Não quero mais voltar ao assunto. Porque já me baixou o astral demais. Porque tenho achado inútil. Minha vontade, neste momento, é ir-me embora daqui. Gastar os anos que me restam em um lugar onde a dedicação de uma vida inteira ao pensamento, à reflexão, à curtição, à linguagem artística, seja um pouco mais respeitada. E, principalmente, porque o cenário que está se montando é terrível.
E a reação a isso será débil.
Não quero mais voltar ao assunto, mas me espanta ver pessoas, que considerava referencias importantes, ainda insistirem na ideia de que os escândalos de corrupção foram o motivo da queda da coligação de esquerda.
Me espanta, neste momento, ver pessoas que considerava referencias importantes lançarem toda a culpa na coligação de esquerda por não ter demarcado mais terras indígenas, não ter enfrentado com mais vigor os rentistas, não ter feito a reforma agrária.
Como se fosse isso que a tivesse derrubado.
Não consigo entender como essas pessoas não conseguem enxergar que a coligação de esquerda foi derrubada não pelo que não fez, mas pelo que fez.
Não consigo entender como essas pessoas não conseguem enxergar que a coligação de esquerda foi derrubada por ter profissionalizado o trabalho das empregadas domésticas, por ter colocado negros nas universidades públicas, inclusive nos cursos de medicina, por ter possibilitado que pobres viajassem de avião, inclusive para o exterior, por ter criado mecanismos para que pobres, negros, gays, mulheres, tivessem seus direitos mais respeitados, por ter criado 12 novas universidades federais, por ter criado políticas culturais que chegaram em periferias onde jamais chegaram, por ter tentado, ao menos, discutir um modelo mais democrático de comunicação de massas. E, finalmente, por ter fortalecido os mecanismos de investigação da corrupção.
Foi contra isso que a medíocre e mesquinha classe dominante do Brasil se rebelou, com o apoio dos medíocres que se espalham em todas as classes sociais.
Foi esse o motivo de todo o ódio.
Foi isso o que derrubou a coligação de esquerda. Ou você acha que esses cidadãos de bem que já votaram a reforma trabalhista, que vão votar a reforma da previdência, que vão implantar o modelo da escola sem-partido, mas com religião, que já fecharam exposições, que vão queimar livros, que vão vender para os gringos tudo o que puderem, querem realmente um novo país, livre, soberano e Incorruptível?
Alguém ainda se lembra o motivo da derrubada de Dilma Rousseff? Pois eu lembro: pedaladas fiscais. Prosaicas pedaladas fiscais.
Os cidadãos de bem que se insurgiram contra as pedaladas fiscais vão roubar mais terras indígenas, vão matar mais indígenas e pequenos agricultores, vão concentrar mais rendas, mais terras, vão sufocar mais os escravos, vão acabar com qualquer indício de inteligência e liberdade.
Vão, não. Já estão fazendo isso.
Não era melhor manter o pacto democrático, ainda que débil, pressionar e fortalecer a coligação de esquerda, ainda que cheia de tranqueiras, para que avançasse mais, para que enfrentasse com mais vigor os seculares problemas dessa sociedade podre e desigual, que prendesse os corruptos e os corruptores, que acumulasse forças para repartir melhor os meios de difusão do conhecimento?
Eram dias perfeitos? Óbvio que não. Havia um monte de tranqueiras? Óbvio que sim. Cagadas homéricas. Por supuesto que sí.
Mas era a Geni possível. Era a Geni que foi ter com o capitão do Zepelim. E ao jogar bosta na Geni, entregaram de bandeja o país ao prefeito de joelhos, ao bispo de olhos vermelhos e ao banqueiro com um bilhão.
Agora estamos vendo cada vez mais a volta da sombra do Zepelim Prateado crescendo sobre as cidades.
E ainda escuto o coro nas alcovas da grande rede social: maldita Geni!
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