quarta-feira, 6 de abril de 2011

Vê uma Raikkonen e... como não tem cachaça?



Era uma padaria dessas metidas a besta. Tomando um café para encarar uma sessão de cinema – que se revelaria chata à beça e exigente daquela ingestão de cafeína para manter-me acordado – desfrutei da conversa alheia.

Chegam à mesa ao lado três homens, um mais moço, na faixa dos 30, outro na casa dos 50, e o terceiro, saindo dos 60. Preferem a mesa do lado de fora, "que é mais fresco", inclusive por uma garoa intermitente.

Eles se provocam até que algum deles atira a pergunta para o garçom:.......


– Você não é corintiano, é?

– É claro – devolveu, com um sorriso que fez todo mundo entender que, sim, era um sofredor-graças-a-Deus.

– Aqui, aqui – repetia o sessentão, comemorando qual um gol a "conquista" de um aliado em terras nada lusitanas daquela padaria metida a chique.

Passado o êxtase e acomodados, começa a conferência?

– Vai uma breja, seu Durval? – sugeriu o mais novo ao mais velho, com a deferência de quem fala ao sogro.

– Mas... você não ia tomar o seu uisquinho? – convidou-se.

– Não, eu não queria ficar muito bêbado. Com uísque eu vou ficar bêbado. Cerveja? – insistiu.

– Tá bom, que cerveja tem?.

O mais novo repete a pergunta ao garçom. Tinha só longneck da Bohemia, da Heineken, da Cerpa e da Skol. Os olhos voltam-se ao de maior experiência e de maior quilometragem rodada em mesas de bar do Brasil.

– (pausa reflexiva) Vai de Räikkönen (sic) – respondeu, agora sem olhar ao outrora aliado corintiano.

– Três Räikkönen (sic), então – concordou, de pronto, o rapaz, dirigindo-se ao garçom.

Arte: Futepoca
Este rótulo foi a piada que imaginei
na hora em que ouvi a pérola.


Sem hesitar, foi-se o trabalhador buscar as garrafas verdes da lager holandesa que há pouco tempo comprou a Kaiser e a Bavária no Brasil. A piada não é nova, mas a confusão involuntária, pelo menos para mim, sim.

Um minuto mais e o mais novo foi para dentro da padaria buscar alguma opção de pão sólido. O senhor, liberado de olhares repressores, chamou o garçom para uma extravagência. 

– Vem cá, que cachaça você tem?

– Não temos cachaça, não, senhor.

– Nenhuma?

– Bom, vende a garrafa, mas seria pro senhor levar pra casa. Pra servir aqui, não tem.

– Nem uma São Francisco? – insistiu.

– Não tem...

A reiterada negativa não bastou.

– Mas eu sou cachaceiro, viu? Como é que não tem cachaça? Vem cá, ô corintiano. Como não tem cachaça? Tem que ter, senão vão achar que eu não sou cachaceiro! E ele também – completou, apontando para o terceiro e calado elemento da mesa.

Nem mesmo um apelo dessa monta demoveu o encarregado das mesas de fora. Para sorte dele, a garoa apertou e o mais novo veio levar a tropa para uma mesa do lado de dentro, já com alguma porção encaminhada – não de pão, mas de alguma fritura não identificada.

O cinquentão foi o último a sair, quando nem garçom nem os parceiros estavam por perto. Calado até ali, exclamou para si mesmo olhando para o outro lado da rua:

– Eu falei pra gente ir pro bar...

futepoca

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