Faltando 2 dias para o Brasil ir às urnas dizer o que decidiu depois de meses a fio de troca de acusações, de denúncias de corrupção, de boataria difamatória, de julgamentos morais sumários, de imposição de dogmas religiosos a não convertidos, vai surgindo uma sensação de que a fúria midiática pode estar se perguntando se vale mesmo a pena disparar a última bala de prata contra Dilma Rousseff.
Como se viu durante a campanha, as denúncias tardam dias a fio para surtir efeito apreciável nas pesquisas e, assim mesmo, têm efeito limitado, ainda que seja possível potencializá-lo porque é preciso convencer parte mais modesta do eleitorado. Todavia, a parte desse eleitorado que poderia desequilibrar o jogo por estar sujeita a mudar de opinião é também a parte que menos se informa, o que lhe explica a hesitação a esta altura do campeonato.
O quadro em que uma bala de prata – uma denúncia de última hora que não possa ser respondida a tempo pelo acusado – poderia inverter o rumo dos quase vinte milhões de votos de vantagem que as pesquisas dão a Dilma na situação que lhe é mais favorável teria que ser o quadro de uma disputa apertada, o que ao menos as pesquisas negam que esteja acontecendo.
Além desse fato, um outro, recente, mostra que a maioria absoluta dos brasileiros não está dando crédito não só a Serra, mas à mídia que tanto trabalhou por ele durante a campanha eleitoral deste ano.
Note-se que o tucano perdeu terreno considerável nas pesquisas justamente após o factóide da bolinha de papel atirada na própria careca em comício no Rio de Janeiro e de uma sua encenação que se tornou presumível com as imagens do SBT e da Record, as únicas emissoras que foram capazes de veicular imagens taxativas quanto ao que atingiu o candidato.
E Serra não perdeu credibilidade sozinho, nesse episódio. A Globo também perdeu ao ter veiculado um vídeo duvidoso que referendaria a versão dele sobre os fatos. As milhões de intenções de voto que se definiram em favor de Dilma em tão pouco tempo insinuam que toda essa gente tampouco acreditou na Globo.
Mas quem não acreditou na Globo, o que ficou pensando dela depois do episódio? Não terá formado a convicção de que a emissora carioca está tentando impor uma escolha eleitoral aos brasileiros? Essa pessoa estará disposta a comprar nova acusação midiática a Dilma sem que exista tempo para avaliar melhor o caso?
Quantos seriam capazes de entender, no caso de a fúria midiática disparar mesmo uma bala de prata, que, se votarem em Serra com base na denúncia e ela não se comprovar, ao fim não haverá como voltar atrás, mas que, se Dilma for eleita e a denúncia for comprovada, sempre se poderá tirá-la do cargo?
Esse é o ponto. O disparo da derradeira bala de prata desta eleição pode sair pela culatra, sobretudo se Dilma vencer. A fúria midiática terá dado em Serra um legítimo abraço de afogado. Juntos lutaram e juntos dividiriam a derrota.
Para a mídia seria desastroso. Pouco se diz que um dos fatores que movem a fúria midiática é o de querer exibir poder de eleger ou de derrubar políticos, de criar crises, enfim, de chantagear a classe política para arrancar dela concessões aos seus interesses particulares de empresários da comunicação e membros da elite branca concentradora de renda.
Pode, portanto, estar caindo a ficha da mídia de que não vale a pena apostar tanto em um “cavalo” manco como Serra, quem, apesar de toda a ajuda da fúria midiática e até da Justiça Eleitoral, tem se mostrado pouco competitivo contra uma tecnocrata que jamais disputara uma eleição na vida.
Pode haver uma surpresa? Pode, claro. As pesquisas não foram tão precisas ao fim do primeiro turno.
Só que a vantagem de Dilma, na pior das hipóteses, é hoje de doze pontos percentuais. Ela teve 47% em 3 de outubro e as pesquisas diziam que teria algo perto de 50%; Serra teve 32% e as pesquisas diziam que teria cerca de 30% – três pontos pra lá, dois pra cá. Ora, para Serra vencer agora o erro teria que ser de no mínimo uns 7 pontos percentuais.
A mídia está fazendo esta reflexão? Há indícios de que está.
Pode ser que matérias inéditas contra Serra como a que a Folha de São Paulo divulgou nesta semana envolvendo o metrô paulistano sejam do mesmo tipo da que o mesmo jornal divulgou no fim do ano passado para poder fazer aquela imundice do “menino do MEP” contra Lula – o jornal, depois de 18 anos, divulgou o filho ilegítimo de FHC com uma jornalista da Globo.
Mas a matéria contra Serra na Folha também pode ser produto desta reflexão que propus. A fúria midiática pode estar tentando, em uma semana, desfazer o vínculo estreito que estabeleceu com ele durante a década que se encerra. Não dá para dizer que seria possível romper laços tão estreitos em tão pouco tempo, mas o Day Afternão seria tão desastroso.
Enfim, como não cabe à sociedade tal reflexão, mas aos mesmos Marinhos, Frias, Civitas e Mesquitas e seus impérios enfurecidos, só nos resta assistir de camarote à decisão que irão tomar sobre como pretendem amanhecer no dia 1º de novembro próximo – se serão considerados vencedores ou perdedores de acordo com o resultado da eleição ou se amanhecerão do mesmo jeito seja qual for esse resultado.
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