quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Seguridade: como criar um déficit a partir de um superávit?




Tania Midori Yoshida  |
O corpo humano é perecível. E a sobrevivência do ser é, ou torna-se cada vez mais ameaçada e dependente de seguridade social, não apenas devido a fatores naturais de envelhecimento ou de deficiência congênita, mas também por problemas característicos do sistema social no qual está inserido. É por este motivo que os trabalhadores criaram as antigas associações mutuarias.
Giddens comparou o que ele considera de vida pós-moderna a um passeio no carro de jagrená. Um tipo de montanha russa, na qual não sabemos ao certo o rumo que iremos tomar. (GIDDENS, 1990). O medo, a ansiedade, a necessidade de confiar na tecnologia e nos técnicos, a incerteza do destino, tudo isso faz parte de nossa vida. Entretanto, diferente do que acontece nos brinquedos eletrônicos, os riscos aos quais estamos sujeitos na vida diária deve-se, muito menos às falhas das máquinas e aos erros humanos, do que ao próprio programa capitalista.
A planificação das sociedades contemporâneas não tem por objetivo a saúde e a segurança das pessoas em geral, mas a máxima produtividade. Assim, todo o aparato técnico e científico, assim como as organizações burocráticas exigem um ritmo acelerado de seus usuários e subordinados.
O ritmo cronometrado em alguma parte do nosso cérebro nos faz acordar antes mesmo do relógio tocar. O resto do dia é o café da manhã mal tomado, o risco de sermos atirados nos trilhos do metrô, o barulho das máquinas, o sadismo dos chefes dotados de inteligência mediana, o colega que quer disputar com você pequenos privilégios, o medo da violência nas ruas, a poluição, a falta de tempo em casa, a deliciosa comida carregada de gordura, conservantes e agrotóxico. Na cama, enfim, adormecemos ao som do tic-tac e, muitas vezes, pensando nas contas a pagar.
Por mais que o sistema tente impor o mesmo ritmo a todas as pessoas, o grau de adaptação é variável. Os menos aptos são excluídos e, não raras vezes, punidos com a própria morte. É assim quanto mais baixa for a classe social a qual pertençam. Apenas o dinheiro pode comprar segurança e um ritmo de vida mais tranquilo.
No período de 2011 a 2013, a média de acidentes de trabalho por ano foi de 717.508 casos, sendo que, dentre esses, 16.180 resultaram em incapacidade permanentemente e 2.834, em falecimento. (PREVIDENCIA SOCIAL, 2014). Se o ritmo de trabalho fosse outro, se as condições de trabalho fossem outras, milhares de mortes, dezenas de milhares de casos de invalidez e centenas de milhares de doenças poderiam ser evitadas por ano.
As lutas sociais precisam ampliar a gama de reivindicações e dar maior atenção à questão da segurança no trabalho e nos trajetos entre a residência, trabalho e escola. Há cada vez mais profissionais habilitados em segurança no trabalho e meio ambiente que devem ser incluídos no mercado de trabalho, nas organizações sindicais e na Previdência Social.
Sob décadas de neoliberalismo, o individualismo e a falta de solidariedade prosperaram. Surgiram novas doenças e cresceu o número de acidentes graves. A solidão e a pobreza nos fazem depender, cada vez mais, de serviços públicos e benefícios previdenciários. Sob o capitalismo, o ser humano não conseguiu evoluir em termos de justiça social e fraternidade
Nesta segunda década do século XXI, chegamos a um ponto limite do desenvolvimento desenfreado do capitalismo. A sucção feroz dos bens, das rendas, da capacidade produtiva e da saúde do povo mundial chegou a um ponto no qual o risco de “miserificação” generalizada é bastante grande. As intervenções das grandes corporações mundiais estão se intensificando, não apenas através da corrupção de pessoas, mas também através do controle da mídia e das redes sociais. Através de mecanismos audaciosos de intervenção internacional, o poder hegemônico dos Estados tem sido ineficaz (ou cumplice) para combater as apropriações das riquezas nacionais por grupos estrangeiros e a transferência de bens e renda pública para grupos empresariais.
Esse é o ponto fundamental que envolve a questão da seguridade social, pois, todas as reformas que vem sendo realizadas vão no sentido de gerar recurso para o pagamento da dívida da União.
No mundo inteiro, as classes médias se dividem entre aqueles que se sentem como parte de uma casta que irá sobreviver às crises e os que perceberam a vulnerabilidade da sua existência diante da radicalização do capitalismo. É importante que as classes médias e também as classes empresariais de pequeno e médio porte percebam, o quanto antes, que o processo de acumulação de capital chegou a um ponto, a partir do qual, irá diminuir suas condições de vida e de existência. Os recursos e saber acumulado pelas classes médias precisam ser utilizados no sentido de combater as novas tendências colonialistas dos grupos capitalistas que, unidos ao Fundo Monetário Internacional, ao crime organizado, bem como a juristas e políticos corruptos pretendem intensificar suas ações de controle humano, apossamento dos bens e riquezas públicas e diminuição dos direitos de todos os cidadãos comuns.
