quinta-feira, 25 de agosto de 2011

O quadro político brasileiro, por Marcos Nobre

Há algumas semanas, o cientista político e filósofo Marcos Nobre cunhou a expressão “tática de queda de braço” para definir o papel que vem sendo exercido pela presidente Dilma Rousseff no campo político. A forma como Dilma reage às denúncias de corrupção, as quase 30 demissões no Ministério dos Transportes ou o enfrentamento político na discussão do Código Florestal seriam, segundo ele, algumas amostras dessa tática. Para Nobre, Dilma estaria moldando sua imagem a partir disso: alguém que, de dentro, enfrenta o sistema político e mantém suas posições, mesmo quando percebe que irá perder.

A tática, que teria sido intensificada após o Planalto perceber sinais positivos nas pesquisas de popularidade, também tem seus limites, segundo Nobre. O prazo, estima, são as eleições de 2012, quando o PT e os outros partidos da base terão de se entender na confecção de alianças pelo país: “Quando chegar lá, pode ser que o Lula queira que a Dilma chancele uma aliança e aí ela pode não topar. Como vai ser isso? Ela será harmoniosa em 2012?”..

Sintetizar o momento político de qualquer país é um desafio sempre ambicioso e arriscado. Nesta entrevista, Nobre procura fazer isso. E ninguém pode acusá-lo de ficar em cima do muro. Entre outras coisas, ele classifica o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), como “líder da oposição”; prevê que o mesmo Temer irá “deitar e rolar” em 2012, crescendo sobretudo em cima do PSDB; afirma que o senador Aécio Neves (PSDB) é “símbolo da peemedebização” do sistema político brasileiro; avalia que o ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB) está desesperado; e ainda celebra a militância ativa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “uma novidade ótima para o Brasil”.
ÉPOCA – O que é isso que o senhor chama de “tática de queda de braço” da presidente Dilma Rousseff?
Marcos Nobre – Uma das dificuldades da Dilma é estabelecer qual é a sua imagem. Então ela encontrou o lugar dela nesse confronto constante. É como se ela fosse uma representante da moralização, do republicanismo, que combate o sistema. É como se ela não fosse política. É como se não fosse do meio. No entanto, ela é sustentada justamente por essa mesma base de apoio. É interessante, pois é tudo muito diferente do Lula.
ÉPOCA – Uma hora pode perder, não?
Nobre – Quando ela vê que vai perder, ela aceita. E é engraçado isso. A tática consiste em saber escolher as brigas que vai perder, mas tirar proveito de todas. Aí, mesmo quando ela perde, é uma vitória moral: “Perdi, mas estava certa, do lado certo”. Foi o caso do Código Florestal. Também é preciso distinguir quedas de braço que dizem respeito ao que é fundamental para o governo Dilma e ao que é, digamos, não tão fundamental. No salário mínimo ela não admitia perder, pois colocaria em risco esse pacto criado pelo Lula, que é o crescimento em torno de 4% e inflação controlada. Já no Código Florestal, ela poderia perder porque não era essencial para a garantia do pacto.
ÉPOCA – O fato de ela ser neófita em cargo eletivo a ajuda na construção dessa imagem?
Nobre – Exatamente. O crédito que ela tem é por ser neófita. Ajuda porque ela não tem um passado fora do governo Lula ou um passado no parlamento que possa atrapalhar essa posição da moralizadora do circo. Ela está usando muito essa posição dela. É muito bem feito.
ÉPOCA – O senhor acha que a presidente e seus assessores formulam isso e então executam? Ou é algo que vão respondendo conforme a demanda, no improviso, até chegar a esse modelo de atuação?
Nobre – Acho que é no improviso. Há um objetivo que vai sendo perseguido e vai se ajustando conforme as respostas da sociedade e do sistema político. Por exemplo: agora a Dilma tem um problema sério, que é convencer os partidos que ela não irá fazer uma faxina generalizada. Porque todos os partidos da base estão em pânico. Pânico. Então a questão é: você tem de um lado a sociedade apoiando essas medidas (demissões, apurações), pedindo mais, e tem o sistema político dizendo “hei, calma!”. Isso não está decidido ainda para onde vai. É uma das coisas que vai ser definida agora, no segundo semestre.
ÉPOCA – O senhor escreveu recentemente que o ex-presidente Lula poderia estar preocupado com essa tática da Dilma. A presidente não corre o risco de ficar isolada se insistir muito nisso?
