sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Rocinha: uma favela conveniente à classe média



“O Nem e esse aparato policial que faz essa operação ficcional geram um simbolismo que convence a população e faz com que a sociedade acredite que, de fato, a Rocinha será algo melhor e diferente. Não é isso que vai acontecer”, availa o sociólogo José Cláudio Alves.

Patricia Fachin, Stéfanie Telles e Rafaela Kley, IHU / Envolverde

“O Rio de Janeiro permite tiro de fuzil em favela, mas não permite mais tiros de fuzil nas ruas da Zona Sul”, declara José Cláudio Alves à IHU On-Line, referindo-se à ocupação da Rocinha nos últimos dias. Para ele, a ocupação anunciada aconteceu porque a “Rocinha é uma das favelas de grande expressão no cenário do Rio de Janeiro, porque está na fronteira entre a área da Zona Sul e a área que vai para a Zona Oeste, para a Barra da Tijuca, para São Conrado. Atrás da Rocinha também tem a Gávea, então, a favela fica localizada numa das áreas mais ricas da cidade. Portanto, jamais seria feita uma ocupação usando a mesma lógica que se utilizou no Alemão”.

Na avaliação do sociólogo, a Rocinha é diferente das demais favelas do Rio de Janeiro porque é formada por uma população nordestina que tem presença muito forte em toda a área da Zona Sul. “A Rocinha expressa o interesse racial da classe dominante daquela região, que tem preferência por ter, dentro de seus prédios, pessoas brancas”, aponta.

Para o sociólogo, a prisão do traficante Nem é estratégica, mas ele continuará controlando o tráfico de dentro do presídio. “Ele vai ser penalizado e sabe disso, mas, por outro lado, ele também sabe que a sua liderança será preservada, até porque, para que a estrutura que está montada na Rocinha se mantenha, é preciso realizar um acordo com ele. A intenção da polícia agora é ocultar o tráfico de droga, de armas sob um manto de uma pacificação da polícia”, avalia.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone para a IHU On-Line, Alves questiona a estrutura policial, fala dos desafios das UPPs e dos acordos estabelecidos entre os traficantes e os policiais. E questiona: “O que mudou nesse país desde 1960? Uma juíza foi assassinada recentemente e um deputado estadual tem que sair do país para poder sobreviver”. E responde: “Hoje nós temos uma estrutura democrática, legítima, eleita, fazendo algo muito mais grave, muito mais intrincado e percolado do que a ditadura foi capaz de fazer”.

José Cláudio Souza Alves é graduado em Estudos Sociais pela Fundação Educacional de Brusque. É mestre em sociologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutor na mesma área pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é professor na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

IHU On-Line – Como o senhor analisa a anunciada ocupação da Rocinha e a forma como a favela foi ocupada? A ocupação foi anunciada pelo fato de a Rocinha estar localizada entre bairros de classe média?

José Claudio Alves –  Naquela época, quando houve a invasão do Complexo Alemão, a polícia já havia anunciado a possibilidade de ocupar a Rocinha. Naquele momento eu disse que a ocupação não aconteceria da mesma forma que aconteceu no Alemão, ou seja, como uma construção político-midiática, com o uso de armamento de guerra, com tanques passando por cima de
carros, com o Exército entrando nas ruas, etc.

A Rocinha é uma das favelas de grande expressão no cenário do Rio de Janeiro, porque está na fronteira entre a área da Zona Sul e a área que vai para a Zona Oeste, para a Barra da Tijuca, para São Conrado. Atrás da Rocinha também tem a Gávea, então, a favela fica localizada numa das áreas mais ricas da cidade. Portanto, jamais seria feita uma ocupação usando a mesma lógica utilizada no Alemão. Não é possível fazer o mesmo tipo de ocupação porque a classe média não permite. Além disso, o Estado e os grupos políticos não possuem interesse em promover tal tipo de ação, porque isso assustaria os moradores da Zona Sul. Lembre-se que o Rio de Janeiro permite tiro de fuzil em favela, mas não permite mais tiros de fuzil nas ruas da Zona Sul.”
Entrevista Completa, ::Aqui::

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