Jornal do Brasil levanta práticas criminosas registradas no país desde a chegada dos europeus.
Via Jornal do Brasil
O Brasil sofre com a corrupção desde antes de ganhar este nome. Junto com as caravelas, chegou e se desenvolveu também a prática que ajuda a manter o status da elite e as amarras do povo, sempre à mercê dos mais diversos esquemas, em uma herança corruptora passada de geração a geração. Talvez o país nunca tenha a real dimensão dos crimes praticados, que garantiriam manchetes muito mais arrepiantes do que as que costumam escandalizar a sociedade brasileira. E as relações promíscuas não se limitam ao poder público, na esfera privada também é comum. O JB levanta alguns casos para ilustrar a quincentenária pilhagem do bem público.
Apesar de não ser de exclusividade do Brasil, a corrupção teve um desenrolar específico nestas terras. Como a Corte precisa convencer pessoas a trabalhar em um desconhecido Brasil, oferecia privilégios em funções desempenhadas sem vigilância e definição de papeis, para garantir a ocupação das terras e criação de instituições. Práticas de corrupção passaram a permear diversos níveis do funcionalismo público, passando do governador, tabeliães e oficiais de justiça para chegar até os cargos mais baixos da Câmara – funcionários que tinham a prática de favorecer ou prejudicar comerciantes, sob pagamento de propina, por exemplo, indicam documentos históricos. Vide também o tráfico de escravos africanos, que era visto sem maiores problemas apesar de denúncias de autoridades internacionais.
A corrupção se tornava frequente até nos locais em que a Coroa prestava maior atenção, como no litoral do país, mas em locais menos notados, como Minas Gerais e Goiás, devido à distância e dificuldades de transporte, as coisas aconteciam de forma ainda pior. A Coroa, inclusive, estimulava que os fidalgos fizessem o que quisessem para mandar e garantir a posse de territórios.
A corrupção eleitoral e a relacionada a obras públicas surgiram logo com a proclamação da Independência, em 1822. Visconde de Mauá, por exemplo, que fundou a indústria naval brasileira em 1846 ao construir estaleiros da Companhia Ponta da Areia, em Niterói, recebeu licença para a exploração de cabo submarino e a transferiu a uma companhia inglesa da qual se tornou diretor. Projetos de grande porte para o país recém-liberto do império se tornavam fonte de dinheiro fácil para grupos oligárquicos.
Eleições de 1898
Mais à frente, com a proclamação da República em 1889, veio a Política dos Governadores, a influência dos coronéis e o voto de cabresto. Acabava o “voto censitário”, que definia renda mínima para qualificar o eleitor, mas vinham outras formas de controlar quem poderia chegar ao poder. Entre 1894 e 1930, o país teve o governo de presidentes civis ligados ao setor agrário, que controlavam as eleições mantendo-se no poder de maneira alternada.
O professor e autor de livros didáticos de história Roberto Catelli Jr., no artigo A República do Voto, relata que, como o voto não era obrigatório nem secreto, o coronel oferecia dinheiro, roupas e chapéus para que os eleitores comparecessem às urnas, e os capangas verificavam o preenchimento da cédula. Ao apurar os votos, eleitores eram inventados e atas com resultados eram adulteradas. Ainda havia a Comissão de Verificação de Poderes, para criar argumentos para não empossar candidatos da oposição (degola) e diplomar representantes da oligarquia. Muitos outros casos foram surgindo ao longo do século seguinte, como o caso de corrupção eleitoral que levou Getúlio Vargas ao seu primeiro ciclo de poder e os casos de corrupção e desvio de verbas na construção de Brasília no governo JK. Da ditadura, também não faltam histórias.
Práticas de corrupção e casos na história recente
Corruptione é a palavra em latim que dá origem ao termo em português, e dá ideia de decomposição, desmoralização, putrefação, suborno. Para o Escritório das Nações Unidas para Combate ao Crime Organizado e às Drogas, trata-se de um “complexo fenômeno social, político e econômico que afeta todos os países do mundo”. Em um ranking deste ano de percepção da corrupção, da Transparência Internacional, o Brasil aparece em 69º entre 175 países. Separar apenas casos na Assembleia legislativa ou nas forças policiais do Rio de Janeiro, por exemplo, já garantia uma extensão considerável a este texto. Jornal do Brasildestaca os principais, ou pelo menos os que ganharam maior destaque na opinião pública.
