A vida é um sonho pro tolo que vive aqui

VIVE AQUI

Vagando nas ruas de São Paulo, tentando chegar vivo em casa, um louco me disse “Cara, eu tô com um palpite, acho que hoje vai chover canivete”. Porra, não acredite nas previsões de um patife! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
Penando dentro de um metrô, mais cheio que um elevador, um velho mudo me disse “Cara, eu vou ter um chilique, uma gestante vai parir no meu pé”. Porra, não acredite nas manhas de um patife! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
Pensando bem, o homem não presta. Um negro apanhou de skinheads. A praga de um neonazista entrou no meio da pista, e a pancadaria já-já vai começar. Porra, não acredite nas crenças de um patife! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
Votando em candidato malandro, a coisa só tende a piorar. A ONG dele é fajuta. O cara é um filho da puta. Tá curtindo com uma amante em Paris. Porra, não acredite nas lábias de um patife! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
Dobrando a esquina tá de lascar. Têm bala, crack e putas ali. Um cego voyuer teve uma crise qualquer, me declarou que desta noite em diante não gosta mais de mulher. Porra, não acredite nas tretas de um patife! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
Cantando é bem mais simples contar. Bebendo fica fácil engolir. Meu bem, eu lhe disse que o nosso amor tava em crise, e um dia a velha chama ia se apagar. Porra, não acredite nas confissões de um patife! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
Morrendo não vou mais me cansar das mazelas que eu nunca quis. Eu não vou pro céu, nem mesmo pro beleléu, mas que destino mais cruel e infeliz. Porra, não acredite nas lágrimas de um patife! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
Agora eu já vou terminar a saga que acabei de inventar. Boa noite, mamãe. Dorme com Deus se quiser. Só acredito no que o cuspe alcançar. Porra, nunca duvide das coisas que eu lhe disse! A vida é um sonho pro tolo que vive aqui.
* Este texto foi inspirado na saga amorosa de John Lennon e Yoko Ono (“The ballad of John and Yoko”, Lennon & McCartney). No último parágrafo, a parte do cuspe é alusiva a um fragmento literário do escritor Carlos Heitor Cony em “O Ventre”.
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