Nobre – Esse risco existe, claro. Acho que o que o Lula está dizendo é o seguinte: “A Dilma tem uma tática que é diferente da minha. Eu não iria nunca pra queda de braço.” Ele sempre contornava o veto, fazia o acordo. E ele deve estar dizendo para ela: “Olha, é perigosa essa tática, tem certos limites”. O Gilberto Carvalho, que é o grande porta-voz do Lula, diz assim: “Não haverá caça às bruxas”. Depois ele mesmo diz: “Vamos caçar todos os corruptos”. É um problema. É o que vai marcar o segundo semestre? Abriu a caixa de pandora. Vai fechar? Vai fechar um pouquinho, deixar meio aberta? É controlável? Qual será a pressão da sociedade? E do sistema político?
ÉPOCA – O senhor acha que vai ter troco dos partidos?
Nobre – É possível. Isso não está revolvido. Acho que o sistema político já entendeu como a Dilma funciona. Porque no começo estava todo mundo perdido. Inclusive na questão da política econômica. Acho que agora as coisas estão mais claras: ela vai ficar em queda de braço em por pelo menos mais um ano.
ÉPOCA – O senhor diria então que, por enquanto, ela está levando a melhor?
Nobre – Por enquanto ela está faturando.
ÉPOCA – O senhor classificou Gilberto Carvalho como o porta-voz do Lula no governo. Alguns dizem que, sem Palocci, só sobrou ele como “representante de Lula”. Essas afirmações partem do pressuposto que Lula não poderia confiar na Dilma. Sugerem que Dilma sonegaria algo importante para Lula. Não é precipitado supor essa distância entre Dilma e Lula?
Nobre – Quando falo isso, não estou pressupondo em nenhuma hipótese essa ideia de que haveria sonegação de informação. Quero dizer o contrário: o que o Lula fez foi dizer para Dilma que iria ajudá-la no começo. É claro para ele que seria um período de transição e precisaria de uma certa adaptação do sistema político e do governo às novas diretrizes. Em nenhum momento acho que o Lula pensou que pudesse mandar no governo da Dilma. Ele conhece a Dilma, sabe que isso nem seria possível. O (ex-ministro Antônio) Palocci era uma figura curiosa. Ele era representante do Lula no sentido que ele era o intérprete da Dilma para o sistema político. A Dilma vinha para a queda de braço e ele traduzia para uma maneira mais delicada, vamos dizer. Quando ele sai, fica só a queda de braço. Para o Lula é um susto, pois ele não sabe se mexer dessa maneira. Não é o estilo dele. Ele sabe que é o estilo da Dilma. Mas ele queria que a transição fosse mais suave. Outra coisa sobre o Lula: foi desastrosa a tentativa dele de ajudar na crise do Palocci. Isso porque, na verdade, ele estava tentando sustentar o Palocci, não ajudar a Dilma. Tanto que ele se recolheu.
ÉPOCA – Qual é o papel do Lula hoje, então?
Nobre – Existia uma certa divisão de tarefas na campanha. Lula foi cuidar de alianças eleitorais, principalmente para derrotar o que restava da oposição. Então agora o Lula vai se dedicar a manter as alianças e tentar tirar as bases da oposição onde elas ainda existem. Tanto para 2012 quanto para 2014. O problema é que quando chegar na hora H, eles (os partidos) vão querer saber o que a presidenta pensa. E aí sim eu acho que vai ter atrito. Não entre Lula e Dilma, mas entre as forças que irão se alinhar em cada um desses momentos. Repare que hoje o Lula já está indo contra a maioria do PT em vários casos, em alianças. Mas note que a Dilma está fora disso. É interessante: eles fizeram um acordo, uma divisão de tarefas. A dúvida é 2012. Quando chegar lá, pode ser que o Lula queira que a Dilma chancele uma aliança e aí ela pode não topar. Como vai ser isso? Ela será harmoniosa em 2012?
ÉPOCA – Há um certo encantamento da classe média tradicional com Dilma. Isso pode colocar em risco a simpatia que foi construída entre as classes C, D e E com o PT?
Nobre – Não. É uma agregação. É a mais. E se deve a essa política dela de queda de braço.
ÉPOCA – E o que resta para a oposição?
