Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa
"Começa na quinta-feira (9/10) um teste definitivo para a mídia tradicional do Brasil. Agora que a alternativa Marina Silva foi descartada, os principais grupos empresariais de comunicação estarão em confronto aberto com o Partido dos Trabalhadores, que controla há doze anos o poder central. O cenário é o da eleição presidencial em segundo turno, no qual o grupo apoiado explicitamente pela imprensa majoritária enfrenta a presidente que busca a reeleição.
Em circunstâncias ideais, este enunciado deveria ser considerado uma aberração. Afinal, espera-se que a imprensa seja uma espécie de mediadora entre as forças que disputam a hegemonia numa sociedade democrática, e não uma entre as potências engajadas na contenda. Mas não há como dissimular a prevalência do viés favorável a uma das partes em praticamente todo o sistema da mídia.
O “Manchetômetro” conduzido pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (ver aqui), que mede o teor do noticiário de maior audiência da televisão e dos jornais de circulação nacional, mostra que aumentou a disparidade entre as notícias negativas que atacam a presidente da República e o viés majoritariamente positivo ou neutro que favorece o candidato da oposição.
A piada pronta
A referência ao “volume morto” não é apenas uma metáfora: ela ajuda a entender como a imprensa tenta dissimular a malversação dos fatos para preservar alguma credibilidade.
O leitor ou leitora com visão crítica há de ter notado que o Jornal Nacional da TV Globo dedicou nesta semana um tempo incomum ao problema da falta de água no estado de São Paulo, e desde a segunda-feira (6/10) apresenta um rigor inédito na análise da questão. De repente, não é apenas São Pedro o culpado pelo esvaziamento dos reservatórios.
Na quinta-feira (9), praticamente toda a imprensa nacional reverte o teor da cobertura sobre o problema, admitindo que a direção da Sabesp – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo errou no planejamento para a temporada da seca. Nos jornais paulistas, o noticiário chega a resvalar para o achincalhamento, com referência a um bordão do colunista José Simão, da Folha de S. Paulo, classificando a declaração da presidente da Sabesp como “piada pronta”. A fonte é o depoimento da executiva, Dilma Pena, em audiência na Câmara Municipal paulistana.
O mote da anedota prêt-à-porter é o eufemismo usado pela presidente da Sabesp para negar que esteja havendo um corte seletivo no fornecimento de água: ela declarou que não há racionamento, “mas administração da disponibilidade de água”. Vereadores aproveitaram para fazer blague, observando que alguns deles não são carecas, mas apenas tiveram o “potencial capilar diminuído”.
Em meio à galhofa, poucos leitores se dão conta de que a imprensa só se dispõe a encarar a evidente falta de responsabilidade do governo paulista diante da crise hídrica depois que o governador Geraldo Alckmin assegurou sua reeleição. A imprensa poderia aproveitar melhor o anedotário criado pelo jornalista José Simão, observando que o governo de São Paulo “tucanou” a falta d’água.
Nenhum comentário:
Postar um comentário