sexta-feira, 10 de julho de 2015

Melhores trechos do discurso anticapitalista do papa Francisco na Bolívia

(O papa Francisco em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia)

(O papa Francisco em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia. Foto: José Lirauze/ABI)
Leia trechos do histórico discurso do Papa Francisco aos movimentos sociais na noite de quinta-feira 9 em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. No final do discurso de quase uma hora, o papa argentino pede que rezem por ele. Oxalá seja apenas força de expressão.
LÓGICA DO LUCRO  “Reconhecemos que as coisas não andam bem num mundo onde há tantos camponeses sem terra, tantas famílias sem teto, tantos trabalhadores sem direitos, tantas pessoas feridas na sua dignidade? Reconhecemos que as coisas não andam bem, quando explodem tantas guerras sem sentido e a violência fratricida se apodera até dos nossos bairros? Reconhecemos que as coisas não andam bem, quando o solo, a água, o ar e todos os seres da Criação estão sob ameaça constante? Então digamos sem medo: precisamos e queremos uma mudança.
Nas vossas cartas e nos nossos encontros, relataram-me as múltiplas exclusões e injustiças que sofrem em cada atividade laboral, em cada bairro, em cada território. São tantas e tão variadas como muitas e diferentes são as formas de enfrentá-las. Mas há um elo invisível que une cada uma destas exclusões: conseguimos reconhecê-lo? É que não se tratam de questões isoladas. Pergunto-me se somos capazes de reconhecer que estas realidades destrutivas correspondem a um sistema que se tornou global. Reconhecemos que este sistema impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza?
Se é assim, insisto, digamos sem medo: queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos…. E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia são Francisco.
GLOBALIZAÇÃO DA ESPERANÇA – “Queremos uma mudança nas nossas vidas, nos nossos bairros, no vilarejo, na nossa realidade mais próxima; mas uma mudança que toque também o mundo inteiro, porque hoje a interdependência global requer respostas globais para os problemas locais. A globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença.
Hoje quero refletir convosco sobre a mudança que queremos e precisamos. Como sabem, recentemente escrevi sobre os problemas da mudança climática. Mas, desta vez, quero falar duma mudança noutro sentido. Uma mudança positiva, uma mudança que nos faça bem, uma mudança, pode-se dizer, redentora. Porque é dela que precisamos. Sei que buscais uma mudança e não apenas vós: nos diferentes encontros, nas várias viagens, verifiquei que há uma expectativa, uma busca forte, um anseio de mudança em todos os povos do mundo. Mesmo dentro da minoria cada vez mais reduzida que pensa sair beneficiada deste sistema, reina a insatisfação e sobretudo a tristeza. Muitos esperam uma mudança que os liberte desta tristeza individualista que escraviza.”
DESTRUIÇÃO DA NATUREZA – “O tempo, irmãos e irmãs, o tempo parece exaurir-se; já não nos contentamos com lutar entre nós, mas chegamos até a assanhar-nos contra a nossa casa. Hoje, a comunidade científica aceita aquilo que os pobres já há muito denunciam: estão a produzir-se danos talvez irreversíveis no ecossistema. Está-se a castigar a terra, os povos e as pessoas de forma quase selvagem. E por trás de tanto sofrimento, tanta morte e destruição, sente-se o cheiro daquilo que Basílio de Cesareia chamava ‘o esterco do diabo': reina a ambição desenfreada de dinheiro. A atenção ao bem comum fica em segundo plano. Quando o capital se torna um ídolo e dirige as opções dos seres humanos, quando a avidez do dinheiro domina todo o sistema socioeconômico, arruína a sociedade, condena o homem, transforma-o em escravo, destrói a fraternidade entre os homens, faz lutar povo contra povo e até, como vemos, põe em risco esta nossa casa comum.
Não quero alongar-me na descrição dos efeitos malignos desta ditadura sutil: vocês os conhecem! Mas também não basta assinalar as causas estruturais do drama social e ambiental contemporâneo. Sofremos de um certo excesso de diagnóstico, que às vezes nos leva a um pessimismo charlatão ou a rejubilar com o negativo. Ao ver a crônica negra de cada dia, pensamos que não haja nada que se possa fazer para além de cuidar de nós mesmos e do pequeno círculo da família e dos amigos.”
O PAPEL DE CADA UM – “Que posso fazer eu, recolhedor de papelão, catador de lixo, limpador, reciclador, frente a tantos problemas, se mal ganho para comer? Que posso fazer eu, artesão, vendedor ambulante, carregador, trabalhador irregular, se não tenho sequer direitos laborais? Que posso fazer eu, camponesa, indígena, pescador que dificilmente consigo resistir à propagação das grandes corporações? Que posso fazer eu, a partir da minha comunidade, do meu barraco, da minha povoação, da minha favela, quando sou diariamente discriminado e marginalizado? Que pode fazer aquele estudante, aquele jovem, aquele militante, aquele missionário que atravessa as favelas e os paradeiros com o coração cheio de sonhos, mas quase sem nenhuma solução para os meus problemas? Muito! Podem fazer muito. Vós, os mais humildes, os explorados, os pobres e excluídos, podeis e fazeis muito. Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e promover alternativas criativas na busca diária dos “3 Ts” (trabalho, teto, terra), e também na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudança nacionais, regionais e mundiais. Não se apequenem!
