Por Andrea Dip, especial para a Pública*
Em 2007, aproveitando o acidente com o vôo 3054 da TAM, empresários paulistas lançaram o “Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros” que ficou conhecido popularmente como “Cansei”, integrado por atrizes, atores e apresentadores de TV famosos que protestavam por uma variedade de temas – caos aéreo, corrupção educação, segurança.
Na visão do cônsul-geral dos Estados Unidos em São Paulo, Thomas White, que deixou o cargo em meados de 2010, o movimento não era apartidário......
Assim começa um comunicado enviado a Washington no dia 18 de setembro de 2007: “Na tentativa de aplacar o descontentamento popular com o governo Lula, um grupo de empresários de São Paulo lançou o Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, conhecido informalmente como ‘Cansei’ (I’m tired)”.
O documento segue dizendo que “apesar de os líderes insistirem no apartidaridarismo e dizerem que o movimento não ataca ninguém especificamente, tem causado forte reação de movimentos sociais e entidades ligadas ao governo Lula, que caracterizam o “Cansei” como um grupo de membros ricos da elite branca sem nada melhor para fazer do que reclamar”.
White diz ainda que o movimento não sabia direito para que direção avançar. “Conforme descrito em seu site e cartazes publicitários, os membros do Cansei estão fartos do caos aéreo, do poder dos traficantes, das crianças nas ruas, balas perdidas e tanta corrupção”.
Conversas com D’Urso
A Washington, White comenta sobre um encontro entre oficiais da embaixada americana, Luiz Flávio Borges D’Urso e representantes da OAB de São Paulo no dia 29 de agosto de 2007. “A OAB organiza frequentemente programas em conjunto com as mesmas associações empresariais que fazem parte do ‘Cansei’. De acordo com D’Urso, faz parte dos interesses da organização elogiar o governo mas também criticá-lo quando for o caso”.
O presidente da OAB São Paulo também aproveitou o encontro para criticar a resolução da arquidiocese de São Paulo, que proibiu o “Cansei” de fazer uma manifestação na Catedral da Sé em julho daquele ano e obrigou o movimento a fazer seu “um minuto de silêncio de indignação” ao ar livre. “Para D’urso, o arcebispo se curvou diante da pressão e não quis criar controvérsias”
FHC: “não é um lema para Martin Luther King”
Outra parte do documento diz que os líderes do “Cansei” não ajudaram ao tentar contar seu lado da história. “Entrevistado pela revista Veja, João Dória Jr. queixou-se que a opinião pública discrimina os bem sucedidos e ricos (…) e que sua imagem de alguém que nunca fumou, bebeu ou usou drogas, não briga, não fala palavrões e usa gel no cabelo tornou difícil aos brasileiros comuns se identificarem com sua causa”.
White diz também que o presidente da Philips no Brasil, Paulo Zotollo, atraiu atenção negativa quando disse a um jornal que, ao apoiar o movimento “Cansei”, desejava remexer no “marasmo cívico” do Brasil, e afirmou: “Não se pode pensar que o país é um Piauí, no sentido de que tanto faz quanto tanto fez. Se o Piauí deixar de existir ninguém vai ficar chateado”. “Zottolo insistiu que sua observação tinha sido tirada do contexto, mas, novamente, o estrago já estava feito” diz o americano.
Thomas White conclui o telegrama dizendo que o slogan “Cansei”, embora possa resumir com precisão os sentimentos de algumas pessoas, não é muito eficaz como um grito de guerra.
“Como ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comentou recentemente ao cônsul-geral, não é um lema que Martin Luther King, Jr., teria escolhido para inspirar seus seguidores”, revela White.
Para ele, “os líderes do movimento, por toda sinceridade e seriedade tornaram-se alvos fáceis para a caricatura”.
Em 2011, não há mais vestígios do “Cansei”. A página do movimento foi tirada do ar.
CartaCapital, *Matéria originalmente publicada em A Pública
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