No Brasil, precisamos estabelecer um primeiro ponto de consenso que é a luta contra essa expropriação do fundo previdenciário, seja, em relação aos bens, rendas e direitos. Nessa luta, é importante identificar todos os remendos que estão permitindo o escoamento do patrimônio e receitas previdenciárias.
A desconstrução de toda essa falsa concepção de seguridade social que foi criada e divulgada por políticos corruptos, temos que relembrar o surgimento da previdência social.
No final do século XIX, as condições de trabalho em geral eram péssimas. Os trabalhadores eram submetidos a altas jornadas de trabalho, salários baixíssimos, trabalho do menor e da mulher sem regulamentação, inexistência de dispositivo legal de proteção aos acidentados, etc. (LOPES, 1988). Para se auto-protegerem, muitos trabalhadores começaram a formar associações de assistência mútua.
A maior parte dessas associações possuía um caráter político e contribuía para organizar e fortalecer as lutas trabalhistas. Entretanto, o seu objetivo central era a formação de fundos previdenciários, ou seja, uma poupança coletiva dos trabalhadores para atender necessidades emergênciais de saúde, falecimento e velhice.
Em 1923, com a criação da Lei Elói Chaves, as associações mutuarias foram transformadas em Caixas de Aposentadorias e Pensões. Os trabalhadores tiveram que dividir a gerência dos fundos previdenciários com o superintendente e o caixa das respectivas empresas nas quais trabalhavam. No entanto, a lei reconhecia as caixas como bens de propriedade dos trabalhadores e também a sua natureza preventiva. Os fundos deveriam ficar depositados em conta bancária de propriedade das CAPs. Embora o dinheiro pudesse ser aplicado em Títulos de Renda Nacional e Estadual, não poderia ser empregado para fins alheios à seguridade.
Durante o Estado Novo, as diversas CAPs foram sendo transformadas em autarquias de nível nacional e passaram a ser chamadas de Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAP). A contribuição tornou-se compulsória e o controle, podemos dizer, era exercido pelo Presidente da República, já que era ele quem nomeava a pessoa que iria presidir cada um dos institutos. Os fundos foram sendo unificados e desvirtuados. O dinheiro arrecadado ajudou a financiar obras desenvolvimentistas, inclusive a construção de Brasília.
Em 1960, o Governo, através da edição da Lei 3.807, reconhece a personalidade jurídica de natureza autárquica dos IAPs. Reconhece também que os mesmos eram detentores plenos de bens, rendas, serviços e ação, e gozavam das mesmas regalias, privilégios e imunidades da União. Em seu Título VII, assume que a União possuía uma dívida para com os institutos e, se comprometia a pagar esta dívida com emissão de apólices da dívida pública federal. A amortização e os juros seriam depositados em um fundo próprio, o “Fundo de Benefícios da Previdência Social”.
Com a publicação do Decreto-Lei 72, em 1966, houve a criação do INPS que unificou todos as IAPs. Estávamos na época da ditadura. O fundo previdenciário, sob a denominação de “Fundo de Liquidez da Previdência Social” (FLPS), passou a ser depositado no Banco do Brasil e gerenciado pelo Conselho Diretor do Departamento Nacional da Previdência Social (DNPS), órgão de planejamento, orientação e controle administrativo. Sendo que era presidido por um dos representantes do Governo. (BRASIL, 1966).
O orçamento seria elaborado nos termos da Lei 4.320 de 17 de março de 1964. De acordo com o artigo 43, dessa lei, havendo superávit apurando em balanço patrimonial do exercício anterior ou superávit proveniente de excesso de arrecadação, pode-se abrir créditos suplementares. (LEI 4.320, 1964).
A utilização de superávit para créditos suplementares significa, nada menos, que o dinheiro destinado à seguridade dos trabalhadores será utilizado também para outras despesas. Na vigência dessa lei, o dinheiro da poupança coletiva dos trabalhadores para assegurar melhores condições de vida tem sido desviado para pagamentos de regalias ou despesas estranhíssimas que podem ser consultadas no portal do Planalto, pesquisando-se as palavras chave “abertura de crédito suplementar”.
Esse artigo chegou a ser vetado pelo então Presidente João Goulart, mas foi mantido pelo Congresso Nacional. No dia 1º de abril de 1964, João Goulart foi deposto pelo golpe militar.
A Lei 4.320 de 1964 orientou a legislação orçamentária, durante todo o período da ditadura e, após mais de 50 anos, mesmo com a queda da ditadura, mesmo com a publicação da Constituição Federal de 1988, continua vigente e ordenando o orçamento da União e da Seguridade Social. Pasmem!
Foi nos termos da Lei 4.320 de 1964 que foi editada a Lei 9.530 de 1997 e outras que visam transferir o superávit da seguridade para o pagamento da dívida pública.
