Por Fabiano Marranghello Zalazar*, via Jornalismo B
Se tivéssemos de eleger o principal problema do país, aquele que é o mais grave e responsável direto pela nossa falência política, econômica e social, não permitindo que sejam atendidos os direitos sociais básicos de milhões de brasileiros, o sistema da dívida pública nacional teria essa primazia. Inicialmente, cabe uma provocação. Se o cidadão comum pode ingressar com uma ação para rever cláusulas contratuais abusivas e os juros ilegais cobrados por uma instituição financeira, por que o Estado brasileiro não faz o mesmo em relação aos juros da dívida pública?
O capital financeiro transnacional recebe do governo brasileiro juros ilegais de uma dívida já paga há décadas, com juros sobre juros, prática vedada pela Constituição Federal que, no seu artigo 26, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias,prevê a auditoria da dívida. Esse, como o que prevê a taxação das grandes fortunas, não é cumprido, tampouco debatido no Congresso Nacional, mais ocupado com outros assuntos como o Estatuto da Família e a redução da maioridade penal.
Definitivamente, não há vontade política por parte de uma classe política comprometida com o sistema financeiro, o qual, sabidamente, é financiador de campanhas, partidos, governantes e parlamentares de todas as instâncias e esferas públicas. A conivência do Estado brasileiro com as instituições financeiras chega a ser criminosa. É pornográfico pagarmos juros diários da dívida pública nacional que consomem R$ 2,7 bilhões do erário público para propiciarmos ao capital financeiro os maiores lucros obtidos em todo o planeta. Não somos mais os campeões do futebol, mas somos os campeões de pagamento de juros e da mais alta carga tributária do mundo. São algumas das contradições responsáveis pelo nosso atraso como nação.
O imoral sistema da dívida pública é responsável direto por infligir a milhões de brasileiros indicadores sociais comparáveis aos de países do continente africano, o mais pobre e sofrido do globo. Entre 187 países do mundo, o Brasil ocupa atualmente o 79º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano. Temos, como preço da política econômica de benesses para o capital financeiro, números que não condizem com o posto de oitava economia do mundo. A Saúde, a Educação e a segurança pública sofrem com a lógica da crescente precarização e do sucateamento de serviços essenciais e estratégicos para a economia, como no caso da educação, que deveria ser a principal responsável pela tecnologia do país.
A corrupção que assola a máquina pública tem causa direta e se retroalimenta dessa lógica perversa de sustentação da dívida pública. É assustador que no ano de 2015, conforme apurado pela Auditoria Cidadã da Dívida, 48% do gasto federal tenha sido usado no pagamento de juros e amortizações da dívida. No ano de 2014, foram destinados apenas 3,98% do orçamento público para a Saúde, 3,73% para a Educação, 3,21% para o trabalho, 3,28% para a assistência social e 0,04% para a Cultura, enquanto foram gastos 45,11% com os juros da dívida, incríveis R$ 2,168 trilhões com esse pagamento imoral e inconstitucional. Aqui no Rio Grande do Sul, como na União e em outros estados, prioriza-se o pagamento dos juros ilegais e escorchantes da dívida, em detrimento dos salários dos servidores e dos investimentos nos serviços essenciais e modernização da máquina pública. Penalizam-se os servidores públicos, a classe trabalhadora e a população, mas nunca os banqueiros.
Enquanto sindicalistas e cidadãos comprometidos com a construção de uma sociedade mais justa e solidária, temos o dever de empunhar a bandeira da auditoria da dívida pública e levar essa discussão para todos os fóruns possíveis. Devemos ser muitas e mais vozes a defender uma auditoria ampla, geral e irrestrita desse ataque diário que sofremos. Nesse aspecto, a Auditoria Cidadã da Dívida Pública, coordenada no Brasil com brilhantismo pela ex-auditora fiscal da Receita Federal Maria Lúcia Fattorelli, cumpre um papel importantíssimo para a democracia brasileira, apontando caminhos para a soberania e a independência do país como forma de buscarmos mais justiça social e a melhoria do atendimento aos direitos sociais básicos de milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha de pobreza e de miséria.
*Diretor do Sindjus/RS.
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