Há que reconhecer que a Globo encontrou uma fórmula extremamente eficiente para favorecer a Serra no debate de ontem. É de se imaginar que poucos tenham se dado conta dessa fórmula até que foi possível vê-la em uso.
O modelo de “indecisos escolhidos pelo Ibope” inquirirem os candidatos poupou a estes e ao público dos bate-bocas dos debates anteriores e, assim, favoreceu a Dilma, que ficou muito mais calma desta vez.
A petista foi favorecida ao não ter que se confrontar diretamente com o adversário, pois nos debates anteriores esteve mais nervosa do que ele.
Aí termina qualquer favorecimento ou igualdade de condições para ela, porque o modelo do debate constituiu-se, também, em uma armadilha devido aos tais “indecisos”. Em suas perguntas, pintaram um quadro muito ruim do Brasil.
Saúde, Educação, Segurança, Saneamento, tudo o que perguntaram sobre esses tópicos – e sendo eles de várias partes do país – colocou a candidata do PT em desvantagem, pois diziam frases como “somos tratados como animais na saúde”.
E de quem é a responsabilidade por 500 anos depois do descobrimento ainda haver gente recebendo serviços públicos básicos de má qualidade?
Houve, também, favorecimentos sutis. Willian Bonner modulou a voz para o modo ironia ao cortar a fala de Dilma quando ela estourava o tempo, o que não ocorria quando Serra fazia o mesmo.
Nas considerações finais, por longos segundos Dilma foi enquadrada de muito longe, aparecendo pequenina no centro da tela. Quando a câmera se aproximou, pegou-a meio que de lado.
Já Serra entrou num belo enquadramento de frente do começo ao fim de sua fala final. E a câmera se aproximou de seu rosto quando ele, previsivelmente, deu aquela choradinha básica ao concluir.
Houve empate no primeiro bloco, com questões mornas e poucas indiretas ou até menções ao governo federal, ao PT ou ao governo de São Paulo por cada candidato ao criticarem indiretamente as administrações adversárias.
No segundo bloco, Dilma não foi bem na questão sobre saúde. O “indeciso” não era de São Paulo e, como em outros tópicos, sua crítica remetia ao problema em termos federais.
Ela poderia ter respondido que havia que comparar a situação de hoje com a que Serra e FHC deixaram, mesmo sem citá-los. Naquele momento, porém, começou a enumerar programas em andamento que, diante de crítica forte à situação atual, não explicam nada.
No terceiro bloco, Dilma venceu. Abordou com paixão e sinceridade a questão pobreza e miséria quando um “indeciso” quis saber como parar de dar o Bolsa Família. E rechaçou acusação indireta do adversário sobre o Estado estar arrecadando muito porque os impostos são altos, respondendo que arrecada-se muito hoje porque o bolo sobre o qual arrecadar é maior devido à economia crescer mais do que no governo passado.
Um ponto digno de nota foi a audiência. Durante o debate, no Twitter falava-se em 29 pontos. Não deve ter ficado muito longe disso.
Com tal audiência e com uma vantagem de Dilma que não é tão confortável – sempre de acordo com as pesquisas –, foi bastante arriscado ela participar daquele jogo. Sobretudo porque não é possível que sua campanha não soubesse que os “indecisos” fariam o que fizeram.
Contudo, Dilma teve uma postura muito boa. Em algumas respostas a eleitores pareceu ter sido eficientemente intimista e adotado um tom sincero. Soube responder sem hesitação a tudo e teve sangue-frio até para brincar com Bonner quando o relógio a prejudicou.
Se não houver abstenção em desfavor de Dilma em um nível que desequilibre o estimado em termos de intenções de votos, ela deve manter a vantagem que lhe dão as pesquisas. Serra precisaria ter extraído muito mais dessa oportunidade.
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