A frase acima foi construída de forma a demonstrar ao leitor que não se pode, o tempo todo, falar como se escreve ou escrever como se fala. O título do post poderia ser usado em uma situação da qual se deve fugir, ainda que seja impossível. Afinal, todos nós, algum dia, já dissemos coisa parecida a alguém. Ou tivemos vontade de dizer.
O livro “Por uma vida melhor”, da professora Heloisa Ramos, adotado pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), está sofrendo um bombardeio simplesmente por tentar explicar ao público ao qual se dirige (crianças e até adultos em processo de alfabetização) exatamente isso, quando usar o português formal e informal. E explica por que usamos as duas formas.
Apesar disso, certos colunistas de jornal andaram se manifestando no sentido de que o governo Dilma, através do MEC, estaria ensinando a crianças que falar errado é certo só porque Lula fala errado. Outros, preferiram dizer que o livro foi escrito para o governo federal não ter trabalho de ensinar direito as crianças.
Vendo que jornalistas capachos de barões da mídia não perdem uma chance de mostrar serviço e tentam descobrir pelo em ovo, vendo-os distorcerem a intenção do livro supracitado, muitos podem ter vontade de lhes dizer uma frase como a que encima este texto. Não é recomendável, mas que dá vontade, isso dá.
Para avaliar o caso há que ler o livro didático que provocou esse surto de má fé, pois ninguém que escreve coluna de jornal é tão burro a ponto de não entender o que a obra explica, ou seja, que não adianta você mandar alguém que faz a sacanagem que esses jornalistas estão fazendo, ir se sodomizar. Tem que mandar no popular, mesmo.
Eis, o capítulo do livro que gerou a polêmica. (click em, mais informações)
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Capítulo 1
Escrever é diferente de falar
“Preciso entregar esse texto e queria que você lesse antes, para ver se está bom.”
A frase acima traduz uma situação bastante comum. Mesmo alguém experiente na leiturae na escrita sente necessidade da avaliação de outra pessoa sobre o que escreve. Escritores consagrados, do passado e da atualidade, também mantiveram, e mantêm, o hábito de trocar correspondências sobre sua obra.
Há momentos em que surgem dúvidas sobre a grafia das palavras (se têm acento, se levam ums ou dois…), sobre a pontuação, o emprego de maiúsculas etc. Às vezes, somos dominados por uma insegurança que nos impede até mesmo de saber ao certo qual é nossa dúvida. Sentimos que falta algo no texto, mas não sabemos o que
é. Isso é natural, pois se trata de uma dificuldade enfrentada por todos que estão aprendendo o funcionamento da língua escrita. À medida que ampliamos nosso conhecimento sobre ela, essas sensações vão sendo superadas.
é. Isso é natural, pois se trata de uma dificuldade enfrentada por todos que estão aprendendo o funcionamento da língua escrita. À medida que ampliamos nosso conhecimento sobre ela, essas sensações vão sendo superadas.
A língua escrita não é o simples registro da fala. Falar é diferente de escrever. A fala espontânea, por exemplo, é menos planejada, apresenta interrupções que não são retomadas. Além disso, conta com outros recursos, como os gestos, o olhar, a entonação. Já a escrita possui muitas convenções. Ela precisa ser mais contínua, sem os cortes repentinos da fala, e mais exata, porque geralmente não estamos perto do leitor para lhe explicar o que queremos dizer.
Você, que é falante nativo de português, aprendeu sua língua materna espontaneamente, ouvindo os adultos falarem ao seu redor. O aprendizado da língua escrita, porém, não foi assim, pois exige um aprendizado formal. Ele ocorre intencionalmente: alguém se dispõe a ensinar e alguém se dispõe a aprender. Geralmente há local, momento e material próprios para isso. Obviamente, em algumas ocasiões, é possível improvisar: um irmão mais velho pode ensinar o que já aprendeu na escola para o irmão mais novo, por exemplo. De qualquer forma, dificilmente aprendemos a ler e a escrever por acaso, sem ter a intenção disso.
Outro ponto importante: da mesma forma que uma criança aprende a falar observando os outros falarem, o aprendizado da língua escrita requer acesso a textos escritos, ou seja, aprendemos a ler lendo e a escrever escrevendo.A leitura e a escrita necessitam de prática. Por isso, mesmo que uma ou outra atividade de escrita lhe ofereça dificuldade, você deve se empenhar ao máximo para realizá-la. Procure reler e revisar o que foi escrito, e, quando necessário, passe o texto a limpo. No começo, você pode achar difícil, mas os resultados compensarão.
