“Sob o ataque de Sistema Globo e Abril, o Estado capitula, apostando numa segunda onda de privatização. Assim como fez com as tarifas públicas a partir dos anos 70, reduzem-se receitas públicas preparando o segundo passo da redução dos gastos.
J. Carlos de Assis, Carta Maior
Diz o provérbio romano que Júpiter enlouquece aqueles a quem quer perder. O Estado brasileiro está se deixando perder desde a segunda metade dos anos 70 quando um incipiente programa de privatização tomou a forma de dilapidação das empresas estatais mediante o sistemático rebaixamento de suas tarifas e preços sob o pretexto de combater a inflação. Entre 1975 e 1987, as tarifas elétricas tiveram queda real de 33%, no setor siderúrgico de 40%, na telefonia de 54%, nos Correios de 37%, no ferroviário de 13%. Não haveria receita que poderia suportar isso.
Acontece que uma segunda frente de ataque ao setor público, agora não apenas o setor público indireto mas também o direto, vem escalando no Brasil na forma de uma tentativa de desmonte da arrecadação tributária. São as campanhas contra os impostos lideradas pela Fiesp e federações do comércio sob o argumento de que o Brasil teria uma das cargas tributárias mais elevadas do mundo. Isso é falso, como é falsa a ideia de que temos um elevado custo trabalhista – alegação de que se deveria envergonhar à vista dos salários médios brasileiros.
É falso também dizer que não temos uma estrutura de serviços públicos compatível com a carga tributária. Esse mantra tornou-se comum entre os próprios usuários ou beneficiários dos serviços públicos, como os mais de 28 milhões de aposentados e pensionistas, os mais de 300 milhões de usuários do SUS, os milhões de alunos e professores das redes públicas de educação, assim como de dezenas de outros serviços de massa atendidos pelo Estado. É claro que a qualidade ainda deixa a desejar. Contudo, ela não é tão ruim como mostra a TV em casos isolados.
Entretanto, a mídia enlouqueceu o Estado. Sob o ataque simultâneo do Sistema Globo e da Abril, que não se conformam por ter alguns interesses marginais atingidos na relação com o governo, o Estado nada explica e nada informa à população, talvez confiando na boa fé da grande mídia. Mais do que isso: ele capitula aos ataques, preparando, ele próprio, uma segunda onda de privatização. De fato, assim como fez com as tarifas públicas a partir dos anos 70, o Estado está reduzindo receitas públicas preparando o segundo passo inevitável da redução dos gastos.
Mas há algo ainda pior: consciente ou inconscientemente, os órgãos de controle (TCU, Ministério Público, Ibama, arqueólogos, índios, quilombolas) estão destruindo a capacidade do Estado de realizar grandes obras públicas. Não que não deva haver controles; contudo, os controles devem seguir um protocolo mínimo de ação coordenada para não impedir as obras. É a existência desse emaranhado de controles que tem levado o governo optar pelas PPPs, que tem meios mais flexíveis de controlá-los do que os órgãos públicos.
Finalmente, convém examinar o papel da imprensa: Veja e Sistema Globo desfecharam uma violenta campanha contra a cúpula do Ministério dos Transportes há dois anos. O ministério, tendo Luís Antônio Pagot no Dnit, tinha passado de um orçamento ridículo em 2008 para R$ 18 bilhões realizados em 2009/10. Vieram então as denúncias: o realizado em 2011 passou a R$ 6 bilhões e, em 2012, a R$ 7 bilhões, tendo sido orçados, nos dois anos, R$ 16 bilhões. Em síntese, as denúncias derrubaram os orçamentos públicos numa área vital. Detalhe: até o momento as investigações não constaram qualquer irregularidade do Dnit na era Pagot.”
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