domingo, 22 de dezembro de 2013

Retrospectiva DCM 2013: Especial “Os malas sem alça do ano”


A Internet tem o dom de amplificar a estupidez das pessoas. Vivemos uma era em que, a cada dia, um panaca fala ou faz alguma besteira. Em homenagem a essas pessoas especiais, criamos a lista dos Maiores Malas de 2013. Queremos agradecer à equipe de especialistas que nos ajudou a chegar a esses nomes que trouxeram diversão e arte ao Brasil. Vamos a eles:

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Marco Feliciano

O deputado pastor chamou atenção para uma comissão que ninguém sabia que existia, mas pelas razões erradas. Homofóbico, obtuso, oportunista, vaidoso, simonista, ele saiu da obscuridade para a obscuridade. Faz chapinha e canta. Firmou-se como a nova estrela da direita evangélica e da Teologia da Prosperidade, uma seita que usa a Bíblia para justificar que enriquecer é divino, especialmente roubando o dinheiro dos fieis. Começou o ano dizendo que o continente africano era amaldiçoado e terminou declarando que Mandela “implantou a cultura da morte” na África do Sul por causa das leis do aborto. Ainda teve tempo de pedir, num culto, um carro para a filha, na maior cara de pau. Foi atendido por Jesus, na pessoa de um pobre coitado que lhe presenteou com o carro da mulher.

Um problema nacional

Joaquim Barbosa

Com sua eterna dor nas costas (por que não se trata?), o presidente do STF foi um espetáculo de arrogância, hipocrisia e sede de vingança. Pegou avião da FAB para ver jogo no Maracanã no camarote de Luciano Huck, chefe de seu filho; comprou apartamento em Miami em circunstâncias mal explicadas; pediu cabeça de repórter; o diabo. Além de tudo, JB é o tipo de sujeito que se compraz com o sofrimento de suas vítimas. Na definição precisa do jurista Celso Bandeira de Mello, professor da PUC há 40 anos: “É um homem mau, com pouco sentimento humano.” É um homem mau.

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Eike Batista

O homem mais rico do Brasil era uma bolha e explodiu. Foi uma falência espetacular, depois de anos prometendo entregar o que não existia — tudo emoldurado por frases de efeito de “vencedor”, fotos do Porsche na sala de estar e aquela indefectível peruca italiana. Sua fortuna derreteu de estimados 10 bilhões de dólares para 73 milhões. Há algumas semanas, saiu para jantar com Ronaldo Fenômeno e alguns amigos e o pessoal fez questão de pagar a conta. A Forbes o comparou ao Rei do Camarote.

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Rei do Camarote

Alexander Augusto de Almeida foi apresentado ao mundo pela Veja São Paulo. Ele contava que tinha uma Ferrari e gastava até 50 mil reais numa balada. Tudo lindo. Mas de onde vinha esse dinheiro todo? Alexander é um zangão do Detran, que trabalha para os bancos ferrando as pessoas que não conseguem pagar as prestações do carro. Devia 55 mil reais de IPTU. Alçado à condição de subcelebridade, deu entrevistas na televisão, protagonizou um vídeo que se tornou viral e já voltou à condição de babaca anônimo.

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Justin Bieber

A criança mais chata do showbizz veio ao Brasil “cantar” para fãs que dormiram em barracas montadas na fila dos ingressos. Foi a um lupanar no Rio de Janeiro, fez xixi na rua, dormiu com uma garota de programa que depois fez um vídeo, pichou o muro enquanto os seguranças olhavam, saiu do hotel onde estava hospedado porque não deixaram que ele brincasse de submarino na piscina. Na Argentina, limpou o chão com a bandeira do país e foi declarado persona non grata. A boa notícia é que avisou que vai se aposentar. A má é que é mentira.

Ele

Lobão

Depois de lançar o livro “Manifesto do Nada na Terra do Nunca”, o músico aderiu às hostes de Olavo de Carvalho e descobriu que o Brasil é uma ditadura comunista-chavista-gayzista dominada pelas FARCs. Trocou a obsessão por Herbert Vianna, a quem reputava ter arruinado sua carreira, por Lula, Dilma e o PT. Mente descaradamente, como quando falou que passou onze anos numa lista negra do “doutor” Roberto Marinho na Globo. Ganhou uma coluna na Veja e ainda vai dar muito trabalho para si mesmo.

