Semana passada, o assunto político mais importante foi a criação da CPI do Cachoeira. Só se falou dela no Congresso e na imprensa.
De acordo com o requerimento para sua instalação, a comissão mista de senadores e deputados deverá investigar as ligações de Carlos Cachoeira com “agentes públicos e privados”. Poderá, portanto, examinar as relações do bicheiro e de seu grupo com parlamentares, governos estaduais, prefeituras e empresas.
É uma CPI inusitada, a começar pelo fato de ter sido proposta e bancada pelos partidos governistas. Normalmente, quem insiste na criação de CPIs são as oposições, para embaraçar o governo, gerar noticiário negativo e manter o foco da mídia em temas que o desgastem.
Não por outra razão, o governo costuma convocar seus aliados para evitá-las.
Quem correu para que a nova CPI fosse instalada foi o PT, secundado pelo PMDB. Com o apoio dos maiores partidos, a proposta queimou etapas e a comissão deve começar a funcionar na terça feira.
Ela recebeu o endosso de Lula, o que não é pouco. Mais que apenas por cálculo partidário, o ex-presidente teria motivos pessoais para querer que fosse criada. Consta que a vê como oportunidade para acertar as contas com adversários na política e na indústria de comunicação.
Pelo pouco que se conhece, até agora, da atuação de Cachoeira, parece que, em termos ideológicos, ele se alinhava preferencialmente com as oposições, seja na política nacional, seja em Goiás. Sua intimidade com Demóstenes Torres, o paladino do combate anti-petista no Senado, é reveladora dessa inclinação.
Assim como a ligação umbilical que mantinha com alguns órgãos de imprensa assumidamente hostis ao PT e ao governo, como a revista Veja. Os dois viveram uma longa e mutuamente recompensadora parceria.
Não que essas afinidades inibissem o comportamento empresarial de seu grupo. Pelo contrário, na hora de ganhar dinheiro, Cachoeira não olhava as diferenças entre gregos e troianos. Políticos de vários partidos surgiram nas investigações da Polícia Federal.
Para Lula e o PT, o prejuízo da CPI expor os vínculos de correligionários - incluindo o governador do Distrito Federal - com os esquemas do bicheiro deve ter sido avaliado como inferior aos benefícios que poderia gerar.
Nas oposições, a CPI não encontrou defensores entusiasmados, mas tampouco teve adversários. Vendo que era inevitável, suas lideranças não lhe colocaram entraves.
Com isso, teremos, nos próximos meses, o assunto Cachoeira em pauta. Quanto a se a CPI será capaz de gerar novidades relevantes, só saberemos à medida que avançar.
Muitos comentaristas acham que sua criação é uma espécie de manobra diversionista do PT. Na sua opinião, ela teria sido criada fundamentalmente - ou, quem sabe, apenas - para desviar a atenção da população do julgamento do mensalão.
A suposição se assenta em duas premissas. Em primeiro lugar, que o Supremo pretende - ou tem condições técnicas - de iniciá-lo logo. Se não, porque querer instalá-la rapidamente?
Isso, no entanto, está longe de ser certo. Pelo contrário.
A outra é que a opinião pública estará interessada no julgamento. Se não, por que seria preciso distraí-la com algum estratagema?
Não é, porém, uma hipótese provável.
Embora temido por governistas e desejado por oposicionistas, o julgamento do mensalão - quando ocorrer - não tem os elementos que criam os fatos de opinião relevantes: surpresa, extensão e drama.
O caso é velho, seu tamanho está delimitado, perdeu a emocionalidade.
Para a opinião pública, o julgamento já aconteceu. A vasta maioria inocentou o único que a interessava: Lula. E aqueles que o culparam também já deram seu veredicto.
Com ou sem CPI, pouca coisa muda no modo como as pessoas vão acompanhar a decisão do Supremo.
Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
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