quarta-feira, 2 de maio de 2012

Quem é o bicheiro Carlinhos Cachoeira e como tudo começou



Família Cachoeira, de pai para filho
É num quarto do Hotel Palace, prédio decadente dos anos 1950 no centro de Anápolis, a 55 km de Goiânia, que mora o mineiro Sebastião Almeida Ramos.
Tião Cachoeira, 82 anos, é pai de Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, contraventor preso por suspeita de chefiar a máfia do caça-níqueis no Centro-Oeste.
O bicheiro controla uma rede criminosa com ligações com empresários da mídia, jornalistas, governadores, senadores, prefeitos, juízes, desembargadores, delegados e até padres.
Foi numa cidade em ebulição repleta de migrantes, entre Goiânia e os canteiros da nova capital federal, que Tião começou a trabalhar no comércio ambulante e como apontador de jogo do bicho – o responsável em anotar as apostas.
Mais tarde, ele já estava em sociedade com Pintadinho, um bicheiro tradicional na cidade.

SEPARAÇÃO

Nos anos 1960, Tião se separou da mulher. A separação foi um trauma para os 14 filhos (12 estão vivos), contam ex-vizinhos da família na antiga Vila Góis, em Anápolis.
Carlinhos, Marquinhos, Paulinho e Julinho saíram em defesa da mãe, mas, sem estudo e influência, foram aos poucos ajudar o pai no “negócio” do jogo do bicho.
Tião se desentendeu com Pintadinho. Depois de uma série de atritos, levaram em conta os conselhos de amigos e dividiram as bancas da cidade.
Aos poucos, Carlinhos foi assumindo o “negócio” do pai e abocanhando as bancas de Pintadinho. Já Marquinhos, com quem Carlinhos vivia uma disputa eterna em família, concluiu o ensino médio e passou num concurso do Banco de Brasília.

ASCENSÃO

A guinada de Carlinhos Cachoeira ocorreu nos anos 1990, quando o então governador Maguito Vilela (PMDB) lhe deu a concessão da Loteria do Estado de Goiás, a LEG.
Hoje, Vilela, prefeito de Aparecida de Goiás, se limita a dizer que era apenas um colega de futebol do “menino” Carlinhos nos campinhos de Anápolis.
Foi naquela década que Carlinhos esteve no Rio de Janeiro para se apresentar aos bicheiros Castor de Andrade e Anysio Abraão Davi e frequentar os camarotes das Marquês de Sapucaí, levando sempre os irmãos.
O velho Tião continuava a morar no decadente Hotel Palace, enquanto Carlinhos começava a desenvolver em Goiás.
Carlinhos virou pioneiro no bingo eletrônico e no jogo de caça-níquel no Centro-Oeste. Tião passou a “exercer” a função de jogador incontrolado de caça-níqueis. “Pelo menos o dinheiro volta para a gente”, disse Carlinhos, resignado, numa roda de amigos, segundo um parente.
O velho Tião, que gosta de dizer que é afilhado do ex-presidente Juscelino Kubitschek, é um homem que fala pouco, sempre introspectivo e que não costuma falar de sua vida.

PERILLO

No período que coincide com a chegada de Marconi Perillo (PSDB) ao governo de Goiás, no fim dos anos 1990, Carlinhos ampliou sua rede de contatos e se mudou para Goiânia.
Ali comprou um apartamento no Excalibur, um edifício de apartamentos de luxo no centro da cidade em que residem cantores sertanejos e empresários da soja. Levou junto os irmãos Julinho, visto por alguns como o braço direito dele, e Paulinho, que morava em Uberaba.
Luizinho foi colocado no comando de uma casa de carteado em Anápolis, frequentada por um seleto grupo de empresários. Outro irmão, Juninho, passou a ajudar Carlinhos nas empresas que a família abria em setores legais da economia.

EMPRESÁRIO

Finalmente, Carlinhos virava um empresário do Distrito Agroindustrial de Anápolis, o Daea, aberto há cerca de 25 anos, e que transformou a cidade, atraindo milhares de migrantes.
A cidade que nos anos 1950 tinha 50 mil habitantes hoje abriga 340 mil moradores. A entrada de Carlinhos no Daea era um marco para um homem tímido, que, assim como o pai e os irmãos, nunca ostentou dinheiro e sempre esteve à sombra de poderosos.
Marquinhos deixou o Banco de Brasília e abriu uma loja de factoring em Anápolis. Para o irmão Ricardinho, o Pipoca, sobrou a área que, agora, era a menos rentável: a Girafa, como chamam a “empresa” de jogo do bicho na cidade.

REDE DE AMIZADE

Os amigos da família também foram sendo incluídos nos negócios de Cachoeira. Foi o caso de Frei Valdair, ligado à matriarca Maria José, que recebeu apoio para incrementar a programação da rádio São Francisco, mantida pela Igreja.
Estar perto de Carlinhos também “motivou” os amigos a “crescerem” na vida, afirma um outro parente do contraventor.
Carlos Nogueira, o Butina, amigo apresentado por Frei Valdair, em poucos anos passou de contínuo na rádio para publicitário de sucesso e dono de dois canais fechados de TV e um jornal de abrangência regional.

REDE DO CRIME

A Polícia Federal incluiu na rede comandada por Carlinhos dezenas de políticos, empresários, desembargadores e policiais. É essa rede que a CPI mista do Congresso começará a investigar.
A prisão do contraventor, no dia 29 de fevereiro aparentemente uniu a família, que vivia às turras nos últimos anos. Há cerca de três anos, Marquinhos reclamou que o irmão estava se dedicando demais à “política”. “Virou político”, criticou.
Na última semana, a três amigos, ele contabilizou que o irmão poderia ter repassado R$ 1 bilhão para os “políticos” nestes últimos anos.
“O problema da nossa família é a corrupção. Mas a polícia só quer caçar a gente. Os políticos vão ficar soltos?”, disse.
Da cadeia, Carlinhos Cachoeira mandou dizer que os desabafos em família, e apenas em família, são toleráveis.

Nenhum comentário:

Postar um comentário