segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Indignados do futebol



Sem dúvidas estamos vivendo na época dos indignados. Mundo afora e em diferentes idiomas, esta palavra se converteu na bandeira dos protestos políticos, sindicais, juvenis e sociais. Mas a novidade é que, agora, os indignados começam a se expressar também no glamoroso mundo do futebol.

O mais popular dos esportes do planeta, o que prende e emociona bilhões de torcedores em todo o mundo, o que converteu humildes meninos em superastros que deslumbraram por suas mágicas jogadas como Pelé, Puskas, Garrincha, Maradona ou Di Stefano está mudando. Desde há algumas décadas, apesar do brilhantismo de alguns craques e da paixão dos torcedores, o futebol começou a ser noticia pelos grandes negócios envolvendo transferências absurdas que servem para lavar dinheiro, pela corrupção e pelo enriquecimento ilícito dos cartolas, pela utilização de sua popularidade em favor dos políticos e pela multiplicação dos lucros das multinacionais de roupa esportiva como Nike e Adidas. 

Mas o fato importante é que esta mudança, para pior, não passou despercebida e começa a ser contestada...
 
Em vários países e regiões, setores que gostam de futebol, refletindo o desejo de transparência, de mudança e de rejeição à corrupção, e como uma expressão, ainda que minúscula e distorcida, das importantes manifestações ocorridas recentemente no mundo, começam a demonstrar sua indignação.

A primeira manifestação ocorreu durante a eleição das sedes para os Mundiais de 2018 e 2022, quando alguns dos máximos dirigentes da FIFA foram flagrados vendendo seus votos para favorecer a Rússia e o Qatar, eleitas em detrimento da Inglaterra. Principal prejudicada, a inventora do futebol ameaçou se desfiliar da máxima entidade e, pressionada pela opinião pública, seus políticos chegaram a tratar do tema no próprio Parlamento Britânico, onde foram ventiladas uma série de denuncias contra dirigentes, dentre eles, o presidente da CBF Ricardo Teixeira e seu ex-sogro João Havelange, ex-chefe da FIFA durante 25 anos.

Também a eleição para presidente da FIFA foi um vexame. Um dos postulantes ao cargo, o asiático Mohamed Bin Hammam, foi banido por corrupção, deixando o caminho livre para a perpetuação de Joseph Blatter, outro corrupto, acusado pelo jornalista britânico Andrew Jennings, autor do livro "Jogo sujo: O Mundo Secreto da FIFA", de negociatas com a família do ditador líbio Gaddafi. Tão escandalosa foi a eleição de Blatter, que o primeiro-ministro da Inglaterra David Gordon qualificou a mesma como "uma farsa" e expressou que a instituição "nunca tinha estado num nível tão baixo". Claro que, o governante só tentava dar uma resposta à torcida inglesa, depois de fracassar no seu intento por sediar a copa de 2018, já que, na Inglaterra, importantes clubes estão nas mãos das máfias russas que lavam dinheiro mediante milionárias contratações. 

Mas a rebelião excede os interesses conjunturais de Gordon. O ex-jogador alemão Karl-Heinz Rummenigge, presidente da Associação de Clubes Europeus, criticou Joseph Blatter e pediu uma revolução contra a corrupção na FIFA: "Não aceito mais que sejamos liderados por pessoas que não são sérias e limpas..." [] "Blatter diz que está a lutar contra a corrupção, mas a verdade é que ninguém acredita no que ele diz. Não estou optimista com o futuro do futebol, porque eles acreditam que o sistema que aí está é perfeito. O futebol é uma máquina de dinheiro, Mundial após Mundial. E, para eles, isso é o mais importante, mais do que ter uma gestão séria e limpa", explicou o ex-craque alemão. 

Teixeira e Grondona com os dias contados?

