Há uma mania da mídia brasileira superestimar a aparição de nomes comerciais no exterior. De forma exagerada, diz que os ídolos "estouraram no mundo inteiro", mas esse "sucesso" todo nunca passa de mera boataria daqui, o que mostra o quanto muitos brasileiros são ainda provincianos, por mais que estejam conectados com a Internet.
Recentemente, houve o caso de Michel Teló. Criaram factóides que, aos nossos olhos, transformaram o medíocre cantor em "fenômeno mundial". Tudo por conta de uma mídia provinciana, velha, que já repete as mesmas fórmulas desgastadas do hit-parade à brasileira, seja no brega-popularesco ou na nossa "peculiar" forma de encarar os sucessos internacionais.
Tentei conferir, em dois sítios, os supostos efeitos do "sucesso" do cantor paranaense. Um deles é o Olimpo do hit-parade mundial, a revista Billboard, no sítio da matriz norte-americana, e outro é o portal da revista britânica New Musical Express, maior referência do pop de sucesso na Europa.
Foi um fiasco em ambos os casos. No sítio da Billboard, simplesmente Michel Teló não existe. Preferi escrever a palavra-chave sem o acento do sobrenome Teló, ou seja, escrevendo "Michel Telo", que é o que os norte-americanos entendem e o que a informática, em muitas buscas, recomenda.
Quanto à busca no sítio da NME (sigla pronunciada como se fosse a expressão inglesa enemy, "inimigo", num trocadilho brincalhão), o resultado é enganador. O sítio opera com os mesmos mecanismos oferecidos pelo Google, e, aparentemente, aparecem vários resultados da palavra-chave "Michel Teló". No entanto, são sítios sem a menor relação com o New Musical Express, que por sinal nem está aí com o sucesso do cantorzinho.
Pelo contrário, quem conhece a natureza da imprensa britânica, sabe que, se Michel Teló aparecer na New Musical Express, é da forma de resenhas satíricas, pejorativas, dessas feitas para esculhambar certos astros de gosto duvidoso.
Além disso, o NME anda muito ocupado com seus nomes locais, seja o cantor Morrissey, o grupo Beady Eye (formada por integrantes do Oasis sem Noel Gallagher), a volta dos Stone Roses e o sucesso mundial da soulwoman Adele. O "enemí" não iria mesmo se curvar para a visão provinciana do mercadão brazuca.
O brega-popularesco nunca teve grande sorte no exterior. É essa a verdade. O "sucesso" estrangeiro se dá por factóides, ou pela apresentação para públicos de imigrantes brasileiros que vivem no exterior.
Desde a primeira "leva" de bregas no exterior, a partir de figuras hoje conhecidas (Fábio Jr., Michael Sullivan e Christian da dupla Christian & Ralf) que passaram a gravar em inglês, o brega-popularesco nunca se tornou um grande sucesso.
Só dois cantores realmente furaram o cerco: Morris Albert, com "Feelings", e, com menor intensidade, Terry Winter, com "Summer Holiday". Mas mesmo assim os dois fizeram sucesso para públicos bastante conservadores, afeitos a nomes como Ray Conniff e Julio Iglesias.
Fora isso, nem sequer os "sofisticados" Alexandre Pires e Chitãozinho & Xororó e nem mesmo a "cultuada" Tati Quebra-Barraco fizeram a música brega emplacar no exterior. Alexandre Pires foi adotado pelo casal cubano anti-castrista Gloria Estefan e Emílio Estefan Jr., e cantou até para o então presidente dos EUA, George W. Bush, mas teve que desistir da carreira no exterior pela ampla concorrência de cantores - seja no segmento latino de Ricky Martin e Enrique Iglesias, seja no segmento black de Jay Z e R Kelly - e pela associação a celebridades conservadoras.
Quanto a Chitãozinho & Xororó, eles chegaram a entrar em contato com Billy Ray Cyrus - o então pouco conhecido cantor country, depois famoso por ser o pai de Miley Cyrus - e Reba McEntire, e a se lançar no mercado sob os nomes de batismo Jose & Durval (José sem o acento agudo e provavelmente pronunciado como "rossé"). Não emplacaram.
Mais tarde, os filhos de um e sobrinhos de outro, Sandy & Júnior, também tentaram carreira no exterior, mas não conseguiram. O público norte-americano viu a dupla como clone de outras duplas conhecidas, como Carpenters e Roxette (dupla sueca adotada pelo hit-parade dos EUA).
Tati Quebra-Barraco, por sua vez, foi jogada para fazer turnê europeia porque os empresários do "funk carioca" estão sempre cheios da grana (embora se autoproclamem "ainda pobres"). E, se alguém falou dela - se é que alguém se interessou em falar - , provavelmente não seria de forma positiva nem elogiosa. Quando muito, ela seria tratada como um "exotismo bizarro".
O Kaoma, o grupo que "lançou" a lambada, também não teria feito muito sucesso, senão para imigrantes brasileiros no exterior. E o É O Tchan, quando se apresentou no Festival de Montreux - numa fase lamentável do evento, antes conhecido como um festival de jazz - , foi da forma mais constrangedora possível, com alguns brasileiros querendo invadir o palco por causa da Carla Perez.
Portanto, o brega-popularesco, essa "música popular" com gosto azedo de mercantilismo, em toda sua trajetória não teria sido um grande sucesso como a verdadeira MPB, que talvez não seja de um "P" tão maiúsculo como gostaríamos de ver, mas com certeza tem "M" maiúsculo de música e "B" de brasileira.
Seria até muita bondade dizer que Michel Teló foi um "fogo de palha" na Europa, ou que a crise no continente abriu caminho para seus sucessos medíocres. Teló, na verdade, nem de longe representa algum sucesso real no exterior, fora algumas rádios de imigrantes latinos.
Dizer que Teló toca mais do que Adele é um contrassenso. Ou melhor, uma grande e vergonhosa mentira. Daqui a pouco, vão comparar o suposto sucesso de Michel Teló na Europa à chegada dos Beatles aos EUA.
Aí será demais. Será muita tolice para uma visão provinciana até demais, que não enxerga o que rola nas nossas "províncias", quanto mais o mundo aí fora.
Alexandre Figueiredo
No Mingau de Aço, via Com textolivre
No Mingau de Aço, via Com textolivre
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