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Danilo Gentili

O ex-comediante teve um ano inesquecível. Não fez uma piada decente, um esquete divertido, uma tirada inteligente, mas conseguiu ofender negros, homossexuais e uma mulher que doava leite para hospitais. Quando é processado, reage dizendo que é perseguido pelo governo e que foi censurado. A única censura real que teve foi em sua emissora, que vetou seu especial de fim de ano, mas sobre isso ele corajosamente se cala. Diz que seu humor débil mental e covarde é politicamente incorreto — não é, é apenas débil mental e covarde. Seu último grande lance foi chamar uma moça que o criticou de “puta” no Twitter e insuflar seus seguidores para que a linchassem. Gosta de plantar notinhas sobre supostos convites de outras emissoras. Um bom nome para substituir Regina Cazé no “Esquenta”.

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A polícia nas manifestações

Sem treino, sem estratégia, sem paciência, sem noção, mas com muita vontade de partir para a porrada, a polícia de todos os estados deu demonstrações de que não tem a menor condição de lidar com protestos como os ocorridos a partir de junho. Fotógrafos cegos com balas de borracha, bombas de gás lacrimogêneo, cacetadas em casais sentados em bares — essa foi a língua utilizada pela PM para dialogar com os manifestantes. A violência foi útil para levantar a discussão acerca da desmilitarização da força policial. Gente de todas as esferas deu sua opinião. Especialistas do Brasil e de fora discutiram o tema. Como era de se esperar, não deu em nada.

Inútil

Roger do Ultraje

Veja Danilo Gentili.

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Miley Cyrus

Ela cresceu, não é mais a Hannah Montana e quer muito que as pessoas saibam disso. Muito. E entseguiu o script de Britney Spears e outros antigos ídolos teens: pirou. Fez um clipe nua balançando numa bola de ferro, lambeu um martelo (!?), se apresentou num prêmio da MTV se esfregando no cantor Robin Thicke. Como presente de Natal para os fãs, tirou uma foto de topless agradecendo a Nova York por ser um dos “poucos estados a libertar o mamilo”.

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Roberto Carlos

O Rei proibiu um livro sobre a Jovem Guarda porque não gostou das ilustrações, mas aquele era só o prenúncio do que viria. Mentor do grupo Procure Saber, que lutou pela não autorização das biografias não-autorizadas, RC acabou dando um nó em seus colegas de MPM ao aparecer no “Fantástico” todo pimpão numa postura aparentemente mais moderada. Destituiu Paula Lavigne, colocou no lugar o advogado dele, Kakay, e levou a briga para os corredores escuros de Brasília. A boa notícia é que, neste ano, não lançou nenhuma canção nova. “Esse Cara Sou Eu” manterá preenchida sua cota de porcarias por mais alguns anos.

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Os jurados do The Voice

Carlinhos Brown, Claudia Leitte, Lulu Santos e Daniel são a hidra de quatro cabeças do novo sucesso da Globo, o programa de calouros “The Voice”. Eles são jurados e técnicos dos rapazes e moças que tentam a sorte cantando como Christina Aguilera — o chamado oversinging, com muito vibrato, inventando notas onde elas não existem e fingindo que aquilo é feeling. Todos os juízes se amam e se completam: Claudia Leitte é a boazinha; Daniel é o bocó; Lulu é o professor; Brown é o Brown. Se a música brasileira estava sob a ameaça do sertanejo, do funk e do pagode, a situação complicou de vez com a ajuda do quarteto.