Este apego ao bairro, à terra, ao território, à profissão, à corporação, este reconhecer-se no rosto do outro, esta proximidade no dia-a-dia, com as suas misérias e os seus heroísmos cotidianos, é o que permite realizar o mandamento do amor, não a partir de ideias ou conceitos, mas a partir do genuíno encontro entre pessoas, porque não se amam os conceitos nem as ideias; amam-se as pessoas. A entrega, a verdadeira entrega nasce do amor pelos homens e mulheres, crianças e idosos, vilarejos e comunidades… Rostos e nomes que enchem o coração. A partir destas sementes de esperança semeadas pacientemente nas periferias esquecidas do planeta, destes rebentos de ternura que lutam por subsistir na escuridão da exclusão, crescerão grandes árvores, surgirão bosques densos de esperança para oxigenar este mundo.
Vejo, com alegria, que trabalhais no que aparece ao vosso alcance, cuidando dos rebentos; mas, ao mesmo tempo, com uma perspectiva mais ampla, protegendo o arvoredo. Trabalhais numa perspectiva que não só aborda a realidade setorial que cada um de vós representa e na qual felizmente está enraizada, mas procurais também resolver, na sua raiz, os problemas gerais de pobreza, desigualdade e exclusão.
Felicito-vos por isso. É imprescindível que, a par da reivindicação dos seus legítimos direitos, os povos e as suas organizações sociais construam uma alternativa humana à globalização exclusiva. Vós sois semeadores de mudança. Que Deus vos dê coragem, alegria, perseverança e paixão para continuar a semear. Podeis ter a certeza de que, mais cedo ou mais tarde, vamos ver os frutos. Peço aos dirigentes: sede criativos e nunca percais o apego às coisas próximas, porque o pai da mentira sabe usurpar palavras nobres, promover modas intelectuais e adotar posições ideológicas, mas se construirdes sobre bases sólidas, sobre as necessidades reais e a experiência viva dos vossos irmãos, dos camponeses e indígenas, dos trabalhadores excluídos e famílias marginalizadas, de certeza não vos equivocareis.
No coração, tenhamos sempre a Virgem Maria, uma jovem humilde duma pequena aldeia perdida na periferia dum grande império, uma mãe sem teto que soube transformar um curral de animais na casa de Jesus com uns pobres paninhos e uma montanha de ternura. Maria é sinal de esperança para os povos que sofrem dores de parto até que brote a justiça.
POR UMA ECONOMIA DE INSPIRAÇÃO CRISTÃ – “Os seres humanos e a natureza não devem estar ao serviço do dinheiro. Digamos NÃO a uma economia de exclusão e desigualdade, onde o dinheiro reina em vez de servir. Esta economia mata. Esta economia exclui. Esta economia destrói a Mãe Terra.
A economia não deveria ser um mecanismo de acumulação, mas a condigna administração da casa comum. Isto implica cuidar zelosamente da casa e distribuir adequadamente os bens entre todos. A sua finalidade não é unicamente garantir o alimento ou um ‘decoroso sustento’. Não é sequer, embora fosse já um grande passo, garantir o acesso aos ‘3 Ts’ pelos quais combateis. Uma economia verdadeiramente comunitária – poder-se-ia dizer, uma economia de inspiração cristã – deve garantir aos povos dignidade, ‘prosperidade e civilização em seus múltiplos aspectos’.  Isto envolve os ‘3 Ts’, mas também o acesso à educação, à saúde, à inovação, às manifestações artísticas e culturais, à comunicação, ao desporto e à recreação. Uma economia justa deve criar as condições para que cada pessoa possa gozar de uma infância sem privações, desenvolver os seus talentos durante a juventude, trabalhar com plenos direitos durante os anos de atividade e ter acesso a uma digna aposentadoria na velhice. É uma economia onde o ser humano, em harmonia com a natureza, estrutura todo o sistema de produção e distribuição de tal modo que as capacidades e necessidades de cada um encontrem um apoio adequado no ser social. Vós, e outros povos também, resumis este anseio duma maneira simples e bela: ‘viver bem’.
Esta economia é não apenas desejável e necessária, mas também possível. Não é uma utopia, nem uma fantasia. É uma perspectiva extremamente realista. Podemos consegui-la. Os recursos disponíveis no mundo, fruto do trabalho intergeneracional dos povos e dos dons da criação, são mais que suficientes para o desenvolvimento integral de ‘todos os homens e do homem todo’.  Mas o problema é outro. Existe um sistema com outros objetivos. Um sistema que, apesar de acelerar irresponsavelmente os ritmos da produção, apesar de implementar métodos na indústria e na agricultura que sacrificam a Mãe Terra na ara da ‘produtividade’, continua a negar a milhares de milhões de irmãos os mais elementares direitos econômicos, sociais e culturais. Este sistema atenta contra o projeto de Jesus.
A justa distribuição dos frutos da terra e do trabalho humano não é mera filantropia. É um dever moral. Para os cristãos, o encargo é ainda mais forte: é um mandamento. Trata-se de devolver aos pobres e às pessoas o que lhes pertence. O destino universal dos bens não é um adorno retórico da doutrina social da Igreja. É uma realidade anterior à propriedade privada.”
PÁTRIA GRANDE – “Nos últimos anos, depois de tantos mal-entendidos, muitos países latino-americanos viram crescer a fraternidade entre os seus povos. Os governos da região juntaram seus esforços para fazer respeitar a sua soberania, a de cada país e a da região como um todo que, de forma muito bela como faziam os nossos antepassados, chamam a ‘Pátria Grande’. Peço-vos, irmãos e irmãs dos movimentos populares, que cuidem e façam crescer esta unidade. É necessário manter a unidade contra toda a tentativa de divisão, para que a região cresça em paz e justiça.