A corrupção envolve práticas como o tráfico de influência, corrupção eleitoral, inserção de dados falsos em sistemas de informação, corrupção ativa ou passiva, emprego irregular de verba ou renda pública, crimes de responsabilidade de prefeitos e vereadores, facilitação de contrabando, entre outras ações proibidas por lei.
Em outros termos, o cidadão paga mas não leva
“A sociedade brasileira, apesar de arcar com uma alta carga tributária, recebe em troca serviços públicos precários e ineficientes. Obras inacabadas, estradas esburacadas e hospitais em situação precária poderiam ter outra cara se o dinheiro arrecadado com os impostos fosse aplicado corretamente. Em outros termos, o cidadão paga mas não leva”, diz o Ministério Público Federal (MPF) em um portal criado para o enfrentamento da prática.
Em 1987, o jornalista Jânio de Freitas denunciou na Folha de S.Paulo o caso daFerrovia Norte-Sul, esquema de corrupção montado para a construção da ferrovia que ligaria o Maranhão a Anápolis, em um investimento de US$2,4 bilhões e 1.600 quilômetros de obras. Na licitação, venceram as empresas integrantes do esquema, que haviam combinado os preços entre si (…). Na mesma época, surgiram o Caso Banespa e a CPI da Corrupção.
O Caso Banespa envolvia dois escândalos no governo de Orestes Quércia em São Paulo, um deles descoberto pouco depois de sua posse, em 1987. Otávio Ceccato, secretário da Indústria e Comércio, envolveu-se em uma fraude que provocou um rombo de 1 bilhão de cruzados na corretora do Banespa. O outro explodiu quando Quércia estava prestes a encerrar seu mandato, também envolvendo o banco, por meio dos empréstimos especiais chamados “antecipação de receita orçamentária”, ou ARO. Em dois deles, o governo pegou 674 milhões de dólares.
Já a CPI da Corrupção envolveu o genro do então presidente José Sarney, Jorge Murad, acusado de intermediar o repasse de verbas federais para o Maranhão. O esquema envolvia membros do alto escalão do governo. O titular do Planejamento, Aníbal Teixeira de Souza, quando pediu demissão, transferiu as acusações para o presidente Sarney e o secretário geral do Ministério, Michal Gartenkraut.
No ano passado, os imóveis da maior fraudadora da Previdência Social que se tem notícia foram a leilão, no Rio de Janeiro – dois apartamentos no Rio de Janeiro, um no Leblon, de frente para o mar, e outro na Barra da Tijuca. O caso, que ficou conhecido também pelo nome dela, Jorgina de Freitas, veio à tona nos anos 1990: a Máfia do INSS. Ela foi apontada como a responsável pelo esquema de corrupção que envolvia juízes, advogados e procuradores, gerentes de bancos e doleiros para realizar fraudes. Entre 1988 e 1990, o esquema sugou a Previdência Social no Rio de Janeiro.
De acordo com as investigações, Jorgina, Ilson Escóssia da Veiga, Armando Avelino Bezerra e Roberto Cardoso Pontes de Miranda tinham contas bilionárias nos bancos Itaú, Banerj, Nacional, Safra, Dimensão e Bamerindus. Calculava-se que mais de US$50 milhões foram desviados e levados a Miami e paraísos fiscais, com apoio logístico de gerentes de banco, que usavam a legislação do próprio Banco Central, que facilitava a evasão de divisas.
Esquema de lavagem de dinheiro da Máfia do INSS tinha aspecto legal
Conforme apontava matéria do Jornal do Brasil, assinada por Carlos Nobre, o que mais espantava era o amparo legal do esquema criminoso. “O que mais surpreende é que o esquema de lavagem de dinheiro da Máfia do INSS tinha aspecto legal. Era feito através da compra de cheques administrativos de empresas que tinham sedes no exterior. O dinheiro era então depositado nas contas destas empresas nos Estados Unidos ou paraísos fiscais”, apontava a reportagem, que informa ainda que Escóssia teria sido o autor do maior golpe individual contra a Previdência, de US$88 milhões.