Se na Europa a coisa começa a fervilhar, não é diferente deste lado do océano. Muitas vozes se levantam contra estes dois sinistros personagens que, faz décadas, mandam na CBF e na AFA, representantes do futebol do Brasil e da Argentina, as duas maiores escolas de futebol do mundo. 

Grondona, ou "don Julio", como é chamado ao melhor estilo de don Corleone, é vice-presidente Executivo da FIFA e presidente da AFA (Associação do Futebol Argentino) há 32 anos. Este recorde de permanência no cargo, que, na eleição de outubro, pretende alongar por mais quatro anos, foi conquistado mediante a armação de uma máquina mafiosa, da qual se beneficiou economicamente, e da proteção dos governos de turno, à sombra dos quais nunca teve que enfrentar investigações. Por isso, não é casual ver-lo em fotos ao lado do genocida general Videla, que o nomeou presidente da AFA em 79, em plena ditadura militar, como, atualmente, com a presidenta Cristina Kirchner, cujo governo lhe financia grande parte dos torneios, já que se utiliza do popular esporte como parte de seu marqueting político. 

Mas a estrela de Grondona também começa a declinar. Uma recente pesquisa nacional acaba de demonstrar que 98% dos torcedores (hinchas) argentinos são contra que don Julio continue à frente da AFA. Como parte dessa oposição, os indignados do futebol argentino preparam uma marcha de torcidas, em frente à sede da entidade, sob o lema: "Chau Grondona" ("Vai embora Grondona"). Preocupado por sua popularidade, o governo K, que preparava junto à AFA um projeto de torneio para devolver River à Primeira Divisão no tapetão, depois dessa pesquisa, rapidamente tomou distância do cartola e engavetou o projeto.

O Fora Teixeira também já deixou de ser uma bandeira pessoal do jornalista Juka Kfuri para começar a ser levantada por vários setores amantes do futebol. Com mais de 20 anos à frente da CBF, a biografia de RT está recheada de denúncias de corrupção e de CPIs. Mas, ao igual que seu vizinho Grondona, Teixeira sabe melhor que ninguém que, para não ser incomodado, a fórmula mágica é ser amigo dos que governam, afinal tão corruptos quanto ele.

Por ocasião da escolha do Brasil como país sede da Copa do Mundo de 2014, 12 governadores foram à Europa a convite de Ricardo Teixeira. Na volta, junto à bancada da bola, eleita com financiamento da CBF, influenciaram para impedir a instalação da CPMI do Corinthians/MSI. Sob o argumento de que a CPI poderia influenciar na escolha da sede, conseguiram que 71 parlamentares mudassem de opinião e retirassem seu nome, impedindo a investigação de uma negociata que incluia Teixeira.

É tanta corrupção que fica difícil ocultar. Depois de denuncia da BBC de que Teixeira e outros dirigentes da FIFA tinham recebido milionárias propinas da ISL, empresa de marketing da entidade, os dirigentes se viram obrigados a fazer um acordo com a justiça suiça, país sede da FIFA, para devolver a dinheirama recebida e se livrar dos processos. Em 1996 a CBF, que até então apresentava lucros en seus balanços anuais, fechou um acordo com a Nike por U$ 160 milhões e, curiosamente, desde esse momento começõu a ter prejuizos. Aí apareceram empréstimos de origem duvidosa, com juros muito acima do mercado. Descobriu-se que empresas suas e de seus "amigos" eram as que faziam as transações irregulares dos empréstimos.

