quarta-feira, 9 de março de 2011

Tréplica

A seguir apresento o comentário do leitor Eugênio, publicado no Contramaré de 07/03, em relação ao artigo de Ricardo Musse intitulado "Por que a velha esquerda se ilude com Kadafi?".

Este tipo de argumentação explica porque "a nova esquerda", como o PSOL, andou a reboque dos setores chamados eufemisticamente de "oposição ao governo Lula", ou seja, dá para entender que uma militante da suposta "nova esquerda" como a ex-senadora Heloísa Helena subia à tribuna do senado para se juntar aos ataques de senadores do PSDB e Dem, desde 2005. Quer dizer então que para ser "verdadeiramente" de esquerda é preciso ser contra o Estado forte? Que seria de nós, em 2008, se o Brasil sob a administração do presidente Lula não estivesse fortalecendo as políticas econômicas de Estado face ao desafio de enfrentar anti-ciclicamente os efeitos da crise financeiras mundial surgida nos EUA e Europa?
Muita ingenuidade afirmar que o que acontece na Líbia é só mais um fenômeno "clássico" de "manifestações populares, greves gerais, insurgência proletária, em suma, pelo arsenal histórico da ação revolucionária." Arsenal histórico da ação revolucionária?... Em 1973, no Chile, isto também aconteceu (então Pinochet chegou ao poder, derrubando um presidente socialista, como fruto de uma "ação revolucionária". Confundir qualquer agitação de rua com revolução e qualquer greve como insurgência proletária é um simplismo bem típico de extrema esquerda que se contenta com meras palavras de ordem (que não explicam nada sobre os processos mais profundos que acontecem para além da superfície da conjuntura agitada).
Tão ruim quanto interpretar o presente com os olhos no passado, é interpretar o presente segundo um ideário doutrinal qualquer que está mais na cabeça de quem afirma tais conclusões sem fundamentos empíricos suficientes do que na realidade em si mesma (a realidade nunca obedece a nenhum esquema ideológico, porque sempre é mais complexa do que as teorias e doutrinas dogmáticas). Estas teses lembram-me a doutrina trotisquista que crê, acriticamente, numa suposta Revolução permanente e universal (bem como em palavras mágicas tais como "greve geral" e "insurgência proletária" que são capazes, por si sós, de fazer grandes revoluções proletárias).
Aqui ele se enquadra na própria crítica que faz à "velha esquerda" - "Exceto nesse período, a destituição do comando do Estado seguiu sempre o modelo ensaiado na Revolução Russa de 1905: manifestações de massas e greve geral." Dizer que todas as reviravoltas políticas do mundo no século passado seguiram sempre o tal esquema da Revolução Russa de 1905, ou seja, primeiro "manifestações de massas", seguidas de "greve geral" é ser muito simplório na análise histórica concreta de cada evento em específico (típico dos trotisquistas da tal "nova esquerda").
É certo que é um erro superestimar as forças sobre-humanas das agências de inteligências (no que concordo plenamente com ele), mas também o é subestimá-los como faz a suposta "nova esquerda". Pensar que tudo não passa de conspirações dos serviços secretos é tão ingênuo quanto pensar que nada é fruto de conspirações secretas (como se todo o jogo político de poderosos interesses internacionais se desse exclusivamente à luz do dia, com a mais ampla transparência ética; só se for na nova ideologia descendente das fábulas da D. Carochinha).
Se a "velha esquerda" desconhece inteiramente a situação histórica e social do mundo árabe, nada prova que a "nova esquerda" o conheça plenamente (pretensão de conhecer não é o mesmo que conhecer de fato, porque não acredito que alguém, no ocidente ou no oriente, seja capaz de fazê-lo, porque são realidades muito complexas e muito difíceis mesmo de serem apreendidas por quem quer que seja). Pelo menos podemos dizer, até o momento, que a Líbia não é o Egito (como é possível ver que não é mais uma "pecinha de dominó" como outra qualquer, porque não está seguindo, mecanicamente, a mesma lógica dos acontecimentos da Tunísia e do Egito, como diziam apressadamente, que cairiam todas, uma após outra) e que Kadafi não é Mubarak. Mas isto é fácil de constatar, não precisa ser nenhum profundo conhecedor da realidade árabe, o resto, não sabemos ainda (ninguém pode afirmar categoricamente onde tudo isto irá parar, a não ser que queira pagar o mico de ser desmascarado pelos fatos concretos).
É muita ingenuidade pensar que o fundamentalismo muçulmano é uma força motriz da "Revolução" mundial... Será que o autor também o inclui no suposto "arsenal histórico da ação revolucionária"? Qual "Revolução"? Como a do Irã em 1979? Como a Francesa de 1789, ou como a Russa de 1917?

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