“Meu cliente nunca obteve qualquer espécie de indenização sem que fossem obedecidos os trâmites legais”, chegou a dizer o advogado de Ilson Escóssia, em agosto de 1991.
De acordo com a justiça, Jorgina desviou cerca de R$1,2 bilhão do INSS. Logo após sua condenação, em 1992, fugiu do Brasil. Passou por países como Estados Unidos, Nicarágua e Costa Rica, onde foi presa, em 1997. Ela ainda tentou, sem sucesso, fazer um acordo: aceitaria a rendição se pudesse ficar com um milhão de dólares. Quando foi solta, em uma tarde de sábado de 2010, a justiça informou que ela teria que ressarcir R$200 milhões aos cofres públicos e que 57 imóveis dela iriam a leilão.
Em 1992, foi a vez do Caso Collor, esquema operado no governo com a anuência do então presidente Fernando Collor de Mello, pelo economista Paulo César Farias, o PC, ex-tesoureiro da campanha de Collor à Presidência. PC recebia propina de empresários, ficava com 30% e repassava o restante ao presidente, com a ajuda de firmas fantasmas para emissão de notas fiscais frias. Foram as denúncias de Pedro Collor, irmão do presidente, que fizeram o caso explodir.
No ano seguinte, veio o Caso Pau-Brasil, quando a Receita Federal descobriu que a empresa Pau-Brasil havia recebido doações clandestinas para as campanhas eleitorais de Paulo Maluf nos anos 1990 para o governo do São Paulo. Surgiu ainda o caso dos Anões do Orçamento, que revelou que um grupo de deputados federais tinha criado um esquema de aprovação de emendas na Comissão de Orçamento do Congresso para desviar dinheiro público. Os envolvidos recebiam comissões para favorecer empreiteiras e desviavam recursos para entidades de assistência social fantasmas. Seis parlamentares foram cassados e quatro renunciaram.
Mesmo com a repercussão negativa das declarações de Recupero, Fernando Henrique Cardoso conseguiu se eleger, e logo no primeiro ano de governo viu surgir o caso da Pasta Rosa, descoberto durante a intervenção do Banco Central no Banco Econômico. Um dossiê com documentos que mostravam uma contribuição de US$2,4 milhões de dólares do Banco Econômico, de Ângelo Calmon de Sá, para a campanha de 25 candidatos nas eleições de 1990, quando a lei eleitoral brasileira proibia empresas financiar campanhas. Outros 24 candidatos teriam recebido doações da Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Como nenhuma das contribuições foi registrada como verba eleitoral, a prática de caixa 2 ficou configurada. Integravam a lista nomes como o do ex-governador da Bahia Antônio Carlos Magalhães, de José Sarney, Renan Calheiros, Ricardo Fiúza e Benito Gama.
Dois anos depois, em 1997, foram quatro escândalos – Precatórios, Frangogate, Escândalo das Privatizações e da compra de votos para a reeleição. Os precatórios – dívidas do poder público sem possibilidade de recurso ou contestação – dos estados e municípios foram processo, contudo, acabou sendo marcado por desvios, com métodos como a alterações do total de débitos. A verba era desviada, entre outras coisas, para financiamento de campanhas e pagamentos a empreiteiras. A CPI apurou irregularidades nos estados de Alagoas, Pernambuco e Santa Catarina, além da cidade de São Paulo, na gestão do então prefeito Paulo Maluf.
O Frangogate envolvia a merenda escolar de alunos da rede pública do município de São Paulo, quando Paulo Maluf era prefeito. Foram descobertas irregularidades na compra de 823 toneladas de frango congelado, por R$1,4 milhão, em uma empresa do cunhado de Maluf que havia perdido a licitação. As aves também tinham vindo de uma granja da família Maluf, a Obelisco. A Frigobrás, do grupo Sadia, venceu a disputa, as depois pediu autorização para subir o preço, devido ao encarecimento da ração usada para alimentar as aves. Com o pedido negado e o contrato rompido, a prefeitura determinou que o fornecimento passasse a ser feito pela A D’Oro, segunda colocada na licitação.