Apesar destes avanços, ainda subsistem fatores que atentam contra este desenvolvimento humano equitativo e restringem a soberania dos países da ‘Pátria Grande’ e doutras latitudes do Planeta. O novo colonialismo assume variadas fisionomias. Às vezes, é o poder anônimo do ídolo dinheiro: corporações, credores, alguns tratados denominados ‘de livre comércio’ e a imposição de medidas de ‘austeridade’ que sempre apertam o cinto dos trabalhadores e dos pobres. Os bispos latino-americanos denunciam-no muito claramente, no documento de Aparecida, quando afirmam que ‘as instituições financeiras e as empresas transnacionais se fortalecem ao ponto de subordinar as economias locais, sobretudo debilitando os Estados, que aparecem cada vez mais impotentes para levar adiante projetos de desenvolvimento a serviço de suas populações’.  Noutras ocasiões, sob o nobre disfarce da luta contra a corrupção, o narcotráfico ou o terrorismo – graves males dos nossos tempos que requerem uma ação internacional coordenada – vemos que se impõem aos Estados medidas que pouco têm a ver com a resolução de tais problemáticas e muitas vezes tornam as coisas piores.”
MONOPÓLIO MIDIÁTICO – “Da mesma forma, a concentração monopolista dos meios de comunicação social que pretende impor padrões alienantes de consumo e certa uniformidade cultural é outra das formas que adota o novo colonialismo. É o colonialismo ideológico. Como dizem os bispos da África, muitas vezes pretende-se converter os países pobres em ‘peças de um mecanismo, partes de uma engrenagem gigante’.”
NÃO AO COLONIALISMO – “Temos de reconhecer que nenhum dos graves problemas da humanidade pode ser resolvido sem a interação dos Estados e dos povos a nível internacional. Qualquer ato de envergadura realizado numa parte do Planeta repercute-se no todo em termos econômicos, ecológicos, sociais e culturais. Até o crime e a violência se globalizaram. Por isso, nenhum governo pode atuar à margem de uma responsabilidade comum. Se queremos realmente uma mudança positiva, temos de assumir humildemente a nossa interdependência. Mas interação não é sinônimo de imposição, não é subordinação de uns em função dos interesses dos outros. O colonialismo, novo e velho, que reduz os países pobres a meros fornecedores de matérias-primas e mão de obra barata, gera violência, miséria, emigrações forçadas e todos os males que vêm juntos… Precisamente porque, ao pôr a periferia em função do centro, nega-lhes o direito a um desenvolvimento integral. Isto é desigualdade, e a desigualdade gera violência que nenhum recurso policial, militar ou dos serviços secretos será capaz de deter.
Digamos NÃO às velhas e novas formas de colonialismo. Digamos SIM ao encontro entre povos e culturas. Bem-aventurados os que trabalham pela paz.”
PERDÃO AOS POVOS ORIGINÁRIOS – “Alguém poderá, com direito, dizer: ‘Quando o Papa fala de colonialismo, esquece-se de certas ações da Igreja’. Com pesar, digo: Cometeram-se muitos e graves pecados contra os povos nativos da América, em nome de Deus. Reconheceram-no os meus antecessores, afirmou-o o CELAM e quero reafirmá-lo eu também. Como são João Paulo II, peço que a Igreja ‘se ajoelhe diante de Deus e implore o perdão para os pecados passados e presentes dos seus filhos’.  E eu quero dizer-vos, quero ser muito claro, como foi são João Paulo II: peço humildemente perdão, não só para as ofensas da própria Igreja, mas também para os crimes contra os povos nativos durante a chamada conquista da América. E junto, junto a este pedido de perdão e para ser justo, também quero que recordemos os milhares de sacerdotes, bispos, que se opuseram fortemente à lógica da espada, com a força da cruz. Houve pecado, houve pecado e abundante, e por isto pedimos perdão, e peço perdão, porém também ali, onde teve pecado, onde abundou o pecado, superabundou a graça através destes homens que defenderam a justiça dos povos originários.”
DEFESA DA MÃE TERRA – “A casa comum de todos nós está a ser saqueada, devastada, vexada impunemente. A covardia em defendê-la é um pecado grave.Vemos, com crescente decepção, sucederem-se uma após outra cúpulas internacionais sem qualquer resultado importante. Existe um claro, definitivo e inadiável imperativo ético de atuar que não está a ser cumprido. Não se pode permitir que certos interesses – que são globais, mas não universais – se imponham, submetendo Estados e organismos internacionais, e continuem a destruir a Criação. Os povos e os seus movimentos são chamados a clamar, mobilizar-se, exigir, pacífica mas tenazmente, a adoção urgente de medidas apropriadas. Peço-vos, em nome de Deus, que defendais a Mãe Terra.”
MOVIMENTOS SOCIAIS – “O futuro da humanidade não está unicamente nas mãos dos grandes dirigentes, das grandes potências e das elites. Está fundamentalmente nas mãos dos povos; na sua capacidade de se organizarem e também nas suas mãos que regem, com humildade e convicção, este processo de mudança. Estou convosco. Digamos juntos do fundo do coração: nenhuma família sem teto, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhum povo sem soberania, nenhuma pessoa sem dignidade, nenhuma criança sem infância, nenhum jovem sem possibilidades, nenhum idoso sem uma veneranda velhice. Continuai com a vossa luta e, por favor, cuidai bem da Mãe Terra.”
VI NO: http://socialistamorena.com.br/melhores-trechos-do-discurso-do-papa/