Nobre – Nada. A oposição só pode fazer o seguinte: ficar sentada esperando que alguma coisa dê errado para ver o poder cair em seu colo. Da maneira como está organizado o sistema, isso que eu chamo de peemedebismo de todo o sistema político, não há oposição. A oposição no Brasil existiu enquanto o PT estava na oposição. Depois que o PT virou governo, acabou a oposição. Repare: as duas primeiras pessoas que saíram em defesa do ministro Antonio Palocci foram Aécio Neves e José Serra. É inacreditável. Isso é expressão do peemedebismo da política brasileira. Você não tem situação e oposição. Só tem um sistema político e um Estado feudalizado. Tem feudos: Grupos de interesse que pegam uma determinada posição e se organizam de tal maneira que, quando você vai fazer alguma política que lhes digam respeito, tem de consultá-los, pois eles têm poder de veto. Então a política no Brasil é ficar contornando vetos. Lula só contornava esses vetos.
ÉPOCA – Explique melhor essa posição de Aécio e de Serra.
Nobre – O que eu quero dizer é que não tem diferença entre eles e o sistema. A Dilma mostra que tem uma diferença entre ela e o sistema. Eles não. Eles fazem parte desse sistema. A única coisa que podem dizer é: “Olha, nós seremos síndicos melhores que esses que estão aí”. Mas síndicos da mesma coisa. Não é para mudar nada.
ÉPOCA – Serra está mais agressivo, não?
Nobre – O Serra não fez uma campanha de oposição. O que ele disse foi: “Vou continuar tudo o que o Lula fez, o Lula estava correto, só que vou fazer melhor que a Dilma”. Aí depois ele começou a pegar nas questões de valor, religião, aborto. Em nenhum momento fez uma campanha de oposição digna do nome. Ele virou de oposição depois que perdeu. Mas agora é porque está isolado. É tática para tentar reconquistar uma liderança dentro do PSDB. Só que agora ele não conta mais. Essa radicalização dele é desespero.
ÉPOCA – O senhor escreveu que o Brasil passou por duas revoluções no período recente, uma econômica e outra social, mas faltaria agora uma revolução política. O que seria isso?
Nobre – Quando falam em reforma política, as propostas são sempre de mudanças das regras eleitorais. Isso não vai mudar muita coisa. Não é esse o ponto. O que tem de mudar é a estrutura da relação entre o Estado brasileiro e o sistema político. Essa cultura feudalizada, esses interesses encastelados, que você não consegue nem tirar, nem enfrentar, tem de ficar contornando o tempo todo. De tal maneira que o limite disso, quando todos estão com seus interesses encastelados, você chega à paralisia.
ÉPOCA – Mas, objetivamente, o que poderia ser feito?
Nobre – Por exemplo: como você classifica uma medida que reduza os cargos comissionados ao mínimo necessário? Fazer isso é uma pequena revolução. Alguém fará, tenho certeza. Vai ter de ter apoio da sociedade. Se não tiver, não acontece. Mas você também precisa ter descentralização, maior poder para os Estados e municípios… É o conjunto de reformas como essas que eu chamo de pequena revolução política. Senão não altera a estrutura disso que eu chamo de peemedebismo. O problema de fato é você conseguir atacar o cerne dessa ideia de que política é feita a partir de grupos de interesse que se organizam, que se encastelam no Estado, não saem dali, e têm poder de veto. Isso não dá mais. Aliás, isso impede que haja polarizações reais.
ÉPOCA – O PMDB parece desorganizado internamente, agrupa políticos com diferentes interesses, não costuma nem lançar candidato próprio à Presidência. Não é um mistério? Como consegue sobreviver e ser sempre grande?
Nobre – Eu não acho. Há um grande acordo que compõe o peemedebismo. Funciona assim: é um partido-ônibus. O que significa? Todo mundo que paga passagem pode entrar. Aliás, um parêntese: o Kassab fez uma inovação agora na política brasileira ao inventar o partido-ponto-de-ônibus: “Qualquer um que passar a gente pega” (risos). Mas voltando ao PMDB. Qual é a lógica? Se você conseguir entrar e se organizar como grupo de pressão, você ganha duas coisas: será consultado sobre tudo o que diz respeito a seu interesse e terá poder de veto no tema. É assim que funciona. Então não é nada desorganizado. Aí tem as repartições regionais, a nacional, sempre com esse pacto básico. Isso, no limite, leva a paralisia. Quando juntou os dois, o que aconteceu?
ÉPOCA – Os dois quem?
Nobre – O PMDB e o Brasil.
ÉPOCA – O que aconteceu?
Nobre – Deu paralisia. Foi o governo Sarney. É por isso que o PMDB nunca tem candidato próprio à Presidência, esse grande mistério da política brasileira. É isso. O PMDB não pode ser síndico. Se o PMDB for síndico, paralisa tudo. E digo mais: todos os outros partidos se organizam exatamente da mesma maneira. É um modelo. Pegue o PSB, é assim. Kassab? A mesma coisa. A lógica é essa.