O Escândalo das Privatizações envolveu os dois principais processos de privatização do governo Fernando Henrique Cardoso, a venda da Companhia Vale do Rio Doce e do sistema Telebrás. A venda da Vale, em 1997, rendeu R$3,3 bilhões ao governo. No ano seguinte, o da Telebrás gerou R$22 bilhões. Em 1998, foi divulgado o áudio de grampos telefônicos em que o ex-ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, e o então presidente do BNDES, André Lara Resende, discutiam formas de interferir no leilão, para beneficiar o Banco Opportunity, de Daniel Dantas, na aquisição do melhor quinhão do leilão de privatização da Telebrás. Em uma das gravações, Mendonça de Barros, Lara Resende e Pérsio Arida – sócio de Dantas no Opportunity – negociam com a Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, para que formar consórcio e arrematar a Tele Norte Leste. O consórcio foi formado, mas a Tele Norte Leste acabou sendo arrematada por um grupo rival, liderado por Carlos Jereissati.
“Temos que fazer os italianos na marra, que estão com o Opportunity. Combina uma reunião para fechar o esquema. Vamos fechar daquele jeito que só nós sabemos fazer”, teria dito Luiz Carlos Mendonça de Barros, no telefonema com o presidente do BNDES, André Lara Resende, sobre o consórcio do Banco Opportunity com a Telecom Itália.
No ano seguinte, Ricardo Sérgio de Oliveira, então maestro de coxia dos negócios da Previ, foi acusado de receber propina para montar o consórcio que venceu o leilão. Mais tarde, em 2001, o ex-senador Antônio Carlos Magalhães denunciou que o consórcio Telemar teria acertado um pagamento de R$90 milhões a Ricardo Sérgio para levar o negócio.
Capa do JB após aprovação na Câmara
A compra de votos para eleição foi outro escândalo do governo Fernando Henrique Cardoso. Uma emenda constitucional que autorizava presidente, governadores e prefeitos a disputarem a reeleição foi aprovada pela Câmara em primeiro turno, no início de 1997. Em maio, quando o texto aguardava aprovação do Senado, uma conversa entre os deputados Ronivon Santiago e João Maia veio a público, em que eles diziam ter recebido R$200 mil para votar a favor da emenda, e que outros também teriam vendido voto. Falavam ainda que o deputado Pauderney Avelino e o então presidente da Câmara, Luís Eduardo Magalhães, eram os intermediários das negociações, e que tudo era tratado diretamente com o ministro das Comunicações, Sérgio Motta, amigo de FHC e principal articulador político do então presidente.
Uma comissão de sindicância na Câmara foi criada para investigar o caso, mas a cúpula do governo de FHC começou a conceder cargos públicos e verbas para evitar a instauração de uma CPI. A comissão, então, apresentou um relatório que retirava a necessidade de CPI, recomendando que a Procuradoria-Geral da República investigasse o envolvimento do ministro Sérgio Motta, que as Assembleias do Acre e do Amazonas fizessem o mesmo com os governadores e que a Câmara tratasse dos deputados. Todos foram inocentados por suposta falta de provas, e a emenda da reeleição foi aprovada.
Ficou famosa a declaração do então deputado federal (PFL-AC), Ronivon Santiago, sobre os R$200 mil: “Uma mixaria dessas não compra ninguém”. Também a comemoração dos deputados governistas, quando o projeto de reeleição foi aprovado na Câmara: “Uh, tererê!”
Aprovação da reeleição na Câmara por placar surpreendente
No ano seguinte, em 1998, foram nada menos que mais dois grandes escândalos. O Dossiê Cayman, um conjunto de documentos divulgado naquele ano, ligava o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o ex-governador paulista Mário Covas e os ex-ministros José Serra e Sérgio Motta a uma empresa chamada CH, J & T Inc., que teria US$368 milhões em uma conta no Caribe. A denúncia, contudo, de autoria do ex-presidente Fernando Collor de Mello e o seu irmão Leopoldo Collor de Mello, seria baseado em papéis falsos.
