sexta-feira, 22 de novembro de 2019

ESTAMOS NUMA DEMOCRADURA E AVANÇA CADA VEZ MAIS A CONTAGEM REGRESSIVA PARA UMA EXPLOSÃO SOCIAL

Estamos próximos, no Brasil de hoje, daquilo com que sonhavam os golpistas de 1964, ao planejarem uma intervenção cirúrgica para eliminar a influência da esquerda nos Poderes da nação, nos veículos de comunicação, nos sindicatos, nas instituições de ensino e no movimento estudantil, principalmente, para em seguida devolverem uma democracia expurgada e reformatada.

Mas, o arbítrio que era para durar poucos anos acabou estendendo-se por 21, durante os quais, na verdade, só se poderia enxergar uma ditabranda (conforme pretendeu a Folha de S. Paulo, num dos editoriais mais infelizes de sua história) no período final, sob João Baptista Figueiredo (1979-1985). O leão já estava desdentado, após os sucessivos fracassos no front econômico lhe retirarem a última justificativa para sua existência, deixando a ditadura em agonia lenta.

A situação atual, contudo, lembra mais o período de 1965 a 1967, quando o furor subsequente à usurpação do poder deu lugar a uma espécie de resignação e pasmaceira, com a contestação ao regime sendo banida das ruas, praças e locais de trabalho, mas consentida na música popular, no cinema e no teatro (a resistência a eles era tão ínfima que os militares se davam ao luxo de vestir a fantasia de déspotas esclarecidos...). 
Aí tivemos a escalada de radicalização ao longo de 1968, culminando em dezembro com a assinatura do Ato Institucional nº 5, que iniciou o período mais extremado e bestial do regime militar.

Durante as trevas absolutas que vão da entrada em vigor do AI-5 até o final do mandato de Emílio Médici em março de 1974, foram 279 os oposicionistas assassinados (baseio-me no relatório final da Comissão Nacional da Verdade, mas não levo em conta a divisão meramente formal entre aqueles cuja morte foi provada e aqueles cuja existência evaporou sem deixar rastros...) e acrescentaram-se mais 12 atos institucionais à legislação de exceção.

Já no período 1965/67  os atos institucionais foram apenas três e os assassinados, 12, em contraste chocante com o morticínio de 1964 (27 mortos!!!), quando a vitória da quartelada foi comemorada à moda dos selvagens.

A comparação com a democradura de hoje se impõe. 

Então, o sistema mudava leis e extinguia direitos consolidados a bel-prazer, contando com a conivência de um Congresso que fora domesticado por meio das cassações de mandatos que modificaram a correlação de forças e intimidaram os oposicionistas salvos da degola.

Agora, os parlamentares estão exultantes com o semi-parlamentarismo decorrente da inapetência para o cargo do presidente-bufão, que lhes permitiu herdarem o papel de principais executantes das determinações do poder econômico, enquanto ele próprio se ocupa de ninharias e baixarias.
Pasmem: os patrões do PT rezam pela mesmíssima cartilha!

As pressões sobre a cultura, a imprensa e as instituições de ensino são ainda maiores atualmente do que naquele intervalo histórico. 

O movimento estudantil até agora não sofreu repressão comparável, p. ex., à desencadeada quando da setembrada de 1966, mas ainda é cedo para soltarmos suspiros de alívio: 2020 se prenuncia um ano sujeito a intempéries, à medida que ficar claro para os brasileiros que as reformas neoliberais do Paulo Guedes produzirão aqui o mesmíssimo resultado que estamos constatando ultimamente no Chile (após anos e anos de retórica triunfalista dos mercadores de ilusões!).

Mas, a principal diferença entre o despotismo esclarecido de 1965/1967 e a atual democradura é que a esquerda brasileira efetuou então o processo mais aprofundado de crítica e autocrítica de toda sua história, questionando erros cometidos e atuações desastrosas, para daquela derrota acachante extrair todas as lições aproveitáveis, no sentido de sua ampla reconfiguração. 

Havia a consciência de que jamais poderia ser repetido fracasso tão humilhante quanto o da derrubada do governo João Goulart sem nenhuma resistência significativa por parte daqueles que até a véspera diziam que já estavam no poder (dou nome ao boi: o fanfarrão Luiz Carlos Prestes).

Hoje, pelo contrário, o PT conseguiu evitar que suas terríveis lambanças fossem colocadas em xeque em 2016, quando do impeachment de Dilma Rousseff, e ameaça repetir o feito agora, se o posicionamento stalinista do Lula a respeito da autocrítica prevalecer.

A autocrítica abortada de 2016 nos conduziu à entrega do poder à extrema-direita em 2018. A nova Operação Abafa nos levará aonde? 

A uma ditadura sanguinária explícita, como sonham Olavo de Carvalho e seus miquinhos amestrados? 

Ou a um despotismo esclarecido permanente, como poderia ter ocorrido caso a esquerda não houvesse redescoberto a combatividade perdida em 1968?

No fundo, nosso povo não sairá da dramática e degradante situação atual se a subjugação ao poder econômico for imposta com a vaselina do Legislativo e do Judiciário, muito menos se com o ferro em brasa dos inquisidores redivivos.

Ou forjamos uma nova esquerda, reciclamos nossa atuação e reassumimos o protagonismo político, ou assistiremos impotentes, de braços cruzados, à explosão social que inevitavelmente decorrerá dos rigores neoliberais que nos estão sendo enfiados goela abaixo. (por Celso Lungaretti)

BOLSONARO CHEGOU A SE DEFINIR COMO "CAPITÃO MOTOSSERRA". ENTÃO OS CRIMINOSOS SE ASSANHARAM

josias de souza
"CULTURA DO DESMATAMENTO" 
É IGNORÂNCIA DO CAPITÃO
Jair Bolsonaro disse que o desmatamento e as queimadas não vão acabar porque são fenômenos culturais. A cultura de um povo também serve para dimensionar a ignorância dos seus dirigentes. E a ignorância de Bolsonaro parece possuir dimensões amazônicas. 

É evidente que desmatamentos e queimadas não começaram em 1º de janeiro de 2019, quando Bolsonaro tomou posse. Mas o presidente, com suas palavras e seus gestos, estimulou os dois fenômenos. 

Isso deixou de ser uma suposição depois da divulgação dos dados consolidados do Inpe, que revelaram a derrubada de quase 10 mil km² de mata, num crescimento de quase 30% em relação aos 12 meses anteriores. 

A coisa degringolou porque o presidente e o seu anti-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles deram de ombros para os alertas científicos do Inpe e desmontaram o aparato fiscalizatório do Ibama e do ICM-Bio. 
Bolsonaro chegou a se autodefinir como capitão motosserra. Deu no que está dando. Os criminosos se assanharam. Mas o presidente se recusa a extrair ensinamento dos seus próprios erros. 

Grande admirador dos Estados Unidos, Bolsonaro deveria inspirar-se no ex-presidente Roosevelt. Ele dizia que a Presidência da República oferece àquele que a ocupa uma tribuna vitaminada. Chamava essa tribuna de bully pulpit —púlpito formidável, numa tradução livre. 

De um bom presidente, ensinou Roosevelt, espera-se que aproveite o palanque privilegiado para irradiar confiança e bons exemplos. De Bolsonaro não se espera tanto. Mas uma dose de recato já pareceria um extraordinário avanço institucional. (por Josias de Souza)