Art. 1º Serão destinados à amortização da dívida pública federal:
I – (…)
II – o superávit financeiro dos fundos, das autarquias e das fundações, integrantes do orçamento fiscal e da seguridade social, apurado no balanço patrimonial do exercício de 1997, 1998 e 1999, nos termos do art. 43, § 2º, da Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, “ (LEI 9.530, 1997)
Os fundos previdenciários, desde o século XIX até abril de 1964, tinham natureza de poupança. Eram reconhecidos como bens, renda e direitos dos Institutos, cujo objetivo era garantir a saúde, a assistência e a previdência social. Esses institutos representavam os interesses dos trabalhadores e deveriam ser geridos por trabalhadores. A partir de 1964, inicia-se um longo processo, legal, financeiro e político, através do qual a grande riqueza acumulada do povo, para sua seguridade, é transferida para os fundos de títulos da dívida pública, ou seja, para a acumulação de capital dos mais ricos do mundo. A participação dos trabalhadores na gerência do seu próprio fundo previdenciário foi excluída.
Todo o montante desviado dos fundos previdenciários deveria ser contabilizado e devolvido aos seus legítimos donos. O Fundo Previdenciário é a mais legítima propriedade, pois foi constituída através do trabalho do povo. Não há argumento legal nenhum que consiga provar o contrário sem ser imoral, injusto e irracional. Se os fundos previdenciários não podem ser considerados como propriedade, os fundos de investimento em dívida pública também não poderiam.
Percebam a ironia existente entre o fundo previdenciário e a dívida da União: Primeiro reconhecem a dívida da União para com os fundos. Criam títulos dessa dívida para amortizar e pagar os juros da dívida com os fundos. Por uma lei da época da ditadura, fica autorizada a utilização do superávit do fundo previdenciário para o pagamento da dívida pública da União. Apesar da Constituição de 1988 essa lei é mantida até hoje. Afirmam, mentirosamente, que o fundo previdenciário é deficitário e por isso irão juntar as contas dele com as da União. Juntando as contas, os fundos previdenciários passam a pagar as dívidas da União. Os bens, as rendas e os direitos que pertencem ao povo passam a ser geridos pela União e vão desaparecendo paulatinamente. Para encobrir as falcatruas unem os dois orçamentos, em desobediência à CF. Por fim, os fundos previdenciários que eram detentores de títulos da dívida, passaram a ser pagadores das dívidas da União para com os riquíssimos detentores de títulos da dívida públçica.
O motivo pelo qual não se estabelece uma Seguridade Social que atenda às reais necessidades da população não é a possibilidade de um colapso no sistema previdenciário. O argumento utilizado pelos governantes de que a Previdência Social está em vias de apresentar déficit orçamentário, por causa do aumento da expectativa de vida dos brasileiros é falso. Esse tipo de explicação mitológica está sendo veiculada inclusive em ambientes acadêmicos. O que realmente acontece com o fundo previdenciário precisa ser amplamente divulgado.
Analisemos, logicamente, a argumentação veiculada: assumindo como verdadeira a proposição de que houve um aumento na expectativa de vida dos brasileiros, isso não significa, necessariamente, que houve um aumento dos gastos com a Previdência Social. O número de concessões de benefícios e os valores reais de cada benefício podem, por suposição, diminuir.
Para comprovar a veracidade desta informação teríamos que, primeiramente, verificar se houve realmente um aumento significativo nos gastos realizados. Tendo havido, precisaríamos comparar estes dados com a quantidade de beneficiários e valores dos salários de benefícios, tomando o devido cuidado de corrigi-los monetariamente. Confirmado o aumento dos gastos e verificado que este aumento não decorre do aumento do número de concessões ou do aumento dos valores dos salários de benefício, mas do prolongamento do tempo de duração dos benefícios, teríamos que investigar quais os benefícios que estão sendo prolongados e se o fator idade é a única e exclusiva variável responsável por este prolongamento. Existem centenas de variáveis que interferem na concessão e manutenção dos benefícios previdenciários, a idade é apenas uma delas.
Vamos supor, que tenha havido um aumento nos gastos com pagamento de benefícios. Isso não significa, necessariamente, que houve déficit orçamentário nas contas da Previdência e, muito menos, nas contas da União.
Para tal afirmação ser considerada verdadeira, seria necessário que o montante acumulado somado aos novos ingressos fosse inferior ao total de gastos com pagamento de benefícios. Mas isso não é verdadeiro.