2014: A Copa da corrupção

Depois de todas que Teixeira aprontou, o governo Lula lhe cedeu o comando da organização da Copa do Mundo 2014. É a prova de que o governo joga com as mesmas cartas que o cartola e, junto a importantes setores de empresários, estão se esfregando as mãos pelos negócios que farão com o evento esportivo. Se não fosse essa cumplicidade, Teixeira não duraria nem um minuto no comando depois de suas debochadas declarações à revista Piauí: "Em 2014, posso fazer a maldade que for. A maldade mais elástica, mais impensável, mais maquiavélica. Não dar credencial, proibir acesso, mudar horário de jogo. E sabe o que vai acontecer? Nada. Sabe por quê? Por que eu saio em 2015. E aí, acabou"

O apoio a Teixeira por parte do poder político se consolidou durante o governo Lula e com a nomeação do Brasil como sede da Copa do Mundo 2014. Nessa empreitada, o governo, de fato, associous-se a Ricardo Teixeira, que à frente da CBF e do COL (Comitê Organizador Local) será o principal executivo de um evento de investimentos e patrocínios milionários. Não é casual que a TAM, patrocinadora oficial da seleção brasileira, tenha-lhe "presenteado" com um jato como agradecimento pelos serviços prestados, ou melhor, pelos "contratos assinados".

Por isso, o governo, que começou falando que não iria investir um tostão na Copa, porque isso seria o papel da iniciativa privada, a pouco andar mudou o discurso e de forma direta ou indireta, via BNDES, já está empenhando bilhões em obras de duvidoso retorno. Além do que, até o chute inicial do primeiro jogo, vários milhões irão pingando aqui e acolá. Segundo o Portal da Transparência, o ministro dos Esportes Orlando Silva (PCdoB), acaba de assinar um contrato milionário com a Calandra Soluções, empresa que oferecerá: "Serviços de implantação da solução de gestão de informações participação colaborativa que será adotada para acompanhamento e controle do Plano Diretor da Copa". Você não entendeu? Não importa, é disso que se trata.

Por sua vez, o governador do estado e o prefeito do Rio de Janeiro, acabam de antecipar um brinde a seus parceiros dos próximos anos. Deram à Globo R$ 30 milhões para organizar a festa do sorteio das eliminatórias, evento de pouca importância que na África do Sul 2010 custou U$ 2 milhões e que, além do mais, deveria ter sido financiado pela própria FIFA, dona do evento, que ganha rios de dinheiro sem aportar nada a não ser exigências ao país organizador. Também as empresas multinacionais que financiam a entidade deveriam ter aportado para o evento, mas nada gastaram.

Nem precisaram, porque os governos estadual e municipal do Rio, que negam aumento de salário para os professores, ofereceram-se prestamente para botar o dinheiro no cofre da Globo.

Este mesmo governo que esculacha os bombeiros, se ajoelha frente a esses cartolas corruptos. Joseph Blatter e Jerome Volker, que vieram ao Brasil para a realização do "sorteio dos grupos das eliminatórias", além de receber a chave de ouro da cidade das mãos das deslumbradas autoridades, foram recebidos com honras de Presidente de dar inveja até à própria Dilma. Os cartolas da FIFA foram conduzidos pela cidade em carros oficiais e acompanhados permanentemente por um grupo de batedores, deferência que o cerimonial oficial oferece somente aos chefes de estado.

As denuncias contra os altos dirigentes do futebol se espalham pelo mundo. A organização da Copa do Mundo, antes de começar, já oferece provas da existência de corrupção, de superfaturamento e de grandes negócios para os cartolas, os políticos e os grupos de empresários que irão efetuar as obras.

Mas, diferente de outras épocas, começa a haver um movimento contra esses desmandos. Em nosso país, o Fora Teixeira ganhou dezenas de sites e milhares de participantes que interatuam na internet.

Esses protestos não podem ficar só no campo virtual, devem se incorporar às manifestações de rua que começam a despontar. Uma rebelião organizada, pode desmascarar e banir dirigentes corruptos, exigir condenações, confisco de bens e a devolução dos dinheiros roubados.

Somente assim será possível fazer com que essa festa tão popular e bonita chamada futebol tenha por protagonistas os esportistas e a paixão dos torcedores, e não a podridão da corrupção e da roubalheira.

Para tanto, como em qualquer luta, será necessário que o mundo do futebol comece a mobilizar seus indignados.

Ousar lutar, ousar vencer

Nenhum comentário:

Postar um comentário