Pelé e Xuxa, no passado |
Não é um assunto fácil de tratar.
Mas, ao mesmo tempo, não posso deixar de enfrentá-lo.
Começo, então, com uma digressão.
Uma das coisas notáveis que o ativista negro Malcom X fez pelo seu povo foi, em suas pregações, elevar-lhe a auto-estima.
Malcom X, com seu poder retórico extraordinário, dizia aos que o ouviam que deviam se orgulhar de sua aparência.
Os lábios grossos de vocês são lindos, bem como o cabelo crespo, bem como as narinas dilatadas – bem como, sobretudo, a cor de sua pele.
Os negros americanos tinham sido habituados a se envergonhar de sua aparência, e a buscar tudo que fosse possível para aproximá-la da dos brancos.
O próprio Malcom X, na juventude, alisou os cabelos.
Não foi por vaidade que um dos seguidores de Malcom X, Muhammad Ali, dizia que era o homem mais bonito do mundo. Ali estava na verdade dizendo aos negros que eles eram bonitos.
Ali casou algumas vezes, sempre com negras. Era mais uma maneira de sublinhar a beleza dos negros. Se Ali, no apogeu, tivesse casado com uma loira a mensagem não poderia ser pior.
Pelé, no Brasil, teve uma atitude bem diferente – e não apenas ele. Era como se na ascensão dos negros no Brasil estivesse incluída a mulher branca.
Falta de consciência? Alienação? Deslumbramento? Compensação? Alpinismo social? A resposta a esse fenômeno é, provavelmente, uma mistura de todos estes fatores.
Pelé casou com uma branca, Rose, há meio século. Depois, passou para uma Xuxa adolescente. É uma bênção para as negras brasileiras que seu orgulho nunca tenha estado na dependência de estímulos de celebridades como Pelé.
Quanto mudou o cenário nestes cinquenta anos fica claro quando se olha a fotografia da namorada de Joaquim Barbosa.
Não mudou nada.
Quando falaram que JB fora fotografado dias atrás em Trancoso numa pizzaria com uma namorada, imediatamente pensei: branca e com idade para ser sua filha.
Ao ver a foto, ali estava ela, exatamente como eu antecipara para mim mesmo.
Não sou tão inteligente assim. Mas observo as coisas.
Seria esperar demais que JB, por tudo que já mostrou, agisse diferentemente. Que estivesse mais para Ali do que para Pelé.
Os traços de personalidade já estavam claros. Numa entrevista à Veja, ele se gabou dos ternos de marca estrangeira que estão em seu guarda-roupa. Não é uma coisa pequena senão por ser grande na definição de caráter.
A partir desse tipo de coisa, você pode montar os dados básicos do perfil da pessoa. Ou alguém imagina, para ficar num personagem dos nossos dias, um Pepe Mujica falando de grifes a repórteres?
De Pelé a JB, o Brasil sob certos aspectos marchou para o mesmo, mesmíssimo lugar.
Racismo não faltou, neste tempo todo. Faltou foi gente do calibre de Malcom X e de Muhammad Ali.
Paulo NogueiraNo Diário do Centro do Mundo
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