diferença: Lula pegou o governo quando vinha ventania de popa. Dilma vai receber o governo com ventania de proa. A ajuda que o crescimento da economia mundial deu ao período Lula está terminando ou já terminou. Neste novo cenário, você vai precisar de muito mais força do mercado interno se quiser manter seu ritmo de crescimento para continuar a distribuir renda. O Brasil precisará em 2030 dar emprego de boa qualidade a 150 milhões de sujeitos entre 15 e 65 anos. Você não vai fazer isso exportando alimentos e minerais. Por mais complexas que sejam essas cadeias, você precisa de uma economia de serviços e industrial. Uma economia competitiva. Todas as políticas precisam incentivar a competição. Aliás, observem o que a Dilma disse sobre as agências reguladoras. Ela disse que gente competente será nomeada porque nós precisamos garantir a competição. Competição é o nome do jogo.
ÉPOCA – A presidente eleita sabe que a situação mudou?
Delfim – Acho que ela tem plena consciência disso, como o Lula teve. Houve pequenos desvios na política fiscal em 2009 e 2010, mas há um grande exagero na crítica dos economistas que falam em desastre fiscal. Sim, houve uma aparição do mágico Harry Houdine. Ele transformou despesa em receita e depois em superávit primário. Mas tudo foi um pecado venial, feito durante um momento de grande necessidade. E produziu resultados importantes. O Brasil foi o país que emergiu mais depressa da crise, foi o país que voltou mais depressa ao nível anterior da crise. Nós, na verdade, sofremos durante dois trimestres, no terceiro já estávamos recuperando.
ÉPOCA – Mas a ação do governo produziu estresse.
Delfim – Produziu um estresse de entendimento. A verdade é que não há desequilíbrio fiscal gigantesco no Brasil. Lula e Dilma sabem que o equilíbrio fiscal é fundamental. Eles sabem que a relação entre a dívida pública e o PIB é um fator importante quando se quer reduzir a taxa de juros real.
ÉPOCA – Como se pode chegar a uma taxa de juros mais baixa?
Delfim – É preciso coordenar a ação fiscal e monetária. Você tem de dar ao Banco Central o conforto de que o combate inteiro à inflação não vai ficar apenas na mão dele. O papel dele é construir, como construiu, uma expectativa de inflação estável. Mas o governo tem de sinalizar com clareza que vai reduzir a relação entre dívida e PIB daqui para a frente.”
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