Oxi neles!

‘Oxi’ neles!


Por Luís Fernando Veríssimo

O Brasil de Joaquim Levy adotou a sangria como tratamento, sem consultar o paciente, a não ser que a reeleição tenha sido um plebiscito: a maioria disse ‘não’, Dilma ouviu ‘sim’

Pode ter sido um voto emocional e apenas simbólico, mas o que simbolizou foi histórico. Votando “não” (“oxi”) num plebiscito que endossou a rebeldia do seu governo diante do capital financeiro da Europa os gregos foram os primeiros a desafiar, oficialmente, a ditadura da Austeridade, que há quase oito anos — contados a partir da crise bancária de 2008 — martiriza populações inteiras sem mostrar nenhum resultado, a não ser aumentar o poder dos credores. Tudo em nome de uma “responsabilidade” fiscal amoral, que ignora o custo humano do arrocho.

O economista Paul Krugman, que tem sido o crítico mais constante da Austeridade, compara a sua receita para acabar com a crise com a dos médicos medievais cuja cura para qualquer doença era a sangria. Se a sangria não desse certo eles só tinham um recurso: mais sangria. Contra todas as evidências de que a Austeridade não está dando certo e só continua porque favorece os donos do dinheiro e, como um brinde aos neoliberais, desmonta, sob o disfarce da “responsabilidade”, as estruturas do bem-estar social da Europa que eram um exemplo para o mundo, dê-lhe sangrias.

O “oxi” não vai reverter esta situação e talvez a piore, dependendo da punição que vem aí para a malcriação grega. Mas o exemplo está dado. A única diferença entre a rebeldia grega e a inconformidade com o arrocho que tem enchido as ruas na Europa, até na Inglaterra, é que o “oxi” veio de uma consulta ao povo organizada pelo governo, enquanto os protestos em outros lugares são organizados, ou desorganizados, extra-oficialmente. Nenhum país devedor se arriscaria a imitar a Grécia e só se pode especular sobre o resultado de um plebiscito parecido na Espanha, por exemplo. Lá o movimento chamado Podemos não quer outra coisa senão a oportunidade de também oxidar como os gregos.

O Brasil de Joaquim Levy adotou a sangria como tratamento. Sem consultar o paciente, a não ser que se considere a eleição da Dilma para seu segundo mandato como uma espécie de plebiscito. Neste caso, o resultado da consulta não foi respeitado. A maioria disse “oxi”, a Dilma ouviu “sim”. E chamou o Levy.
http://blogdoitarcio.blogspot.com.br/2015/07/oxi-neles.html

Para que servem e por que existem os sites progressistas?


O Helicoca não foi assunto para a mídia tradicional
Para que servem os sites progressistas? Por que existem?

A sociedade sabe as respostas para ambas as questões, mas a mídia tradicional insiste em tentar manipular as pessoas.

Os sites progressistas servem, fundamentalmente, para dar pluralidade ao mercado de notícias e opiniões.

E existem por causa disso: porque há uma expressiva parcela de brasileiros que não se satisfazem com o que lhes é oferecido, ou impingido, pela Globo, pela Veja, pela Folha e por aí vai.

É, no fundo, uma questão de mercado.

O conservadorismo monolítico das grandes empresas jornalísticas — já não tão grandes assim na Era Digital, aliás — abriu espaço para sites com outra visão de mundo.

Chamar os sites progressistas de governistas é uma mistura de mentira e obtusidade.

Sob qualquer governo, eles seriam o que são. O mesmo já não se pode dizer da grande imprensa: ela protege administrações conservadoras e fustiga administrações populares. Com isso, defende não os interesses da sociedade, mas os seus próprios.

Que o mercado pedia isso — outras vozes — está claro. É só ver os números.

DCM, por exemplo.

Tivemos, em junho, 3,4 milhões de visitantes únicos. É o melhor termômetro de audiência: você conta apenas uma vez pessoas que entram diversas ocasiões no site.

Os acessos são algumas vezes aquilo: no ápice da campanha presidencial, o DCM bateu em 20 milhões de visualizações.

Importante: isto tudo foi conseguido num espaço de dois anos e meio. Em janeiro de 2013, quando tomamos a forma atual de um espaço de análises e informações, tivemos 200 mil acessos e 100 mil visitantes únicos.

Sites progressistas acolhem e propagam ideias que não existem nas empresas jornalísticas.

Um exemplo notável: a desigualdade, o câncer nacional.

Jamais o combate à desigualdade esteve na pauta da mídia tradicional. Seus donos sempre se beneficiaram dela, aliás: basta ver sua colocação nas listas das maiores fortunas do país.

