segunda-feira, 16 de maio de 2011

A cara da decadência paulista


Os dois fenômenos 
Janio de Freitas, Folha de S. Paulo

Kassab é mesmo o político mais importante de São Paulo; como é possível que seja ele o relevo do Estado?
Negá-lo, ou fingir que não percebe, não alteram a evidência: com a elevação de Lula a político acima de limites estaduais, Gilberto Kassab, senhoras e senhores, é mesmo o político mais importante de são paulo. Não será isso um apelo bastante forte para os paulistas ilustrados e os nem tanto se entregarem, afinal, à reflexão que devem há tanto tempo, sobre si mesmos e sua relação com o Estado e o país?

Nem uma só frase sua, nem uma só ideia sua o nome dessa eminência política, com tantos anos de trânsito na vida pública, traz à lembrança. E não é em algum lugar subalterno que Kassab se sobrepõe aos circunstantes. É no Estado das grandes universidades, do poder financeiro e econômico, da imprensa predominante em influência nacional. Como é possível que seja ele o relevo?

Políticos tirados de uma cartola são comuns. O berço malufista em que Kassab surgiu foi o mesmo de onde saiu Celso Pitta, o que explica a união das duas crias até que o segundo sucumbisse à desgraça política. Mas Kassab encontrou outra cartola, mais surpreendente: a de José Serra. Nem com tal ajuda, ainda retribuída por serviços variados, o Kassab prefeito foi além de suas marcas físicas - a peculiaridade da aparência e do timbre de voz.

Não. Teve uma diferenciação no território político, sim. Ficou aí, mesmo inerte e insignificante, mesmo para nada. E à volta os outros foram minguando, ou aturdindo-se, ou errando em cada passo. Os que ainda falam às vezes, falam sem eco. Quem ainda ambiciona, refugia-se no ressentimento e na perplexidade. E o mundo de pujanças que é São Paulo não foi capaz de fazer brotar nada que se mostrasse, na planície árida de um só tronco em pé, apesar de si mesmo.

Gilberto Kassab, sem contraste e sem cerimônia, pode fazer o que quiser. Por mais despropositado que seja. Cria uma representação sua na Inglaterra para ilustrar-se, na preparação da Olimpíada de Londres, para a Olimpíada que será no Rio. Só desmando debochado com os paulistanos, mais um sem reação, ou algum aviso aos cariocas? Nomeia para más particularidades paulistanas conselheiros que nelas não padecem. A respeito, parece-lhe bastante dizer que o faz "em homenagem" a Marco Maciel, atitude que a Maluf custou pesado processo, por também homenagear a seleção brasileira com dinheiro impróprio.

Bem à sua imagem, Kassab lança o tal PSD, partido sem razão de ser e sem uma só ideia definida ainda que alheia. Não é, de fato, partido político. É uma oportunidade para kassabs de diversos calibres e semelhantes propósitos. Não há como concordar, porém, com a ampla opinião de que o PSD não terá maior consequência. As adesões que recebeu na Câmara aproximam-se já de 50 deputados, uma numerosa bancada capaz ainda de crescer, e no Senado incluem já dois parlamentares com probabilidade de mais dois.

O que Kassab traz com seu partido é mais um bando do toma-lá-dá-cá. Com isso, um fator de maior degradação da vida política em suas instâncias institucionais e maiores desvios da atividade parlamentar. 

Como e por que esse é o realce da política de São Paulo e sua única oferta ao país, eis um fenômeno no melhor sentido da palavra. Em nível semelhante, só a apatia paulista diante dele e da realidade decadente que o produz.
Esquerdop̶a̶t̶a̶ 

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