A condenação pela presidenta Dilma Roussef da abstenção do Brasil na ONU em resolução repreendendo o Irã durante o governo Lula não significa que o Brasil planeje se afastar do país, segundo o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota.
João Fellet, BBC Brasil em São Paulo
Em entrevista à BBC Brasil, ele diz que o Brasil mantém relações “corretas com países de todas as regiões, sem discriminação quanto a sua orientação política”, mas reafirmou o compromisso do governo brasileiro com a defesa dos direitos humanos. Leia trechos da entrevista.
BBC Brasil – Numa entrevista recente, a presidenta Dilma condenou a abstenção do Brasil, adotada no governo Lula, em resolução da ONU contra violações de direitos humanos no Irã. Recentemente, no entanto, o senhor disse que o governo Dilma manteria relações próximas com Teerã. O Brasil se afastará ou continuará próximo do Irã?
Antônio Patriota – O Brasil tem relações com o conjunto de membros da comunidade internacional. Inclusive, no ano de 2010, nós estabelecemos relações diplomáticas com um pequeno número de países com as quais ainda não as tínhamos, como a República Centro-Africana e o Butão, de modo que procuramos desenvolver relações corretas, frequentemente também econômicas, com países de todas as regiões, sem discriminação quanto a sua orientação política. Mas nós também somos extremamente respeitosos das resoluções do Conselho de Segurança, que são mandatórias. No caso do Irã, um dos países que estão sob sanções do Conselho de Segurança, isso foi respeitado pelo ordenamento jurídico brasileiro. A declaração da presidenta Dilma deve ser interpretada como um compromisso muito firme dela, pessoal, e do governo brasileiro com a promoção dos direitos humanos onde quer que ocorram violações, e aí não é só no mundo em desenvolvimento, não é só em determinadas regiões do globo, ou no mundo islâmico. Não nos esqueçamos de que algumas das piores violações de direitos humanos do mundo foram cometidas por países altamente poderosos, de modo que há necessidade de uma vigilância ecumênica, digamos assim, neste ponto.
BBC Brasil – O Brasil vai apoiar a nomeação de um relator especial para investigar a questão dos direitos humanos no Irã? Nesta semana, o chanceler iraniano disse esperar que o Brasil não mude sua postura em relação a votações recentes.
Patriota – Cada resolução é um assunto. Está sendo examinada no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, uma resolução sobre a criação de um relator especial para o Irã. Existem relatores especiais para uma quantidade grande de assuntos, que às vezes são temáticos, como tortura, discriminação racial, às vezes são por países. Estamos em contato com outras delegações em Genebra para ver como se encaminha essa situação.
BBC Brasil: O senhor está na China num momento em que o país pressiona o Brasil para que o reconheça como uma economia de mercado. Ao mesmo tempo, o governo brasileiro dá sinais de que pode adotar medidas para coibir a entrada de produtos chineses e se posiciona de uma forma mais crítica em relação à desvalorização da moeda chinesa, o yuan. Como aprimorar a relação nesse cenário de embates?
Patriota – A China é o nosso principal parceiro comercial individual, é um parceiro estratégico, com que desenvolvemos uma relação complexa que envolve uma ampla gama de assuntos. Também nos coordenamos estreitamente com a China em vários foros multilaterais. À medida que o relacionamento com a China envolve interesses econômicos, de diversos setores e de dimensão muito significativa, é natural que surjam questões que precisam ser lidadas com franqueza, transparência, e o Brasil não se furta a levantar as suas preocupações nesse relacionamento bilateral. Existe uma preocupação, por exemplo, com a qualidade do comércio, na medida em que exportamos grande proporção de commodities – três produtos compõem a nossa pauta exportadora para a China, em quase 80% (soja, minério de ferro e petróleo). Nós gostaríamos de exportar mais produtos manufaturados. Mas essa questão de medidas de proteção comercial é algo que todo membro da OMC tem o direito de fazer, e não é só o Brasil que aplica contra a China, a China também aplica contra outros parceiros. O importante aí é observar estritamente as regras multilaterais para atuarmos dentro da legalidade. A questão da economia de mercado é uma que está em pauta não agora, recentemente, nem a China está pressionando agora de uma maneira diferente do que poderá ter feito no passado. Isso fez parte de um memorando bilateral que foi negociado no ano de 2004, e estamos em conversas com a parte chinesa para ver como é que implementamos esse memorando, que inclui compromissos da parte brasileira e da parte chinesa.
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