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Dinho Ouro Preto

Recordemos o discurso imortal do nosso tiozinho no Rock In Rio: “Vamos usar a cabeça, cara. Esse Natan Donadon, esse cara, nosso primeiro presidiário congressista, cara. O próprio Congresso, cara, por ter mantido o cargo desse sujeito, falou, cara. Então, cara, cada um de vocês pode fechar os olhos de vocês, cara, e escolher o seu preferido, cara, eu prefiro, cara, dedicar ao parlamento brasileiro pelo conjunto da obra. Tá ligado, véio (aeee!). Eu tenho a seguinte impressão, cara, quando neguinho olha lá de cima, de Brasília, para o resto do Brasil, cara, olha para baixo, cara, para a planície, eles olham 200 milhões de cidadãos assim, ó. (Coloca um nariz de palhaço). Essa aqui é pra Brasília, essa aqui se chama Saquear Brasília, e vai assim, cara”. Dito isto, cremos ter dito tudo.

Os Perrellas

Os Perrellas

Aliados de Aécio em Minas, amigos torcedores do candidato do PSDB à presidência, o senador Zezé Perrella e seu filho, o deputado estadual Gustavo, estão entre as maiores fortunas do estado. Gustavo tinha sob seu nome o helicóptero apreendido com 445 quilos de cocaína no Espírito Santo. Ele contratou o piloto, que era funcionário da Assembleia Legislativa. É óbvio que nenhum deles sabia de nada. Como poderiam saber, é ou não é? O delegado da Polícia Federal responsável pela apreensão já descartou a participação dos Perrellas — sobrenome, aliás, “emprestado” da família de imigrantes italianos cujo frigorifico Zezé comprou nos anos 70.

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José Serra

O Careca continua causando. Fez que ia mudar de partido, desistiu, acabou ficando no PSDB. Já avisou que desistiu de concorrer à presidência. Os “amigos” tentam convencê-lo a sair para deputado federal. Com o escândalo do metrô em São Paulo, sua antiga imagem de “bom gerente” — seja lá o que isso queria dizer — também foi para o ralo. Um annus horribilis para JS, a mala eterna do PSDB. De uma coisa podemos estar certos: os artigos de fundo perpetrados por uma das cabeças mais brilhantes de sua geração continuarão sendo publicados no “Estadão”.

FLUMINENSE X GUARANI

O Fluminense e o STJD

A campanha medíocre do time carioca foi salva no tapetão pelo STJD, que atirou a Portuguesa à série B. Foi o desfecho fúnebre de um campeonato desorganizado e suspeito, com cenas de guerra civil nos estádios. Com a decisão, o STJD ajudou o Flu a se tornar o time mais odiado do Brasil. Torcedores foram hostilizados nas ruas. O atacante Rafael Sobis foi xingado no Galeão. O ano que vem promete para o Tricolor carioca.

Ela

Rachel Sheherazade

A musa neoconservadora bíblica bateu em toda e qualquer ameaça à família e aos bons costumes: em gays, em “abortistas”, na legalização da maconha no Uruguai, nos “arruaceiros” que invadiram os shoppings, nos índios, nos “liberais”, no Mais Médicos, no Genoíno etc. O único poupado em suas catilinárias é Joaquim Barbosa, chamado por ela de “Paladino da Justiça”. Deu também conselhos para o papa sobre como modernizar a Igreja. Rachel sabe de tudo. É a prova viva da grande máxima de Bertrand Russell: “O problema com o mundo é que os idiotas são cheios de certeza e os sábios cheios de dúvidas.”

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As atrizes da Globo em luto pelo Brasil

Parece que a ideia foi da atriz Bárbara Paz. Como deu errado e virou motivo de piada no país inteiro, a ideia ficou órfã. Mas foi o seguinte: ela e suas colegas de novela ficaram chateadas por causa dos embargos infringentes. Bárbara, Carol Castro, Rosamaria Murtinho, Nathalia Timberg e Susana Vieira, então, se vestiram de preto, fizeram uma cara entre a indignação, o banzo e a constipação, mandaram o office boy tirar fotos e as postaram no Instagram. Em minutos várias versões surgiram na Internet, muito melhores que as originais — e mais fieis à fanfarronice que elas perpetraram.

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Pessoas que fazem fotos de comida e selfies no Instagram

Parem. Apenas parem.
Sobre o Autor
Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

Espírito natalino e consumismo exacerbado





O espírito natalino desnuda a realidade mais cruel do modelo no qual estamos sendo conduzidos. Não basta só o consumo. É necessário o consumismo exacerbado.