A imprensa sempre preferiu, por demagogia, fazer campanhas contra a corrupção, por saber que num certo tipo de leitor menos qualificado esse discurso hipnotiza.

Vital: não contra toda corrupção, mas contra aquela — real, imaginária ou brutalmente ampliada — associada a governos populares.

Não é notícia nada que diga respeito ao PSDB. A roubalheira no Metrô de São Paulo nunca foi assunto. A compra de votos para a reeleição de FHC, idem. O aeroporto particular de Aécio também.

Um delator diz que um ex-presidente tucano recebeu 10 milhões de reais para melar uma CPI da Petrobras. Ninguém, na grande mídia, dá a menor bola, porque este tipo de notícia mina a tese de que a corrupção está sempre ligada a governos populares, de Getúlio a Jango, de Lula a Dilma.

Neste e em tantos outros assuntos, os sites progressistas jogam luzes onde as corporações de jornalismo projetam sombras. (Fizemos,aqui, levantamentos sobre assuntos tabus na imprensa, como o “Helicoca” e a sonegação da Globo.)

Pessoas que são ignoradas pela mídia tradicional aparecem nos sites progressistas, e enriquecem os debates.

No DCM, para ficar num caso, Jean Wyllys é figura frequente. Vá ao arquivo da Veja e tente encontrá-lo.

pauta dos sites progressistas é outra. São outros os personagens, são outras as visões, são outros os princípios e valores.

São outros também os leitores. Veja os comentários do blogue de Reinaldo Azevedo: são o primado do ódio, do preconceito, da homofobia.

Agora compare com os comentários dos sites progressistas. São mundos diferentes.

Os anunciantes podem escolher o público que desejam atingir. Não fossem os sites progressistas, esta escolha não existiria.

Como seria o debate no Brasil de 2015 se não houvesse o contraponto digital?

Você pode imaginar.

O cidadão iria para o trabalho ouvindo a CBN ou a Jovem Pan. Leria a Folha e a Veja. Veria à noite o Jornal Nacional e a Globonews.

É sempre a mesma mensagem. A isso se dá o nome de monopólio de opinião.

Os sites progressistas surgiram e cresceram como resposta, exatamente, a esse monopólio.

É para isso que servem. É por isso que existem.

Paulo Nogueira
No DCM, via : http://www.contextolivre.com.br/2015/07/para-que-servem-e-por-que-existem-os.html

"Comunismo, Hipnotismo e os Beatles."


O chamado "anti-comunismo" teve seu auge principalmente no período da chamada "Guerra Fria", onde a disputa entre os EUA e a URSS não se restringiam apenas ao terreno geopolítico, mas possuía uma importante disputa cultural entre os defensores do "capitalismo" e do "comunismo".

Não apenas de renomados acadêmicos e políticos se deram este embates. Nos subterrâneos desta disputa, se produziram algumas bizarrice notáveis. Um exemplo disso é o livro de 1965 intitulado "Comunismo, Hipnotismo e os Beatles."

Com a autoria do líder religioso e escritor norte-americano David A. Noebel, ele denunciou em seu livro que o surgimento da "Beatlemania" era o resultado de um plano de doutrinação comunista via hipnose!!!

Mesmo os Beatles sendo britânicos (país aliado dos EUA) e pouco afeitos a manifestações políticas naquele momento, para o reverendo Noebel, o rock, a música popular entre a juventude, não passava de uma conspiração soviética para a lavagem cerebral da juventude americana.

Para provar sua teoria, são arrolados argumentos conspiratórios delirantes. Por exemplo, ele afirmou que as gravadoras comunistas invadiam as ondas de rádio, através de suborno, e com isso conseguiam infectar os jovens com música "não-cristã" (Sic)!

Apesar de toda a excentricidade desvairada dos argumentos anti-comunistas do reverendo Noebel, sua obra acabou ganhando relativa popularidade e teve influencia em alguns críticos conservadores do rock.
no: http://www.aldeiagaulesa.net/2014/02/comunismo-hipnotismo-e-os-beatles.html#.VaAzcPlViko

Saiba como de fato funciona o auxílio-reclusão no Brasil



Seguramente você já deve ter recebido inúmeras mensagens por e-mails ou em redes sociais "denunciando" o auxílio-reclusão. Usando informações fragmentadas, estas mensagens em tom de denuncia costumam carregar uma boa dose de desinformação, confusão nos fatos e um mal disfarçado preconceito social, servindo apenas para desinformar e alimentar toda a sorte de discursos de ódio.
Mas, como de fato funciona o auxílio-reclusão no Brasil?
 Para responder esta pergunta e tentar auxiliar para diminuir a desinformação espalhada na rede, seguem algumas informações sobre como o auxílio-reclusão funciona de verdade.


O que é o auxílio-reclusão?
É um benefício legalmente devido aos dependentes de trabalhadores que contribuem para a Previdência Social. Ele é pago enquanto o segurado estiver preso sob regime fechado ou semi-aberto e não receba qualquer remuneração da empresa para a qual trabalha, nem auxílio doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço. Dependentes do segurado que estiver em liberdade condicional ou em regime aberto perdem o direito de receber o benefício.

Todos os presidiários recebem o auxílio-reclusão?
Não, ao contrário do que afirma muitas correntes na internet, somente os familiares de presos que contribuíam para a Previdência Social tem direito ao benefício.

