O Radical Classe Média se imagina como o que resta de bom no Brasil. Não raro, flerta com o fascismo
Há uma figura pitoresca que costuma habitar a classe média tradicional brasileira. Ela pode ser encontrada na universidade, nos protestos políticos, nos shoppings centers, na high society, entre os mais escolarizados, tanto nos movimentos de esquerda, como nos de direita. Na verdade, é uma radicalização da visão específica de uma classe. Vou expor algumas de suas características.
Vale lembrar que o modo de vida apontado abaixo é um tipo idealizado do caráter do “Radical Classe Média”, podendo, portanto, uma pessoa comum reunir uma maior ou menor quantidade de tais inclinações, se associar intensamente ou dissociar do modelo.
O Radical Classe Média:
Geralmente, o radical classe média se apresenta como politizado, para, na verdade, repetir os velhos cacoetes do senso comum da política – é contra partidos;
Mais. Todo político é ladrão. Alias, para o Radical Classe Média, o problema do Brasil não é o da desigualdade, mas o da corrupção. Por isso, não perde a oportunidade de comparar a nossa suposta natural propensão para a malandragem com a sonhada condição positiva dos EUA, ou numa perspectiva intelectualizada, dos países escandinavos;
Nesse sentido, a eleição não passa de uma chantagem. Tanto faz quem vai ganhar – “é tudo igual mesmo”. O Radical Classe Média, quando não é capturado pelo moralismo e/ou suposta superioridade gerencial de um bonachão, prega o voto nulo;
O Radical Classe Média não gosta muito de se “misturar”. Quer exclusividade. No fundo, ele não suporta que ônibus coletivo passe nas praias “nobres” de sua cidade. Ou, em sua versão intelectual, defende a criação de “espaços” para os mais “humildes”;
Para o Radical Classe Média, as instituições devem aprender a se relacionar com ele, já que o dito cujo apresenta muitas especificidades;
Instituição a favor dele é democracia. Contra ele? Fascismo;
Seguranças-policiais-trabalhadores devem fazer cursos de capacitação só para aprenderem a se relacionar com ele;
Ele é anarquista para os deveres, mas não para os direitos;
Ele é contra impostos, mas quer que tudo funcione a seu favor;
Um bom Radical Classe Média critica o inchaço do Estado, mas sempre tem alguém da família, gozando de acesso privilegiado ao próprio Estado – um cargo, um contrato, etc;
O Radical Classe Média não tem diploma de graduação. Ele tem diploma de nobreza. E o “resto”? É resto, alienado. Ele se vê como o (único) “intelectual orgânico”…;
Ele é terminantemente contra o bolsa-família, a quem ele chama de bolsa-esmola, pois produz preguiçosos e premia quem nunca “quis” estudar;
Para o Radical Classe Média, quem não sabe escrever o português corretamente deveria ser impedido de votar, de expor sua opinião num blog ou jornal. Enfim, de argumentar;
Pensar é sinônimo de dominar a gramática. Do contrário, o dito cujo se encontra no nível dos animais irracionais;
Para ele, às vezes, o problema do Brasil é porque o pobre-analfabeto – ele chama de “não esclarecido” – não sabe votar. Uma cientista política advinda da USP teria um bom conceito radical de classe média para isso – ausência de “sofisticação política”;
Na versão intelectualizada, o Radical Classe Média é um crítico do jeitinho brasileiro, gosta de ler Nietzsche, Foucault, Deleuze, Guatarri. É um crítico do “micropoder”, dos “fascismos da norma”, conceitos mobilizados para negar qualquer coisa que lhe cobre alguma contrapartida social;
Há também aquelas versões do Radical Classe Média que tornam Karl Marx, ou o socialismo, numa questão de superioridade ético-moral;
O Radical Classe Média é um supercidadão. Os demais… subcidadãos;
Afinal, o Radical Classe Média estudou. Merece mais do que os simples mortais.
O Radical Classe Média se imagina como o que resta de bom no Brasil. Não raro, flerta com o fascismo.
Por Daniel Menezes, em CartaPotiguar
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