A Polícia Federal abriu um inquérito para investigar o caso, com apoio do FBI, incluindo nomes de adversários do PSDB que teriam recebido cópias do documento – José Dirceu, Paulo Maluf, Ciro Gomes, Marta Suplicy, Leonel Brizola, Benedita da Silva, Marcio Thomaz Bastos e Luiz Inácio Lula da Silva. “São farsantes, falsários e pessoas que o Brasil custou a expulsar da vida pública”, tratou de declarar FHC, sobre os autores do dossiê. “Pode ser ‘c’ de cebola”, disse Mário Covas, então governador de São Paulo, negando que o ‘c’ da empresa CH, J & T se referisse à inicial do seu sobrenome.
Outro caso descoberto naquele ano foi a Máfia dos Fiscais, que envolvia funcionários da Prefeitura de São Paulo, que estava sob o comando de Celso Pitta, e era conduzida por vereadores da capital paulista e teria movimentado pelo menos R$436 milhões. Depois que um fiscal que tentou extorquir a dona de uma academia foi preso, uma série de denúncias foram revelando o esquema montado, que tinha vereadores no comando de fiscais para tirar dinheiro de pequenos comerciantes, vendedores ambulantes e empresas de coleta de lixo.
O Caso Marka/FonteCindam revelou o esquema montado para evitar a quebra de dois bancos, que prejudicaria o sistema financeiro do país. Com a desvalorização cambial de janeiro de 1999, associada a problemas no combate à inflação, o Banco Central vendeu dólares a preços mais baratos aos bancos Marka e FonteCindam. O banco Marka, de Salvatore Cacciola, tinha 20 vezes seu patrimônio líquido aplicado em contratos de venda no mercado futuro de dólar. A CPI que apurou o caso indicou um prejuízo de 1,5 bilhão de reais aos cofres públicos com esse esquema. Dois meses, Francisco Lopes, então presidente do Banco Central, pediu demissão.
“Chico é um picareta, um safado, um ladrão. Quem montou o esquema foi o Luiz Cesar (Fernandes), que, depois de ganhar muito dinheiro, chantageou seus sócios para vender sua parte no banco. Fui usado em toda essa história. Só não dei um tiro na cabeça não sei por quê. Tenho catorze fitas de reportagem de tevês, um disquete e 1 497 folhas de matérias publicadas. Estou juntando tudo para um dia mostrar a verdade”, disse De Salvatore Cacciola, sobre o ex-presidente do BC, Chico Lopes, em entrevista à Veja.
Pouco tempo depois, testemunhas disseram que Cacciola comprava informações privilegiadas do BC, e ele próprio falou na CPI dos Bancos que pagava R$125 mil por mês a um alto funcionário do BC para conseguir informações. Uma delas lhe garantiu que o mês em que ocorreria a mudança do câmbio, então ele quebrou seu banco e o fundo de investimentos do qual era sócio, mas recebeu ajuda do BC para salvar. O FonteCindam, de Antônio Gonçalves, passou pela mesma situação.
No mesmo ano, veio a público o esquema montado para faturar em cima da construção do prédio do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, que tinha começado em 1992 e ainda não tinha sido concluída. Dos R$230 milhões que saíram dos cofres públicos, apenas R$70 milhões foram efetivamente para a obra, ou seja, 30% do montante. O desvio teve autoria do juiz Nicolau dos Santos Neto, o Lalau, em parceria com o então senador Luiz Estevão, do PMDB, e veio à tona a partir da CPI instaurada no Senado para investigar o Poder Judiciário, em março de 1999, a pedido do então senador Antônio Carlos Magalhães, morto em 2007, a partir de denúncias de corrupção nos tribunais brasileiros.
Mais grave e mais revelador ainda era que a obra contava com o aval do Tribunal de Contas da União (TCU), do Legislativo, do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que liberou R$52 milhões para a obra, mas disse que assinou sem ler. Em agosto de 2012, em acordo inédito feito com a Advocacia-Geral da União, Luiz Estevão concordou em devolver aos cofres públicos 468 milhões de reais. No mês seguinte, a Justiça da Suíça decretou a devolução de parte da fortuna do ex-juiz Lalau, resguardada no paraíso fiscal há duas décadas.
