O fenômeno Wikileaks monopolizou inúmeras análises e reflexões sobre o futuro da informação, da Internet e da participação cidadã na difusão das notícias. O debate ficou limitado entre aqueles que apresentavam a distribuição de informação secreta como um problema e uma irresponsabilidade e aqueles que defendiam a sua livre circulação e apoiavam o Wikileaks. Na minha opinião, trata-se de uma simplificação, e o modus operandi do Wikileaks demonstrou que o assunto é mais complexo.
Uma prova disso foi a forma como difundiu os 250.000 documentos que recolhiam comunicações da diplomacia e da Administração Central estadunidense. Aqueles que pareciam subverter as formas de comunicação do século 21 optaram por oferecer em exclusivo e de forma privilegiada a documentação a cinco grandes meios de comunicação mundial: The New York Times, The Guardian, Der Spiegel, Le Monde e El País. Dias depois de as direções destes jornais os terem em seu poder, os cidadãos continuam sem poder acessar os documentos no site do Wikileaks.
Por sua vez, os cinco jornais organizam-se num cartel e coordenam-se. Segundo reconheceram, "há um acordo sobre a publicação simultânea dos mesmos documentos de relevância internacional e as datas da sua difusão". Afirmam que "têm autonomia para decidir sobre a selecção, valorização e publicação das comunicações que afetem os seus países", isto é, a cinco países do bloco Ocidental; toda a informação referente ao resto do mundo está filtrada por eles.
"Só serão publicados aqueles documentos que consideremos que não representam uma ameaça para a segurança de pessoas ou de países", dizem. Em concreto, o El País reconhece que "decidiu aceitar os compromissos a que o The New York Times chegue com o Departamento de Estado para evitar a difusão de determinados documentos".
A conivência entre o Wikileaks e o cartel dos cinco é absoluta. A partir do seu twitter, o Wikileaks já se remetia a eles assumindo que a sua página ficaria fora de serviço. E o que anuncia na rede social são ligações às páginas dos jornais.
Não sei se a origem do Wikileaks é limpa e honesta, o que sim parece claro é que se está a transformar num sujeito domesticado. Até o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, afirmou que os documentos dão razão ao seu governo na valorização da ameaça iraniana.
Não devemos descartar que, perante a perda de credibilidade da informação que os governos tornam pública, se esteja a recorrer a formas imaginativas que, sob a aureola de espontaneidade, filantropia e mitificação da Internet, não sejam mais que o mesmo cão com diferentes coleiras. Que, por agora, a única iniciativa concreta contra o fundador do Wikileaks seja algo tão peregrino como acusá-lo de um estupro, resulta bastante pitoresco.
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