Conforme dados fornecidos pela ANFIP (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil), no ano de 2014, “as contribuições criadas e destinadas exclusivamente para a Seguridade Social somaram R$ 686 bilhões. Em contrapartida, foram gastos R$ 394 bilhões com benefícios previdenciários (aposentadorias, pensões, auxílio-doença, salário maternidade, etc.). Mais R$ 38 bilhões com benefícios assistenciais administrados pelo INSS, que são os benefícios abrangidos pela Loas – Lei Orgânica da Assistência Social. Foram gastos ainda R$ 26 bilhões com benefícios de transferência de renda (Bolsa Família). Com serviços, ações e programas de saúde (pagamento de médicos, enfermeiros, construção de hospitais, medicamentos, procedimentos) foram gastos R$ 94 bilhões. Mais de R$ 50 bilhões foram gastos com ações do FAT (seguro desemprego, abono salarial). (ANFIP, 2015)
Ainda segundo a ANFIP, a arrecadação sobre a folha de pagamento, para o ano de 2014, foi de R$ 340 bilhões; com a Cofins, R$ 195 bilhões; com a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, CSLL, R$ 63 bilhões e com outras receitas que compõem a Seguridade, mais de R$ 20 bilhões. Ou seja, a categoria de maiores contribuintes não é a classe empresarial, mas a classe dos trabalhadores.
A classe empresarial, uma grande parte dela, é devedora. Em outubro de 2015, O Ministério da Fazenda divulgou uma lista das maiores empresas devedoras da Fazenda Nacional, um total de 500 nomes, cujo montante devido é de R$ 392,2 bilhões de reais. Ou seja, praticamente a mesma quantia gasta, em 2014, com pagamento de benefícios previdenciários e 57,7% do total arrecadado.
Já em 2006, Denise Lobato Gentil, em sua tese de doutorado, havia concluído que a Seguridade é “autossustentável, sendo capaz de gerar um volumoso excedente de recursos”. Sua análise abrangeu o período de 1990 a 2005. (GENTL, 2006)
Para ela o financiamento do sistema de seguridade social através das receitas de contribuições definidas na CF de 1988 são suficientes e geram superávit. A receita gerada poderia, inclusive, ajudar a reverter a “situação de carência e penúria da grande maioria da população”. Entretanto, grande parte das receitas são desviadas para “pagamento de despesas financeiras com juros e outras despesas correntes do orçamento fiscal”. Esse desvio, segundo a autora, supera os 20% autorizados pela DRU.
A DRU, Desvinculação das Receitas da União, é a sucessora legal do Fundo Social de Emergência que foi criado em 1994, através de uma medida provisória. Desde então, essa desvinculação segue “ad aeternun”, através de diversas Emendas Constitucionais. A última DRU foi normatizada pela EC nº 68 de 2011 e constou no artigo 76 da CF.
Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2015, 20% (vinte por cento) da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 68, de 2011).
Esse ano, o Governo novamente anuncia um suposto déficit nas contas da seguridade. Contraditoriamente, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, no dia 08/06/2016, a PEC 4/2015 que propõe aumentar a porcentagem da DRU, de 20% para 30%, com efeito retroativo a janeiro de 2016 e prolongamento até 2023. Ora, se há déficit, porque aumentar os desvios? Se não houve superávit, como poderiam retroagir os efeitos ao início do ano?
Essa contradição entre o discurso do déficit e a pressão governamental no sentido de aprovar novas desvinculações das receitas previdenciárias refletem a rede emaranhada e contraditória de normas previdenciárias que procuram driblar o regime democrático e os direitos e garantias dos cidadãos.
A Constituição Federal de 1988 não é perfeita. Vários institutos que poderiam ter eficácia imediata, dependem de regulamentação legal, porque a Constituição assim determina. Além disso, deveria ter sido mais específica em relação às emendas condicionais e revogação das leis anteriores que ferem os seus princípios e objetivos fundamentais. Entretanto, o grande problema no ordenamento jurídico brasileiro não é a redação original da CF, mas as instituições governamentais que a interpretam tendenciosamente.
Em relação às normas que direta ou indiretamente interferem nos assuntos previdenciários, destaca-se a Lei 4.320 de 1964 que, como já mencionamos, deveria ter sido revogada há muito tempo. Além dela, é importante desvelar outras que também deveriam ser alteradas ou retiradas do nosso ordenamento jurídico.
  1. O seu artigo 1o, determina que “os recursos financeiros de todas as fontes de receitas da União e de suas autarquias e fundações públicas, inclusive fundos por elas administrados, serão depositados e movimentados exclusivamente por intermédio dos mecanismos da conta única do Tesouro Nacional, na forma regulamentada pelo Poder Executivo.” (BRASIL, 2001)
  2. O artigo 3º, autoriza a antecipação de “recursos provenientes de quaisquer receitas para execução das despesas, até o limite das respectivas dotações orçamentárias, mediante utilização de disponibilidades de caixa.”. No § 1opondera que isso não irá prejudicar “a entrega das receitas vinculadas aos respectivos beneficiários”. Entretanto, no § 2o, ao determinar que “a comprovação de utilização das receitas vinculadas do Tesouro Nacional, nas finalidades para as quais foram instituídas, será demonstrada mediante relatório anual da execução da despesa orçamentária”. A comprovação fica prejudicada, uma vez que os orçamentos da União e da seguridade foram consolidados, através do Decreto 347 de 1991. (BRASIL, 2001)
Comentário:
O Art. 62 da CF, estabelece que somente em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei. Além disso veda a possibilidade de edição de MP sobre matéria relativa a: planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º (para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública,); que vise a detenção ou sequestro de bens, de poupança popular… Sem considerar que o prazo de transformação em lei há muito foi ultrapassado.
