sexta-feira, 16 de julho de 2010

O dever dos governadores


por Mauro Santayana

“Ele comprometeu o destino do país por alguns segundos de televisão.”


Começa a crescer, nos estados, a consciência de que, diante do quadro sucessório nacional, só o entendimento entre os novos governadores e o Senado poderá suprir a falta de liderança presidencial durante o próximo mandato. O discurso de todos os candidatos é vazio de razão política e, por isso mesmo, prenhe de propostas meramente administrativas, como se postulassem a gerência de um estabelecimento mercantil.
 Não conseguiram compreender que a Humanidade – e, dela participando, o Brasil – se encontra em momento agudo de sua crise histórica, e necessita de dirigentes capazes de indicar os rumos que a redima de suas aflições. Os grandes dirigentes não brotam como os cogumelos: eles são construídos com a razão de Estado e a experiência da ação cotidiana. 
É certo que faltam homens de Estado em todas as latitudes: os atuais são pálidos espectros dos que houve no passado. Mas não nos serve de consolo a universalidade da carência. Temos que pensar no Brasil. 
Lula, com todas as suas dificuldades, trouxe para o poder a experiência de chefe sindical e de sua política, e mobilizou a nação para alguns objetivos. Enfim, atuou como chefe de Estado. Mas não conseguiu estimular uma liderança à sua altura para a sucessão. Uma coisa é chefiar uma equipe de burocratas, na realização de projetos administrativos de governo, como fez sua candidata. Outra é conduzir a sociedade nacional em momento de graves desafios no mundo. Os grandes homens de Estado não mandam: convencem. Seu competidor não escapa das teias do discurso medíocre. Como exemplo de suas razões de Estado, basta a escolha do candidato a vice-presidente para qualificá-lo. Ele comprometeu o destino do país por alguns segundos de televisão. 
É nessa ordem de preocupações que as eleições para os estados se tornam mais importantes do que o pleito nacional. Serão os governos estaduais, com a força de sua proximidade com os cidadãos, que irão garantir a estabilidade política, em caso, quase impossível, mas sempre provável, de alguma crise maior. Seria muito melhor para a democracia que, no primeiro turno, todos os partidos oferecessem nomes ao eleitorado. Isso favoreceria a distinção entre os programas partidários e o discurso dos candidatos. Não havendo isso, a alternativa de escolhas mais pensadas se transfere para os pleitos estaduais, onde há mais alternativas, pelo menos no primeiro turno. Além disso, quase todos os postulantes nos estados têm presença política conhecida, no exercício do Poder Executivo, ou nas casas legislativas. 
A estabilidade institucional dos Estados Unidos, tal como foi identificada por Tocqueville e, mais tarde, por Lord Acton, se funda no poder político dos governadores dos estados, capazes de moderar os governos centrais. Por isso, a questão da legitimidade se transfere para as unidades federadas. A Câmara Alta contará com a presença de ex-governadores e outros homens públicos de boa experiência política. Eles, em respeito a seus eleitores, devem recusar a participação no Poder Executivo, a fim de representar os estados e, em estreita colaboração com os governadores (como é de seu dever constitucional), estabelecer o contrapeso necessário ao Poder Executivo. 
Os grandes interesses, que preferem o poder concentrado em Brasília, têm impedido a restauração do pacto federativo. Essa é uma tarefa do novo Senado, em aliança com os governadores mais lúcidos. É o que podemos esperar, como continuidade ao grande movimento que foi a transição política de há 25 anos. 
Mauro Santayana

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