Jaciara Itaim, Carta Maior

A chegada do mês de dezembro reproduz a cada ano cenas que poderiam ser consideradas completamente irracionais por algum alienígena que se aproximasse de nosso País. Estamos em pleno final de ano, auge do verão aqui no hemisfério sul, com temperaturas bastante elevadas. No entanto, os ambientes todos estão tomados por indivíduos fantasiados com roupas pesadas e quentes, imitando a figura emblemática e mitológica do Papai Noel. A tentativa é de reproduzir o contexto da Lapônia, uma província da Finlândia, onde as temperaturas podem atingir mínimas de -20° C nessa época do ano.

Vem daí então o imaginário da neve, do pinheirinho, do trenó com as renas e tudo o mais que cerca o ambiente de Natal. Estranho sincretismo esse que conseguiu unir as tradições bíblicas que envolvem o nascimento de Jesus às estórias fantásticas do velhinho barbudo do norte europeu em um território equatorial e do outro lado do Oceano Atlântico. A tradição dos presentes - que remonta, na verdade, à chegada dos reis magos no dia 6 de janeiro - foi sendo aos poucos substituída pela pressão social em torno da oferta dos presentes no próprio dia do nascimento do menino Jesus.

Consumir, consumir, consumir e oferecer

Assim, o espírito natalino se converteu à sanha das compras e das aquisições. Festejar o Natal passou a ser sinônimo de desejo de consumo, impulso expresso por todos - desde as crianças até os adultos de todas as idades e gerações. As cartas ingênuas à entidade desconhecida de barriga grande e barbas brancas, as trocas de presentes no ambiente de trabalho, as festas familiares com as encomendas acertadas previamente ou sob efeito surpresa do amigo-secreto. Pouco importa a forma, uma vez que o essencial é um elemento apriorístico: o consumo.

É importante reconhecer que a realidade brasileira é pródiga na criação e na ampla aceitação social de datas “comemorativas”, onde o foco é sempre o presentear outrem por meio de compras. Apesar de o Natal ocupar, de longe, o primeiro lugar em importância e em faturamento, na seqüência surgem outros momentos que são utilizados para que a indústria e o comércio esquentem seus motores ao longo do ano. É o caso do Dia das Mães, Dia dos Namorados, Dia das Crianças e Dia dos Pais, para citar alguns exemplos. Para além das questões de natureza cultural e de sociabilização, a grande marca deixada pelas organizações que constituem a nossa formação capitalista relaciona-se ao verbo comprar. Ou seja, transformar esse misto de desejo e de imposição social em circulação de mercadoria, em movimentação acelerada de valores de troca e de valores de uso.

Nesse aspecto, ganha relevância o papel desempenhado pelas estruturas de propaganda e marketing. Trata-se da criação de necessidades sociais e culturais de forma artificial e exógena, em processos onde os indivíduos se sintam motivados a desenvolver determinadas ações ou a adotar certos comportamentos em nome de uma espécie de “unanimidade construída”. O verdadeiro bombardeio a que estamos todos submetidos por várias semanas antes mesmo da data da ceia tem uma mensagem muito clara. Natal feliz é Natal com presente. Quem não recebe nada comprado na data deve se sentir menosprezado ou desprezado por aqueles que o cerca. Quem se atreve a não comprar presentes para oferecer não merece o carinho nem o bem querer de seus pares. A comemoração é fortemente carregada do elemento simbólico: o querer é avaliado a partir da quantidade, da exuberância e dos preços.