2-  DECRETO Nº 347, DE 21 DE NOVEMBRO DE 1991.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, incisos IV e VI, da Constituição, DECRETA: Art. 1º “A execução orçamentária, financeira e contábil dos órgãos e entidades do Poder Executivo Federal que integram os Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social será realizada através do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal SIAFI, na modalidade total, ressalvadas as entidades de caráter financeiro.” (BRASIL, 1991)
Comentário:
O artigo 84 da CF não autoriza a integração dos orçamentos da União com o da seguridade, apenas determina que cabe ao Presidente da República “enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento previstas nesta Constituição”. A Constituição Federal de 1988 é clara. Em seu artigo 195, inciso IV e § 1º, determina: As receitas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios destinadas à seguridade social constarão dos respectivos orçamentos, não integrando o orçamento da União. ” (BRASIL, 1988)

Através dessa lei, cria-se o Fundo do Regime Geral de Previdência Social e dele se excluí as receitas provenientes das contribuições das empresas referentes a receitas, faturamentos e lucros. (BRASIL, 2000)
“Art. 68. Na forma do art. 250 da Constituição, é criado o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, vinculado ao Ministério da Previdência e Assistência Social, com a finalidade de prover recursos para o pagamento dos benefícios do regime geral da previdência social.
  • 1o O Fundo será constituído de:
I – bens móveis e imóveis, valores e rendas do Instituto Nacional do Seguro Social não utilizados na operacionalização deste;
II – bens e direitos que, a qualquer título, lhe sejam adjudicados ou que lhe vierem a ser vinculados por força de lei;
III – receita das contribuições sociais para a seguridade social, previstas na alínea a doinciso I e no inciso II do art. 195 da Constituição;
IV – produto da liquidação de bens e ativos de pessoa física ou jurídica em débito com a Previdência Social;
V – resultado da aplicação financeira de seus ativos;
VI – recursos provenientes do orçamento da União.
  • 2o O Fundo será gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social, na forma da lei.”(BRASIL, 2000)

4-  EC nº 20 de 15 de dezembro de 1998:
  1. Inclusão do inciso XI no artigo 167 da CF, ou seja, a vedação da “utilização dos recursos provenientes das contribuições sociais de que trata o art. 195, I, “a”, e II, para a realização de despesas distintas do pagamento de benefícios do regime geral de previdência social…” (BRASIL, 1998).
Comentário:
Ao especificar apenas a alínea “a” do Inciso I e o Inciso II, essa EC procura estabelecer que as receitas com contribuições sobre receita, faturamento e lucro das empresas podem ser utilizados para fins distintos do pagamento de benefícios do RGPS.
Denise Lobato explica que, ao criar o Fundo do Regime Geral da Previdência Social, a Lei de Responsabilidade Fiscal considerou a receita com COFINS, CSLL e CPMF externas ao orçamento da previdência. Assim, quando se fala em déficit na seguridade social, não se está considerando tais ingressos.
  1. b) EC nº 20 de 15 de dezembro de 1998, incluí o artigo 250, com a seguinte redação: “Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento dos benefícios concedidos pelo regime geral de previdência social, em adição aos recursos de sua arrecadação, a União poderá constituir fundo integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei que disporá sobre a natureza e administração desse fundo.”
Comentário:
Com a integração dos bens, direitos e ativos da União com os da seguridade, abre-se uma “brecha” para que os bens da seguridade possam ser alienados sem o devido acompanhamento e aval dos trabalhadores e aposentados.
A CF, determina em seu artigo 194, que ao cabe ao poder público organizar a Seguridade Social. Poder público, vale ressaltar, não é sinônimo de Governo. A gestão, de acordo com o inciso VII desse artigo, deve ter caráter democrático e descentralizado, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo.
No artigo 60 da CF, está claro que as emendas à CF não podem abolir os direitos e garantias individuais e, conforme o §2º, do artigo 5º da CF, os direitos e garantias individuais elencadas não excluem outras “decorrentes do regime e dos princípios constitucionais.
O Fundo de Seguridade Social é o que assegura os direitos à saúde, assistência, seguridade social e tantos outros direitos dos indivíduos. Ele não pertence à União e deve ser gerido por todos os contribuintes, sejam eles diretos ou indiretos. Todas as leis, decretos e emendas inconstitucionais devem ser revogadas. Todo o dinheiro desviado dos fundos previdenciários, desde a publicação da lei 4.320 de 1964, deve ser devolvido. Isso iria contribuir muito para que a dignidade e a riqueza do povo brasileiro fosse resgatada.
