quinta-feira, 12 de agosto de 2010

As várias caras do atraso

Mário Amato, Regina Duarte e Maitê Proença
Por Marcos Verlaine*

Eleições são raros momentos de reflexão política e a possibilidade de passar a limpo a democracia, ainda mais num país como o Brasil, em que o povo fica mais próximo e atento ao processo e debate políticos. Para o bem ou para o mal, as eleições no Brasil são momentos de engajamento e engate.

Mas todo processo político tem suas gafes - pequenas ou grandes - e essas chamam a atenção pelo inusitado.

Nas eleições de 1989, a direita temia dois 'bichos papões': Lula e Brizola. O segundo foi inviabilizado ficou o primeiro. Naquela ocasião, quem foi escalado para semear o pânico e o terror foi o então presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do estado de São Paulo), Mário Amato, quando disse que se Lula ganhasse os empresários iriam embora do Brasil.

Na ocasião, Amato disse: "Se Lula for eleito, 800 mil empresários deixarão o país". A frase teve grande impacto na mídia e repercutiu entre os empresários, por ter sido proferida pelo presidente da Fiesp. Em entrevista à revista Veja, anos depois, ele declarou que de fato sua frase foi fundamental para derrota de Lula.

Bem, o resultado todos sabem. Collor se elegeu, e fez um governo pífio e corrupto.

Nas eleições de 2002, a atriz global Regina Duarte, a ex-namoradinha do Brasil, protagonizou um momento triste, para dizer o mínimo, quando foi para a televisão, na propaganda eleitoral do então candidato tucano José Serra, dizer ter "muito medo" de um possível governo do então candidato Lula.

Em novembro de 2009, a Folha de S.Paulo procurou a atriz e questionou se ela ainda sentia medo em relação ao próximo presidente, a atriz foi enfática.

"Eu tenho muuuuuuuuuuuuito medo. Eu tenho muuuuito medo", repetiu.

A atriz, no entanto, não quis especificar a origem do temor, mas afirmou que não pretende se engajar novamente em uma campanha política.

Nestas eleições, o mico vem agora da atriz global Maitê Proença, que declara simpatia a Marina Silva (PV) e José Serra (PSDB), e disse que talvez a discriminação contra as mulheres "venha a calhar nesse momento de eleições" para salvar o país de Dilma Rousseff.

Maitê foi uma das pessoas que estavam presentes em recente encontro de Serra com artistas no Rio de Janeiro.

"A mulher ainda é tratada como escrava na África, Ásia, países árabes, na maior parte do planeta. Só no ocidente houve progressos, muitos, mas ainda há discriminação. Quem sabe a própria [discriminação] venha a calhar nesse momento de eleições, atiçando os machos selvagens e nos salvando da Dilma?", disse a atriz, em entrevista ao jornal Estado de S.Paulo, na última segunda-feira (9), ao ser perguntada se "o feminismo já era ou a mulher ainda precisa lutar contra as discriminações da sociedade?".

A frase embute em si absoluto despreparo, pois o machismo dos "machos selvagens" vitima muitas mulheres Brasil afora. E foi pronunciada num momento muito infeliz, quando a Lei Maria da Penha completa 4 anos, e explicita que a cultura machista está por trás da violência contra as mulheres no país.

O raciocínio é torpe, sinuoso, diria burro, e mostra o quanto o preconceito é perigoso, pois a atriz se mostrava, parecia, mais aberta ao debate político. Com essa 'pérola' talvez anime um pouco mais o debate eleitoral, que se mostra insosso até o presente momento.

Subjacente ao terror de Mário Amato, o medo de Regina Duarte e o preconceito de Maitê Proença está o conservadorismo do Estado brasileiro, que ao fim e ao cabo estimula essas estultices, sobretudo em momentos de decisões políticas importantes, cujo resultado poderá ser de mais amadurecimento político e social de nosso povo.

Que prevaleça a inteligência de nosso povo contra essas e outras tolices parta de onde partir.

(*) Analista político e assessor parlamentar do Diap

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