(E por que a Dilma está ganhando)
Ganhar – ou perder – uma eleição depende, antes de tudo, do consenso dominante no período eleitoral. Este, por sua vez, não é construído durante o processo eleitoral. Ele pode ter variações na forma das campanhas expressá-lo. Mas ele se constrói antes, vai se construindo ao longo do tempo e se cristaliza no processo eleitoral.
Nesse sentido, o governo que termina seu mandato é determinante. A escolha do novo governante é, em primeiro lugar, o julgamento do desempenho do governo, conforme a percepção – deformada pela mídia – da população. O governo Sarney saía desmoralizado – por múltiplas razões, principalmente por ter frustrado o impulso democrático saído das lutas contra a ditadura e plasmado, em parte na nova Constituição -, o que permitiu um vazio em que se inseriram candidatos críticos a esse governo: Collor e Lula, entre eles.
As eleições de 1994 tiveram o enfrentamento de dois projetos de novos consensos, diante do fracasso de Collor. Lula, favorito no inicio da campanha, representava o binômio justiça social (expresso nas Caravanas em que o Lula percorria o país) e ética na política (representada pelo seu primeiro candidato a vice, Bisol). O primeiro aspecto vinha da denúncia das desigualdades marcantes da sociedade brasileira, a segunda do acúmulo de denúncias contra o governo Sarney e, posteriormente, na campanha vitoriosa pelo impeachment do Collor.
Se não tivesse assumido quase um ano antes das eleições o Ministério da Economia do governo Itamar, FHC não teria tido possibilidade de contrapor a essa primeira proposta, a do ajuste fiscal, assentada na projeção da inflação, no lugar da desigualdade, como problemas central do Brasil. Ajuda pela mídia – que apoiou-o plenamente, desde sua ida ao Ministério e durante todos os seus dois mandatos -, FHC venceu as eleições, o que voltaria a fazer quatro anos depois, impulsionado pelo consenso da estabilidade monetária e sempre apoiado pelo monopólio midiático.
A ampla rejeição do governo FHC – que chegou a ter índices de apoio de apenas 18% - abriu o espaço para o voto antineoliberal que Lula representava. Serra representava a continuidade, por mais que tentasse disfarçar e perdeu.
Perde agora de novo, diante do sucesso do governo Lula e do consenso novo assumido pelo país – desenvolvimento econômico e social. O povo se deu conta que a estabilidade monetária tinha se esgotado, sem que as promessas de distribuição de renda, de retomada do crescimento econômico, de modernização do país, tivessem sido cumpridas. Ao contrário, ao se limitar a malabarismos monetaristas, a própria estabilidade monetária se perdia, com o retorno da inflação, a desigualdade havia aumentado, a economia havia entrado em profunda e prolongada recessão, os direitos sociais da maioria foram expropriados – em primeiro lugar, a carteira de trabalho, mas também a degradação das políticas de educação e de saúde pública, entre outras -, a privatização tinha sido um negócio para favorecer grandes empresas privadas, a deterioração do Estado tinha feito piorar ainda mais o nível de vida da massa da população.
Perde o Serra e perdem os tucanos porque assumiram o modelo neoliberal no Brasil, promoveram o Estado mínimo, diminuírem os gastos públicos especialmente em políticas sociais, para obedecer às Cartas de Intenções que assinaram com o FMI, fizeram uma política internacional de costas para a America Latina e o Sul do mundo e de subserviência com os EUA, reprimiram e criminalizaram os movimentos sociais. Em suma, governaram com as elites, para uma minoria, apoiados no monopólio privado da mídia.
Por isso, assim que Lula pôde governar, ficaram evidentes as diferenças, que se espelham no amplo favoritismo da Dilma.
Emir Sader, em Carta Maior
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