Esse benefício é pago ao preso?
O preso não recebe qualquer benefício. Ele é pago a seus dependentes legais. O objetivo é garantir a sobrevivência do núcleo familiar, diante da ausência temporária do provedor. Dessa forma, o auxílio-reclusão nada mais é do que a garantia de que a família de um indivíduo recolhido à prisão não será ela também “penalizada”.

Qual o valor do auxílio-reclusão?
Ao contrário das correntes online, que afirmam ser o auxílio-reclusão um benefício no valor de R$915,05, esta é apenas a renda limite para a concessão do benefício.
O auxílio-reclusão terá valor correspondente a 100% do salário-de-benefício, que, por sua vez, é a média dos 80% maiores salários-de-contribuição do período contributivo, a contar de julho de 1994. Dessa forma, o valor do auxílio-reclusão não é fixo e vai variar de acordo com as contribuições de cada segurado, sendo o valor de R$915,05 o valore máximo que uma família pode receber.


O auxílio-reclusão é proporcional à quantidade de dependentes?
Não. O valor do benefício é dividido entre todos os dependentes legais do segurado. É como se fosse o cálculo de uma pensão. Não aumenta de acordo com a quantidade de filhos que o preso tenha. O que importa é o valor da contribuição que o segurado fez. O benefício é calculado de acordo com a média dos valores de salário de contribuição.

O "povo" esta "pagando salários para presidiários"?
Está é uma das confusões que circulam na rede com grande frequência. O benefício é pago com orçamento da Previdência Social. O orçamento, por sua vez, é obtido através das contribuições dos filiados ao INSS. Ou seja, quem paga o auxílio-reclusão são os contribuintes do INSS, através das contribuições previdenciárias, e não todos os brasileiros, através de impostos, taxas, etc.
O INSS funciona como um seguro de automóvel, por exemplo. Todos os segurados contribuem e o seguro presta a assistência aos que necessitam. Há prazos de carência para alguns benefícios. Mas não é o caso do auxílio-reclusão. A partir da primeira contribuição previdenciária e enquanto o segurado mantiver esta qualidade, seus dependentes terão direito ao benefício.
Os contribuintes do INSS não pagam a conta apenas dos beneficiários presos. Pagam também a conta dos aposentados, dos enfermos, das viúvas, etc. Pela lógica, protestar contra o INSS financiar o auxílio-reclusão em nada se diferencia de protestar por financiar as aposentadorias dos idosos, por exemplo.

Que princípios norteiam a criação do auxílio?
O princípio é o da proteção à família: se o segurado está preso, impedido de trabalhar, a família tem o direito de receber o benefício para o qual ele contribuiu, pois está dentre a relação de benefícios oferecidos pela Previdência no ato da sua inscrição no sistema. Portanto, o benefício é regido pelo direito que a família tem sobre as contribuições do segurado feitas ao Regime Geral da Previdência Social.

Desde quando ele existe?
O auxílio não foi criado pelo PT, na verdade ele foi instituído já faz mais de 50 anos, pelo extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM) e posteriormente pelo também extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários (IAPB), e depois incluído na Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS (Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960). Esse benefício para dependentes de presos de baixa renda foi mantido na Constituição Federal de 1988, o consolidando como um direito dentro dos marcos republicanos.

A família do preso pode perder o direito de receber o auxílio?
Sim, desde que o segurado obtenha sua liberdade, fuja ou sua pena progrida para o regime  aberto. Pela legislação, os dependentes têm que apresentar a cada três meses, na Agência da Previdência Social, a declaração do sistema penitenciário atestando a condição de preso do segurado.

Quantos benefícios de auxílio-reclusão são pagos atualmente no país?
De acordo com o Boletim Estatístico da Previdência Social (Beps), o INSS pagou 33.544 benefícios de auxílio-reclusão na folha de janeiro de 2012, em um total de R$ 22.872.321. O valor médio do benefício por família, no período, foi de R$ 681,86.


Se ainda ficou alguma dúvida, consulte o site da Previdência Social.

Por Erick da Silva, no : http://www.aldeiagaulesa.net/2013/05/saiba-como-de-fato-funciona-o-auxilio.html#.VaAye_lViko

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Auditoria da Dívida da Grécia e os Segredos do Kapital.

