Para Terry Eagleton, hoje considerado o crítico literário mais influente da Inglaterra, a resposta é sim e não
Cristo, um líder político? Eagleton analisa os quatro evangelhos canônicos (Mateus, Marcos, Lucas e João) e, seguindo as omissões, contradições, escolhas e tendências de suas estruturas narrativas, procura dar conta de uma questão controversa que historicamente excede o campo da teologia.
Na apresentação ao livro, o crítico mostra que a pergunta retórica – “Jesus era apenas um líder espiritual e não um líder político?” – já incorpora um anacronismo pelo qual as interpretações mais costumeiras passam batidas. Afinal, perguntas dessa natureza só se tornam possíveis quando se “projeta para o passado uma distinção moderna entre religião e política que certamente não está nas Escrituras”. Nesse sentido, independente da voltagem espiritual das pregações de Cristo, é no mínimo sensato supor que a severa punição da crucificação não se deu por exclusivas razões de fé. Os romanos não se interessavam por diatribes ideológicas ou religiosas de suas colônias, mas destinavam a crucificação àqueles que representavam uma concreta ameaça à ordem pública.
O texto incisivo e elegante de Eagleton, cuja envergadura teórica rechaça qualquer acusação de diletantismo, não se exime de passagens corrosivas que, em outras épocas, facilitariam enormemente o trabalho dos inquisidores e censores do Index. Quando se fala, por exemplo, da proximidade de Jesus (depois desmentida) e principalmente de Judas com a seita dos zelotes (movimento clandestino anti-imperialista dedicado a expulsar os romanos da Palestina, que Eagleton compara ironicamente à Al-Qaeda), o autor chega a cogitar não sem um certo cinismo: “Talvez Judas tenha vendido Jesus porque esperava que ele fosse um Lênin e ficou amargamente desencantado quando compreendeu que não ia liderar o povo contra o poder colonial romano”.
Eagleton detecta o ímpeto materialista das atitudes cristãs (“O Reino dos Céus revela-se uma questão surpreendentemente materialista”), testemunhadas aliás na própria letra dos Evangelhos. E conclui que Jesus, ao contestar as autoridades judaicas e ao defender um horizonte de justiça e fraternidade até então inexistente (embora não ambicionasse com isso uma transformação radical do poder – “a César o que é de César”), foi a um só tempo mais e menos revolucionário que Lênin e Trotski. Pode-se não concordar com muito do que é dito. Mas o estilo afiado de Eagleton consegue localizar uma dimensão curiosamente incendiária e não tão popular do Cristo dos Evangelhos, confirmando, no final das contas, que uma outra exegese é possível.
Na apresentação ao livro, o crítico mostra que a pergunta retórica – “Jesus era apenas um líder espiritual e não um líder político?” – já incorpora um anacronismo pelo qual as interpretações mais costumeiras passam batidas. Afinal, perguntas dessa natureza só se tornam possíveis quando se “projeta para o passado uma distinção moderna entre religião e política que certamente não está nas Escrituras”. Nesse sentido, independente da voltagem espiritual das pregações de Cristo, é no mínimo sensato supor que a severa punição da crucificação não se deu por exclusivas razões de fé. Os romanos não se interessavam por diatribes ideológicas ou religiosas de suas colônias, mas destinavam a crucificação àqueles que representavam uma concreta ameaça à ordem pública.
O texto incisivo e elegante de Eagleton, cuja envergadura teórica rechaça qualquer acusação de diletantismo, não se exime de passagens corrosivas que, em outras épocas, facilitariam enormemente o trabalho dos inquisidores e censores do Index. Quando se fala, por exemplo, da proximidade de Jesus (depois desmentida) e principalmente de Judas com a seita dos zelotes (movimento clandestino anti-imperialista dedicado a expulsar os romanos da Palestina, que Eagleton compara ironicamente à Al-Qaeda), o autor chega a cogitar não sem um certo cinismo: “Talvez Judas tenha vendido Jesus porque esperava que ele fosse um Lênin e ficou amargamente desencantado quando compreendeu que não ia liderar o povo contra o poder colonial romano”.
Eagleton detecta o ímpeto materialista das atitudes cristãs (“O Reino dos Céus revela-se uma questão surpreendentemente materialista”), testemunhadas aliás na própria letra dos Evangelhos. E conclui que Jesus, ao contestar as autoridades judaicas e ao defender um horizonte de justiça e fraternidade até então inexistente (embora não ambicionasse com isso uma transformação radical do poder – “a César o que é de César”), foi a um só tempo mais e menos revolucionário que Lênin e Trotski. Pode-se não concordar com muito do que é dito. Mas o estilo afiado de Eagleton consegue localizar uma dimensão curiosamente incendiária e não tão popular do Cristo dos Evangelhos, confirmando, no final das contas, que uma outra exegese é possível.
Jesus Cristo – Os Evangelhos
Apres.: Terry Eagleton
Trad.: José Maurício Gradel
Jorge Zahar
240 págs.
Apres.: Terry Eagleton
Trad.: José Maurício Gradel
Jorge Zahar
240 págs.
* Fonte: Revista Cult, 30 de março de 2010, disponível emhttp://revistacult.uol.com.br/home/2010/03/lancamentos-ciencias-humanas-2/
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