Neste capítulo, vamos exercitar algumas características da linguagem escrita. Além disso, vamos estudar uma variedade da língua portuguesa: a norma culta. Para entender o que ela é e a sua importância, é preciso antes conhecer
alguns conceitos.
alguns conceitos.
Em primeiro lugar, não há um único jeito de falar e escrever. A língua portuguesa apresenta muitas variantes, ou seja, pode se manifestar de diferentes formas. Há variantes regionais, próprias de cada região do país. Elas são perceptíveis na pronúncia, no vocabulário (fala-se “pernilongo” no Sul e “muriçoca” no Nordeste,
por exemplo) e na construção de frases.
por exemplo) e na construção de frases.
Essas variantes também podem ser de origem social. As classes sociais menos escolarizadas usam uma variante da língua diferente da usada pelas classes sociais que têm mais escolarização. Por uma questão de prestígio — vale lembrar que a língua é um instrumento de poder —, essa segunda variante é chamada de variedade culta ou norma culta, enquanto a primeira é denominada variedade popular ou norma popular.
Contudo, é importante saber o seguinte: as duas variantes são eficientes como meios de comunicação. A classe dominante utiliza a norma culta principalmente por ter maior acesso à escolaridade e por seu uso ser um sinal de prestígio. Nesse sentido, é comum que se atribua um preconceito social em relação à variante popular, usada pela maioria dos brasileiros.
Esse preconceito não é de razão linguística, mas social. Por isso, um falante deve dominar as diversas variantes porque cada uma tem seu lugar na comunicação cotidiana.
Como a linguagem possibilita acesso a muitas situações sociais, a escola deve se preocuparem apresentar a norma culta aos estudantes, para que eles tenham mais uma variedade à sua disposição, a fim de empregá-la quando for necessário.
Há ainda mais um detalhe que vale a pena lembrar. A norma culta existe tanto na linguagem escrita como na linguagem oral, ou seja, quando escrevemos um bilhete a um amigo, podemos ser informais, porém, quando escrevemos um requerimento, por exemplo, devemos ser formais, utilizando a norma culta. Algo semelhante ocorre quando falamos: conversar com uma autoridade exige uma fala formal, enquanto é natural conversarmos com as pessoas de nossa família de maneira espontânea, informal. Assim, os aspectos que vamos estudar sobre a norma culta podem ser postos em prática tanto oralmente como por escrito.
Neste capítulo, vamos ler dois textos. Eles permitirão aprofundar questões relativas à escrita e à maneira formal de as pessoas se expressarem em português
A concordância entre as palavras
A concordância entre as palavras é uma importante característica da linguagem escrita e oral. Ela é um dos princípios que ajudam na elaboração de orações com significado, porque mostra a relação existente entre as palavras.
Verifique como isso funciona:
Alguns insetos provocam doenças, às vezes, fatais à população ribeirinha.
insetos (masculino, plural) ß alguns (masculino, plural)
doenças (feminino, plural) ß fatais (feminino, plural)
população (feminino, singular) ß ribeirinha (feminino, singular)
As palavras centrais (insetos, doenças, população) são acompanhadas por outras que esclarecem algo sobre elas. As palavras acompanhantes são escritas no mesmo gênero (masculino/feminino) e no mesmo número (singular/plural) que as palavras centrais.
Essa relação ocorre na norma culta. Muitas vezes, na norma popular, a concordância acontece de maneira diferente. Veja: Os livro ilustrado mais interessante estão emprestado.
livro (masculino, singular) à os (masculino, plural)
ilustrado (masculino, singular)
interessante (masculino, singular)
emprestado (masculino, singular)
Você acha que o autor dessa frase se refere a um livro ou a mais de
um livro? Vejamos:
um livro? Vejamos:
O fato de haver a palavra os (plural) indica que se trata de mais de um livro. Na variedade popular, basta que esse primeiro termo esteja no plural para indicar mais de um referente. Reescrevendo a frase no padrão da norma culta, teremos:
Os livros ilustrados mais interessantes estão emprestados.
Você pode estar se perguntando: “Mas eu posso falar ‘os livro?’.” Claro que pode. Mas fique atento porque, dependendo da situação, você corre o risco de ser vítima de preconceito linguístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas. O falante, portanto, tem de ser capaz de usar a variante adequada da língua para cada ocasião.
via blog da cidadania
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