“O tribunal de São Paulo não fiscalizou. O governo federal não agiu com cautela ao soltar os recursos. E o Congresso ajudou a facilitar”, disse na João Coser, então deputado federal pelo PT, relator da CPI do Judiciário, em 2000.
Luiz Estevão
O relatório final da CPI do Judiciário apontou Estevão como suspeito de enriquecimento ilícito, atos lesivos ao patrimônio público e falsidade ideológica. Conforme a apuração, ele ganhou dinheiro com os desvios do TRT por meio da conexão financeira entre a construtora Incal, depois rebatizada Ikal, e o Grupo OK. A Polícia Federal teve acesso a um contrato pelo qual o senador se tornava dono de 90% da Ikal, embora ele alegasse que o papel não tinha validade legal.
Luiz Estevão também foi denunciado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) por sonegação fiscal da Fazenda Santa Prisca entre abril de 1997 e fevereiro de 2000. Segundo a denúncia, Estevão suprimiu tributo de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), omitindo informações às autoridades fazendárias e fraudando a fiscalização tributária.
Em 2006, foi condenado pelo Tribunal Regional Federal pelos crimes de peculato, corrupção ativa, estelionato, uso de documento falso e formação de quadrilha, com pena de 36 anos e meio de reclusão, além de multa de R$3 milhões. Em junho de 2012, o Superior Tribunal de Justiça confirmou a condenação do TRF, e Estevão recorreu outra vez. Em agosto do mesmo ano, fez um com a Advocacia-Geral da União. Aceitou devolver R$468 milhões em troca do desbloqueio do seu patrimônio de R$20 bilhões, com mais de 1.255 imóveis.
Em fevereiro de 2013, o ex-senador e sua mulher, Cleicy de Oliveira, foram condenados a quatro anos e oito meses de prisão por sonegar R$57,7 milhões em impostos pela OK Pneus.
Estevão também foi denunciado porque teria acessado, em 6 de fevereiro de 1997, o Sistema Integrado de Administração Financeira para Estados e Municípios (Siafem/DF) para verificar saldo na Conta Única no Distrito Federal, e repassar as informações à Saenco, para pedir ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) o sequestro dos valores. A solicitação foi feita em papel timbrado da Câmara Legislativa do DF.
Nem a votação no Senado que culminou na cassação de Luiz Estevão escapou de denúncias. O painel de votação foi violado em 28 de junho de 2000 – dia em que ele perdeu o mandato. Um laudo técnico preparado por quatro peritos da Unicamp confirmou que, um dia antes da votação, o então senador José Roberto Arruda pediu que Regina Célia Peres Borges, diretora do Prodasen, a Secretaria Especial de Informática da Casa, conseguisse a lista dos votos para ACM, presidente do Senado na época.
Em 2000, foi a vez de escândalos na Sudam. Uma auditoria do governo encontrou fraudes em projetos apresentados à Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), em um rombo de R$100 milhões. A Polícia Federal, por sua vez, que já havia iniciado investigações dois anos antes, descobriu um grande esquema de corrupção, que já havia custado pelo menos R$360 milhões de reais. Conversas revelaram a proximidade do esquema com o então senador Jader Barbalho, que havia tido uma sociedade com um dos mais notórios fraudadores da Sudam, Osmar Borges. A Sudam foi considerada um feudo político do senador, que indicou dois superintendentes da autarquia.
Em julho de 2013, a Justiça Federal no Tocantins condenou o senador Jader Barbalho a devolver R$2,2 milhões à União. De acordo com decisão do juiz de primeira instância Waldemar Claudio de Carvalho, da 2ª Vara da Seção Judiciária do Tocantins, Barbalho aumentou sua fortuna ao receber 20% de propina de um contrato de R$18,1 milhões firmado entre a Sudam e a empresa Imperador Agroindustrial de Cereais S/A, e que de fato ele pediu e recebeu a propina.