A vitória do NÃO ( charge de Ferran Martín)
A vitória do NÃO ( charge de Ferran Martín)
“Vamos assenta-te agora no trono; apesar de angustiados
é conveniente deixar que as tristezas no peito se aplaquem.
Nada o homem lucra em deixar-se invadir pelo gélido pranto.
Sempre viver em tristeza: eis a sorte que os deuses eternos
de descuidada existência aos mortais infelizes dotaram.
Sobre os umbrais do palácio de Zeus dois tonéis se acham postos
de suas dádivas; um só de males; de bens o outro cheio.
Se misturando-as Zeus grande senhor dos trovões as derrama
quem as recebe ora goza ora males por sorte lhe tocam;
mas o que dele recolhe somente infortúnios escárnio
vivo se torna; em extrema miséria na terra divina
é condenado a vagar desprezado por homens e deuses”. (Ilíada, Homero)
Acompanho a Crise 2.0 e escrevo sobre ela desde abril de 2011, o que rendeu um livro aqui publicado, mas o mais importante é que também rendeu alguns insights sobre o funcionamento do Kapital, mesmo sem ser economista, pesquisador ou contador. Além de conhecer alguns fundamentos de análise do Kapital desenvolvidos por Marx, procuro observar atentamente alguns fenômenos, que passam despercebidos a muitos pela dinâmica de nossas vidas corridas e a forma como são descritos na mídia.
No caso da dívida grega, em artigos de 2011/ 2012, tinha notado que o perfil dela era com os bancos privados, em especial os da França (39%) e os da Alemanha (27,5%), daí a crueza do tratamento despendido por Merkel e Sarkozi (Hollande) aos vários líderes gregos. Entretanto, não caía bem um líder de um Estado vociferar e ameaçar outro Estado por dívidas privadas, não havia instrumento de pressão que justificasse tal comportamento.
Analisando os números da dívida grega dos anos mais recentes, em especial quem eram seus credores, percebi que houve uma mudança radical no perfil deles, praticamente sumiram os bancos privados, sendo, agora, os novos donos dos títulos a Troika ( BCE, UE e FMI). No artigo (#OXI, o NÃO da Grécia.) de ontem fiz as seguintes conclusões, puramente intuitivas:
“Obviamente, a Troika (BCE, UE e FMI) “estatizou” a dívida grega comprou os títulos dos bancos privados, os maiores credores gregos até então, assim, a Troika, se tornou a dona dos destinos do povo grego, impondo um plano de austeridade inexequível, “que a Grécia deveria a sair de uma recessão que dura desde 2009. A economia contraiu cerca de 25 por cento e a dívida disparou para 175 por cento do PIB, o equivalente a 324 bilhões de euros, segundo Open Europe e o Mecanismo europeu de Estabilidade Financeira. É uma situação que ultrapassa em muito os limites fixados pelos tratados europeus, isto é, um endividamento de 60 por cento do PIB. (Euronews, 06/07/2015).
Sem mais riscos privados, os abutres do Kapital aparecem para “resolver” a questão, no Estadão de domingo, Alan Greenspan, declarou que acha ser uma questão de tempo a Grécia sair do bloco. “Acredito que a Grécia abandonará a zona do euro. Não acho que permanecer no euro é vantajoso para os gregos ou para o resto da zona do euro. É só uma questão de tempo antes de todo mundo reconhecer que a saída (da Grécia) é a melhor estratégia”.
Hoje no site Euronews, as palavras vão ao mesmo sentido, “No parlamento Europeu, o presidente da Comissão, Jean Claude Junker, disse que fará tudo para evitar a saída da Grécia da zona euro, mas que “há países que, aberta ou secretamente, trabalham para excluí-la”. A bola está do lado do governo grego que terá que explicar como tenciona desenvencilhar-se desta situação. A Comissão Europeia, por seu turno, está disposta a fazer tudo para encontrar um acordo num prazo aceitável”, afirmou”.
Foi a minha conclusão final de que, para exercer o poder político diretamente, sem questionamento legal, Merkel, a comandante-em-chefe da Troika, matou dois coelhos de uma cajadada só: Primeiro, salvou os banqueiros (seus patrões) comprando os títulos gregos (até os mais tóxicos, puramente especulativos). Segundo, passou a exercer a autoridade de fato e de direito sobre os destinos gregos, não é a toa que TODOS os líderes gregos eleitos tinham que bater continência a ela, suas primeiras viagens eram sempre a Berlim.
Porém, precisava de mais dados que fundamentasse tal conclusão, fui pesquisar e encontrei um longo e preciso artigo de Maria Lucia Fattorelli (Le Monde Diplomatique – 01/07/2015 – site Opera MundiAnálise: Tragédia Grega esconde segredo de bancos privados. Ela descreve detidamente os dados que me faltavam, os meios pelos quais os títulos públicos gregos, em posse dos bancos privados foram recomprados pela Troika, o trabalho é explosivo. Há uma comissão da verdade da dívida grega no seu parlamento que demonstra a manobra e a conivência das autoridades gregas. O NÃO, agora nos parece até pouco diante da manobra.
Fattorelli, abre seu artigo dizendo que  “A Grécia está enfrentando um tremendo problema de dívida pública e uma crise humanitária. A situação atual é muitas vezes pior do que a de 2010, quando a Troika –FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu – impôs seu “plano de resgate” ao país, justificado pela necessidade de apoiar a Grécia. Na realidade, tal plano tem sido um completo desastre para a Grécia, pois o país não tem obtido absolutamente nenhum benefício com os peculiares acordos de dívida implementados desde então”.
Segue provocando-nos: “O que quase ninguém comenta é que um outro exitoso plano de resgate foi efetivamente implementado naquela mesma época em 2010, não para a Grécia, mas para os bancos privados. Por trás da crise grega há um enorme e ilegal plano de resgate de bancos privados. E a forma pela qual tal plano está se dando representa um imenso risco para toda a Europa.
Depois de cinco anos, os bancos conseguiram tudo o que queriam. Por outro lado, a Grécia mergulhou numa verdadeira tragédia: o país aprofundou gravemente seu problema de dívida pública; perdeu patrimônio estatal à medida em que acelerou o processo de privatizações, assim como encolheu drasticamente sua economia. Pior que tudo, tem amargado imensurável custo social representado pelas vidas de milhares pessoas desesperadas que tiveram seu sustento e seus sonhos cortados pelas severas medidas de austeridade impostas desde 2010. Saúde, educação, trabalho, assistência, pensões, salários e todos os demais serviços sociais têm sido afetados de forma destrutiva”.
A manobra é assim descrita:
Em Maio de 2010, ao mesmo tempo em que todas as atenções estavam focadas nas abundantes notícias sobre a interferência da Troika na Grécia, com seu peculiar “plano de resgate” grego, um outro plano de efetivo resgate bancário viabilizado por um conjunto de medidas ilegais também estava sendo aprovado, mas atenção alguma foi dispensada a esse último.
Em uma tacada, sob a justificativa de necessidade de “preservar a estabilidade financeira na Europa”, medidas ilegais foram tomadas em maio de 2010, a fim de garantir o aparato que permitiria aos bancos privados livrar-se da perigosa “bolha”, isto é, da grande quantidade de ativos tóxicos – em sua maioria títulos desmaterializados e não comercializáveis – que abarrotava contas “fora de balanço”[1] em sua escrituração contábil. O objetivo principal era ajudar os bancos privados a transferir tais ativos tóxicos para os países europeus.
Uma das medidas adotadas para acelerar a troca de ativos de bancos privados e acomodar a crise bancária foi o programa SMP[2], mediante o qual o BCE (Banco Central Europeu) passou a efetuar compras diretas de títulos públicos e privados, tanto no mercado primário como secundário. A operação relativa a títulos públicos é ilegal, pois fere frontalmente o Artigo 123 do Tratado da União Europeia[3]. Tal programa constitui apenas uma entre várias outras “medidas não-padronizadas” adotadas na época pelo BCE.
A criação de um “Veículo de Propósito Especial”, uma companhia baseada em Luxemburgo, constituiu outra medida implementada para transferir ativos tóxicos desmaterializados dos bancos privados para o setor público. Acreditem ou não, países europeus[4]se tornaram sócios de tal companhia privada, uma sociedade anônima chamada Facilidade para EFSF (Estabilidade Financeira Europeia)[5]. Os países se comprometeram com bilionárias garantias, inicialmente no montante de 440 bilhões de euros[6], que logo em 2011 subiram para 779.78 bilhões de euros[7]. O verdadeiro propósito de tal companhia tem sido disfarçado pelos anúncios de que ela iria providenciar “empréstimos” para países, fundamentados em “instrumentos financeiros”, não em dinheiro efetivo. Cabe mencionar que a criação da EFSF foi uma imposição do FMI[8], que lhe forneceu uma contribuição de 250 bilhões de euros[9]“.
O artigo é longo e esclarecedor, vale a leitura completa.
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Notas sobre o artigo e sobre Fattorelli.
*Maria Lucia Fattorelli é graduada em Administração e Ciências Contábeis. Auditora Fiscal da Receita Federal desde 1982, é coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida e membro do CAIC (Comisión para la Auditoría Integral de Crédito Público) criada pelo Presidente Rafael Correa em 2007.

