“Vazamento do WikiLeaks não revela grandes segredos: apenas a fragilidade da inteligência dos EUA
Antonio Luiz M. C. Costa, CartaCapital
O que fazer de 251.287 memorandos diplomáticos? Uma leitura, análise e interpretação razoavelmente aprofundadas seriam um trabalho de anos, capaz de gerar milhares de artigos e teses acadêmicas em história, relações internacionais e ciências políticas.
Em vez de discutir as minúcias das árvores para as quais querem que prestemos atenção, busquemos uma visão geral da floresta. Uma conclusão inevitável é que o Departamento de Estado de fato põe diplomatas a serviço da espionagem, inclusive de seus aliados – e pode ter perdido parte da confiança destes, vista a facilidade- com que seus segredos são vazados. Outra é que os EUA têm pouca capacidade de interpretação das informações que reúne. As opiniões desabridas de diplomatas de Washington e de seus amigos e informantes sobre líderes mundiais são por vezes divertidas, mas raramente acrescentam algo novo. Suas análises e especulações revelam poucos segredos e também pouca capacidade de ir além do senso comum.
Simon Jenkins, do Guardian, comenta: “A impressão é da superpotência mundial- vagando impotente num mundo onde ninguém se porta como ela pede. Irã, Rússia, Paquistão, Afeganistão, Iêmen, a ONU, todos vivem saindo do roteiro. Washington reage como um urso ferido, com instintos imperiais, mas uma projeção de poder improdutiva. Sua diplomacia mostra-se escrava do deslocamento da política à direita e se apavora com uma bomba que explode no exterior ou com um congressista pró-Israel”.
Nas palavras de um alto funcionário do governo argentino ao Página/12, as mensagens “revelam que uma parte da administração estadunidense se converteu em um Estado policial, com uma análise muito pobre da política internacional. Muitas vezes esse tipo de organismo, como os que fazem inteligência dentro do Departamento de Estado, exageram seu trabalho, apesar de chegarem a conclusões e limites absurdos, para justificar sua existência, pedir mais recursos e aumentar seu poder interno”.
Nos próprios documentos vazados, os diplomatas de Washington tiveram de relatar o desdém de aliados e inimigos por sua inteligência. Em um almoço no Quirguistão, um empresário britânico disse ao príncipe Andrew que os investimentos do Reino Unido e dos EUA no vizinho Cazaquistão eram comparáveis, embora a economia estadunidense seja muito maior. “Nenhuma surpresa”, disse o príncipe, “os americanos não entendem de geografia, nunca entenderam.” Em uma recepção a senadores dos EUA, o presidente sírio Bashar Assad pondera: “Vocês possuem um gigantesco aparato de informação. Não temos esses recursos, mas somos bem-sucedidos no combate aos extremistas porque contamos com melhores analistas. Vocês gostam de fuzilar terroristas, mas sufocar as redes deles dá melhores resultados”.
Não se deve nem minimizar o conjunto como irrelevante fofoca de comadres ou papo de botequim para desvalorizar o que tem de incômodo, nem tratar as opiniões e alegações dos diplomatas dos EUA como verdade revelada. O material precisa ser criticado como qualquer outra fonte primária. John Kornblum, ex-embaixador dos EUA na Alemanha, contou como teve de escrever pareceres sobre personalidades do país onde atuava aos 23 anos, ao iniciar a carreira. Que avaliação séria do pensamento e dos planos de um líder estrangeiro poderia ter feito quando tão jovem e inexperiente?”
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