ÉPOCA – O PSDB é a mesma coisa?
Nobre – O PSDB é quase a mesma coisa. O único partido, de fato, que não é peemedebizado é o PT. Bom, e o PCdoB, que é pequeno. O PSDB, com Aécio, é peemedebizado.
ÉPOCA – Por que com Aécio?
Nobre – O Aécio é o representante disso. Perceba: o PMDB nunca tem um discurso claro sobre coisa alguma. São sempre genéricos, sempre a favor do amor, do progresso. E o Aécio é esse cara. É o sujeito que não tem nada a dizer, não tem proposta, nenhum discurso, nada. É aquele cara que abraça todos os prefeitos. É aquele que acomoda todos os interesses. Olha o que ele fez em Minas Gerais. Não vou chegar no limite do Espírito Santo, que é o caso ideal, né?
ÉPOCA – Caso ideal de peemedebização?
Nobre – É. Estou falando do (governador Renato) Casagrande (PSB). Você sabe quantos deputados tem na Assembléia Legislativa do Espírito Santo? Trinta. Quantos apóiam o governo? Trinta. Esse é o caso do peemedebismo no seu estado perfeito. O Aécio é a mesma coisa.
ÉPOCA – E o Aécio é o melhor que a oposição tem a oferecer no momento?
Nobre – O melhor, não. O único. Hoje o Aécio é o candidato do PSDB. É o que consegue reunir aquilo que se chama de oposição.
ÉPOCA – O PSDB perdeu o Gabriel Chalita, que depois foi o segundo mais votado de São Paulo e agora desponta como candidato importante na capital. Perdeu o Eduardo Paes, que depois virou prefeito Rio. Agora, mais recentemente, perdeu o Gustavo Fruet, no Paraná. Tem um problema sério aí, não?
Nobre – Você tem razão. O problema é o seguinte: ninguém consegue sobreviver fora do governo. O PSDB tenta sobreviver nos bastiões que conquistou nos Estados. Do ponto de vista do sistema, é muito difícil ser oposição. O que você listou são migrações para partidos que são da base do governo. O segundo aspecto é: quando você está isolado, a tendência de fragmentação é maior. Então começa a ter briga interna. O Serra quer ser o representante da oposição que ele nunca foi em oito anos, o PSDB tem quatro pré-candidatos á prefeitura (de São Paulo), o Alckmin não consegue mais controlar, o Aécio entra mas não quer brigar com ninguém. Então é muito difícil. O sistema, como está organizado, mata a oposição em todos os sentidos.
ÉPOCA – E como o PT sobreviveu na oposição? E ainda triunfou?
Nobre – Ah, o PT tinha uma ligação com os movimentos sociais, uma ligação com a base da sociedade que era muito viva. Sobreviveu por isso. Colocava gente na rua, tinha central sindical, tinha movimento social. Nenhum outro partido tem essa base. O PT é um raio em céu azul nesses últimos 30 anos da política brasileira. É um caso único.
ÉPOCA – Então, pelo que o senhor diz, não há oposição real alguma no país?
Nobre – Tem. Quando o sistema está peemedebizado, como está, a oposição migra para dentro do governo. Então qual é o líder da oposição hoje? É o Michel Temer, claro. Temer, hoje, é o líder da oposição. O que ele faz? Ele vem para São Paulo e faz um ato junto com o governador Geraldo Alckmin (PSDB), na inauguração da ponte Orestes Quércia. Depois acena para o DEM. O que ele quer dizer com isso? Está dizendo: “eu posso fazer aliança com a oposição em qualquer outro lugar”. O que ele está querendo fazer é subir o preço do PMDB. E essa candidatura do Gabriel Chalita, em São Paulo? O que ele quer? Está tentando levantar o cacife. Eu acho que quer o posto de vice na chapa do PT. Se não derem, ele sai com o Chalita ou com qualquer outro partido.
ÉPOCA – Essa unidade do PMDB não é a grande novidade da política brasileira? Antes tinha uma disputa entre o PMDB da Câmara e o PMDB do Senado. O Temer aparentemente pacificou isso. No Congresso, agora, o partido vota unido. Em São Paulo tinha a divisão do Temer com o Quércia, um atuando só na esfera nacional, outro só na estadual. Não tem mais. Agora, essa iniciativa forte de colocar o Chalita.
