quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Quanto mais senso comum, mais likes! O tabu de pensar de verdade.


Por André Zanardo

Política, religião e futebol não se discute

Dizem que religião futebol e política não devem ser discutidos. Tal senso comum é originado em um tabu social criado para evitar discórdias entre pessoas. Entretanto, quando proibimos determinados assuntos, perpetuamos erros históricos e geramos falhas de comunicação entre as pessoas e, por consequência, o fim da empatia entre elas.
A criação de tabus ou a falta de discussão, aprofundada sobre determinados assuntos, alimentam as polarizações violentas, instituindo novos inimigos e perpetuando guerras intermináveis. Os exemplos estão em toda parte: Palmeiras e Corinthians, Esquerda e Direita, Judeus e Muçulmanos.

A origem do tabu

A palavra tabu é derivada do tonganês tabu e do maori tapu, termos que se referem à proibição de determinado ato, com base na crença de que tal ato invadiria o campo do sagrado, implicando em perigo ou maldição para os indivíduos comuns.
Em suma, o “Tabu” é uma instituição de fundamento religioso que atribui caráter sagrado a determinados seres, objetos ou lugares, interditando qualquer contato com eles. Segundo Freud, o tabu é a base da “Idolatria política” de políticos como Adolf Hitler, instrumento de cegueira e controle social com base no cerco à informação.
Para Freud e Levi-Strauss, o tabu divide um ambiente entre “amigos” de um lado e “inimigos” de outro, funcionando como uma ponte entre duas determinações comportamentais, “um duelo” entre forças antagônicas.

Senso comum, argumentos rasos e tabu

Da mesma sorte, assim como a não comunicação completa gera conflitos, a superficialização dos discursos provocam a perpetuação do senso comum como se fosse um novo tabu, impedindo a discussão profunda em razão da ignorância das partes.
O não diálogo e os discursos rasos, sem fundamentação empírica, têm levado a humanidade a repetir os seus erros pela eternidade. Errar é humano,  persistir no erro também tem se tornado uma grande característica humana.
A pós-modernidade trouxe consigo a necessidade de processamento rápido de informações  produzidas com conteúdo superficial e dinâmico, no qual exigem das pessoas opiniões e análises imediatas para toda sorte de assuntos. Essa análise, sem fundamento, respira senso comum e, com dados falaciosos, fazem com que as pessoas retirem ideias equivocadas a respeito de assuntos sérios e complexos.

Prender, punir e matar. As soluções do “tiozão inteligente”

As pessoas sentem conforto para falar de Direito Penal como se tivessem propriedade no assunto. Acreditam, de forma equivocada que, por assistirem aos noticiários ou conviverem ao cotidiano de violência, entendem dos mecanismos que levam as pessoas ao desvio criminoso e, também acreditam saber como impedir este comportamento.
Quando ocorre algum crime de repercussão, insurgem-se os sabedores de todas as ciências humanas com as opiniões mais inteligentes do mundo: “É preciso aumentar a pena”; “Prisão perpétua pra esses canalhas”; “Adolescente tem de ir pra cadeia”; “Bandido bom é bandido morto”. (Quem irá matá-lo, veja aqui).
Com soluções práticas e “inteligentes”, encontram no seu simplismo discursivo um conforto de serem capazes de resolucionar quaisquer problemas da ordem terrestre. Quando proferem  estes argumentos rasos, eles são automaticamente validados por seus semelhantes que acenam positivamente com a cabeça, reforçando o sujeito como elemento social aceito por sua “inteligência” notoriamente reconhecida.

O seu sentimento de impunidade e o senso comum

Mal sabem as pessoas que o sentimento de medo criado pelas informações, pinçadas na mídia, automaticamente geram suposições e argumentos artificiais e falaciosos a respeito de impunidade e formas de contenção da violência.
O superdimensionamento do sentimento de violência é devido, muitas vezes, em razão da maciça exposição midiática que, por sua vez, leva a criação de tipos penais desnecessários. O Direito penal, para estas pessoas, acaba se tornando um instrumento de satisfação psicológica, placebo de um pensamento que foi, falaciosamente, implantado na sua mente. O nome técnico deste mecanismo denomina-se populismo penal midiático. Nas palavras de Alexandre Morais da Rosa, se trata de um conhecido “remedinho” chamado Penazil (Saiba mais).

Quanto mais senso comum, mais “likes”

Há algum tempo, as pessoas tinham seus argumentos validados e reforçados positivamente pela sociedade quando falavam pessoalmente. Hoje, em uma sociedade interconectada, em que as pessoas são estimuladas a ganhar “likes” nas redes sociais para satisfazerem a sua aceitação social, o senso comum se torna uma exponencial.
Por não encontrarem nenhuma barreira linguística, não se depararam com contestações científicas e, em razão da posição confortável, de se emitir análises aceitas socialmente, todos se sentem confortáveis para falar sobre determinados assuntos, mas de forma rasa, se tornando quase um tabu dizer a verdade. Resultado disto tudo são conflitos intermináveis e  repetição incessante de erros.

Por um mundo que pensa de verdade

Vamos combinar, quando tiver vontade de dar “pitacos”, seja nas redes sociais, em casa ou com amigos, sobre assuntos como, por exemplo, relacionados ao Direito Penal, pare e tente falar sobre microbiologia molecular. Provavelmente, sem estudo, você é tão ignorante em matéria penal quanto em microbiologia molecular. Só que você não sabe disso. Discursos rasos levam ao senso comum, que levam ao tabu da ignorância que, por consequência, mantém o mundo, que tanto criticam, como está: quase perdido.
É preciso muito estudo para encontrar a raiz do problema. É preciso buscar na essência o vetor que origina o erro e enfraquece as bases que incomodam a acomodação social. Sem tabu, com menos senso comum!
ANDRÉ ZANARDO é advogado criminalista em São Paulo, sócio do escritório Tardelli, Zanardo e Leone Advogados, um dos fundadores do grupo de direitos humanos Advogados Ativistas e diretor do Justificando.
do http://justificando.com/2014/08/27/quanto-mais-senso-comum-mais-likes-o-tabu-de-pensar-de-verdade/

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