A criação das necessidades e a generalização das compras

Vale recordar, por outro lado, a importância adquirida por uma forma muito especial, em meio à multiplicidade de estratégias mercadológicas: a publicidade dirigida ao público infantil. Apesar da festa não ser dirigida apenas às crianças, o foco recai sobre essa parcela expressiva da população, que termina por exercer influência significativa sobre as decisões das famílias no período. Ainda que os espaços de tangência entre a ética e a legalidade estejam presentes em todo o tipo de propaganda, no caso específico do universo infantil a situação é ainda mais escabrosa. São pessoas ainda em processo de formação e amadurecimento, sem quase nenhuma capacidade de discernimento entre o necessário e o supérfluo, entre o real e a fantasia, com pouca referência a respeito de preços e capacidade de aquisição. Ou seja, é o caso típico de atividade que deve ser proibida por lei - em razão de seus reconhecidos efeitos nocivos para o conjunto da sociedade – e não ser liberada em nome da liberdade do mercado e da possibilidade de amplo de acesso à informação.

O padrão civilizatório hegemônico nos tempos atuais determina que a conquista da felicidade e a vigência do bem estar estão intimamente associados à capacidade do indivíduo ter e comprar. A posse dos bens é elemento sempre martelado pelos meios de comunicação, a todo momento associada à imagem da pujança, da beleza e do amor. Quem tem, pode. Quem tem mais, pode mais. Quem tem mais caro, pode ainda muito mais. Ocorre que na sociedade capitalista, a tendência é a da generalização das relações mercantis. Assim, via de regra, para se ter algo é necessário processar o ato da compra. A relação de troca se realiza por meio do equivalente geral, o dinheiro. E para os que ainda não reúnem as condições de recursos para a compra do presente desejado, o sistema oferece o instrumento mágico que permite a antecipação do consumo: o crédito.

A intermediação da esfera financeira ajuda a completar o ciclo da realização do capital, com a garantia de que o consumo se efetive mesmo na ausência dos recursos monetários no momento da aquisição do bem. Isso porque o modelo envolvido na dinâmica do capitalismo pressupõe a produção e a venda das mercadorias de forma contínua, sempre em escala crescente, para promover a acumulação concentrada de riqueza.

Esmagamento do espaço para práticas de sustentabilidade

De forma geral, a lógica que orienta a ação da empresa privada é a da maximização do lucro no curto prazo, sem nenhuma perspectiva de médio e longo prazo. No jogo pesado das disputas por novas fatias de mercado não existe muito espaço para a noção da sustentabilidade. Pouco importa se ela se refere ao aspecto econômico, ao elemento social ou à sua dimensão ambiental. Assim, o que interessa na “racionalidade” inerente ao processo de acumulação de capital é o crescimento do consumo em toda e qualquer escala. Portanto, a mudança comportamental envolvendo inovações como “consumo consciente” ou “processos sustentáveis” só se viabilizam com a entrada em cena das políticas públicas, proibindo determinadas ações ou estimulando outras alternativas. A lógica pura do capital, atuando com plena liberdade, combina uma dialética de criação e destruição em sua própria essência. 

Assim, o que todos verificamos à nossa volta com a aproximação do espírito natalino é a cristalização mais evidente da forma de funcionamento da economia capitalista. Nas sociedades hegemonizadas pelo padrão civilizatório do mundo ocidental, o mês de dezembro radicaliza e potencializa o comportamento social que assegura a reprodução ampliada dessa forma particular de organização social e econômica. Não basta um Natal que seja marcado apenas pelo espírito da solidariedade e pelo sentimento da fraternidade. O período das festas deve ser o momento do consumo, por excelência.

Os ingredientes que contribuem para manter esse gigante em movimento são introduzidos de forma crescente ao longo do processo. Isso significa a incorporação crescente de bilhões de novos agentes no mercado consumidor e a generalização do acesso às compras em escala global. Além disso, torna-se necessário avançar bastante nos processos envolvendo a chamada “obsolescência programada”, de forma a garantir a continuidade do ciclo de consumo por meio da redução da vida útil dos produtos. A propaganda também joga um papel essencial, ao incutir nos indivíduos valores e desejos que estão muito distantes das necessidades, digamos, mais reais e concretas.

Em suma, não é mais suficiente que as pessoas exerçam sua função de compradores finais de bens e serviços. O espírito natalino desnuda a realidade mais cruel do modelo no qual estamos sendo conduzidos. Não basta apenas o consumo. Faz-se necessário o consumismo exacerbado."

(*) Economista e militante por um mundo mais justo em termos sociais e econômicos.