Referências bibliográficas:
ANFIP. Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil. Informação à imprensa: Estudo de auditores confirma superavit de R$ 53,9 bilhões na Seguridade Social. 15/07/2015. Brasil. Disponível em:http://www.anfip.org.br/informacoes/releases/Informacao-a-imprensa-Estudo-de-auditores-confirma-superavit-de-R-539-bilhoes-na-Seguridade-Social_15-07-2015Acesso em 01/08/2016.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF. 1988. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm Acesso em 01/08/2016
BRASIL. Texto da Lei nº 8.029 de 12 de abril de 1990. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8029cons.htm. Acesso em 01/08/2016.
BRASIL. Texto do Decreto-Lei nº 8.769 de 21 de janeiro de 1946. Disponível em:http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=77489&norma=104184. Acesso em 01/08/2016.
BRASIL. Texto do Decreto-Lei nº 7.835 de 06 de agosto de 1945. Disponível em:http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-7835-6-agosto-1945-378662-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em 01/08/2016.
BRASIL. Texto da Lei nº 8.212 de 24 de julho de 1991. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8212compilado.htm. Acesso em 01/08/2016.
BRASIL. Texto da Lei nº 9.530, de 10 de dezembro de 1997. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9530.htm. Acesso em 01/08/2016.
BRASIL. Texto do Decreto nº. 4.682 de 24 de janeiro de 1923. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Historicos/DPL/DPL4682.htm. Acesso em 01/08/2016.
COELHO, Inocêncio Mártires. Teoria da Constituição e Hermenêutica Constitucional. Texto Elaborado para o Curso de Especialização em Direito Público. Brasília: UNOPAR Virtual, 2008.
GENTIL, Denise Lobato. A Política Fiscal e a Falsa Crise da Seguridade Social Brasileira –Análise financeira do período 1990–2005. Tese submetida ao Corpo Docente do Instituto de Economia (IE) –Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas (CCJE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor. UFRJ, 2006.
GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: Editora Unesp, 1990.
LOPES, José Sérgio Leite. A Tecelagem dos Conflitos de Classe na “Cidade das Chaminés. 1ª Edição. São Paulo: Editora Universidade de Brasília, 1988.

Revista Consultor Jurídico. Fazenda divulga lista das 500 empresas que mais devem à União. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-out-14/fazenda-divulga-500-maiores-inscritos-divida-ativa-uniao http://s.conjur.com.br/dl/500-maiores-inscritos-dau.pdf.Acesso em 01/08/2016.

Governo Temer: eis o Triunvirato Repressor

160808-Triunvirato
Como o general Etchegoyen, Raul Jungmann e Alexandre Moraes coordenam a tentativa de calar protestos populares contra programa ultraconservador do presidente
Por Fernando Marcelino
O governo Temer inicia um novo capítulo na história do Brasil. Mais uma vez, as mesmas forças que mataram Getúlio e derrubaram Jango agora aplicaram um golpe de Estado contra Dilma via impeachment.
Uma articulação que conta com o apoio decisivo dos Estados Unidos, operacionalizado por Michel Temer, setores reacionários do Congresso Nacional, do Judiciário, Ministério Público, Polícia Federal, Tribunal de Contas e entidades empresariais, contando com a mão amiga de diversos órgãos de mídia – sob o comando da Globo, Estadão, Folha de São Paulo e outros jornais, revistas e mídias digitais – visando construir uma narrativa de normalidade do funcionamento das instituições. Um verdadeiro golpe institucional.
Temer falou que fará um governo de “salvação nacional” sob o lema “ordem e progresso”.
O ministério nomeado por Temer já deixa a entender porque veio. Muitos são membros de oligarquias familiares, como na República Velha. Além de não ter nomeado nenhuma mulher ou negro, o “novo governo” é recheado de investigados pela Justiça e até mesmo condenados por crimes como improbidade administrativa e desvio de recursos públicos. Dois são investigados e sete citados no âmbito da Operação Lava-Jato. O próprio Temer também foi considerado inelegível pelos próximos oito anos, por decisão da Procuradoria Eleitoral de São Paulo, por doação de campanha acima do limite legal. Não é a toa que uma das primeiras medidas do governo Temer foi diluir a Controladoria-Geral da União (CGU) para que o órgão perca cada vez mais o poder de fiscalizar e auditar instituições do governo federal.
Além do caráter corrupto, o presidente Michel Temer vai tirar do papel a proposta de vender empresas na área de infraestrutura para alavancar o caixa do governo. “A ordem é privatizar ou conceder tudo o que for possível na área de infraestrutura”, confirmou o ministro dos Transportes, Maurício Quintella Lessa, minutos após tomar posse. Também estão na lista para privatização Petrobrás, Eletrobrás, Caixa Econômica, Banco do Brasil, Correios, Casa da Moeda, Infraero, BNDESPar, Embrapa, entre outras empresas estatais. Até o ensino médio deverá ser totalmente privatizado, assim como o ensino superior.
Com a posse de Temer como presidente, está colocada de maneira aguda o impasse entre a força dos golpistas e sua ilegitimidade democrática. Neste período de transição, o governo Temer precisa avançar com máxima velocidade para legitimar-se e neutralizar as forças que podem ser opor ao governo. Por isso, o governo Temer fará de tudo para impedir a reunião de forças políticas e das massas, ou parte delas, contra o novo governo.
