domingo, 26 de agosto de 2018

Neoliberais progressistas. Eles existem


Pawel Kuczynski 
Falar em “neoliberalismo progressista” chega a doer nos ouvidos. Como poderiam ser progressistas políticas que retiram direitos e conquistas e entregam às leis de mercado os destinos de povos inteiros?

Mas não é nada disso. O conceito é da filósofa e feminista estadunidense Nancy Fraser. Em ótima entrevista publicada no portal Outras Palavras, ela diz:

O que é específico do “neoliberalismo progressista” é que ele combina políticas econômicas regressivas, liberalizantes, com políticas de reconhecimento aparentemente progressistas. Sua economia política baseia-se em “livre comércio” (que em realidade significa livre movimentação do capital) e desregulamentação das finanças (que empodera investidores, bancos centrais e instituições financeiras globais para ditar políticas de “austeridade” para o Estado por meio de decretos e da chantagem da dívida). Entretanto, seu lado de reconhecimento centra-se na compreensão liberal do multiculturalismo, do ambientalismo e dos direitos das mulheres e LGBTQ [lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer]. Inteiramente compatível com o neoliberalismo financeiro, essa compreensão é meritocrática, oposta ao igualitarismo. Focados na “discriminação”, eles buscam assegurar-se de que uns poucos indivíduos “talentosos” de “grupos sub-representados” possam ascender ao topo da hierarquia corporativa e alcançar posições e remuneração paritárias com os homens heterossexuais brancos de sua própria classe.

O que não é mencionado, contudo, é que enquanto esses poucos “quebram o teto de vidro”, todo o resto continua preso no porão.

Essa combinação é explorada com sucesso pela direita para alimentar um clima de ressentimento contra as lutas progressistas.

Em plena campanha eleitoral, esse importante debate chega atrasado ao Brasil. Mas as eleições vão passar, as encrencas vão permanecer e, muito provavelmente, se tornar ainda mais graves.

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