sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Serra vai ou fica?



Abaixo, dois artigos muito interessantes, ambos publicados na Folha de S. Paulo, sobre a candidatura de José Serra à presidência da República pelo PSDB. Janio de Freitas vai direto ao ponto na polêmica criada a partir de artigo e declarações de Fernando Henrique Cardoso. E Ricardo Melo apresenta a ideia de que Serra, no momento certo, vai abrir mão da disputa e tentar a reeleição ao Bandeirantes.

Lendo os dois textos, é possível perceber uma complementariedade nas teses dos jornalistas, mas fica em aberta a questão: se Serra desistir, quem assume a candidatura tucana? Quem pensou em Aécio Neves, alternativa natural, pode estar enganado – se Serra desiste, é porque terá avaliado como muito difícil a vitória do PSDB nas urnas, e tal situação não seria diferente com Aécio. Geraldo Alckmin também não seria bom nome para marcar posição, até pela pouca consistência teórica, digamos assim.

No fundo, os tucanos só têm um nome consistente e capaz de aceitar o debate nos termos que o lulismo pretende levar na campanha eleitoral. Sim, quem pensou em Fernando Henrique Cardoso acertou na mosca. É muito difícil imaginar o ex-presidente na disputa eleitoral, mas a verdade é que ele seria o candidato ideal em uma situação crítica para a oposição, com moral até para “exigir” o sacrifício de Aécio Neves na condição de vice em uma chapa pura. Cardoso é muito mais qualificado para o debate público do que seus colegas de partido e se não tem grandes chances de vencer a eleição em função da alta rejeição popular que ainda perdura, daria uma canseira grande para Dilma e Lula.

O problema todo é saber se FHC teria o despreendimento de partir para mais uma disputa eleitoral, ainda que para perder, depois de uma carreira vitoriosa, com dois mandatos na presidência da República. A vaidade, como se sabe, é um complicômetro grande no ninho tucano.

Inferno astral


Ricardo Melo

SÃO PAULO - José Serra está diante de uma decisão política dramática. Lideranças tucanas dão como favas contadas a sua candidatura à Presidência da República. Já falam em comparar a biografia do ex-militante da Ação Popular com a da ex-militante da VAR-Palmares e colocam Serra em um tour país afora e Estado adentro para ampliar sua visibilidade -com direito a Madonna e recadinhos via Twitter.


Os resultados, no entanto, têm sido magérrimos. As pesquisas eleitorais, todas elas, exibem Serra na descendente e Dilma ladeira acima. Aliados do tucano alegam que a trajetória atual era esperada, uma vez que Dilma é candidata assumida, tem o apoio de um campeão de popularidade e conta com a máquina federal. Já os rivais veem uma tendência irresistível a favor da petista.


De todo modo, os lances mais recentes do xadrez eleitoral são desfavoráveis ao governador. O presidente do PSDB, Sergio Guerra, adora falar, mas, quando fala, gela a espinha dos correligionários. A entrada em cena do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, se fez algum barulho, irritou os tucanos que aceitam tudo, menos o que o FHC propôs: o tal debate plebiscitário com o governo Lula. No Congresso, a refrega mostra-se previsível e desanimadora, com oposição e governo trocando xingamentos.


Num cenário em que inclusive a meteorologia parece atrapalhar, Serra tem cada vez menos tempo para escolher entre uma possível reeleição estadual e o imponderável no plano nacional. Além dos números das pesquisas; da água que sobra na propaganda da Sabesp, mas falta nas torneiras de contribuintes; e da fragilidade do discurso do partido que o abriga, não escapa ao governador o fato de que o principal aliado do PSDB, o DEM, carrega o fardo de um megaescândalo de Brasília.


Serra nunca foi daqueles de ir para o sacrifício "em nome do partido", até porque um partido como o PSDB nunca faria isso por ele ou qualquer de seus caciques. Não será surpresa se, na hora H, o refúgio dos Bandeirantes falar mais alto.

Nos ombros de Serra


Janio de Freitas

FHC, Sérgio Guerra e Tasso caíram na esparrela de Lula; quem pagará outra vez é o governador de São Paulo

POR MAIS QUE Lula avisasse do seu desejo de confronto plebiscitário com o PSDB, ainda assim Fernando Henrique Cardoso, Sérgio Guerra, presidente do partido, e Tasso Jereissati caíram na esparrela -e quem vai pagar outra vez por ideias que nunca teve é José Serra.


Uma das causas da limitação eleitoral de Serra em 2002 foi não expor sua divergência frontal com a política econômica anticrescimento de Fernando Henrique, só apoiada pelas classes alta e média alta (o que ficou um tanto esquecido). Com tal cautela, Serra omitiu de sua campanha os temas de maior interesse do eleitorado, que eram sua pretendida política econômica e os projetos sociais. Enquanto Lula aproveitou e explorou os dois temas por si e por Serra. Só de novos empregos seriam 10 milhões, e nem é possível lembrar de quantas reformas.


Ainda que da fraude à realidade seja o mesmo que da campanha ao governo, os feitos do governo Lula, atabalhoados e descriteriosos embora, deixam o governo de Fernando Henrique sem condições reais de comparação. Nem mesmo com os truques de inverdade desvendados na Folha por Gustavo Patu.


É, porém, com essa imensidão de incomparáveis que Fernando Henrique e seus dois acompanhantes identificam Serra para o eleitorado. E já o compelem a adotar na campanha, porque Lula e Dilma Rousseff não abandonam mais esse presente, o papel em que os três caíram. Então, ou Serra se omite outra vez e será criticado pelos próprios companheiros-candidatos do PSDB, ou pespega na testa corresponsabilidades que não tem e por muito de que discordava mesmo.


São notórias a velha competição entre Fernando Henrique e Serra, a relação muito precária entre Tasso Jereissati e Serra, e o desagrado de Sérgio Guerra com a maneira como Serra impôs sua (pré?) candidatura. Mas a mesma bomba duas vezes sobre a mesma vítima é um tanto excessivo. Inclusive porque José Serra parece não saber o que fazer.

Umazinha


Por falar em Serra, quando ele se queixa está, quase sempre, fora do tom e do momento. Sua queixa contra a insistência da TV Brasil, sobre o que diria da falta de água para 750 mil paulistanos, esqueceu-se de que a pergunta era incômoda, mas compensava um pouco o protetor silêncio de tantos meios de comunicação a respeito. Como de outras perversas sequelas, ainda tão vivas como sofrimento, das últimas semanas em São Paulo.

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