Alexandre de Moraes Foto: Edson Lopes Jr/A2 FOTOGRAFIA
Alexandre de Moraes Foto: Edson Lopes Jr./A2 FOTOGRAFIA
Alexandre de Moraes no Ministério da Justiça e Cidadania 
Para tentar implementar seu programa privatista e corrupto sob um forte déficit de legitimidade e desconfiança geral, o Governo Temer precisará de uma repressão física em ampla escala. Em seu Ministério, Temer formou um triunvirato da repressão com Alexandre Moraes na Justiça, Raul Jungmann na Defesa e Sérgio Etchgoyen no novo SNI/ABIN.
O escolhido para o Ministério da Justiça e Cidadania, a quem ficará subordinada a Polícia Federal, é o truculento Alexandre de Moraes, que coleciona ações arbitrárias em série. Ele já foi secretário de Justiça de Geraldo Alckimin (PSDB) e secretário do ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD). Iniciou sua carreira como promotor de Justiça no Ministério Público de São Paulo em 1991, cargo que exerceu até 2002. Entre 2007 e 2010, durante a gestão de Kassab, Moraes foi secretário municipal dos Transportes e de Serviços e chefe da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) e da SPTrans. De agosto de 2004 a maio de 2005, também acumulou a presidência da antiga Febem, hoje Fundação Casa. Moraes se filiou ao PSDB no final de 2015.
No fim de 2014, pouco antes de assumir a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, o novo ministro da Justiça pouco defendeu Eduardo Cunha, presidente afastado da Câmara dos Deputados, em uma ação sobre uso de documento falso em que conseguiu a absolvição do peemedebista.
Em 2015, reportagem do “Estado de S. Paulo” afirmou que Alexandre constava no Tribunal de Justiça de São Paulo como advogado em pelo menos 123 processos da área civil da Transcooper. A cooperativa é uma das cinco empresas e associações que está presente em uma investigação que trilha movimentações de lavagem de dinheiro e corrupção engendrado pela organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Em 2015, durante sua gestão, a polícia paulista foi responsável por uma em cada quatro pessoas assassinada na cidade de São Paulo, a maior taxa já registrada, segundo levantamento do SPTV. Os dados indicaram ainda que as mortes classificadas como confronto entre suspeitos e policiais militares de folga aumentaram 61%.
Em janeiro deste ano, um protesto realizado pelo MPL (Movimento Passe Livre) contra aumento de tarifas foi reprimido de forma ostensiva, o que reservou ao papel de Alexandre uma repercussão negativa diante da opinião pública. Sob sua gestão na secretaria foram utilizados, pela primeira vez, blindados israelenses para enfrentar manifestações.
Mais recentemente ele deu ordens para a PM invadir ilegalmente – isto é, com desprezo total do Estado de direito – o Centro Paula Souza ocupado por estudantes. E diante dos protestos contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff na manhã do dia 10 de maio, disse que foram “atos de guerrilha”.
Raul Jungmann Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
Raul Jungmann Foto: Edilson Rodrigues/ Agência Senado

Raul Jungmann na pasta da Defesa
Já a pasta da Defesa acabou ocupada por Raul Jungmann do PPS. Durante o governo FHC, foi o principal responsável por questões fundiárias no país, chefiando o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) entre 1996 e 2002. Chegou a ser investigado por fraude em licitação, peculato e corrupção em contratos de publicidade da época em que foi ministro do Desenvolvimento Agrário, entre 1998 e 2001. Os contratos somavam R$ 33 milhões. A Justiça Federal arquivou o inquérito.
Segundo Jungmann, a previsão é de que o MST volte a assumir a postura agressiva e combativa que sustentava durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. “Durante o governo do PT, o MST ficou quietinho, muito mais dócil. Agora, ele quer voltar a ser agressivo contra um possível futuro governo Temer”, apontou numa recente entrevista. Também disse que precisa lidar com o movimento com firmeza, para evitar que as paralisações e bloqueios causem tumulto na vida das pessoas. Na entrevista ele também indicou os caminhos repressivos para paralisar o MST. Entre os métodos cogitados, todos sem nenhum fundamento legal, consta o de estrangular financeiramente as cooperativas que se suspeite colaborarem para ações de bloqueio implementadas pelo movimento, além de indicações precisas para impedir o deslocamento de seus membros para essas ações.
general
Sérgio Etchegoyen como ministro-chefe da Secretaria de Segurança Institucional
O general gaúcho Sérgio Westphalen Etchegoyen foi o escolhido para assumir como ministro-chefe da Secretaria de Segurança Institucional. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) também ficará subordinada à pasta que terá uma estrutura mais próxima do antigo SNI (Serviço Nacional de Informações).
