quinta-feira, 9 de junho de 2016

As condições de Gilmar para o mensalão tucano ser investigado



Relator no Supremo Tribunal Federal (STF) do processo contra caciques do PSDB no esquema do chamado mensalão tucano em Minas Gerais, Gilmar Mendes autorizou a abertura de inquérito contra Aécio Neves (PSDB-SP) e o grupo que teria trabalhado para esconder o esquema do Congresso. Mas com adendos, poréns e até comandando como a equipe de investigadores deveria trabalhar e o que eles seriam obrigados a encontrar para o caso ser considerado crime.
 
O ministro Gilmar Mendes inicia a decisão afirmando que não via "necessidade" para enviar o processo, mais uma vez, ao Ministério Público Federal (MPF), ressaltando o "porém" de que um dos investigados, ao lado de Aécio, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), havia apresentado alegações e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não havia se manifestado sobre a posição de Sampaio. "Muito embora os autos tenham sido enviados à PGR, não houve manifestação acerca das razões", ressaltou Gilmar.
 
Em seguida, destacou que a decisão pela abertura ou não do inquérito é sua, não dependendo de posições da PGR e dos investigados. 
 
Após expor as condições de jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal (STF) que não trazem sustentação à tese de que o procurador, Rodrigo Janot, precisaria novamente se manifestar sobre o caso, Gilmar Mendes apresenta uma segunda possível motivação para o arquivamento do inquérito: de que o caso sobre os dados maquiados do Banco Rural estaria prescrito.
 
O ministro protege-se de uma possível acusação de impunidade aos investigados do PSDB, decidindo pela abertura da investigação, ao mesmo tempo que adianta a blindagem: pelos crimes "em tese" apontados, os oito anos que já se passaram prevêm a "extinção da pretensão punitiva".
 
"O ponto inicial de apuração seria a prestação de informações falsas, pelo Banco Rural, à CPMI dos Correios. Esse fato, se isolado, representaria o crime do art. 10, parágrafo único, da Lei Complementar 105/2001. O decurso de mais de oito anos da data do fato conduziu à extinção da pretensão punitiva", publica Gilmar.
 
Com o adendo de que, somente se provados os outros crimes por Aécio Neves (MG), Carlos Sampaio (SP), o ex-vice governador de Minas Gerais, Clésio Andrade, e o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB): "Mesmo prescrito, a apuração do crime é relevante, porque ele se inseriria em uma série de práticas criminosas, ainda passíveis de persecução penal".
 
Em seguida, o ministro parte para a descrição do caso. Ao contrário do que fez o procurador-geral da República, no pedido de inquérito, ao detalhar em XX páginas o enredo em que o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, teria atuado ao lado de Clésio Andrade, Paes e Carlos Sampaio para esconder o mensalão tucano em Minas Gerais na CPI dos Correios, no Congresso, Gilmar resume em quatro parágrafos o caso, sem detalhes, e com apenas uma rápida referência às argumentações da PGR. 
 
Não citou, por exemplo, a maquiagem supostamente utilizada pelo grupo, restringindo o crime investigado à simples "omissão". A seguir, um trecho do despacho do ministro:
 
A omissão de informações teria levado a relatoria da CPMI ao engano. Em consequência, o relatório final da Comissão teria omitido informações relevantes sobre os possíveis crimes que se buscava ocultar. Essas condutas foram classificadas pelo Ministério Público como potencialmente configuradoras de crimes de gestão fraudulenta de instituição financeira (art. 4º da Lei 7.492/86) e falsidade ideológica praticada por funcionário público (art. 299, parágrafo único, do CP), além de crimes contra a administração pública e lavagem de dinheiro.
 
Com a descrição, mais um porém: Gilmar enfatiza que, para ser considerada a prática de "omissão de informações pelo Banco Rural", são preciso provas. "Ainda que se busque seguir a trilha de ilícitos, a plataforma para tanto seria a demonstração da omissão de dados", completando que o único indício existente é a delação premiada do ex-senador, Delcídio do Amaral, que presidiu a CPMI dos Correios.
 
"No momento, não há corroboração documental da omissão de informações", insistiu Gilmar, completando, posteriormente, que a delação não pode ser, por si só, considerada prova. "Saliento que, a despeito de seu valor probatório limitado (art. 4º, §16, da Lei 12.850/13), 'depoimentos propriamente ditos do colaborador constituem meio de prova' – HC 127.483, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 27.8.2015. Na medida em que mereçam um mínimo de credibilidade, podem servir como indicativo mínimo e suficiente para a instauração de investigação", disse.
 
O cuidado tomado com o deputado Carlos Sampaio pelo ministro é ainda maior. O relator cita que o possível envolvimento do parlamentar tucano está "limitado", uma vez que Delcídio apenas mencionou que Sampaio "tinha ciência da omissão das informações financeiras. Não há narração de qualquer contribuição ativa de Carlos Sampaio para os fatos", disse Gilmar.
 
Em seguida, publicou no despacho a possível descrença nas informações prestadas pelo delator: "Tampouco há uma explicitação da razão que levou Delcídio do Amaral a crer que Carlos Sampaio efetivamente tinha conhecimento dos fatos".
 
Gilmar Mendes não autoriza a abertura de inquérito com a garantira de autonomia dos investigadores - tanto dos procuradores da República, quanto dos delegados da Polícia Federal. Impõe em seu despacho o caminho a ser percorrido pelas diligências:
 
"Será necessário comprovar minimamente que os fatos ocorreram – ao menos que as informações financeiras foram omitidas – e coligir indícios de que os demais investigados contribuíram para a omissão das informações financeiras. Só então será o caso de demonstrar que Carlos Sampaio tinha conhecimento da omissão e que poderia e deveria agir para evitar a produção de resultado criminalmente relevante", disse.
 
Contraditoriamente, não abriu a possibilidade de que os investigadores sequer percorressem esse caminho apontado pelo ministro, excluindo Carlos Sampaio do rol de investigados no caso da maquiagem dos dados do Banco Rural, envolvendo o chamado mensalão tucano, do PSDB.
 
E, além disso, pressiona o próprio delator: pede que Janot "esclareça se pretende" incluir Delcídio do Amaral no rol dos investigados, considerando a sua "admitida participação". Para este ponto, contraditoriamente, o ministro considera credibilidade ao conteúdo da delação.

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