quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Apetites de um consumo sem espírito


De volta ao artigo que Anthony Elliott publicou na Folha em 31/12/2017. Nele, o professor de sociologia da Universidade South Australia e da Universidade Keio, no Japão, discute um novo tipo de individualismo.

Mas um aspecto lateral abordado pelo texto é o que ele chamou de “consumo desigual”. Um exemplo:

...a ONU apontou num estudo da década de 1990 que prover educação básica para todos os cidadãos dos países em desenvolvimento custaria em torno de US$ 6 bilhões adicionais ao ano, enquanto os EUA sozinhos já gastavam espantosos US$ 8 bilhões por ano com cosméticos.

Mais “dados chocantes sobre gastos anuais (segundo o mesmo documento de 1998)”:

- US$ 11 bilhões com sorvete na Europa;

- US$ 17 bilhões com comida para animais de estimação na Europa e nos EUA;

- US$ 50 bilhões com cigarros na Europa;

- US$ 105 bilhões com bebidas alcoólicas na Europa;

- US$ 400 bilhões com narcóticos em todo o mundo.

Os números refletem não só uma obsessão cultural com consumo, prazer e hedonismo mas também apontam para uma ênfase individualista na satisfação dos desejos.

Em “O Capital”, Marx transcreve a seguinte frase de Nicholas Barbon, da obra “A Discourse on coining the new Money lighter”, de 1696:

O desejo implica a necessidade; é o apetite do espírito, que lhe é tão natural quanto a fome para o corpo (...) A maior parte [das coisas] retira seu valor do fato de satisfazerem as necessidades do espírito.

Caberia perguntar que espírito regeria apetites como os descritos por Elliott, não fosse o fato de que provavelmente já não lhes reste espírito algum.


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