Sérgio Etchegoyen ingressou nas fileiras do Exército em 1971 na Academia Militar das Agulhas Negras. Foi oficial do Estado-Maior da Missão de Verificação das Nações Unidas em El Salvador, entre 1991 e 1992, chefe da Comissão do Exército Brasileiro em Washington (EUA), de 2001 a 2003, e assessor especial do ministro da Defesa, Nelson Jobim, de 2009 a 2011. Desde dezembro de 2012 ocupava o cargo de chefe do Departamento-Geral do Pessoal do Exército, localizado em Brasília (DF), quando em março de 2015 foi escolhido Chefe do Estado-Maior do Exército.
A família Etchegoyen está ligada a revoltas militares desde os anos 1920.
O avô e o tio-avô de Sérgio, os tenentes Alcides e Nelson Etchegoyen, sublevaram o regimento de artilharia montada de Cruz Alta, no Rio Grande do Sul, em uma tentativa de impedir a posse do presidente Washington Luís. Derrotado e perseguido, o tenente Alcides participaria quatro anos depois da Revolução que derrubou a República Velha. Durante o governo Vargas, ele trabalhou no gabinete do ministro da guerra Eurico Gaspar Dutra e, depois, substituiu Filinto Müller como chefe da polícia do Distrito Federal, então sediado no Rio. Nos anos 1950, Alcides venceu as eleições para a presidência do Clube Militar em oposição à liderada pelo general nacionalista Newton Estilac Leal. Em agosto de 1954, assinou o manifesto que exigia a renúncia de Getúlio Vargas. Acabou preso em 1955 pelo ministro Henrique Teixeira Lott quando envolveu-se na articulação para impedir a posse de JK e Jango. Alcides morreu em 1956. Deixou dois filhos no Exército: Leo Guedes e Cyro.
Leo é o pai do general Sérgio. Nasceu em 22 de março de 1925, fez Escola Preparatória de Cadetes de Porto Alegre e seguiu na Academia Militar das Agulhas Negras – AMAN, em Resende-RJ. Foi declarado aspirante a oficial em 1945. Participou da derrubada de João Goulart em 1964 e após o golpe foi nomeado Chefe de Polícia do Estado, tendo sido sub-comandante nos períodos de Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir Santos Maciel. No final da década de 60, foi chamado a Brasília para atuar como chefe da Assessoria Especial do presidente Emílio Garrastazu Médici. Leo foi citado no relatório da Comissão da Verdade, responsabilizado por graves violações a direitos humanos durante a ditadura militar. Conforme o relatório, Leo chefiou a Polícia Civil no “período no qual recebeu Daniel Anthony Mitrione, notório especialista norte americano em métodos de tortura contra presos políticos, para ministrar curso à Guarda Civil do Estado”. A comissão cita elogios do general ao tenente-coronel Dalmo Lúcio Muniz Cyrillo, chefe do DOI- CODI, em São Paulo, e a atuação dele na prisão coletiva de sindicalistas e líderes metalúrgicos do ABC paulista, assim como de seus advogados. Leo morreu em 2003.
Seu irmão Cyro trabalhava com o general Milton Tavares, o chefe do Centro de Informações do Exército (CIE). Foi apontado como chefe da Casa da Morte, centro de tortura que funcionou em Petrópolis. Usava o codinome de “Dr. Bruno”. Os mortos na casa eram depois esquartejados e enterrados nas cercanias. O número total de mortos nela é até hoje desconhecido, mas pelo menos 22 guerrilheiros foram assassinados em seu interior. Cyro Etchegoyen foi quem ordenou a libertação de Inês, ex-militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), acreditando que ela aceitara ser uma agente dupla. A ex-guerrilheira, porém, blefara e suas revelações custaram a Cyro a promoção para general.
O golpismo está no DNA dos Etchgoyen. Depuseram Getúlio, tentaram impedir a posse de JK e aplicaram um golpe contra Jango para liderar a repressão, a tortura e o assassinato. Agora em sua nova versão atual estão trabalhando para que um golpe parlamentar se transforme numa caça às bruxas, representando novamente os interesses escusos daqueles que pretendem “manter a ordem” contra o povo e a democracia brasileira.
Mais repressão para aplicar programa antipovo
As mobilizações contra o golpe e todos esses retrocessos vêm aumentando consideravelmente nos últimos meses, o que demonstra que o governo ilegítimo não terá sossego. E é justamente por isso que os golpistas se articulam para legitimar uma violenta repressão contra os movimentos sociais, estudantis e todos os trabalhadores que lutam em defesa da democracia e das grandes reivindicações populares.
É provável que nos próximos meses haverá uma escalada de violência. Existem setores no governo com objetivo de dar fim à esquerda e à democracia. As tentativas escancaradas de prender e condenar Lula, liquidar politicamente o PT e derrubar Dilma são apenas as primeiras iniciativas para liquidar toda a esquerda como agente político. E diante do clima sem possibilidade de conciliação, os militares podem entrar em cena. Ainda mais se inventarem um novo Plano Cohen terrorista para assustar a população e intervir energicamente contra o inimigo interno.
http://outraspalavras.net/brasil/governo-temer-eis-o-triunvirato-repressor/