Em 2002, um dos casos de maior repercussão foi o Lunus, nome da empresa de Jorge Murad em parceria com sua mulher, a então senadora Roseana Sarney. Uma batida da Polícia Federal autorizada pela Justiça encontrou, em março de 2002, R$1,34 milhão no cofre da empresa e as investigações uma sociedade oculta com uma empresa que teria desviado até R$15 milhões num projeto agrícola financiado pela Sudam. O escândalo acabou custando a Roseana a candidatura à Presidência, que disputaria naquele ano.
Denúncias surgidas durante as investigações sobre o escândalo dos precatórios, em 2003, acabaram dando início a outra CPI, para apurar evasão de divisas por meio de títulos podres dos estados de Santa Catarina e Alagoas e de operações do Banestado (Banco do Estado do Paraná). O desvio se baseava nas contas CC-5, instrumento legal que visava tornar mais transparentes as transações de remessa de dinheiro entre o Brasil e os demais países da Tríplice Fronteira (Argentina e Paraguai). O Banestado era um dos bancos autorizados, pelo qual teriam sido remetidos ilegalmente cerca de US$30 bilhões. Os títulos eram postos à venda pela corretora do Banestado e, no mesmo dia, adquiridos a preços mais baixos por outras corretoras do esquema, a Divalpar DTVM e a Essex DTVM. Estados e municípios emissores dos títulos registravam prejuízos.
Operação Anaconda
A Operação Anaconda, por sua vez, teve início em Alagoas, com a denúncia de que um delegado aposentado da PF participava de um esquema para aliviar acusados em inquéritos policiais. Era uma máfia de venda de sentenças judiciais integrada por juízes e policiais federais, por meio do pagamento de altas somas em dinheiro. Os juízes também liberavam cargas ilegais e vendiam sentenças de liberdade condicional.
Em 2004, ganhou espaço o caso das obras superfaturadas no governo de São Paulo, na gestão de Paulo Maluf, entre 1993 e 1996, em relação a contratos firmados para construção de grandes obras, como o Túnel Ayrton Senna e a Avenida Água Espraiada. As empresas contratadas entregavam o dinheiro que recebiam a mais da prefeitura para doleiros indicados por Maluf e estes, por sua vez, enviavam o dinheiro para os Estados Unidos e, posteriormente, para grandes bancos europeus. Da Europa, os recursos eram transferidos para fundos de investimento controlado pela família Maluf no paraíso fiscal da Ilha de Jersey. Os fundos compraram US$93 milhões em debêntures da Eucatex, empresa da família Maluf. Assim, o dinheiro voltou direto para o bolso do ex-prefeito.
Em julho de 2012, o Ministério Público Federal fez outra denúncia relacionada ao caso, contra oito executivos ligados ou que já pertenceram aos quadros das empreiteiras Mendes Júnior e OAS, por peculato e lavagem de dinheiro. Também foram acusados dois nomes da cúpula da antiga Emurb (Empresa Municipal de Urbanização). Em janeiro de 2013, a Corte de Jersey anunciou que as empresas offshores ligadas ao ex-prefeito teriam de devolver quase R$58 milhões aos cofres públicos do município de São Paulo, além de pagar custos com advogados. Em abril ao mesmo ano, a Justiça de São Paulo determinou o bloqueio de cerca de R$520 milhões em bens da Eucatex S.A. Indústria e Comércio, controlada pela família do ex-prefeito. Só que em 2012 a família Maluf registrou uma nova empresa, a ECTX, e anunciou que iria transferir para ela parte dos bens da Eucatex.
Em 2005, veio o caso da Corrupção nos Correios, que depois desaguou no“mensalão”. Maurício Marinho, então diretor dos Correios, foi flagrado embolsando R$3 mil de propina para direcionar o resultado de uma licitação na estatal, e contou que o deputado Roberto Jefferson havia recebido o controle sobre vários cargos na administração federal, em estatais e em autarquias em troca do apoio do PTB ao governo. A CPI acabou revelando indícios de corrupção em outras estatais, como o Instituto de Resseguros do Brasil e a Eletronorte, e Jefferson decidiu falar sobre o esquema batizado de “mensalão”.
Via: http://limpinhoecheiroso.com/2015/01/03/corrupcao-no-brasil-das-colonias-a-todas-as-esferas-da-politica-e-do-mercado
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