Por Milly Lacombe, em seu blog
Nossa imprensa começou a falar sobre o acordo econômico entre nações banhadas pelo Pacífico, o Trans-Pacific Partnership, ou TPP, mas faz isso sem lançar sobre ele um olhar crítico e insinuando a reclamação de que o Brasil tenha ficado de fora.
O Brasil ficou de fora, imagino eu, por questões técnicas já que, salvo algum terremoto que mude a geografia do planeta, trata-se de um país que não é banhado pelo Pacífico.
Mas deixemos de lado tecnicidades e vamos falar do reverenciado acordo.
Para entender o TPP, que está sendo negociado há oito anos, recorri a algumas mentes brilhantes, como Noam Chomsky, Richard Wolff, Bernie Sanders e a vazamentos do WikiLeaks.
Acho que a primeira coisa que deve ser dita sobre o TPP, conhecido internacionalmente como um “free trade agreement”, é a seguinte: o acordo vem sendo elaborado em sigilo absoluto.
Conduzido por advogados corporativistas, ele é mantido fora do alcance da população e apenas recentemente foi liberado para alguns membros do Congresso americano, que receberam a orientação de ler a papelada numa sala fechada, foram proibidos de xerocar e de comentar o que leram.
O candidato democrata ao governo americano, Bernie Sanders, foi à plenário dizer ser um escárnio que um acordo econômico que envolve 40% da economia mundial seja mantido em sigilo e que o TPP deveria estar aberto para análise pública.
Sanders lembrou que toda a vez que existe um acordo como esse – como já houve o NAFTA, entre EUA, Canadá e México nos anos 90 – a desculpa é sempre a mesma: será bom para aumentar empregos, bom para o trabalhador, mas, segundo ele, a promessa jamais se concretizou e o trabalhador nunca foi beneficiado com acordos desse tipo.
Chomsky diz que esse tipo de acordo não tem nada de “free” e muito pouco de “trade” e que são arranjos protecionistas para blindar o lucro de grandes corporações e os direitos dos investidores. Ele avisa que acordos desse tipo tendem a ignorar direitos trabalhistas e do meio-ambiente.
Chomsky explicou (em entrevista cujo link colocarei no final desse texto) que não pode analisar especificamente o TPP por causa do enorme sigilo que o cerca, mas que o NAFTA foi bastante ruim para o trabalhador/fazendeiro mexicano e que assim que foi implementado, em 1994, Bill Clinton, presidente na época, tratou de militarizar as fronteiras entre EUA e México.
Chomsky especula que o efeito colateral do NAFTA era sabido pela administração Clinton e que a fuga de trabalhadores mexicanos para os EUA passou a ser esperada, por isso se fez necessário militarizar as fronteiras.
O economista Richard Wolff lembra que o acordo dará ainda mais poderes a mega-corporações, que passam a estar acima da lei. Uma das cláusulas do acordo, que tem sido chamada informalmente de “cláusula da pena de morte”, amplia o monopólio da indústria farmacêutica sobre alguns remédios (veja no final do texto matéria do canal democracynow.com)
Sobre algumas cláusulas polêmicas um recente vazamento do WikiLeaks é esclarecedor, e escrevi o texto abaixo quando ficamos sabendo da informação:
“Para dar um exemplo do tipo de notícia que você jamais verá em destaque na mídia corporativa vamos falar do vazamento de hoje do Wikileaks, que revela que um acordo internacional prevê que corporações possam processar nações.
Basicamente ficaria assim: mega-corporações globais podem, via esse acordo, ser indenizadas por você e por mim através de uma côrte supra-nacional que seria criada para isso.
Se parece um filme de terror é porque é. Vamos saber mais.
O WikiLeaks tornou público nessa quinta-feira, 26 de março, o Investment Chapter (capítulo de investimento) do acordo secreto que os Estados Unidos estão firmando com um pool de nações – o TPP (Trans-pacific partnership agreement).
“O capítulo prevê a intenção de conferir aumento do poder das corporações globais através da criação de uma côrte supra-nacional, ou tribunal, no qual empresas estrangeiras poderiam ‘processar’ estados e obter indenização do contribuinte para ‘lucros futuros previstos’”.
Em retorno, segue a nota, estados imaginam que receberiam mais investimentos – tudo às custas da segurança que o dinheiro do contribuinte, sendo dado como garantia, ofereceria.
O TPP, que está sendo elaborado secretamente, poderia cobrir até 40% da economia global.
Por que um acordo que chegaria afetar metade da economia do planeta tem que ser feito em sigilo é a primeira pergunta que precisamos fazer.
Depois dessa, é preciso voltar alguns anos o filme e lembrar de quantas vezes o dinheiro do contribuinte já salvou corporações (e bancos são corporações) da falência.
É justo um sistema que dá todo o poder à corporação e deixa o risco com você e comigo? Não seria isso a privatização do lucro e socialização do risco? As coisas não estariam invertidas?”
Por tudo isso o TPP tem sido chamado de NAFTA em esteróides.
Acho que faltou o noticiário brasileiro lançar sobre esse acordo um olhar crítico para poder, assim, nos ajudar a entender.
A entrevista de Noam Chomsky sobre o TPP aqui
Vejam reportagem sobre o TPP feita pelo canal Democracynow
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