Nobre – O Temer não tinha o PMDB de São Paulo. O que ele fez no passado foi: “No Estado de São Paulo eu estou morto. Mas faço um acordo com o Quércia para sobreviver e vou para o plano federal”. Agora que o Quércia morreu, ele toma o espólio todo. Sobre a pacificação, havia um desequilíbrio entre situação e oposição no Senado. No Senado, o governo ia pior. Então a dependência (do governo) do Senado era maior que na Câmara. O PMDB lá era mais importante. Agora está começando a se equilibrar de novo. Então essa pacificação entre PMDB da Câmara e PMDB do Senado não é por ele, Temer. É pelas circunstâncias.
ÉPOCA – O PMDB chegou a ter metade dos deputados federais paulistas no fim dos anos 80. Agora, em 2010, só elegeu um. Definhou. Quem se beneficiou dessa queda foi o PSDB. E agora, com o PMDB unido e o PSBD em briga, o que pode ocorrer? O PMDB vai crescer em cima do PSDB?
Nobre – Não tenho dúvida. Se você olhar as cadeiras, o PMDB se mantém mais ou menos estável no Congresso ao longo dos anos. Mas muda conforme o Estado. O que aconteceu é que o Quércia era oposição ao Lula. Isso enfraquecia o PMDB de São Paulo. Nos Estados em que o PMDB era oposição, caiu. Olha o que ocorreu em Pernambuco. Onde era oposição, o PMDB caiu. Agora, com o Temer na situação, fazendo alianças, a tendência é o PMDB crescer em São Paulo. Nessas eleições de 2012, o Temer vai deitar e rolar.
ÉPOCA – Nos Estados Unidos tivemos recentemente uma polarização real entre o presidente Barack Obama e os republicanos. E isso deixou muita gente apavorada. Tem até uma provocação engraçada sobre o episódio: dizem que se os Estados Unidos tivesse um grande PMDB, nada daquilo teria ocorrido.
Nobre – Ninguém xingou mais os republicanos que eu. Mas eu olho para aquilo e digo: eles estão fazendo política. Essa história de ficar demonizando a democracia porque eles estão fazendo o que acham que deve fazer é um equívoco. Já aconteceu antes, em 2008, quando o Congresso americano não passou o pacote do governo (George W.) Bush. E também falavam: “o que vai acontecer?”, “o país vai pro buraco”… É importante saber o seguinte: não existe um acordo previamente estabelecido entre democracia e capitalismo. De fato, nos últimos 30 anos, todos os partidos caminharam para o centro. Do ponto de vista do mercado financeiro, foi excelente. Agora, do ponto de vista do sistema democrático, não. Então alguém diz assim: “nós não queremos uma polarização igual à dos Estados Unidos”. Por que não? O que é que tem de ruim? Claro: se os republicanos levassem isso até o ponto em que os Estados Unidos chegassem de fato ao calote, você poderia dizer que chegou num limite. Mas não. Foi tudo calculado. Foram irresponsáveis no limite, pois queriam dobrar o Obama. E dobraram. Tenho que dizer: isso é um sistema democrático.
ÉPOCA – Não foi um pouco daquilo que o PT fazia quando era oposição?
Nobre – Exato. Era oposição de verdade. É assim que é oposição. Dizem que tem de ser oposição responsável. Por que responsável? Nada. Oposição tem de fazer aquilo que acha que deve ser a política. Se for irresponsável, o que vai acontecer é o que o eleitorado vai abandoná-la. Mas nada disso ocorre no Brasil. O sistema político brasileiro é peemedebizado. Não tem oposição.
ÉPOCA – Queria que o senhor fizesse uma reflexão sobre o papel do ex-presidente Lula, que está ativo. Como o senhor tem visto? É a primeira vez na história recente que há um ex-presidente com enorme popularidade livre por aí, não?
Nobre – Uma coisa muito boa é o Brasil começar a ter ex-presidentes muito ativos, como você diz. A figura de ex-presidente é o melhor quadro político que o país produz. Ele não tem de se retirar da vida política coisa nenhuma. Tem mais é que fazer política. De preferência sem atrapalhar quem está no governo. Fazer política tem muitos sentidos. Fernando Henrique continua fazendo ativamente, abraçou a questão da descriminalização (da maconha). O Lula está fazendo política partidária até muito forte, com articulação para 2012.
ÉPOCA – Alguns comentaristas parecem incomodados com as movimentações de Lula.
Nobre – Não me incomoda. Nada. A opinião dele conta para fazer diferença no debate público. É uma novidade ótima para o Brasil. Que os ex-presidentes façam política cada vez mais livres, como você falou. São quadros ótimos. Por que vamos perder esses quadros?

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