[1] “Fora de balanço” significa uma seção à margem da contas normais que fazem parte do balanço contábil, onde ativos problemáticos, tais como títulos desmaterializados, não comercializáveis, são informados.
[2] Securities Markets Programme (SMP) – EUROPEAN CENTRAL BANK. Monetary policy glossary. Disponível em: https://www.ecb.europa.eu/home/glossary/html/act4s.en.html#696 [Acessado em 4 de Junho de 2015]
[4] Países Membros da zona do Euro ou Sócios da EFSF: Reino da Bélgica, República Federal da Alemanha, Irlanda, Reino da Espanha, República da França, República da Itália, República de Chipre, República de Luxemburgo, República de Malta, Reino da Holanda, República da Áustria, República de Portugal, República da Eslovênia, República da Eslováquia, República da Finlândia e República Helênica.
[5] A companhia privada EFSF foi criada como um instrumento do MECANISMO DE ESTABILIZAÇÃO FINANCEIRA EUROPEIA (EFSM): http://ec.europa.eu/economy_finance/eu_borrower/efsm/index_en.htm
[6] EUROPEAN COMMISSION (2010) Communication From the Commission to the European Parliament, the European Council, the Council, the European Central Bank, the Economic And Social Committee and the Committee of the Regions – Reinforcing economic policy coordination. http://ec.europa.eu/economy_finance/articles/euro/documents/2010-05-12-com(2010)250_final.pdf– Página 10.
[7] IRISH STATUTE BOOK (2011) European Financial Stability Facility and Euro Area Loan Facility (Amendment) Act 2011.  Disponível em: http://www.irishstatutebook.ie/2011/en/act/pub/0025/print.html#sec2 [Acessado em 4 Junho de 2015].
[8] Depoimento de Dr. Panagiotis Roumeliotis, representante da Grécia junto ao FMI, para o “Comité da Verdade sobre a Dívida Pública”, no Parlamento Grego, em 15 de junho de 2015.
[9] EUROPEAN FINANCIAL STABILITY FACILITY (2010) About EFSF [online] Disponível em: http://www.efsf.europa.eu/about/index.htm e http://www.efsf.europa.eu/attachments/faq_en.pdf – Question A9 [Acessado em 4 Junho de 2015].
do: http://arnobiorocha.com.br/2015/07/08/auditoria-da-divida-da-grecia-e-os-segredos-do-kapital/