sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

O indefeso consumidor



"Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há-de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há-de precipitar a tua audácia sem freio? (...) Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem? (...) Oh tempos, oh costumes!"
(Cícero, "Catilinárias")

O Procon paulista soltou uma nota para esclarecer os consumidores sobre essa confusão toda causada pelos supermercados, que resolveram não embalar mais os produtos que vendem, e assim aumentar seus lucros, com o pretexto de "salvar" o mundo.
Diz a nota, depois de um blá-blá-blá sobre consumo "sustentável e consciente", que "no caso da campanha realizada nos supermercados, que visa a substituição de sacolas plásticas comuns por biodegradáveis, o Procon-SP esclarece que a par da informação prévia e adequada acerca de eventual cobrança e, ainda, do devido e contínuo esclarecimento e conscientização da população quanto a tais procedimentos, os estabelecimentos devem oferecer uma alternativa gratuita para que os consumidores possam finalizar sua compra de forma adequada, devendo essa medida ser adotada pelo tempo necessário à desagregação natural do hábito de consumo".
E continua: "É importante destacar que, na ausência de opção gratuita para que o consumidor possa concluir sua compra, fruindo de maneira adequada o serviço, o estabelecimento deverá fornecer gratuitamente a sacola biodegradável, respeitando assim os ditames do Código de Defesa do Consumidor (CDC)."
Parece incrível, mas é verdade: um órgão que deveria defender o consumidor, num caso flagrante de abuso aos seus direitos, fica no muro. Ora, a tal "alternativa gratuita" às sacolinhas de plástico, todos sabem, nada mais é que aquelas caixas de papelão imundas que embalam as mercadorias que os supermercados compram e que antes eram jogadas fora.
Com essa saída, o Procon acha que agradou tanto aos consumidores quanto aos supermercados. Agiu, isso sim, de forma a atender aos desejos dos empresários, que nunca estiveram, não estão, e nunca estarão preocupados com "consumo sustentável e consciente", com direitos do consumidor ou qualquer outra coisa que prejudique o seu faturamento.
É como a conhecida a fábula do escorpião e do sapo: o escorpião ferroa o sapo que lhe dava carona para atravessar o rio, selando a sorte de ambos, com a justificativa de que não podia deixar de fazer aquilo porque aquela era a sua natureza. Com os supermercados ocorre o mesmo: eles não vão nunca deixar de levar vantagem sobre o consumidor porque isso está no seu DNA.
E assim, sem amparo de ninguém, bombardeado por uma propaganda incessante, o cidadão comum vai se acostumando a ser cada vez mais espoliado, mais explorado, mais feito de trouxa.
Crônicas do Motta 

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