Michael S. Roth
[artigo originalmente publicado na New Republic]
Assim que a temporada de admissões na universidade acelera, tenho conversado com muitos jovens estressados com a decisão sobre que faculdade devem escolher. Como reitor de uma universidade dedicada à educação liberal, exorto-os a considerar a faculdade não apenas como uma oportunidade de adquirir competências específicas, mas como uma oportunidade notável para explorar a sua vida individual e social em conexão com o mundo em que eles vão viver e trabalhar.
Debates contenciosos sobre os benefícios – ou desvantagens – da ampla aprendizagem integradora, a aprendizagem liberal, são tão antigos quanto a própria América. Vários dos fundadores viram a educação como o caminho para a independência e liberdade. Um amplo comprometimento com a pesquisa era parte de sua dedicação à liberdade. Mas os críticos da educação também têm uma longa tradição. De Benjamin Franklin no século XVIII aos especialistas da Internet de hoje, eles atacaram sua irrelevância e elitismo – muitas vezes pedindo por mais instrução profissional.
Benjamin Franklin provavelmente teria tido alguma simpatia em relação à mensagem contra a universidade: “Você não precisa de faculdades. Saia e aprenda coisas em seu próprio país. Você acredita que é um inovador? Você pode prová-lo sem diploma. Você quer começar uma empresa de sucesso? Você não precisa da permissão de professores fora de alcance.” De Tom Paine a Steve Jobs, histórias de pessoas com inteligência e audácia o suficiente para educarem a si mesmas às suas próprias maneiras ressoam há tempos entre os americanos.
Mas Franklin também não via com bons olhos a exibição arrogante de provincianismo. Ele ficaria chocado com a atual mania de conduzir jovens a lugares cada vez mais estreitos em nome do “primeiro dia” de trabalho. Ele certamente reconheceria que, quando os líderes industriais e cívicos exigem especialização cada vez mais cedo, estão nos colocando num caminho que fará com que as pessoas sejam menos capazes enquanto cidadãos e ainda menos capazes de se adaptar às mudanças no mercado de trabalho.
Cidadãos capazes de ver através das contradições políticas ou burocráticas também são trabalhadores que podem defender seus direitos em face dos ricos e poderosos. A educação protege contra a tirania estúpida e o privilégio arrogante. A aprendizagem liberal não tem a ver apenas com treinamento numa especialidade; é um convite a pensar por si mesmo. Por gerações, cidadãos alfabetizados e bem preparados foram vistos como essenciais para uma república saudável. Cidadãos amplamente educados não são apenas um conjunto de habilidades – eles são pessoas inteiras. Para os críticos de hoje – geralmente utilizando jargões sofisticados do Vale do Silício -, no entanto, uma ampla e contextual educação é puro desperdício – não-monetizado – de escolaridade.
Não é à toa que, numa sociedade caracterizada por uma desigualdade de renda radical, a ansiedade sobre como obter o primeiro emprego vai levar muitos a apontar para as necessidades imediatas do mercado atual. O alto custo da faculdade e a dívida ruinosa que muitos assumem apenas pioram essa ansiedade. Neste contexto, alguns afirmam que a educação deve simplesmente preparar as pessoas para serem consumidores, ou, se são talentosas o suficiente, para serem “inovadoras”. Mas quando as necessidades do mercado mudarem – e elas certamente irão -, as pessoas com essa formação estreita ficarão sem sorte. Seus chefes, os responsáveis pela definição de tendências de mercado, ficarão bem, porque eles provavelmente nunca se limitaram a uma maneira ultra-especializada de fazer as coisas. Tome cuidado com os críticos da educação que ocultam o seu desejo de proteger privilégios (e desigualdade) nas vestes da reforma educacional.
“Se fizermos com que o dinheiro seja o objeto de treinamento do homem”, W.E.B Dubois escreveu no início do século XX, “vamos desenvolver fabricantes de dinheiro, mas não necessariamente homens”. Ele continuou a descrever como “a inteligência, a ampla simpatia, o conhecimento de como o mundo foi e de como ele é e a relação dos homens diante disso – este é o currículo do ensino superior que deve estar subjacente à verdadeira vida.” Sendo um bom pragmatista, DuBois sabia que era por meio da educação que desenvolvemos padrões de pensamento que se tornam padrões de ação. Como William James ensinou, o objetivo de aprendizagem não é chegar a verdades que de alguma forma correspondem à realidade. O objetivo da aprendizagem é a aquisição de melhores formas de lidar com o mundo, melhores formas de agir.
A educação liberal pragmática tem como objetivo capacitar os estudantes com meios poderosos de lidar com as questões que irão enfrentar no trabalho e na vida. É por isso que ela deve ser ampla e contextual, inspirando hábitos de atenção e crítica que serão recursos para estudantes anos após a graduação. Para desenvolver este recurso, os professores devem enxergar o estudante como uma pessoa completa, não apenas como um conjunto de ferramentas que pode ser aprimorado. Precisamos de ferramentas, é claro, mas a educação universitária precisa convidar os estudantes a aprender a aprender, criando hábitos de pensamento crítico e criativo independentes, que duram toda uma vida.
No século XIX, Emerson incitou os estudantes a “resistir à prosperidade vulgar que retroage sempre à barbárie”. Ele enfatizou que uma verdadeira educação iria ajudar o indivíduo a encontrar o seu próprio caminho através da expansão do seu mundo, e não de seu estreitamento: perceber tudo, mas imitar nada, ele pediu. O objetivo desta atenção cultivada não é descobrir alguma grande Verdade, mas também não é apenas preparar o indivíduo para o pior trabalho que provavelmente terá: o seu primeiro trabalho após a formatura.
Em vez disso, o objetivo da educação liberal é, nas palavras de John Dewey, “a experiência livre de rotina e capricho”. Esse objetivo fará com que haja mais pessoas eficazes no mundo, e isso vai ajudar para que elas continuem a crescer como pessoas inteiras além da universidade. Esse projeto, como a aprendizagem em si, nunca deve acabar.
Ano Zero via feicibuqui Marcos Bourscheid
via: http://gilsonsampaio.blogspot.com.br/2016/02/a-universidade-nao-deve-nos-preparar.html
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